Acórdão nº 2359/19.7T8STS.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-06-27

Ano2022
Número Acordão2359/19.7T8STS.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 2359/19.7T8STS.P1-Apelação
Origem-Tribunal Judicial da Comarca do Porto-Juízo Local Cível de Santo Tirso-J2
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra
5ª Secção
Sumário:
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I-RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
Os Autores AA e BB, residentes na Travessa ..., ..., ..., intentaram a presente acção de processo comum contra CC e DD, residentes na Rua ..., ..., ..., peticionando:
a) declarar-se e reconhecer-se os autores como donos e legítimos possuidores do prédio melhor identificado no artigo 1º deste articulado;
b) declarar-se a extinção, por desnecessidade, das servidões de água e de aqueduto, constituídas por usucapião, que oneram esse prédio dos autores, nos termos descritos nos artigos 18º a 20º desta peça, em benefício do prédio dos réus referido no artigo 2º deste articulado;
Condenando-se os réus:
c) a também reconhecerem e a respeitarem o direito de propriedade mencionado na precedente alínea a) e, consequentemente, a absterem-se de usar a água do poço referido no artigo 18º deste articulado e a procederem, a expensas suas, no prazo de 15 dias a contar da data do trânsito em julgado da sentença, à retirada, do prédio dos autores, de todos os motores, engenhos, canos, tubos e demais materiais que no mesmo colocaram para efeitos de utilização da água daquele poço;
d) a não se oporem ao livre exercício do direito de propriedade dos autores sobre o dito prédio; e,
e) a absterem-se de praticar quaisquer atos que prejudiquem ou colidam com o livre exercício do direito de propriedade dos autores.
Alegam, sumariamente, que:
(i) Os Autores e os Réu são proprietários de prédios confinantes, dois lotes que foram objeto de permuta entre os Autores e os pais da Ré, que doaram à mesma o lote n.º ...;
(ii) Sucede que, aquando da permuta e doação, a Ré solicitou aos Autores, que a deixassem utilizar, para abastecimento do seu prédio, a água potável de um poço existente no prédio dos autores, o que foi autorizado pelos mesmos;
(iii) Desde há alguns anos que o prédio dos Réus passou a poder ser abastecido diretamente, de forma autónoma e suficiente para as suas necessidades, pela rede pública de distribuição de água.
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Os Réus aduziram contestação, impugnando as alegações dos Autores, invocando, sinteticamente, que são comproprietários das águas e poço indicados na petição inicial.
Concluem, propugnando a improcedência da ação e, impetrando pedido reconvencional, solicitam que:
a) seja declarado o direito de compropriedade dos Réus sobre as águas, poço, canos e todos os elementos necessários à sua captação e condução descritos na petição inicial dos Autores;
b) e condenados os Autores a reconhecerem esse direito de compropriedade;
c) e a absterem-se da prática de quaisquer atos que atentem contra o referido direito dos Réus.
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Os Autores consignaram réplica, pugnando pela improcedência da reconvenção.
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Proferiu-se despacho saneador, bem como o despacho a enunciar o objecto do litígio e os temas da prova.
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Teve lugar a audiência de julgamento, com observância do formalismo processual.
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A, final, foi proferida decisão que julgando a ação parcialmente procedente:
a) Reconheceu que os Autores AA e BB titulam o direito de propriedade com referência ao prédio descrito nos itens 2) e 4) dos factos provados;
b) Condenou os Réus CC e DD a reconhecerem o direito de propriedade dos Autores e a absterem-se de praticar quaisquer atos que prejudiquem ou colidam com o livre exercício do mesmo, absolvendo-os do demais peticionado.
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Por seu turno julgou a reconvenção totalmente improcedente e, consequentemente, absolveu os Autores/reconvindos do peticionado.
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Não se conformando com o assim decidido, vieram os Autores interpor recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos:
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Devidamente notificados contra-alegaram os Réus concluindo pelo não provimento do recurso, e, recorrendo de forma subordinada, formularam as seguintes conclusões:
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Foram dispensados os vistos.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. cfr. arts. 635.º, nº 3, e 639.º, nsº 1 e 2, do CPCivil.
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No seguimento desta orientação são as seguintes as questões a decidir no presente recurso:
Recurso independente
a)- saber se deviam, ou não, ter sido declaradas extintas por desnecessidade, as servidões de água e aqueduto.
Recurso subordinado
b)- saber se devia, ou não, ter sido julgada procedente a reconvenção e, por mor disso, ter-se declarado que Réus reconvintes adquiriram por usucapião, o direito de propriedade atinente à água do poço existente no prédio dos Recorrentes e do respetivo aqueduto.
