Acórdão nº 2379/21.1T8SNT.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2022-02-01

Data de Julgamento01 Fevereiro 2022
Ano2022
Número Acordão2379/21.1T8SNT.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA)







Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:[1]

I - A) - 1) – A “MASSA INSOLVENTE DE A., LDA.”, pessoa colectiva n.° …, representada pela Administradora da Insolvência, B., que também usa o nome de BB., nomeada nos autos de processo de insolvência n.° 2855/10.1TJCBR, que correm termos no Juízo do Comércio de Montemor o Velho, veio, em 12/2/2021, propor AÇÃO DE PROCESSO COMUM contra C., viúva (1ª Ré), D. (2ª Ré) e marido, E. (3º Réu), pedindo que fosse declarada a ineficácia, em relação à aqui Autora, das compras e vendas tituladas pelo:

a) título de compra e venda celebrado no dia 16 de Agosto de 2017 na Casa Pronta da … Conservatória do Registo Predial de … - tendo por objecto o imóvel urbano, composto fracção autónoma designada pela letra “G” correspondente ao terceiro andar nascente, destinada a habitação, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal sito na Urbanização do …., Lote …, …., em …, …, na cidade de … e respectivo contrato promessa de alienação; e pelo

b) contrato de compra e venda de bens móveis celebrado entre os Réus no dia 16 de Agosto de 2017,

e, em consequência, ser reconhecido à Autora o direito de executar tais bens (imóvel e móveis) no património dos 2.° e 3.° Réus, adquirentes, para pagamento do crédito que detém sobre a 1ª Ré.

Alegou, em síntese, que tendo um direito de crédito no montante total de 88.074,07€ sobre a 1ª Ré, que resulta de condenação da mesma por sentença de 27/2/2017, do Juízo Central Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, no processo nº 2206/07.2TBCBR, tal Ré, em 16 de Agosto de 2017, em conluio com os 2º e 3º Réus, e tendo como único objectivo impedir que a Autora satisfizesse o seu crédito, vendeu a estes o imóvel acima identificado e os bens móveis identificados no artº 22º da petição, impedimento esse concretizado, já que a Autora tendo instaurado contra a Ré, com base na referida sentença condenatória, acção executiva para cobrança do mencionado crédito, não conseguiu que nela se encontrassem bens penhoráveis à executada de modo a poder depois aí fazer-se pagar do crédito exequendo.

2) – A Ré C., contestando, invocou, além do mais, a excepção da ilegitimidade da Autora, vindo esta a pugnar pela improcedência de tal excepção.


*

B) – Em 2021-09-22, dispensando-se a audiência prévia, foi proferido saneador, onde, julgando-se procedente a excepção de ilegitimidade activa da autora, massa insolvente de A., Lda., absolveram-se da instância os réus C., D. e E..

*

II - a) - Inconformada com esta decisão do Juízo Central Cível de Coimbra (Juiz 3), dela apelou a Autora para este Tribunal da Relação, tendo, a finalizar as alegações desse recurso - que veio a ser admitido com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo -, oferecido as seguintes conclusões:

«1.ª – Ao decidir julgar procedente a excepção dilatória de ilegitimidade ativa da AUTORA MASSA INSOLVENTE DE A., LDA., o Tribunal a quo incorreu em erro na determinação da norma aplicável, violando o disposto no artigo 127.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas e, bem assim, o disposto nos artigos 610.º e seguintes do Código Civil.

2.ª – A legitimidade para deduzir pedido de impugnação pauliana corresponde à posição de atual credor de obrigação civil prejudicado pelo ato impugnado.

3.ª – A Recorrente é efetivamente credora da 1.ª Ré e o pagamento (ou, no caso, a cobrança coerciva) do seu crédito foi prejudicado pelos atos (contratos de compra e venda) celebrados entre os Réus (familiares próximos), impugnados através da ação de impugnação pauliana.

4.ª – As ações de impugnação pauliana a que se refere o regime consagrado no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, em especial no artigo 127.º – que o Tribunal a quo aplicou ao caso concreto, erroneamente, segundo se propugna – têm um escopo diferente daquele a que se refere a ação de impugnação pauliana requerida pela aqui Recorrente.

5.ª – No caso em apreço não estamos perante uma situação que reclame a aplicação da norma contida no artigo 127.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ou, em geral, do regime consagrado no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas; nem perante uma situação igual ou semelhante à apreciada no acórdão proferido por este TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA em 12 de Fevereiro de 2019, no âmbito dos autos de processo n.º 3356/16.0T8LRA.C1 (relator SÍLVIA PIRES), em cuja fundamentação o Tribunal a quo se sustentou e que transcreveu na decisão ora sindicada.

6.ª – O regime consagrado no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas aplica-se aos atos praticados pelo devedor insolvente que se mostrem prejudiciais à massa insolvente, por diminuírem, frustrarem, dificultarem, porem em risco ou retardarem satisfação dos credores da insolvência.

7.ª – A situação fática sobre que versam os presentes autos é substancialmente diversa.

8.ª – No caso ora em apreço, a Recorrente (MASSA INSOLVENTE DA A., LDA., que nenhuma relação processual tem com a 1.ª Ré, devedora do crédito) é credora da 1.ª Ré e impugna dois concretos atos (contratos de compra e venda) celebrados entre os Réus (que não estão insolventes).

9.ª – A presente ação de impugnação pauliana não se dirige a quaisquer atos praticados por um devedor insolvente; nem tem em vista a apreensão dos bens objeto dos negócios impugnados para a Massa Insolvente; ou sequer visa que os efeitos da ação aproveitem a credores da insolvência, não impugnantes.

10.ª – A aqui Recorrente – Massa Insolvente da sociedade comercial A., LDA., pessoa colectiva n.º …. – detém um crédito judicialmente reconhecido por decisão transitada em julgado sobre a 1.ª Ré e, através dos atos impugnados, viu diminuída a garantia patrimonial de tal crédito, cujo pagamento está a reclamar pela via coerciva.

11.ª – O disposto no artigo 127.º do CIRE está previsto para as situações em que o crédito que motiva a impugnação pauliana é um crédito sobre o devedor insolvente e em que o ato impugnado foi praticado pelo devedor insolvente (o que não acontece no presente caso); a prevalência da possibilidade de perseguir e atacar tais atos ocorre, no âmbito do CIRE, pelo instituto da resolução em benefício da massa insolvente e, nessa circunstância, os bens regressam à massa insolvente para, através da sua...

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