Acórdão nº 19326/16.5T8LSB.L3-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-04-28

Ano2022
Número Acordão19326/16.5T8LSB.L3-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 6.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


I–RELATÓRIO


F.., Autor na acção declarativa de condenação com processo comum que instaurou contra:

BANCO ESPÍRITO SANTO SA e OUTROS, todos melhor identificados nos autos, não se conformando com a decisão que julgou extinta a instância por deserção, vem do mesmo interpor recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
A.–Entende o Apelante que, na douta sentença recorrida, as normas jurídicas que constituem fundamento jurídico da presente decisão foram incorrectamente interpretadas e aplicadas, consubstanciando ainda uma nulidade do processado por omissão de um acto e/ou formalidade.
B.–Gritante é, tendo descoberto agora o Autor, a omissão de um acto por parte do Tribunal a quo.
C.–Omissão essa que alterará toda a contagem do prazo de deserção, bem como só virá evidenciar a ausência de culpa por parte do Autor na (ainda) não promoção do incidente de habilitação de herdeiros.
D.–Ora, vejamos, consta do processo um despacho datado de 04.05.2021 que dita o seguinte: “Aguarde o decurso do prazo de deserção atenta a suspensão de prazos entre 21.1.2021 e 5.4.2021.”, despacho esse que não foi notificado ao Autor, nem ao seu mandatário.
E.–Conforme dita o n.º1 do art.º 195.º do CPC: “1- Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.” (negrito e sublinhado nosso).
F.–Ora, a omissão do acto de notificação do conteúdo do despacho supra identificado, influi e bastante na decisão da causa.
G.–Pelo que, só se poderá conseguir a nulidade do processado e incorrendo a sentença em vício de nulidade, por omissão de acto que influiria na decisão da causa, que aqui se invoca nos termos e para os efeitos previstos na alínea c) do n.º1, do art.º 615.º do CPC.
H.–Entende ainda o Apelante que andou mal a apreciação pelo Tribunal a quo da aplicação aos presentes autos do disposto naquele artigo 281.º do CPC, já que é seu entendimento que não se encontra preenchido um dos requisitos para que a instância se considere deserta.
I.–Mais, conforme consta do disposto no n.º 1 do artigo 281.º do CPC, a instância considera-se deserta quando o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses e que essa falta de impulso seja devida a negligência das partes.
J.–Ora, a deserção da instância depende de dois requisitos um de natureza objectiva (demora superior a 6 meses no impulso processual) e outro de natureza subjectiva (inércia imputável a negligência das partes).
K.–O Tribunal a quo deu nota do falecimento da Ré L.. em 08-07-020, tendo decidido pela suspensão da instância nos termos do artigo 269.º, n.º 1, alínea a) e 270.º, ambos do CPC.
L.–Contudo, o mês de Julho é o mês das férias judiciais que, no ano em questão, decorreram entre 16 de Julho e 31 de Agosto de 2020.
M. Assim, a contagem dos seis meses para o respectivo impulso processual, só poderia iniciar-se em 8 de Setembro de 2020.
N.–Eis que, entre 22 de Janeiro e 5 de Abril de 2021 foi decretada a suspensão dos prazos processuais e administrativos, por força do disposto no Artigo 6.º-B e C da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, na redação conferida pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, no âmbito da pandemia Covid-19.
O.–Assim, só a 6 de Abril de 2021 é que a respectiva suspensão foi levantada ao abrigo da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de Abril.
P.–Salvo melhor opinião, o prazo de seis meses para impulso processual só terminará em Outubro do presente.
Q.–E dada a infeliz situação em que todos nós vivemos devido à pandemia Covid-19, é do conhecimento geral que os serviços públicos, nomeadamente, conservatórias, estiveram praticamente parados e sem atendimento desde 2020.
R.–Pelo que não tinha o Autor possibilidade de reunir a documentação, sequer em tempo útil, para efeitos da respectiva habilitação de herdeiros.
S.–Mas sem prejuízo do exposto, não pode ser imputada ao Autor a omissão de um acto cuja falta de diligência não foi culpa sua.
T.–Ora, não se poderá considerar verificado o pressuposto subjectivo da deserção da instância.
U.–Ora, não tendo o douto Tribunal a quo conseguido comprovar que o incidente de habilitação de herdeiros não foi deduzido por completa e total negligência (desinteresse) por parte do Autor, mesmo estando na posse de todas as informações (que efectivamente não estava!), a instância não se poderá considerar deserta, bem como por ainda não ter decorrido o prazo de 6 (seis) meses.
Nestes termos, deve o presente recurso de apelação ser julgado totalmente procedente, revogando-se in totum a decisão recorrida.

Não foram apresentadas contra alegações.

II–OS FACTOS

A matéria relevante para a decisão do recurso é a que resulta do relatório que antecede, destacando-se ainda o seguinte que consta dos autos:

1-Por despacho de 07-07-2020 foi decidido o seguinte:
Nos termos do disposto no art.º 269.º n.º1 a) e 270.º do CPC, suspende-se a instância por falecimento de Ré L..”.
2-Em 4 de Maio de 2021, foi proferido o seguinte despacho:
Aguarde o decurso do prazo de deserção atenta a suspensão de prazos entre 22.01.2021 e 5.4.2021.”
3-Este despacho não foi notificado ao Autor.

4-Em 30 de Junho de 2021, foi proferida a decisão recorrida, infra transcrita para melhor esclarecimento:
Nestes autos de acção declarativa comum que F.. instaurou contra Banco Espirito Santo, S.A., Fundo de Resolução, Novo Banco e L…, todos identificados nos autos, tendo a instância sido suspensa em 7.7.2020 nos termos do disposto pelo artigo 269º, nº 1, a) e 270º, nº 1 , do C.P.C. , por falecimento da ré L.. , decisão essa notificada em 8.7.2020 , decorreram mais de seis meses sem qualquer impulso processual por parte do Autor ( artigo 281º , nº1 , do C.P.C. ).
Ora, não tendo o Autor deduzido nesse prazo o necessário incidente de habilitação dos herdeiros da falecida Ré, ou sequer - caso se verificasse dificuldade no apuramento desses herdeiros - requerido nesse período qualquer diligência ao tribunal no sentido de apurar esses factos, essa omissão de impulso processual é claramente negligente e como tal, nos termos preconizados pelo disposto nos artigos, 277º, c), 281º, nº1, 269º, nº 1, a), 270º, 276º , nº 1 , a) do C.P.C. , a instância extinguiu-se por deserção.
Custas pelo Autor.
Registe e notifique, dando a necessária baixa de processo reiniciado para decisão.

III–O DIREITO

Tendo em conta as conclusões do recurso que delimitam o respectivo âmbito de cognição deste Tribunal a única questão que importa apreciar consiste em saber se foi legal a decisão de julgar extinta a instância por deserção.
Conforme decorre dos elementos recolhidos dos autos, falecida uma das Rés, foi declarada a suspensão da instância, competindo ao Autor diligenciar pela dedução do incidente de habilitação dos herdeiros da falecida, sem o que os autos não poderão prosseguir. A suspensão da instância ocorreu por despacho de 7 de Julho de 2020, notificado a 8 de Julho de 2020,
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