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A)-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
É a seguinte a matéria factual que o tribunal recorrido deu como provada:
1. Pela ap. ... de 1974/08/06, afigura-se registada a aquisição a favor de AA, casado com BB no regime de comunhão de adquiridos, e de EE, casado com FF no regime de comunhão geral, do prédio composto por terreno para construção e designado por lote n.º ..., sito em ..., freguesia ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o n.º ... e inscrito na matriz sob o artigo ..., por compra a GG e mulher HH.
2. Pela ap. ... de 1974/08/06, afigura-se registada a aquisição a favor de AA, casado com BB no regime de comunhão de adquiridos, e de EE, casado com FF no regime de comunhão geral, do prédio composto por terreno para construção e designado por lote n.º ..., sito em ..., freguesia ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o n.º ... e inscrito na matriz sob o artigo ..., por compra a GG e mulher HH.
3. Em 10 de julho de 1989, lavrou-se escritura pública no Cartório Notarial de Santo Tirso com a epígrafe “Permuta e Doação”, subscrita por AA e mulher BB, como primeiros outorgantes, EE, na qualidade de segundos outorgantes, e CC, como terceiro outorgante, consignando-se, designadamente, que:
“Pelos primeiros e segundos outorgantes foi dito:
Que entre si fazem a seguinte permuta:
Os primeiros dão aos segundos no valor de trezentos e oitenta e três mil escudos e ainda dez mil escudos em dinheiro metade indivisa de uma parcela de terreno destinada à construção urbana, com a área de trezentos e oitenta e três metros e vinte e cinco decímetros, sito no aludido ligar de ... (…) a destacar do prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial deste concelho sob o número ..., omisso à matriz respetiva;
Que os segundos cedem aos primeiros, em troca, no valor de trezentos e noventa e três mil escudos, metade indivisa de uma parcela de terreno destinada à construção urbana, com a área de trezentos e noventa e três metros e doze decímetros, sito no aludido ligar de ... (…) que constitui a restante parte daquela descrição predial número quarenta e quatro mil duzentos e setenta e quatro, omisso à matriz respetiva;
Que os terrenos atrás mencionados constituem os lotes número um e dois, do loteamento a que respeita o alvará número vinte e seis (…)
Declaram os segundos outorgantes:
Que doam à terceira, sua filha, a parcela de terreno para construção urbana cuja metade foi adquirida por esta escritura (…)
A terceira outorgante declarou:
Que aceita a doação (…)”
4. Pela ap. ... de 2016/10/27, afigura-se registada a aquisição a favor de AA e BB de 1/2 do prédio composto por terreno para construção e designado por lote n.º ..., sito em ..., freguesia ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o n.º ... e inscrito na matriz sob o artigo ..., por permuta.
5. Há mais de 20, 30, 40 anos que os Autores e antecessores limpam o mato do prédio descrito em 2) e 4) à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, ininterruptamente e com a convicção de estarem a exercer um direito próprio correspondente ao direito de propriedade e de não lesarem ou violarem direitos de outrem.
6. No prédio indicado em 2) e 4) existe um poço de água.
7. Em 10 de julho de 1989, AA e mulher BB, como primeiros outorgantes, e CC, como segunda outorgante, subscreveram um escrito com a epígrafe “Contrato Promessa de Servidão” no âmbito do qual os primeiros outorgantes declararam reservar à segunda outorgante o direito perpétuo de utilização da água do poço, “nele podendo colocar um motor um engenho semelhante, para benefício exclusivo do seu prédio confinante (…) Poderá ainda a segunda outorgante encanar subterraneamente ou a descoberto as águas do poço para o seu prédio (prédio dominante)”.
8. No circunstancialismo mencionado em 7), a Ré declarou solicitar aos Autores que, desde a antedita data, a deixassem utilizar, para abastecimento do seu prédio, a água potável do poço, sendo que os Autores declararam autorizar que ela colocasse, no interior do sobredito poço, um motor destinado a bombear a água e encanasse, subterraneamente ou a descoberto, as águas do poço para o prédio enunciado em 1).
9. Após, a Ré colocou um motor no predito poço e encanou a água em direção ao prédio indicado em 1).
10. Posteriormente, os Réus edificaram uma habitação no prédio descrito em 1), o qual se afigura atualmente inscrito na matriz da freguesia ... sob o artigo ....
11. Desde o enunciado em 7) a 9), a Ré tem utilizado a água do poço para abastecimento do prédio, designadamente, para cozinhar, tomar banho, lavar a roupa e a louça, regar o quintal, lavar veículos automóveis, e usando o antedito encanamento da mesma à vista de toda a agente, com a convicção de exercer um direito de servidão.
12. Desde dezembro de 2002 que a habitação dos Réus dispõe de ligação à rede pública de abastecimento de água.
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Factos não provados
Não se provou que:
13. Os Réus têm utilizado a água do sobredito poço
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