Acórdão nº 1977/20.5T8LOU-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 07-02-2022

Data de Julgamento07 Fevereiro 2022
Ano2022
Número Acordão1977/20.5T8LOU-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação nº 1977/20.5T8LOU-A.P1

Processo do Juízo de Execução de Lousada – Juiz 2
Relatora: Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha
1º Adjunto: Maria Fernanda Fernandes de Almeida
2º Adjunto: Maria José Simões

Acordam na 5ª Secção (3ª Secção Cível) do Tribunal da Relação do Porto

Sumário (elaborado pela relatora - cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC):
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I - RELATÓRIO

Recorrente: Embargada/Exequente C..., Sa
Recorrida: Executada AA

Por apenso à execução comum que C..., Sa lhe moveu, veio a executada, AA, deduzir oposição à execução, pretendendo a extinção da execução, alegando, para tanto, a prescrição dos juros de mora e, bem assim, do capital.
Notificada para contestar, a exequente pugna pela improcedência da oposição à execução sustentando que no caso em apreço, não estamos perante uma dívida relativa a prestações periodicamente renováveis, que em 26 de março de 2014, foi proferida sentença de declaração de insolvência da mutuária BB no âmbito do processo n.º 508/14.0TJPRT e o bem imóvel hipotecado foi vendido no referido processo de insolvência pelo montante de €123.250,00, conforme decisão de adjudicação proferida a 5 de março de 2015 e após ter sido aplicado o produto da venda do referido bem imóvel e constatando a insuficiente do mesmo para a liquidação das responsabilidades junto da C..., S.A., instaurou a presente ação executiva, sendo que podia ter, de imediato, acionado judicialmente os Executados/fiadores mas, dado o disposto no artigo 752.º, n.º 1 do CPC, e como não podia penhorar bens dos Executados/fiadores sem que tivesse sido constatada a insuficiência do bem imóvel hipotecado, não o fez, entendendo que ao capital peticionado é aplicável o prazo ordinário de prescrição de 20 anos previsto no artigo 309.º do Código Civil, sendo que a obrigação a título de capital é distinta da obrigação a título de juros enquanto remuneração do capital mutuado.

