Acórdão nº 20918/21.6T8PRT-B.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 08-06-2022

Data de Julgamento08 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão20918/21.6T8PRT-B.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
PROC. 20918/21.6T8PRT-B.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Central Cível do Porto – Juiz 5

REL. N.º 684
Relator: Rui Moreira
Adjuntos: João Diogo Rodrigues
Anabela Andrade Miranda
*
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

1 - RELATÓRIO

Por apenso a um procedimento cautelar de arresto deduzido por AA (arrestante) contra BB (arrestado) e CC, em que foi decretado o arresto da expectativa de aquisição da fracção autónoma designada pela letra “S”, correspondente a um estabelecimento comercial no rés-do-chão centro direito, com entrada pelo nº ... da Rua ..., da freguesia e concelho de Águeda, objecto de contrato de locação financeira imobiliária nº ... em que é locador o Banco 1..., SA, veio C..., L.da, pessoa colectiva nº ..., com sede na Rua ..., Santa Maria da Feira, deduzir embargos de terceiro, alegando que tal arresto ofende direitos seus.
Justificou essa afirmação descrevendo que a fracção foi alvo de contrato de locação financeira em que figuraram como locatários os referidos BB e AA, tendo este cedido, depois, a sua posição àquele. Mais alega que, por sua vez, BB, com consentimento do locador, transferiu para si, C..., a mesma posição contratual, pelo que o arresto incidiu sobre bem alheio. Pede, pois, o levantamento do arresto e o cancelamento do respectivo registo.
AA contestou, apontando a incompletude dos documentos juntos pela embargante, alegando que as assinaturas do contrato entre BB e a embargante não contém assinaturas reconhecidas, pelo que é nulo, que não foi levado a registo, bem como que apenas é invocado para frustar o direito que visou salvaguardar com o arresto.
Sucessivamente, deduziu, em reconvenção, impugnação pauliana quanto ao referido negócio de cessão de posição contratual naquele contrato de locação financeira, para a hipótese de este ser tida por válida e eficaz. Alegou que no âmbito do contrato de locação já tinham sido pagos 181.094,05€, de um custo total previsto de 239.045,36€, sendo incompreensível a cedência da posição contratual pelo preço de 100,00€. Como tal, esse negócio sempre se deve ter por gratuito, sendo dispensável a prova da má fé do adquirente, para a procedência da impugnação pauliana. Em qualquer caso, também alega que essa má fé se verifica, visando o requerido BB “escapar das legítimas penhoras dos seus credores”, para o que se conluiou com a ora embargante. Alega um crédito sobre este, de 51.000,00€ e sempre a crescer, bem como o negócio impugnado impede a satisfação do seu crédito, face às dívidas do requerido BB e à ausência de bens suficientes.
Conclui, pedindo que se lhe faculte a execução do bem no património da embargante.
O embargado BB contestou, acompanhando a posição da própria embargante, além de se ter pronunciado pela inadmissibilidade e pela falta de fundamento do pedido reconvencional.
A embargante C..., em réplica, também se pronunciou pela inadmissibilidade da reconvenção, bem como pela ilegitimidade que nesta se verifica, resultante da ausência do transmitente, no negócio impugnado.
Alegou que o pedido reconvencional não emerge da mesma causa de pedir dos embargos de terceiro, que é incompatível com a defesa apresentada contra os embargos, pelo próprio AA, que não apresenta os fundamentos necessários, v.g. a caracterização do seu crédito sobre o embargado BB. Por fim, alegou que o negócio foi real, tendo assumido o remanescente das responsabilidades do contrato de locação perante o locador, num total de cerca de 57.000,00€, a que acrescerá um valor residual de 19.500,00€, além de ter dado por paga uma outra dívida de BB, de 27.000,00€, para além do custo da própria operação, de 1.238,00€. Justificou os termos do negócio e concluiu pela improcedência da reconvenção.
Em audiência prévia, o embargado AA foi convidado a completar a factualidade alegada quanto à constituição e montante do crédito por si invocado, e a embargante a esclarecer os valores efectivamente envolvidos e por si assumidos aquando do negócio de cessão da posição contratual.
Depois de outras vicissitudes processuais, veio a ser proferida sentença que, depois de afirmar a inadmissibilidade do pedido reconvencional, concluiu pela manifesta improcedência dos embargos, afirmando que “… é irrelevante a titularidade do direito invocado pela embargante. Com efeito, o direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos (art. 6.º do Cód. Reg. Predial). Embargante e arrestante terceiros entre si, prevalece o direito do segundo de satisfazer o seu crédito mediante a execução da posição jurídica arrestada (com expressão patrimonial).”
É desta decisão que vem interposto recurso, pela embargante C..., L.da., que o termina formulando as seguintes conclusões:
Vem o presente recurso interposto do douto despacho sentença de fls. Do processo, que julgou manifestamente improcedentes os embargos de terceiro deduzidas pela Recorrente e, em conformidade, absolveu os Embargados, AA e BB do pedido de levantamento do arresto formulado pela Embargante, C..., L.da.
Decidindo como decidiu, o Mm. Juíz "a quo" não fez adequada aplicação do Direito.
DA SURPRESA DA DECISÃO
2. A 24.02.2021, foi proferido o seguinte despacho - despacho liminar - (refª citius 423050321): “Não se verificando qualquer motivo evidente para indeferimento liminar e em face dos documentos juntos pela embargante, julga-se verificada a probabilidade séria da existência do direito invocado (art.º 345º, do NCPC), pelo que se recebe liminarmente os presentes embargos de terceiro. Em consequência, determina-se a suspensão dos ulteriores termos do arresto no que se refere ao bem objecto dos presentes autos (art.º 347º do NCPC). Notifique as partes primitivas, requerente e requeridos, para contestarem, seguindo se os ulteriores termos do processo comum, conforme determina o art.º 348º do citado diploma legal.”
3. Por despacho de 22.09.2021 (refª 428312261) foi ordenada a realização da audiência prévia. Lê-se no referido despacho: “Atenta a posição assumida pelas partes nos articulados, afigura-se indispensável a realização de audiência prévia, a qual terá por finalidades as previstas no nº 2, do artigo 591.º, do NCPC. Para o efeito, designo o dia 11.10.2021, pelas 9.30 horas.”
4. Em sede de audiência prévia, realizada a 11 de outubro de 2021, a Meritíssima Juíza “a quo” (do J7 – onde a acção correu inicialmente termos) proferiu o seguinte despacho: para a boa decisão da causa, e independentemente da decisão a proferir quanto à admissibilidade do pedido reconvencional, julga-se indispensável fazer uso da faculdade prevista no art.º 590º, nº 2, al. b), do NCPC, convidando-se o embargado AA a esclarecer/complementar a factualidade alegada nos artigos 61º e 62º, da contestação (quanto à constituição e montante do respectivo crédito), bem como a embargante a esclarecer o teor do por si invocado no artigo 36º, da réplica (quanto aos valores efectivamente envolvidos e assumidos pela embargante aquando do negócio de cessão da posição contratual). Notifique. (…) Concede-se o prazo de 10 dias às partes responderem ao convite ao aperfeiçoamento ora formulado e/ou se pronunciarem acerca da junção dos autos do original do contrato de cessão de posição contratual e do original do aditamento ao contrato de cessão de posição contratual. Após a apresentação dos articulados em resposta ao convite ao aperfeiçoamento e cumprido o devido contraditório, abra conclusão nos autos a fim de ser proferido despacho saneador ao abrigo do disposto no art.º 595º, nº 2, do NCPC. Notifique.”
5. Entretanto, os presentes autos de embargos de terceiros foram distribuídos ao
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