Acórdão nº 2182/14.5TBVFR-U.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-19

Ano2024
Número Acordão2182/14.5TBVFR-U.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
APELAÇÃO N.º 2182/14.5TBVFR-U.P1

SUMÁRIO (art.º 663.º, n.º 7, do C.P.C.):
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Acordam os Juízes na 3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto, sendo
Relator: Jorge Martins Ribeiro;
1.ª Adjunta: Teresa Fonseca e
2.ª Adjunta: Fátima Andrade.
ACÓRDÃO

I – RELATÓRIO

Nos presentes autos de incumprimento do regime de exercício das responsabilidades parentais, no atinente ao convívio paterno-filial, são progenitores AA (titular do N.I.F. ..., com domicílio profissional em Av. ..., ..., sala ..., ... Esmoriz, e BB (titular do N.I.F. ..., residente em ..., ..., 3.º Direito, ..., Santa Maria da Feira, sendo criança CC, nascido aos ../.../2008.
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Procedemos agora a uma síntese do processado, e factual, destinada a facilitar a compreensão do objeto do presente recurso([1]), sem prejuízo de darmos por reproduzido o exato teor dos itens que referiremos.
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A) Entre todos os demais que correram termos (este é o apenso U), o apenso E reporta-se a um processo de promoção e proteção de crianças e jovens em perigo, tendo sido aberto por sinalização, de março de 2015, do I.N.M.L.C.F. à C.P.C.J., por o jovem CC ter estado exposto a agressões perpetradas pelo progenitor sobre o irmão mais velho, DD (que, no decurso dos autos, atingiu a maioridade e não pretendeu a continuação destes) e a situações de violência doméstica entre os progenitores.
Tais autos (nos quais foi também decidido o apenso C relativamente ao filho DD, bem como o apenso D, relativo à regulação do exercício das responsabilidades parentais atinentes ao filho CC) terminaram por acórdão proferido aos 08/01/2018, depois de realizado o debate judicial do Apenso E, tendo, no a este respeitante, sido decidido a cessação da medida de apoio junto dos pais, a executar na mãe, que tinha sido aplicada a título provisório, e o arquivamento dos autos por ser desnecessária a continuação da intervenção.
Esse apenso E está com visto em correição desde 20/03/2018.
B) No apenso 11 (por incorporação do apenso Q, além doutros), entre o mais, fundando a sua pretensão em incumprimento do regime de convívio de férias de verão (emergente da regulação atrás referida, no apenso D) o requerente pretendia a entrega judicial da criança CC e que ao processo fosse atribuída a natureza urgente, o que foi indeferido e posteriormente confirmado por acórdão desta Relação datado de 24/11/2022.
C) Ao longo de diferentes apensos é relatada a posição da criança: em suma, diz que a mãe lhe diz para estar com o pai, que não quer um regime de convívio pré-determinado mas estar com o pai quando lhe apetecer, manifestando desagrado com a atitude continuada de o pai estar sempre a falar mal da mãe, de passar muito tempo sozinho quando ia ao pai e de ele ser ríspido, dando como exemplo que “não” é “não” sem mais explicar.
D) Os incidentes (e apensos) sucedem-se ininterruptamente ao longo dos anos (como a consulta do histórico de processos relacionados comprova) mantendo-se, no fundo, a questão de o regime de convívio não estar a ser cumprido por o jovem CC manifestar, reiteradamente, que não quer estar com o pai, explicando os seus motivos, como referido.
E) Tendo o jovem CC nascido aos ../.../2008 tem, neste momento, cerca de 15 anos e meio.
F) Como resulta desta sinopse e dos factos provados n.º 14 a 18, 64 a 66 e 69 a 72 já no apenso E atrás referido (sendo o acórdão, transitado em julgado, datado já de 08/01/2018) o jovem tem passado a infância envolvido numa incessante disputa judicial.
G) No acórdão atrás referido em F), os factos provados que enquadram a situação (quanto à dinâmica relacional, disfuncional, por um lado, e quanto às avaliações de capacidades parentais e psiquiátricas efetuadas aos progenitores, por outro), entre outros, são do seguinte teor([2]):
14. O relacionamento entre os progenitores após 2003 foi pautado por conflitos e agressões físicas, com exposição até direta do filho DD, conflitos e agressões que persistiram após a separação do casal, pelo menos até Janeiro de 2014, data em que ocorreu um episódio no local de trabalho de ambos, que culminou com a intervenção dos OPC´s e que deu origem ao inquérito-crime 11/14.9GAVNG.
15. Nesse mesmo inquérito em 04.03.2014 foi proferido despacho de indiciação do requerido por crime de violência doméstica e aplicação de medida de coação de proibição de contactar com a requerida e de frequentar ou permanecer na residência da mesma (fls. 209 a 212 do apenso D).
16. A requerida beneficiou de teleassistência.
17. Em 23.01.2015 o requerido foi acusado pelo crime de violência doméstica, tendo vindo a ser julgado e condenado por sentença datada de 15.07.2015, transitada em julgado em 17.08.2015, por crime de violência doméstica, em pena de prisão de 3 anos, suspensa na sua execução por igual período, sob condição de submissão a regime de prova e a afastamento do contacto com a ofendida, com exceção do estritamente necessário ao exercício comum das responsabilidades parentais dos filhos.
