Acórdão nº 193/22.6BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-04-13

Ano2023
Número Acordão193/22.6BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO
I......., S.A., intentou ação de contencioso pré-contratual contra o Instituto Português de Oncologia do Porto – FG, EPE, com vista à impugnação do ato de adjudicação constante da deliberação do Conselho de Administração do IPO do Porto, de 22/12/2022, no âmbito do concurso público com publicidade internacional n.º 0629/20 lançado pelo IPO do Porto (entidade adjudicante) para a celebração de um contrato de aquisição de bens móveis, tendo por objeto a “Aquisição de Fluodesoxiglucose (18FDG)” e do contrato que, entretanto seja celebrado, bem como dos demais atos relativos ao procedimento de concurso público, como sejam a decisão de contratar e de autorização da despesa, de aprovação das peças de procedimento e as próprias peças do procedimento.
Indicou como contrainteressada A........ Unip.
Por sentença datada de 18/11/2022, o TAC de Lisboa – Juízo de Contratos Públicos julgou improcedente a ação e absolveu o réu e a contrainteressada dos pedidos.
Inconformada, a autora interpôs recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem:
“I. ENQUADRAMENTO DO LITÍGIO
1. Na base do litígio encontra-se a abertura do concurso público com publicidade internacional n.º 0629/20, cujo objeto é a aquisição de fluodesoxiglucose (18FDG), tendo o prazo de vigência do contrato sido fixado para dois anos.
A decisão de contratar foi proferida em 5 de março de 2020, por deliberação do Conselho de Administração da Entidade Demandada. Desde essa data, a Entidade Demandada celebrou cerca de cem (!) contratos por ajuste direto com a Contrainteressada, todos dirigidos ao fornecimento de 18FDG.
2. No total, em termos tão impressivos como inacreditáveis, o valor global dos contratos celebrados entre a Entidade Demandada e a Contrainteressada para aquisição de 18FDG, desde 2019 até ao presente, ascende a, sensivelmente, €1.895.635,68 (um milhão, oitocentos e noventa e cinco mil, seiscentos e trinta e cinco euros e sessenta e oito cêntimos), valor que excede já largamente – há muito que excedia – o preço base fixado para o concurso público n.º 0629/20, de €1.350.000,00.
3. Verifica-se assim que desde 2019 a Entidade Demandada vem fracionando ilegalmente um objeto contratual unitário, de que são parcelas o contrato a celebrar e os restantes contratos anteriores e contemporâneos com o concurso ora impugnado, com o resultado de que esse todo contratual se furtou às exigências consagradas na lei, no que diz respeito, nomeadamente, não limitadas, às regras de cálculo do valor do contrato, às regras atinentes à autorização de despesa e à escolha do procedimento a adotar, de que se dará nota mais detalhada infra.
4. Sem prejuízo de a decisão de contratar ter sido tomada a 5 de março de 2020, a autorização para assunção do compromisso plurianual apenas foi solicitada a 20 de outubro de 2020, tendo a respetiva portaria de extensão de encargos – Portaria n.º 599/2021, de 15 de novembro – sido publicada cerca de um ano e um mês depois. O que significa que entre a decisão de contratar e o pedido de autorização para a assunção do compromisso plurianual em causa mediaram mais de 7 meses, tendo entre aquela e a publicação da Portaria n.º 599/2021 decorrido mais de 21 meses. A tudo se soma, ainda o facto de a decisão de adjudicação apenas ter sido notificada aos concorrentes a 27 de dezembro de 2021. No presente, a Entidade Demandada veio esclarecer os autos de que ainda não procedeu à submissão do pedido de reescalonamento da despesa para o período de vigência do contrato. Sabe-se que, no decurso do presente processo, a Entidade Demandada alegou inexistir dotação orçamental para o efeito, pelo que, por falta de fundos disponíveis, ainda não tinha apresentado o pedido de reescalonamento da despesa. A celebração do contrato encontra-se, ainda, à data de hoje, pendente.
