Acórdão nº 2/22.6 BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-03-24

Data de Julgamento24 Março 2022
Ano2022
Número Acordão2/22.6 BELRA
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

K...., com os demais sinais nos autos, veio, em conformidade com o artigo 283.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, interpor recurso do despacho proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 7 de janeiro de 2022, que rejeitou liminarmente a reclamação por si deduzida, contra o acto de órgão de execução fiscal, que procedeu à liquidação oficiosa n.º 2021/09806516 praticado pelo Diretor da Alfandega de Peniche, relativo a Imposto sobre Veículos (ISV), Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e respetivos juros compensatórios, no montante total de € 14.779,22.

O Reclamante, ora Recorrente, termina as alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

«A. O Tribunal a quo rejeitou liminarmente a reclamação apresentada nos termos do art.º 276º do CPPT pelo ora Recorrente do ato do órgão de execução fiscal, no pressuposto de se verificar a exceção de erro na forma de processo e ser inviável a convolação para o meio processual considerado idóneo, ordenando o seu desentranhamento e devolução ao Recorrente, decisão com a qual o Recorrente, salvo o devido respeito, não pode concordar por considerar ter sido efetuada uma incorreta aplicação das normas de direito para fundamentar a rejeição liminar do pedido.

B. No entendimento do Recorrente a reclamação nos termos do art.º 276.º do CPPT não poderia ter deixado se ser apreciada pelo Senhor Diretor da Alfandega de Peniche, porquanto, e desde logo, resultava da reclamação apresentada que o aqui Recorrente não concordava com o ato de liquidação oficiosa que lhe foi imputado, tendo-lhe assacado vários vícios por violação de lei de fundo e que importavam na sua nulidade, bem como na do procedimento de conferência final.

C. Destarte, ainda que não se encontrasse já instaurado processo de execução, e sabendo que tal iniciativa de instauração nunca poderia ser do controlo do Recorrente, desde logo decidiu defender-se do ato de liquidação oficiosa, seguro de que estava do avanço da Autoridade Tributária para a cobrança coerciva, atenta a opção do Recorrente pelo não pagamento voluntário e o decurso deste prazo.

D. Salvo o devido respeito, andou mal o Tribunal a quo ao suportar-se num motivo de ordem formal, como seja o de que o mecanismo da reclamação previsto na norma do art.º 276 do CPPT, prescreva que se encontre já formalmente instaurado o processo executivo.

E. No entender do Recorrente é suficiente para a possibilidade de lançar mão dos meios de garantia de defesa do administrado sempre que, perante a notificação de um ato de liquidação tributária oficiosa, o mesmo se tome por ofendido nos seus direitos e podendo desde logo discutir a legalidade de tal ato, não apenas na sua vertente de correta liquidação, mas desde logo quanto a aquilatar da legalidade da instauração do processo de Inspeção Tributária e os atos praticados no Procedimento de Conferencia Final (PCF) que podem inquinar a boa fé do órgão da Administração Tributária, afetando a exigível lisura que um processo executivo tem obrigatoriamente de conter, bem como de uma solenidade irrepreensível e inatacável no cumprimento das normas legais aplicáveis.

F. Assim como andou mal o Senhor Diretor da Alfandega de Peniche ao não apreciar a reclamação que lhe fora tempestivamente apresentada, remetendo os autos ao douto Tribunal a quo, já na pendência do processo executivo, relegando para o órgão de execução fiscal a tomada e conhecimento dos vícios assacados ao PCF e que são da sua autoria, sendo que também do OE não se colheu qualquer resposta.

G. Aqui chegados, e sem prescindir do que supra se expôs, agora perante a reclamação judicial prevista no artigo 276º e seguintes do CPPT, temos que este é o meio processual adequado para impugnar decisões proferidas no âmbito do PCF com direto impacto no processo de execução fiscal, visando em regra a pretensão aí deduzida, como in casu, a anulação dessas decisões ou atos em concreto (os atos reclamados), e que a final redundem na anulação ou extinção da própria execução, o que está em contradição com o que parece ter sido o entendimento, incorreto diga-se, do douto Tribunal a quo ao concluir por não conhecer da reclamação por erro na forma de processo.

