Acórdão nº 21307/20.5T8PRT.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-09-28

Ano2023
Número Acordão21307/20.5T8PRT.E2
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
P. 21307/20.5T8PRT.E2

Acordam no Tribunal da Relação de Évora:

(…) – Comércio (…) de Produtos Alimentares, Lda. instaurou contra (…) International Limited requerimento de injunção de pagamento europeia, ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 1, do Regulamento (CE) 1896/2006, de 12/12, o qual criou o referido procedimento europeu de injunção de pagamento, tendo pedido a condenação da R. a pagar-lhe a quantia global de € 144.261,80 – em virtude de transacção comercial efectuada e de que a R. não pagou o respectivo preço – sendo € 134.558,82 a título de capital em dívida e € 9.702,98 a título de juros vencidos sobre o referido capital, desde as datas dos vencimentos das facturas até à data de entrada do requerimento em juízo, bem como os juros vincendos à taxa de 8% sobre o capital em dívida e, ainda, o montante de € 40,00 a título de indemnização pelos custos com a cobrança do valor em dívida e o montante de € 306,00 a título de taxa de justiça paga e as demais despesas.
Devidamente citada para o efeito, veio a R. deduzir oposição à injunção, pedindo, desde logo, a sua absolvição da instância por entender, além do mais, que se verifica a excepção de incompetência absoluta do Tribunal. Alegou, em síntese, que nos termos do disposto no artigo 6.º do aludido Regulamento (CE) n.º 1896/2006, que remete para o Regulamento (CE) n.º 44/2001, de 22 de dezembro de 2000, sendo a sua sede social no Reino Unido, sempre deveria ter sido demandada perante os Tribunais do Reino Unido, por serem os competentes para dirimir o presente litígio. Referiu ainda que, por saber disso, é que a A. não indicou, no requerimento inicial, um fundamento concreto que atribua a competência aos Tribunais portugueses, violando a obrigação de especificação prevista no campo 3 do requerimento em causa («Formulário A»), tendo indicado o código “14 Outros (queira especificar)”, nada dizendo no espaço destinado a tal especificação.
A A. notificada para, querendo, no prazo de 10 dias, exercer o contraditório sobre esta questão veio pugnar pela improcedência da excepção deduzida pela R. e reafirmar a competência do tribunal a quo para dirimir o litígio em causa. Alegou, em resumo, que o Regulamento (CE) n.º 44/2001 foi revogado pelo Regulamento (CE) n.º 1215/2012, o qual estabelece no seu artigo 7.º que em matéria contratual as pessoas domiciliadas num Estado-membro podem ser demandadas nos tribunais de outro Estado-membro, mais precisamente perante o tribunal do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão, sendo que no caso de venda de bens, o lugar do cumprimento da obrigação será o lugar onde, nos termos do contrato, os bens foram ou devam ser entregues, e no caso dos autos a entrega dos bens ocorreu nas suas instalações em Évora, em janeiro de 2020. Referiu ainda a A. que fez constar das facturas a indicação de carga e descarga, uma vez que a mercadoria iria ser transportada pela R. até ao Reino Unido, sendo que a factura pode ser utilizada como documento de transporte desde que contenha os elementos referidos no n.º 5 do artigo 36.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e, ainda, a indicação dos locais de carga e descarga, referidos como tais, e a data e hora em que inicia o seu transporte.
Atendendo à matéria de facto alegada e ao disposto no artigo 7.º do Regulamento (CE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro, foi determinada a produção de prova (testemunhal) com vista à determinação do tribunal competente.
Produzida que foi tal prova testemunhal (requerida pela A.) veio a ser proferida decisão pela Mm.ª Juiz a quo, a qual julgou procedente a excepção dilatória de incompetência absoluta deste Tribunal em razão da nacionalidade e, em consequência, absolveu a R. da instância.

Inconformada com tal decisão, dela apelou a A. para esta Relação que, por decisão singular proferida pelo relator em 21/3/2023, veio anular aquela que foi proferida pelo tribunal a quo (por omissão de factos provados e não provados e respectiva fundamentação).
Voltando os autos à 1ª instância foi proferida nova decisão pela Mm.ª Juiz a quo, na qual foi sanada a referida omissão, tendo sido julgada procedente, uma vez mais, a excepção dilatória de incompetência absoluta deste Tribunal em razão da nacionalidade e, em consequência, absolveu a R. da instância.

