Acórdão nº 2154/16.5 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 02-03-2023

Data de Julgamento02 Março 2023
Ano2023
Número Acordão2154/16.5 BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – RELATÓRIO

A sociedade denominada S …….. SARL à A ………. interpôs no Tribunal Tributário de Lisboa, ao abrigo do artigo 80º do RGIT, recurso da decisão que, no âmbito do processo de contraordenação nº ………………….909, lhe aplicou uma coima no montante de €45.000,00, acrescida de custas processuais, pela prática de infração fiscal prevista nos artigos 27º, nº1 e 41º, nº1, alínea a) do CIVA e punida pelos artigos 114º, nº 2, 5 a) e 26º, nº4, todos do RGIT.

O Tribunal Tributário de Lisboa julgou o recurso de contraordenação extemporâneo e, consequentemente, rejeitou-o liminarmente.

Inconformada com o assim decidido, a arguida S ……………… interpôs recurso jurisdicional para este Tribunal Central, acompanhado das respetivas alegações, as quais apresentam as seguintes conclusões:

A) O Tribunal a quo decidiu erradamente rejeitar o recurso interposto por suposta intempestividade, ao partir do pressuposto errado de que a Arguida foi notificada da decisão de aplicação da coima;

B) O Tribunal a quo incorreu em erro na apreciação das provas, assim como em contradição do julgado com os concretos meios probatórios constantes do processo, que impunham uma decisão diferente da tomada sobre a matéria de facto e de direito;

C) Com efeito, o despacho recorrido não fundamentou de facto a conclusão de que a Recorrente teria designado representante fiscal em Portugal, conclusão essa aliás errada, conforme ficou documentalmente provado (cfr. doc. n.º 1 em anexo);

D) O despacho recorrido não fundamentou de facto a conclusão de que a Recorrente teria aderido ao sistema via CTT, conclusão também errada, conforme ficou documentalmente provado (cfr. doc. n.º 1 em anexo);

E) Em face do exposto é manifesta a errónea - no mínimo insuficiente - fundamentação de facto da sentença recorrida.

F) Com base nos múltiplos erros de julgamento acima referidos, o tribunal a quo concluiu pela aplicação de uma presunção de notificação por efeito da mera existência de uma adesão em nome da Recorrente, porém indevida e abusiva, ao sistema via CTT, conforme ficou documentalmente provado (cfr. doc. n.º 1 em anexo);

G) Assim, o tribunal presumiu a notificação com base numa presunção legal inaplicável, posto que não pode ser havida como aplicável a um sujeito passivo que não aderiu, nem estava obrigado a aderir a tal sistema, desconhecendo em absoluto do que se tratava, e desconhecendo, em particular, que podia presumir-se notificado, conforme ficou documentalmente provado (cfr. doc. n.º 1 em anexo);

H) O recurso é tempestivo, devendo seguir os seus ulteriores trâmites legais com vista à apreciação do seu mérito, devendo em consequência ser anulada a decisão impugnada de aplicação da coima por manifesta inexistência de qualquer infracção a ela sujeita;

I) Sem conceder, ocorre nulidade do despacho liminar proferido pelo Tribunal a quo, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 379, nº1, alínea c) do CPP, aplicável ex vi do artigo 3º do RGIT e 41º do RGCO, por omissão de pronúncia quanto à possibilidade de convolação do recurso apresentado pela ora Recorrente em revisão invocada pela Arguida.

Nos termos expostos, e nos mais de direito que V. Excelências doutamente suprirão, deve a decisão recorrida ser revogada, e o presente recurso judicial ser julgado procedente, por provado, e por conseguinte anulada a decisão impugnada, com as demais consequências legais.

Foi junto um documento.


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Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.

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Foram colhidos os vistos legais.

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II - FUNDAMENTAÇÃO

- De Facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

A) A Recorrente trata-se de sujeito passivo de IVA não residente em Portugal, residente fiscal em França, sem estabelecimento estável em Portugal (cfr. fls. 166 dos autos – numeração em suporte de papel).

B) A Recorrente designou como sua Representante Fiscal em Portugal a sociedade “C ………………e Serviços, Lda” (artigo 5º do requerimento da Recorrente de fls. 187 e ss. – numeração SITAF).

C) A Recorrente aderiu ao sistema ViaCTT mediante a utilização do endereço electrónico do colaborador da sua Representante, V ……………, não tendo aderido ao serviço de alertas do ViaCTT (artigo 6º e doc. nº 2 do requerimento da Recorrente de fls. 187 e ss. – numeração SITAF).

D) Em 13.11.2015 foi instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa 3 o processo de contra-ordenação nº ………………….909, por pagamento fora de prazo do IVA do período de 2015/06, no montante de 206.497,36€, infração punida nos termos do disposto nos artigos 114º, nº 2 e 5, alínea a) e 26º, nº 4 do RGIT, constando como infrator a ora Recorrente (cfr. fls. 2 e 3 dos autos).