H. E ainda que se pretenda considerar, no que não se concede, estar-se, em sede judicial, perante um erro na forma do processo, o que consubstancia uma nulidade processual de conhecimento oficioso, a mesma é sanável pela convolação para a forma de processo correta, importando, unicamente, a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, e a prática dos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, tanto quanto possível, da forma estabelecida na lei, cfr. artº.97, nº.3, da LGT, e artº.98, nº.4, do CPPT.

I. Ainda de outro prisma, considerando-se que as concretas causas de pedir invocadas não são adequadas à forma de processo escolhida pelo Recorrente, então estamos perante questões relacionadas com a viabilidade do pedido, e não da propriedade do meio processual utilizado, pelo que nunca poderia haver erro na forma do processo, mas eventual improcedência da ação, não estando o Tribunal a quo impedido de interpretar o pedido, determinando o real sentido da pretensão do Recorrente.

J. E caso ocorra uma cumulação de pedidos, não pode obstar, só por si, que se conclua pela impropriedade do meio processual utilizado, podendo e devendo considerar-se sem efeito os demais que não sejam adequados, prosseguindo o processo relativamente ao pedido adequado à forma de processo que viesse a ser escolhida pelo Recorrente.

K. Pelo que o Tribunal a quo, salvo o devido respeito, não poderia concluir como conclui, considerando tão só que não poderia substituir-se ao Recorrente na escolha do meio processual com que este pretenderia prosseguir com a ação, optando por não proceder à convolação do processo, rejeitando liminarmente a reclamação do ato do órgão de execução fiscal nos termos do disposto no artigo 590.º n.º 1 do CPC, ex. vi al. e) do artigo 2.º do CPPT.

L. Sem que antes tivesse ouvido o ora Recorrente quanto à forma de processo que pretendia fazer seguir, incorrendo assim perante uma decisão-surpresa, pois não foi dada oportunidade para que este se pudesse pronunciar sobre o erro da forma de processo, ou de alguma forma exercer o contraditório, incorrendo numa nulidade, por violação do princípio do contraditório no termos do artigo 3°, nº 3, do CPC.

M. O artigo 3º nº 3 do CPC estipula que o Juiz deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem, sendo este um poder/dever vinculado do Juiz da causa, cfr. art.º 98.º n.º 4 do CPPT e 97.º nº 3 da LGT.

N. O indeferimento liminar só tem lugar quando for de todo impossível o aproveitamento da petição inicial, o que se entende não ser o caso da reclamação apresentada pelo ora Recorrente.

O. Pois se fosse concedida a oportunidade ao Recorrente, este não deixaria de se pronunciar sobre a forma de processo em que a reclamação se deveria revestir, no caso impugnação judicial, sem prejuízo de entender poder, e ter direito a que lhe fosse mantida a possibilidade processual de separadamente invocar as restantes pretensões na forma de processo adequada.

P. Ao ter decidido o douto Tribunal a quo pela exceção do erro na forma do processo sem possibilidade de convolação, sem observância do princípio do contraditório, foi preterida uma formalidade legal suscetível de influir no exame ou decisão da causa, o que constitui nulidade processual, nos termos daquele artigo195º, nº1 do CPC, e determinar a anulação dos atos pertinentes do processo, como se estatui o nº 2.

Q. Sem prejuízo da nulidade invocada, sempre se dirá nas específicas circunstâncias do caso concreto, que se justifica outra solução jurídica que não a adotada na douta Sentença, mais compatível com critérios impostos pelos princípios do moderno processo, menos formalista, e, bem assim, pelo princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva, concluindo-se, com o devido respeito, que Tribunal a quo tinha condições para conhecer da reclamação tal como lhe foi apresentada.

R. E se assim não se entendesse então, e com o devido respeito, deveria os autos ser convolados em requerimento/reclamação a dirigir ao autor do ato administrativo, para que o mesmo dele conheça e aprecie o que tiver por conveniente e necessário.

S. E ainda, subsidiariamente caso...

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