Entendendo-se reunir o processo os elementos necessários, foi proferida decisão de mérito no despacho saneador, tendo a mesma a seguinte
parte dispositiva:
“Pelo exposto, julgo procedente a excepção de prescrição invocada e procedentes os presentes embargos de executados e em consequência determina-se a extinção da ação executiva.
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Custas a cargo da exequente”.
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A embargada/exequente apresentou recurso de apelação pugnando pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que julgue os embargos improcedentes, formulando as seguintes
CONCLUSÕES:
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DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA
8. A Recorrente C..., S.A. entende que o Douto Tribunal a quo deveria ter dado como provado, para além dos referidos pontos, os seguintes:
- Em 18 de abril de 2013, a Exequente foi citada no âmbito do processo n.º 1410/10.0TBPFR, enquanto credora com garantia real para, querendo, reclamar créditos, o que fez em 3 de maio de 2013;
- Em 28 de abril de 2014, a Exequente reclamou créditos no âmbito do processo de insolvência n.º 508/14.0TJPRT, tendo sido os mesmos reconhecidos e graduados em primeiro lugar.
9. Os referidos factos mostram-se provados nos presentes autos através da prova documental não impugnada pela Embargante AA, a qual foi junta pela Exequente com a sua contestação.
10. Na sua Contestação, a Exequente C..., S.A. alegou, por um lado, que havia sido citada no processo executivo n.º 1410/10.0TBPFR para, querendo, reclamar créditos enquanto credora com garantia real, tendo junto cópia da respetiva citação e da reclamação de créditos apresentada.
11. Na contestação, a Exequente C..., S.A. invocou que a mutuária BB havia sido declarada insolvência no processo n.º 508/14.0TJPRT, onde apresentou a respetiva reclamação de créditos, os quais foram reconhecidos e graduados em primeiro lugar face à garantia real existente, tendo junto cópia da reclamação de créditos apresentada, da relação de créditos reconhecidos e da sentença de verificação e graduação de créditos proferida no referido processo n.º 508/14.0TJPRT.
12.Tais factos mostram-se relevantes para a decisão do mérito da causa dado que a Exequente, na respetiva contestação, invocou a interrupção do prazo de prescrição ao abrigo do artigo 323.º do CC, sendo certo que o Douto Tribunal a quo nem sequer se pronunciou sobre a mesma.
13.Como tal, deve ficar a constar da matéria de facto dada como provada que:
“- Em 18 de abril de 2013, a Exequente foi citada no âmbito do processo n.º 1410/10.0TBPFR, enquanto credora com garantia real para, querendo, reclamar créditos, o que fez em 3 de maio de 2013;
- Em 28 de abril de 2014, a Exequente reclamou créditos no âmbito do processo de insolvência n.º 508/14.0TJPRT, tendo sido os mesmos reconhecidos e graduados em primeiro lugar.”
DO DIREITO
I. DA NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA
14. Na contestação apresentada, a Exequente C..., S.A. invocou que reclamou créditos quer no processo executivo n.º1410/10.0TBPFR, quer no processo de insolvência n.º 508/14.0TJPRT, o que, nos termos do disposto no artigo 323.º do CC, constitui motivo de interrupção do decurso do prazo de prescrição em curso.
15. Na sentença ora em crise, o Douto tribunal a quo apenas se pronunciou quanto ao prazo de prescrição aplicável ao caso em apreço que, no seu entendimento, é de cinco anos, sem, contudo, se ter pronunciado quanto à causa de interrupção do respetivo prazo.
16. O Tribunal a quo não se pronunciou quando à causa de interrupção do prazo de prescrição que foi expressamente invocada pela Exequente na respetiva contestação, sendo que, estamos perante uma matéria que tem necessariamente reflexos na decisão de mérito.
17. A sentença ora em crise é nula, por omissão de pronúncia, dado que o Tribunal a quo deixou de conhecer de uma questão que tinha necessariamente de conhecer dada o seu eventual reflexo na decisão de mérito, razão pela qual deverá o Tribunal a quo pronunciar-se sobre a nulidade agora arguida, nos termos do disposto no artigo 617.º do CPC.
II. DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO APLICÁVEL
18. OTribunal a quo entende que ao caso em apreço não é aplicável o prazo prescricional ordinário de 20 anos, uma vez que a situação em apreço se encontra contemplada na al. e) do artigo 310.º do Código Civil e, como tal, registando-se o incumprimento em 2009 e a insolvência da mutuária em 2014, já decorreu o prazo de prescrição de 5 anos ali previsto.
19. A Exequente C..., S.A. entende que ao caso em apreço é aplicável o prazo ordinário de prescrição de 20 anos previsto no artigo 309.º do Código Civil por dois fundamentos distintos.
20. O contrato de mútuo, nos termos do disposto no artigo 1142.º do Código Civil, é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.
21. Da noção civil do contrato de mútuo resulta uma única obrigação para cada uma das partes contraentes, ou seja, para o mutuante, a obrigação de emprestar dinheiro ou outra coisa fungível e, para o mutuário, a obrigação de restituição de outro tanto do mesmo género e qualidade.
22. O facto de se poder contemplar em cada contrato de mútuo uma determinada forma de restituição, seja através de uma única prestação, seja mediante várias prestações, mensais, trimestrais ou semestrais, é uma questão paralela ao contrato.
23. Dos contratos de mútuo resulta uma única obrigação principal para os mutuários que consiste na restituição do dinheiro mutuado, in casu, das quantias de €67.717,07 e de €65.000,00, independentemente da forma de restituição, que pode ser fracionada e diferida no tempo.
24. No contrato de mútuo estamos perante uma única obrigação de restituição da coisa mutuada, sendo que, não obstante seja possível estipular a restituição de forma fracionada e diferida no tempo, não pode a mesma ser equiparada a uma prestação periódica, renovável e cuja constituição dependa do decurso do tempo.
25. A coisa objeto da obrigação de restituição encontra-se previamente determinada no momento da constituição da obrigação, não obstante a forma e o prazo da sua restituição.
26. A restituição de uma quantia mutuada pode ocorrer de forma fracionada, o que significa que a obrigação para o mutuário se prolonga no tempo, através de sucessivas prestações, embora o objeto da prestação esteja previamente fixado, sem dependência da relação contratual.
27. “As prestações fracionadas ou repartidas caem no âmbito da prescrição ordinária de 20 anos prevista no artigo 309.º do Código Civil.” – Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 3 de outubro de 2017.
28. A obrigação a título de capital mutuado é distinta da obrigação a título de juros enquanto remuneração do capital mutuado, pelo que, o capital mutuado, previamente fixado, está sujeito ao prazo ordinário de prescrição de 20 anos, enquanto os juros estão sujeitos ao prazo de prescrição de 5 anos.
29. Por outro lado, as prestações acordadas no âmbito dos contratos de mútuo peticionados nos presentes autos deixaram de pagas a partir de janeiro e de agosto de 2009, pelo que, a partir desta data, venceram-se todas as prestações acordadas nos termos do artigo 781.º do Código Civil.
30. O Tribunal a quo considera que, em face ao referido incumprimento dado como provado, não há dúvidas que os contratos de mútuo peticionados nos presentes autos se encontram totalmente vencidos, para além de considerar que ambos os contratos de mútuo se encontram igualmente vencidos, na sua totalidade, face à declaração de insolvência da mutuária BB no âmbito do processo n.º 508/14.0TJPRT.
31. Resulta das Cláusulas 15.ª e 13.ª dos documentos complementares dos contratos de mútuo peticionados nos autos, que a C... poderá considerar antecipadamente vencida toda a dívida e exigir o seu imediato pagamento no caso de incumprimento contratual, de venda do bem imóvel hipotecado sem o seu consentimento e de insolvência de um
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