E) Após notificação ViaCTT para efeitos do exercício do direito de defesa, em 02.02.2016 foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças, a fixar a coima no montante de 45.000,00€, acrescido de 76,50€ de custas processuais (cfr. fls. 5 a 10 e 54 e 55 dos autos).

F) Em 07.02.2016 foi remetida para o receptáculo postal ViaCTT da Recorrente, a notificação da decisão referida na alínea antecedente (cfr. fls. 10 dos autos – numeração de papel, e doc. 2 junto com o requerimento da Recorrente de fls. 187 e ss. – numeração SITAF).

G) Em 07.04.2016 foi extinto o processo de contraordenação identificado em D) por extracção da certidão de dívida (cfr. fls. 10 dos autos).

H) A Recorrente acedeu à sua caixa postal ViaCTT em 26.04.2016 (cfr. fls. 160 e 162 dos autos – numeração em suporte de papel).

I) Em 09.05.2016 foi configurado o email ctb-a@comark.pt no sistema de alertas ViaCTT, relativamente à Recorrente (cfr. artigo 4º e doc. 1 do requerimento da Recorrente de fls. 187 e ss. – numeração SITAF).

J) O presente recurso foi apresentado em 24.05.2016 (cfr. fls. 61 dos autos - numeração de papel).


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II - De Direito

Antes de entrarmos na análise do recurso propriamente dito, comecemos por fazer referência ao documento junto com as alegações, junção esta que, nesta fase, como se sabe, só excecionalmente pode ocorrer.

Esclareçamos, desde já, que, no caso, daquilo que se trata é de um requerimento datado de 04/11/16, ao qual foram anexados dois documentos, requerimento este dirigido ao tribunal a quo e que já integra os autos. Efetivamente, o requerimento em causa foi apresentado na sequência de um despacho judicial e posterior à apresentação de um primeiro requerimento, no qual a ora Recorrente protestava juntar outros elementos (precisamente os que foram apresentados em 04/11/16).

Não obstante não vir esclarecida a oportunidade da junção do documento nesta fase, até por o mesmo já constar dos autos e, nessa medida, nada impedir que a Recorrente para ele remetesse nas referências que agora faz, entendemos que nada obsta à sua manutenção nos autos, não se justificando (até por razões de economia processual) o seu desentranhamento e devolução à parte.

Para além do mais, tratam-se de documentos que foram juntos para efeitos de afastar a presunção estabelecida no artigo 39º, nº 10 do CPPT, e, como tal, para efeitos de aferir da tempestividade do recurso judicial, o que, sendo uma questão de conhecimento oficioso, deve levar a que o Tribunal aceite os elementos necessários à boa decisão da causa.

Mantém-se, assim, o articulado com as alegações de recurso tal como foi apresentado, devendo ter-se em consideração a data da sua apresentação em 1ª instância.


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Avançando.

As conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.412, nº.1, do C.P.Penal, “ex vi” do artº.3, al.b), do R.G.I.T., e do artº.74, nº.4, do Regime Geral das Contraordenações e Coimas, aprovado pelo dec.lei 433/82, de 27/10).

Comecemos por deixar devida nota, por tal se revelar importante para a análise que segue, daquilo que, em síntese útil, foi decidido pelo Tribunal Tributário de Lisboa.

Escreveu-se na sentença, além do mais, o seguinte:

“Ora, o requerimento de interposição de recurso de decisão de aplicação de coima deve ser apresentado no Serviço de Finanças onde tiver sido instaurado o processo de contra-ordenação, no prazo de 20 dias, atento o disposto no artigo 80º, nº 1, do RGIT, sendo tal prazo computado nos termos do disposto no artigo 60º, do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas (RGCO), e não sendo tal prazo de natureza judicial, não se lhe aplicam as regras privativas dos prazos judiciais (artigos 144º, nº 1, e 145, nº 5, do CPC), embora se suspendendo aquele prazo aos sábados, domingos e feriados (cfr. Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, “Regime Geral das Infracções Tributárias” anotado, 4ª. edição, 2010, Áreas Editora, pág.535 e seg.; Isabel Marques da Silva, “Regime Geral das Infracções Tributárias”, Cadernos IDEFF, nº.5, 3ª. edição, 2010, Almedina, pág. 145 e ss; acórdãos do STA de 01.06.2011, proc. nº 0312/11 e de 13.07.2011, proc. 0314/11).

Está-se, deste modo, perante um prazo substantivo, perentório e de caducidade.

(…)

Dispõe o artigo 70º, nº 2 do RGIT que “Às notificações no processo de contra-ordenação aplicam-se as disposições correspondentes do Código de Procedimento e de Processo Tributário”.

Por seu turno dispõe o artigo 38º, nº 9 do CPPT que “As notificações referidas no presente artigo podem ser efectuadas por transmissão electrónica de dados, que equivalem, consoante os casos, à remessa por via postal registada ou por via postal registada com aviso de recepção.”

Prevê ainda o artigo 39º do CPPT, nos seus nºs 9, 10 e 11, o seguinte:

“9 - As notificações efectuadas por transmissão electrónica de dados consideram-se feitas no momento em que o destinatário aceda à...

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