Acórdão nº 20420/19.6T8SNT-B.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-04-07

Data de Julgamento07 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão20420/19.6T8SNT-B.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 6ª Secção CÍVEL Do Tribunal da Relação de LISBOA


1.Relatório.


Na sequência da instauração – a 20/12/2019 - de acção executiva [ a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste Sintra - Juízo Execução - Juiz 2 ], movida por A [ .... – Construção Civil, S.A. ] , contra B [ M..... & E..., Lda. ], com vista à cobrança coerciva da quantia de € 9.903,56 [ sendo €500,00 referente a parte de uma renda vencida e não paga na vigência do contrato de arrendamento celebrado entre as partes, datado de 01.05.2014 ; €8.100,00 correspondente a rendas respeitantes aos meses de Maio a Julho de 2019, no valor líquido de €5.400,00, acrescido da indemnização prevista no artigo 1041.º, nº1, do CC, no valor de €2.700,00 ; e €1.050,00 correspondente a penalização de 50,00€/dia de atraso na entrega de imóvel, valor calculado desde 27/11/2019 até 17/12/2019, tudo acrescido de Juros de mora calculados à taxa comercial de 7% desde a data de vencimento de cada uma das prestações e no valor de 253,56 ], veio a executada deduzir oposição à execução, pugnando pela respectiva desobrigação de efectuar o pagamento da quantia total supra referida , e impetrando que :
a)-Seja declarada a extinção da Execução quanto ao contrato de arrendamento que não consta dos autos;
b)-Seja declarada a extinção da Execução relativamente à indemnização por falta de pagamento de rendas;
c)-Seja declarada a extinção da Execução, por pagamento, da renda de Maio de 2019.
d)-Seja reduzida a taxa dos juros para a taxa de 4%
e)-Seja extinta a Execução quanto à cláusula penal.

1.1.-Para tanto, alegou a executada/embargante, em síntese, que :
- Dispondo art. 14º - A, do NRAU, que a apresentação do contrato de arrendamento acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa, certo é que o invocado contrato de arrendamento datado de 01 de Maio de 2014 não consta dos autos, logo, não existe título executivo ;
- Acresce que a Embargante não é arrendatária, pois o contrato de arrendamento caducou em 31 de Julho de 2019 e, ademais, a indemnização que a Exeqte. Reclama não se encontra abrangida pela possibilidade de ser executada ao abrigo do disposto no art. 14º -A, nº1, do NRAU;
- Mas, a ser a referida indemnização exequível, certo é que o se valor é actualmente de 20%, nos termos da redacção do art. 1041º do C. Civil, que resulta da Lei nº 13/2019, de 12/2 ,pelo que haveria que reduzir o montante de € 2700,00, reclamado pela Exequente, para € 1.080,00, com a consequente redução dos juros vencidos;
- Seja como for, a verdade é que a referida indemnização destina-se a pôr fim á mora do locatário, assim se retirando ao senhorio a possibilidade de resolver o contrato de arrendamento, mas, in casu, o contrato de arrendamento caducou, não existindo assim qualquer mora a que o arrendatário deva pôr cobro;
- Depois, é errado que estejam em dívida três rendas relativas ao contrato que teve início no dia 1/05/2019, e , também os juros a ser contabilizados nesta execução deveriam ter sido civis, e nunca comerciais;
- Por último, certo é que a possibilidade de o senhorio requerer execução do arrendatário, nos termos do art.14º-A, do NRAU, não abrange a cobrança coerciva de eventuais valores devidos a título de cláusula penal , logo, inexiste título executivo que permita a execução relativamente à cobrança da cláusula penal.

1.2.-Recebida liminarmente a oposição, foi o exequente notificado, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 732.º, nº2, do C.P.C., vindo o mesmo a apresentar contestação, impugnando, parcial e motivadamente a factualidade alegada pela executada/opoente e pronunciando-se, por outro lado, quanto às excepções invocadas pela executada/opoente, pugnando no final, pela improcedência da oposição.

1.3.-Findos os articulados, realizou-se a audiência prévia – não tendo sido possível alcançar acordo –, no âmbito da qual o Tribunal fixou o valor da causa, pronunciou-se sobre os pressupostos processuais, sobre os requerimentos probatórios e designou data para realização da audiência de discussão e julgamento.

1.4.-Realizada a audiência de discussão e julgamento (a 12/10/2021) e conclusos os autos para o efeito , foi então proferida a competente SENTENÇA, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor :
V.Decisão;
Em face de todo o exposto, julgo parcialmente procedente a presente oposição à execução.
Custas pela executada/opoente e pelo exequente na proporção dos respectivos decaimentos.
Registe, notifique (sendo o exequente para, no prazo de 10 dias contados do trânsito da presente sentença, proceder a nova liquidação da obrigação exequenda em conformidade com o decidido) e comunique ao Sr. Agente de Execução.
Sintra, 23.11.2021”