Em tal sentença deu-se como provado que:
. A relação conjugal foi pautada por discussões, o requerido apelidava a requerida de puta e vaca, ameaçou-a de morte, com exibição de faca, agredia-a com murros, pontapés, empurrões, puxões de cabelo, calcadelas, arremesso de objetos, muitas vezes na presença do filho DD.
. No dia 06.01.2014 apelidou-a de puta, vaca, escroque, porca, cuspiu-lhe na cara, anunciou que a mataria, projetou uma cadeira contra a ofendida, desferiu murros e pontapés, empurrou a ofendida, prostrando-a no chão, colocou um pé na face esquerda da mesma, fazendo pressão, colocou as mãos no pescoço da ofendida e apertou como se quisesse estrangulá-la, bateu no corpo da ofendida com um cinto até o mesmo se partir.
. Seguiram-se outros episódios de ameaças, inclusive de morte.
(fls. 265 a 269 e 488 a 498 do apenso D).
18. A comunicação entre os requeridos a partir de Janeiro de 2014 passou a ser quase nula, salvo algumas mensagens e/ou mails enviados pelo requerido, embora o progenitor aluda a uma melhoria dessa comunicação nos últimos meses, mantendo-se, no entanto, latente uma forte conflituosidade.
[64]. Foi proposto aos progenitores serem alvo de terapia familiar, a realizar pelo CAFAP, o progenitor rejeitou colaborar por entender que é «um pai quase perfeito» (sic), sem necessidade de melhorar o exercício das responsabilidades parentais, tendo-se mostrado, no entanto, disponível para realizar mediação.
65. A progenitora foi alvo de intervenção pelo CAFAP entre Janeiro e Outubro de 2017, tendo o CAFAP dado por cumprida e finda tal intervenção (relatório de fls. 301 a 303 do apenso E).
66. A requerida sempre considerou o requerido como um pai interessado, com forte vinculação aos filhos e vice-versa, tendo mantido uma postura de promoção dos contactos dos menores com o pai, permitindo que os mesmos ocorressem para além do que estava estipulado.
[69]. Realizada avaliação às capacidades parentais da progenitora, resulta do respetivo relatório pericial que a mesma não revela presença de psicoterapia e/ou padrões comportamentais indicadores de disfuncionalidade que sugiram incapacidade…. deu mostras de estar emocionalmente ligada às crianças, de estar motivada, interessada e disponível para o exercício das responsabilidades parentais … capacidade de gestão e de organização da vida doméstica e familiar… (fls. 272 a 279 do apenso D).
70. Realizada avaliação psiquiátrica da progenitora, resulta do respetivo relatório pericial que a mesma não apresenta sintomas de padecer de doença psiquiátrica descompensada ou psicopatologia aguda que interfiram nas suas capacidades parentais (fls. 465 a 667 do apenso D).
71. Realizada avaliação às capacidades parentais do progenitor, resulta do respetivo relatório pericial que o mesmo não colaborou no âmbito da realização da perícia, o que condicionou a recolha de dados clínicos.
Não obstante, revelou-se egocêntrico, superior, impulsivo, reativo, excessivamente sensível perante críticas ou desaprovações, com elevada confiança interpessoal. Adotou um discurso excessivamente impressionável e deficiente em detalhes. Demonstrou um humor disfórico, com modelação afetiva inadequada, instabilidade psicoemocional, incapacidade de gerir e integrar de forma adaptativa o fim do relacionamento conjugal, incapacidade de separar o subsistema conjugal do subsistema parental, responsabilização unilateral da progenitora de todos os problemas vivenciados, estando demasiado centrado na mesma.
No decurso das sessões com vista à realização da referida avaliação o requerido verbalizou, no que para aqui particularmente importa: Em 2003 ela teve um caso extraconjugal com um do cartório…ela é uma mentirosa compulsiva…deixei um gravador que era ativado por voz e ouvi os telefonemas entre eles…a partir de setembro de 2011…iniciou relacionamento com um formando…apanhei-a em Gondomar com ele…ela é uma vadia…basta ir à página do facebook para perceber que ela não é em condições…em Agosto de 2014 fui com os meus filhos a Cabo Verde…quando cheguei soube que a mãe foi de viagem atrás de um indivíduo que conheceu na internet…para Marrocos…que tipo de mulher faz isto…corrupção moral total…quero que ela se meta debaixo do comboio o mais rapidamente possível…é uma vadia, ninguém sabe onde ela anda…se ela morresse os meus filhos iam viver comigo e iam ter um futuro garantido…o DD é assim porque ele moldou a personalidade desde os 5 anos de idade, com as neuroses da mãe, etc… (fls. 280 a 287 do apenso D).
72. Realizada avaliação psiquiátrica do progenitor, resulta do respetivo relatório pericial que o mesmo não revela evidência de doença psiquiátrica, porém é possível detetar alguns traços disfuncionais da personalidade, que se traduzem por impulsividade acentuada, instabilidade afetiva, bom desempenho intelectual e boa capacidade de argumentação e persuasão, não se evidencia nenhuma circunstância
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