Novamente inconformada com tal decisão dela apelou a A., tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões:
I. O recurso ora interposto pela Recorrente versa sobre a sentença proferida no âmbito da Injunção Europeia em curso, que julgou verificada e procedente a exceção dilatória de incompetência absoluta dos tribunais portugueses para apreciar o litígio em questão.
II. Entendeu o tribunal a quo, concretamente, que “da conjugação da prova documental e testemunhal (e que acabámos de referir), com as regras da experiência comum, e com as normas legais citadas, o Tribunal não tem dúvidas em afirmar que a entrega material da mercadoria à Ré pela Autora não ocorreu nas instalações desta, sitas em Évora, sendo que, pelo contrário, tal entrega, no sentido do local em que a Recorrida passou a puder dispor da mercadoria, ocorreu no Reino Unido”.
III. Tal decisão foi proferida após a produção de prova testemunhal requerida pela Autora, atendendo a que havia sido suscitada a eventual incompetência absoluta dos tribunais portugueses, defendendo a Autora, em resposta, que, tendo por base o disposto no artigo 7.º do Regulamento (CE) n.º 1215/2012, os bens foram entregues à Ré nas suas instalações, sitas em Évora, tendo esta procedido ao seu transporte para o Reino Unido.
IV. Ora, não se conformando com a douta sentença, vem dela a Recorrente interpor o presente Recurso de Apelação com fundamento na incorreta e errada apreciação e valoração da prova, bem como subsunção dos factos ao direito, com referência à reapreciação da prova produzida, entendendo a Recorrente, no que respeita à convicção que o tribunal a quo acabou por formar, que este incorreu em erro de julgamento na apreciação da prova documental, bem como erro na livre apreciação da prova quanto ao depoimento prestado pelas testemunhas arroladas pela Recorrente.
V. E isso evidencia-se, sobretudo, quando refere o tribunal a quo na douta decisão, que “a referência por parte das testemunhas ao facto de que a empresa transportadora foi contratada pela Ré, não passa de mera suposição”.
VI. Escusado será dizer que, quanto ao esclarecimento deste facto, todas as testemunhas estavam plenamente seguras, e as “contradições” que todas apresentaram entre si, segundo o tribunal a quo, disseram respeito ao número de cargas e momento temporal das mesmas, o qual – releva-se – mediou num curto espaço de 3 meses e sem certezas exatas por parte das mesmas, o que foi, aliás, referido pelas próprias.
VII. Facto é que, tal decisão, da qual se recorre, acarreta, por conseguinte, e como se disse, a impossibilidade de a Recorrente obter, dos tribunais portugueses, o reconhecimento do seu direito de crédito, obrigando-a a recorrer à justiça através de um país que não é o seu, com todos os elevados custos e consequências que daí decorrerão.
VIII. Pelo que, desde já se invoca a violação, pelo juiz a quo, dos princípios do acesso ao direito, previsto no artigo 2.º do C.P.C. e artigo 20.º da C.R.P., princípio do inquisitório, previsto no artigo 411.º do C.P.C., princípio da livre apreciação da prova, violação e erro de aplicação do disposto nos artigos 5.º, 7.º, n.º 1 e 26.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de Dezembro, pois que tomou uma decisão que, não só é contrária aos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela Recorrente, como é injusta e errada (de facto e direito).
IX. A questão que pretende a Recorrente ver reapreciada prende-se, assim, com a competência internacional dos tribunais portugueses, julgando que errou o tribunal a quo ao referir não estar convencido com a versão apresentada pela Autora, i.e., que os bens haviam sido levantados pela Recorrida nas suas instalações, sitas em Évora – fator de conexão com a competência dos tribunais portugueses para resolver o litígio.
X. Para começar, considerou o tribunal a quo que em nenhuma das faturas peticionadas pela Recorrente, está identificada a viatura que procedeu à recolha da mercadoria, mas esta exigência não é obrigatória.
XI. Porém, jamais poderia esta omissão ser reveladora de que a mercadoria foi entregue pela Recorrente no Reino Unido, na sede da Recorrida, como veio aquele tribunal a decidir.
XII. Sem prejuízo, um outro facto que motivou o tribunal a quo a decidir pela procedência da exceção de competência do tribunal baseou-se na circunstância das testemunhas arroladas pela Recorrente terem afirmado que a mercadoria foi entregue nas instalações da autora a uma empresa transportadora contratada pela Recorrida, tendo, porém, explicado, que apenas tiveram intervenção na parte logística, não tendo qualquer conhecimento quanto aos contratos realizados.
XIII. O que o levou a crer tratar-se de uma mera suposição.
XIV. Porém, não se consegue perceber como pôde o tribunal a quo ter extraído, dos depoimentos das testemunhas,
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