Acórdão nº 23/10.1BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-03-31

Ano2022
Número Acordão23/10.1BELLE
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo, do Tribunal Central Administrativo Sul:
Relatório
L… – Sociedade Comercial e de Representações, Lda instaurou ação administrativa especial contra a ANA – Aeroportos de Portugal, SA e a contrainteressada «M… – Acessórios de Moda, Lda», pedindo que seja:
a) declarada a nulidade ou anuladas: a decisão de 14.10.2009, que atribuiu à «M... – Acessórios de Moda, Lda» uma licença de ocupação de um espaço no aeroporto de Lisboa, a licença de ocupação A…/DRET/140.12/09 e a comunicação interna de 9.10.2009;
b) condenada a entidade demandada a ordenar a retirada e desocupação por parte da sociedade «M... – Acessórios de Moda, Lda» da loja; a reconhecer que tem em seu poder as existências de mercadorias e produtos descritos; a permitir que a autora exerça a sua atividade comercial na loja, entregando-lhe todas as mercadorias, objetos, móveis, chaves, etc.; a pagar à autora uma indemnização provisória, no montante de €: 500,00 diários, e igual montante a favor do Estado; a pagar à autora os juros devidos sobre o montante €: 500,00 diários; a pagar à autora, a título de abuso de direito, indemnização a fixar pelo tribunal em valor não inferior a €: 500,00 diários; como litigante de má fé;
c) condenada a entidade demandada e a contrainteressada a reconhecerem que o equipamento e o imobilizado corpóreo descrito pertence à autora e está a ser utilizado pela contrainteressada; a, em liquidação de execução de sentença, a pagarem à autora todos os prejuízos que já sofreu com o fecho da loja desde o dia em que a contrainteressada ocupou a loja, equipamento e material até à entrega efetiva da loja, equipamento e material à autora;
d) condenada a contrainteressada a pagar à autora a quantia mensal de €: 1.500,00, a título de renda ou enriquecimento sem causa ou utilização do equipamento e material, pertencente à autora, desde a data da ocupação e utilização da loja, equipamento e todo o material até à data em que a contrainteressada os entregar à autora.
A ação prosseguiu os ulteriores termos e a 18.9.2012 foi proferido despacho saneador, tendo as partes sido notificadas para a apresentação de sucintas alegações escritas, isolando a factualidade relevante e formulando conclusões.
A autora apresentou alegações de fls 897 a 1032 dos autos.
A 19.4.2013 foi concedido prazo para a autora reformular as Alegações Escritas apresentadas, sintetizando o seu conteúdo, concentrando, isolando e identificando de forma explicita a factualidade entendida como relevante, formulando conclusões, acompanhadas de ficheiro informático, sob pena de desentranhamento das pretéritas alegações apresentadas (Cfr. Artº 201º nº 1 CPC).
Em resposta veio a Autora, por e-mail de 13.05.2013, requerer a junção aos autos das "alegações reformuladas" constantes a fls.1101 a 1217 dos autos.

Notificada para contra-alegar, a entidade demandada, para além de manter o por si alegado anteriormente no documento apresentado em 15.04.2013, considerou que as "novas alegações" da Autora correspondem, praticamente, na íntegra, às anteriormente apresentadas e que em desrespeito do ordenado apresentou novamente um "documento imoderadamente extenso, confuso, sem qualquer delimitação da matéria factual relevante (encontrando-se esta, antes dispersa ao longo do documento) e, incompreensivelmente, com indicação dos meios de ' prova a produzir" que "não corresponde (...) a umas alegações de direito (...) não obstante a ordenação realizada nesse sentido".

Por despacho de 3.10.2014 o tribunal decidiu:
Efetivamente, não obstante a oportunidade que lhe foi concedida pelo Tribunal, o articulado apresentado pela Autora como «alegações reformuladas» é em quase tudo semelhante às suas primeiras alegações escritas, com exceção do suprimento de alguns parágrafos tendo, dessa forma, reduzido para 117 páginas e 222 conclusões as anteriores 136 páginas e 231 conclusões.

Nestas "novas alegações", onde o conteúdo continua confuso e descomedido, persiste em não delimitar a matéria de facto entendida por relevante, além das respetivas conclusões ascenderem a um número completamente despropositado, recorde-se 222, em total desrespeito do que foi ordenado no despacho de 19.4.2013.

Assim sendo, os articulados apresentados pela autora, em ordem a consubstanciarem «alegações escritas» para os efeitos do art 91º, nº 4 do CPTA, são inadmissíveis, razão pela qual se determina o seu desentranhamento e a sua devolução à apresentante, após trânsito em julgado do presente despacho.

A autora, inconformada, reclamou do despacho para a conferência.