1.5.-Inconformada com a sentenciada procedência parcial da oposição, veio então a exequente A, da referida sentença interpor recurso de apelação, que admitido foi e com efeito devolutivo, formulando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:
a)-O presente recurso tem por objecto matéria de direito, em particular a errada interpretação e aplicação da lei a duas situações diferenciadas, mas não totalmente distintas, por parte do Tribunal a quo.
b)-O que está em causa é apreciação de duas excepções invocadas pela Recorrida, em sede de embargos de executado, que na Sentença recorrida mereceram provimento.
c)-A Recorrente não pode aceitar que o Tribunal a quo tenha dado razão à Recorrida nessa matéria, não só porque as quantias peticionadas são indiscutivelmente devidas à Recorrente, como também por existe, de facto, título executivo que sustenta a sua exigibilidade em sede de acção executiva.
d)-A Recorrente discorda da douta decisão, por entender que a mesma incorre numa errada apreciação da natureza e finalidade dos pedidos formulados relativamente (i) ao valor legal indemnizatório e (ii) ao valor da cláusula penal contratual e, por conseguinte, uma errónea interpretação e aplicação do direito.
e)-O Tribunal a quo concluiu pela inexigibilidade da indemnização peticionada pela Exequente/Recorrente por não se tratar de “rendas, encargos e despesas”, conforme referido no artigo 14.º-A do NRAU, referindo que o legislador se cingiu àquela enumeração excluindo deliberadamente as demais importâncias devidas pelos arrendatários no âmbito das relações contratuais estabelecidas.
f)-Releva ainda o facto de tal indemnização decorrer da lei e não do contrato, para sair do âmbito do título previsto no art.º 14.º-A, bem como que, enquanto sanção legal, não é de aplicação automática.
g)-Com o devido respeito, parece o douto Tribunal olvidar – o que não se aceita ou concebe – que estamos perante um título executivo especial e complexo que integra diversos elementos essenciais e específicos, logo, desde que se afigurem correctos, completos e idóneos à subsunção à norma do art.º 14.º-A, então assim deverão ser considerados para efeitos de força de título executivo (Maria Olinda Garcia, A Nova Disciplina Do Arrendamento Urbano, 2.ª Ed., Coimbra Ed. 2006, pp.100 e 101).
h)-Tal entendimento não colide com o princípio da tipicidade ou qualquer outro e não desrespeita os direitos do devedor, nomeadamente do seu património.
i)-Ademais, se o que a lei pretende é a comprovação da comunicação ao arrendatário dos concretos montantes em dívida, seja a título de rendas ou outros, então apenas será de exigir essa prova, por meio documental e suficiente para o efeito.
j)-No caso, foi feita a comunicação com a indicação expressa e discriminada dos montantes em dívida e intenção de reclamar judicialmente todas as quantias contratual e legalmente exigíveis.
k)-A Executada/Recorrida sabia e não tinha como ignorar a obrigação de pagamento das rendas, bem como todas as consequências do respectivo incumprimento.
l)-Para além disso, a sobredita indemnização, mesmo não estando indicada no contrato, encontra-se perfeitamente definida na lei (art.º 1041.º CC), sendo facilmente determinável e sabendo-se de antemão qual o seu valor, em função do montante e do número de meses de renda em falta.
m)-Mais, embora não seja automática, quando aplicada só é legalmente excluída se o contrato de arrendamento for resolvido com fundamento na falta de pagamento dessas mesmas rendas, o que não se verifica na situação em apreço e isso é evidente.
n)-Neste sentido, Ac. da RC, proc. 4798/17.9T8CBR-D.C1, disponível em www.dgsi.pt.
o)-Pelos artigos 219.º e 224.º/1 do CC constatamos que vigora, como regra geral, a liberdade de forma e que a declaração negocial que tem um destinatário se torna eficaz logo que chega ao seu poder ou dele é conhecida.
p)-Concluímos, assim, que o senhorio pode escolher o meio de efectuar a comunicação em causa, desde que a comprove documentalmente, uma vez que a mesma visa dar a conhecer ao arrendatário os montantes de rendas e/ou outros em dívida.
q)-Neste sentido, vejam-se as decisões da RC, de 05.02.2013, proc. n.º 643/11.7TBTND-A.C1; de 21.04.2009, proc. n.º 7864/07.5TBLRA-B.C1; e da RL, de 12.12.2008, proc. n.º 10790/2008-7, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
r)-A obrigação de pagamento de rendas pelo arrendatário constitui a sua principal obrigação contratual e decorre do disposto no artigo 1038.º, al. a) do CC, da mesma forma que a pretendida indemnização tem assento no artigo 1041.º, n.º 1 do CC.
s)-No caso vertente, o requerimento executivo foi acompanhado do contrato de arrendamento que subjaz aos presentes autos, bem como duas cartas registadas, datadas de 22.07.2019 e 26.11.2019, respectivamente, dirigidas à Executada – que não as impugna – e nas quais se encontram expressos todos os montantes reclamados, nos seus valores líquidos, formas de cálculo e a que título são peticionados.
t)-Dúvidas não restam de que as notificações foram válida e eficazmente realizadas pela Recorrente,
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT