Acórdão nº 2059/21.8T8PNF.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-04-20

Ano2023
Número Acordão2059/21.8T8PNF.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 2059/21.8PNF.P1

Sumário.
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1). Relatório.
AA, residente na Rua ..., ..., ...,
propôs contra
BB e CC, residentes na Rua ..., ..., ...
Ação declarativa de condenação, pedindo a sua condenação em:
A- Declarar-se que o contrato promessa de compra e venda foi definitivamente incumprido, por culpa dos Réus, que não cumpriram com as obrigações que voluntariamente se propuseram, apesar de interpelados por notificação judicial avulsa para tal.
B- Restituição do sinal pago por si pago em dobro, que corresponde ao montante de 199.519,16 EUR.
C- Pagar juros de mora vencidos, a contar da data em que entraram em incumprimento, em 14/08/2020.
O sustento consiste no incumprimento, pelos Réus, enquanto promitentes vendedores, de contrato promessa de compra e venda celebrado com os mesmos em 10/03/1997, relativo a fração de um imóvel.
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Os Réus contestaram, arguindo a prescrição do direito em causa e negando que tenha sido efetivamente celebrado a mencionada promessa que foi exigido como garantia de um contrato de mútuo em que o Réu marido era mutuário e o Autor mutuante.
O Autor apresentou articulado onde negou que tivesse ocorrido a prescrição.
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Foi elaborado despacho saneador onde se fixou como objeto de litígio «apurar da outorga pela Ré mulher da promessa geradora da obrigação exercida pelo Autor e da consciência pelo Réu marido da outorga de uma promessa e/ou da outorga desta como garantia de restituição de um mútuo, entretanto já satisfeito/devolvido.
Concluindo-se pela outorga vinculante, da prescrição dos direitos emergentes, a depender agora do apuramento do reconhecimento pelos RR das suas obrigações.
Na improcedência da prescrição, do incumprimento definitivo da promessa e respetivas consequências.»
Fixou-se matéria de facto assente e elencaram-se factos como temas de prova.
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Foi proferida sentença a julgar improcedente a ação e condenar o Réu como litigante de má-fé, em multa fixada pelo mínimo legal.
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Inconformado, recorre o Autor, formulando as seguintes conclusões:
«I Há elementos probatórios nos Autos, quer documentais, quer testemunhais, que impõem uma Douta decisão diversa, e dos quais se pretende a reapreciação pelo Venerando Tribunal.
II Há erro na apreciação da prova produzida em sede de Audiência de Julgamento.
III Pretende-se a reapreciação pelo Venerando Tribunal, do depoimento do senhor AA, que constam da Gravação no dia 11-10-2022 com início às 10:20:19 e fim às 12:04:55, e em concreto das passagens que se transcreveram, sublinhadas e a negrito.
IV Com tal reapreciação, impõe-se que seja dado como provado nos pontos A, B, L, e O, o seguinte:
A) A 10-03-1997, o Autor e os Réus assinaram o contrato de promessa de compra e venda, junto como doc. nº 1 com a petição, o qual se dá por integralmente reproduzido.
B) O Réu foi ter com o Autor na data mencionada em A, levando consigo já selado e assinado por ambos os Réus, o aludido contrato de promessa de compra e venda.
L) Em data não exactamente apurada, mas não subsequente a março de 1997, o Autor emprestou ao Réu marido a quantia de 20 Milhões de Escudos, em numerário.
O) O Autor e os Réus, quiseram prometer comprar e vender, respectivamente, o imóvel descrito no contrato de promessa de compra e venda, pois o Réu redigiu o contrato da forma que consta nos Autos, e o Autor, ao assinar, aceitou tal contrato.
V Em face desta reapreciação da prova produzida em Audiência de Julgamento, impõe-se que seja revogada a Douta Sentença, e seja proferido Douto Acórdão que julgue procedente e provados os pedidos formulados pelo ora recorrente, com as legais consequências.
VI Além disto, há Erro na Interpretação e Aplicação do Direito, devendo as questões de direito serem apreciadas pelo Venerando Tribunal, que implicam necessariamente a procedência total da acção.
VII O contrato de promessa de compra e venda foi proposto ao Autor pelos Réus, que o elaboraram, assinaram, tendo o Réu marido levado ao Autor para assinar, que assim o fez, passando assim a valer entre as partes esse contrato assinado, e não qualquer outro negócio ou contrato que possam ter celebrado antes.
VIII Não existe qualquer nulidade do contrato de promessa de compra e venda celebrado entre as partes, e junto aos Autos.
IX Há incumprimento definitivo por parte dos Réus, em face da notificação judicial avulsa, pois não marcaram a escritura, nem devolveram o dinheiro recebido por eles, e declarado por eles no contrato, a título de sinal.
X Há culpa total dos Réus no incumprimento definitivo do contrato, nos termos do disposto no artigo 799º, nº 2 do Código Civil.
XI Não existe qualquer prescrição do direito do Autor, em face da forma como o contrato de promessa foi redigido, e em face dos efeitos da notificação judicial avulsa.
XII O Autor considera que tem direito à devolução do sinal pago em dobro, nos termos do disposto no artigo 442º nº 2, do Código Civil, ou seja, a quantia de 199.519,16 Euros em moeda de Euros, em vigor à presente data, que resulta da conversão dos vinte milhões de escudos em euros a multiplicar por dois.