Por acórdão proferido pela Conferência em 9.9.2015 foi indeferida a reclamação apresentada do despacho de 3.10.2014, com um voto de vencido.
Inconformada com o acórdão, a autora interpôs o presente recurso jurisdicional.
Nas alegações de recurso, a recorrente formula as seguintes conclusões:
1) A Recorrente propôs contra a Ré e Contrainteressada a Ação Administrativa Especial de anulação e declaração dos atos descritos no introito da p.i., tendo previamente à apresentação da presente ação, já apresentado os pedidos de suspensão da eficácia, sendo que esta ação vem na sequência do pedido feito no âmbito do processo de Intimação para Prestação de Informação e Passagem de Certidão, no 2154/09.1BELSB, que corre termos na 4a Unidade Orgânica, do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, e de acordo com a sentença proferida nesse processo;

2) Foi proferido Despacho saneador, facultando às partes a «apresentação de sucintas alegações escritas, isolando a factualidade relevante e formulando conclusões»;

3) A Recorrente apresentou as suas alegações, contudo, por Despacho, foi notificada para 'reformular as alegações escritas apresentadas', sob pena de desentranhamento;

4) Em resposta, a Recorrente, juntou aos autos alegações reformuladas, as quais acima se transcreveram;

5) Sucede, porém, que a Meritíssima Juiz emitiu o Despacho supratranscrito, determinando o desentranhamento das alegações escritas apresentadas;

6) A Recorrente apresentou uma Reclamação para a Conferência (art. 27º, nº 2 do CPTA), apresentando as conclusões supratranscritas;

7) Porém, em conferência deliberou-se manter a decisão reclamada, contudo, com voto vencido, supratranscritos;

8) Salvo o devido respeito, que é muito, não podemos concordar com tal decisão;

9) As alegações escritas apresentadas pela Recorrente não são confusas ou desordenadas, peio que jamais poderia a Conferência deixar de conhecer o seu conteúdo e compreendê-lo;

10) Na Sentença recorrida, a Conferência bastou-se em confirmar o Despacho reclamado o qual se limitou a refugiar em conceitos imprecisos como 'conteúdo confuso e descomedido", baseando-se simplesmente no facto de as conclusões ascenderem a um número excecionalmente relevante, ou, como vem a considerar, "um número completamente despropositado"

11) Sucede que tais conceitos indeterminados e imprecisos, em nada revelam uma leitura atenta do conteúdo das alegações apresentadas pela Recorrente, até porque urge relembrar que a matéria em causa nos presentes autos prende-se com Luna excecional complexidade, na qual se entrelaçam muitos factos a ter em conta, nenhum mais relevante que o outro, para a determinação de uma decisão mais justa e adequada;

12) Sucede, ainda, que a decisão da qual aqui se recorre teve como ponto de partida o número de conclusões apresentadas, o qual se considerou como "um número completamente despropositado", em vez de, após uma leitura diligente, compreender que tai número apenas se deve ao facto da matéria em causa se caracterizar pela sua complexidade, em virtude da quantidade e densidade dos pedidos a ela inerentes;

13) Não pode a Conferência apresentar um mero juízo conclusivo, sem fundamentar porque concluiu de tal forma, pelo que deve tal Sentença ser considerada nula, por vício de falta de fundamentação, nos termos dispostos 154º e 615º, nº 1, alínea b) do NCPC;

14) A Recorrente, ainda que não concordando com a primeira determinação para apresentar alegações reformuladas, veio ainda assim tratar de condensar ao máximo, reduzir as suas alegações, procurando não colidir com a necessidade de em nada omitir factos relevantes para a decisão que viesse a ser proferida;

15) Ao impor-se o ónus de síntese, visa-se promover quer a ordenação do escrito, quer a melhor compreensão do Tribunal, pelo que, ainda que se apresentasse conclusões que eventualmente pecassem por prolixidade - situação meramente hipotética que aqui se coloca nunca se poderia determinar a sanção automática cominada que representa um impedimento de acesso à Justiça, de todo inconstitucional;

16) Na Sentença recorrida, tai como no Despacho primeiramente reclamado, em momento algum se alega no sentido das alegações e conclusões em causa estarem redigidas de modo obscuro, deficiente de forma a impossibilitar o conhecimento e compreensão dos fundamentos e dos pedidos deduzidos, pela simples razão que, lendo as alegações e conclusões em causa, percebe-se perfeitamente o conteúdo, alcance e propósito, nada havendo que impossibilite o Tribunal de conhecer e julgar as mesmas;

17) É sabido que dizer que as alegações e conclusões são obscuras e obstam à compreensão do seu conteúdo, é totalmente diferente de dizer que são em grande número, e a verdade é que no presente caso a Recorrente não apresentou qualquer conteúdo obscuro;

18) A Recorrente apresentou, isso sim, uma quantidade excecional de conclusões, o que simplesmente sucedeu em virtude da própria matéria se prender com variados assuntos a analisar nos presentes autos, para a emissão da decisão mais justa;

19) Apresentar alegações mais reduzidas, ou apresentar um menor número de conclusões iria implicar necessariamente a omissão de matéria relevante para o julgamento da causa, pelo que se invoca, desde já, a irregularidade da Sentença...

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