XIII Indicam-se como violadas, entre outras, as normas constantes dos artigos 46º nº 1, al. c), 819º do C.P.C. na redacção aplicável, artigos 285º e seguintes, 473º e seguintes, 1142º e 1143º do Código Civil.
XIV Assim, nos Doutamente supridos, deverão Vossas Excelências dar provimento ao presente recurso, e em consequência, ser proferido Douto Acórdão que revogue a Douta decisão em crise, reapreciando a prova nos termos supra requeridos, apreciando-se as questões de direito suscitadas, e a final proferindo-se Douto Acórdão que julgue procedente e provados os pedidos formulados na petição inicial, com as legais consequências da condenação dos Réus em conformidade, assim fazendo Vossas Excelências a costumada Justiça!».
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O Réu contra-alegou, pugnando pela rejeição do recurso e, caso tal não suceda, pela manutenção do decidido.
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As questões a decidir são:
- admissibilidade da impugnação da matéria de facto;
- análise dos factos impugnados referentes à assinatura do contrato promessa também pela Ré mulher, valor emprestado pelo Autor, intuito da celebração do mesmo contrato;
- prescrição do direito do Autor;
- validade do contrato promessa.
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2). Fundamentação.
2.1). De facto.
Resultaram provados os seguintes factos:
«A) A 10-03-1997, o Autor e ao menos o Réu marido, assinaram o contrato promessa de compra e venda, junto como Doc. n.º 1 com a petição, o qual se dá por integralmente reproduzido.
B) Dele consta uma assinatura do nome da Ré mulher.
C) Naquele os Réus declaram prometer vender e o Autor prometer comprar a fracção autónoma designada pela letra “N”, relativo ao prédio urbano, sito no lugar ..., freguesia ..., concelho ..., então omisso na matriz e participado na Repartição de Finanças de Lousada a 02-01-1995, descrito na competente Conservatória sob o n.º ...26 ..., de que os Réus à data eram donos e legítimos proprietários.
D) O preço ali referido foi o de 22.000.000$00 (actualmente 109.735,54 Euros).
E) No referido contrato promessa de compra e venda, está declarado que o Autor pagou a quantia de 20.000.000$00 (actualmente 99.759,58 Euros), a título de sinal, tendo ficado acordado que o remanescente em dívida seria pago com a realização da escritura de compra e venda.
F) Ficou igualmente declarado que a escritura seria realizada logo que os Réus regularizassem a situação do prédio nas Finanças, não podendo contudo ultrapassar 12 meses desde a data de celebração do contrato-promessa de compra e venda, celebrado a 10-03-1997.
G) Ficou salvaguardado o direito à execução específica.
H) O Autor intentou uma notificação judicial avulsa, no dia 01-07-2020, para que os Réus, no prazo de 30 dias, realizassem a referida escritura de compra e venda, conforme petição inicial junta como Doc. n.º 2 com a petição inicial, que se dá por integralmente reproduzida, constando da parte final da mesma: “sob pena de não o fazendo se considerar o incumprimento como definitivo e poder ser exigida a restituição do sinal em dobro”.
I) Tendo sido os mesmos citados no dia 14-07-2020, conforme citações juntas sob os Docs. n.º 3 e 4 com a petição.
J) A escritura não foi realizada.
K) O Autor nunca pagou aos RR a quantia de 20.000.000$00 (actualmente 99.759,58 Euros), a título de sinal.
L) Em data não exactamente apurada, mas não subsequente a Março de 1997, o Autor emprestou ao Réu marido a quantia de 20.000 EUR, em numerário.
M) O Réu BB obrigou-se a restituir ao Autor a quantia mutuada ao menos no prazo máximo de um ano após a assinatura da intitulada promessa.
N) Foi ao menos por volta da ocasião da entrega da quantia mutuada que o A. solicitou ao Réu BB que assinasse a promessa, para garantir o cumprimento do então acordado quanto à restituição da quantia mutuada.
O) Foi com esse intuito que o Réu assinou a declaração referida em A).»
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E resultou não provado:
«1. A assinatura do nome da Ré constante do documento referido em A) foi feita pelo punho daquela/por ela aposta.
2. O Réu marido assinou o documento sob A) sem tomar consciência do seu teor.
3. Apesar da aposição das respectivas assinaturas e do declarado no escrito, o Réu não quis prometer vender, como o Autor não quis prometer comprar o imóvel ali descrito.
4. O A. nunca entregou aos RR a quantia de 20.000.000$00 (actualmente 99.759,58 Euros), a título de empréstimo/mútuo.
5. Em Março de 1997 o Autor emprestou ao Réu marido a quantia de 5.000.000$00 (actualmente €24.939,90), em numerário.
6. BB obrigou-se a restituir ao Autor a quantia mutuada até aos inícios do mês de Março de 1998, acrescida dos respectivos juros acordados, à taxa anual de 5%, no montante de 250.000$00.
7. Foi na precisa/exacta ocasião da entrega da quantia mutuada que o A. solicitou ao Réu BB que assinasse um documento realizado por aquele e que, no dizer do Autor, apenas seria um mero “pro forma”,
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