II. INTRODUÇÃO E OBJETO DO RECURSO
5. O presente recurso vem interposto da sentença proferida nos presentes autos a 18 de novembro de 2022, que julgou improcedentes todos os pedidos formulados pela Autora, ora Recorrente, na presente ação, sendo dirigido tanto à decisão sobre a matéria de facto, como a decisão sobre o Direito.
6. Com efeito, conforme se demonstrou, o Tribunal a quo incorreu num primeiro erro ao fixar os pressupostos de facto da decisão e, posteriormente, evidenciando não alcançar os contornos da relação material controvertida e a amplitude das consequências resultantes da conduta da Entidade Demandada previamente ao e no decurso do concurso público, incorreu em erro de julgamento de Direito ao julgar improcedentes todos os vícios invocados pela Recorrente.
7. Impõe-se, como tal, conceder provimento ao recurso e substituir a sentença recorrida por outra, totalmente favorável à Recorrente, nos termos em que de seguida se conclui.
8. Tendo sido referido que os primeiros erros incorridos pelo Tribunal o são em sede da decisão sobre a matéria de facto, sobre esta incide o primeiro capítulo das alegações recursivas. Num segundo momento, partindo de uma base factual talhada à medida dos contributos probatórios – ou falta deles – das partes e das questões efetivamente colocadas à apreciação do Tribunal, demonstrou-se em que termos a sentença recorrida se encontra viciada, devendo, portanto, ser substituída por decisão que julgue procedente a pretensão da Autora.
III. DA NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA
i) Da omissão de pronúncia sobre os contratos celebrados ao abrigo de ajustes diretos enquanto factos essenciais constitutivos da causa de pedir
9. Ao arrepio do que se lhe impunha o Tribunal a quo isentou-se expressamente do dever de apreciar, no âmbito do presente processo, os inúmeros contratos celebrados por ajuste direto pela Entidade Demandada com vista à aquisição de FDG18, como factos jurídicos constitutivos da sua causa de pedir. Fê-lo porque determinou, erradamente, que aqueles ajustes diretos não constituem objeto da ação.
10. É evidente a contradição do Tribunal a quo a este propósito, uma vez que considera os ajustes diretos como factos relevantes para a boa decisão da causa mas, simultaneamente, dispensa sumariamente a sua apreciação.
11. A contrario sensu, porque os contratos celebrados foram pelo Tribunal a quo considerados como factos relevantes – o que decorre inelutavelmente da decisão sobre a matéria de facto –, tendo sido invocados pela Recorrente também como factos relevantes para a decisão da causa, impunha-se-lhe o seu atendimento, sob pena de omissão de pronúncia.
12. Ou seja, os contratos celebrados por ajustes diretos integram a causa de pedir da ação proposta pela Recorrente, isto é, factos a serem considerados para efeitos da apreciação da ilegalidade do procedimento ora impugnado.
13. Tendo o Tribunal a quo recusado pronunciar-se sobre os referidos contratos com base num pressuposto pelo mesmo fabricado, a sentença recorrida incorre em vício de omissão de pronúncia, sendo nula, nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.
ii) Da omisão de pronúncia quanto ao invocado vício de violação de princípios da atividade administrativa
14. Da mesma forma, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a violação dos princípios do interesse público, da imparcialidade e da concorrência, sem prejuízo de a Recorrente a ter expressamente invocado de devidamente consubstanciado.
15. O Tribunal a quo encontrava-se, contudo, obrigado à apreciação daqueles vícios, como resulta de forma inequívoca do n.º 3 do artigo 95.º do CPTA.
16. Nestes termos, a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia quanto ao vício de violação dos princípios do interesse público, da imparcialidade e da concorrência, o que decorre da conjugação do disposto no artigo 95.º, n.º 3 do CPTA e no artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.
IV. DA AMPLIAÇÃO DA PROVA
17. Entende a Recorrente que o Tribunal a quo não tomou posição sobre dois elementos estruturais da pretensão da Recorrente: (i) a existência de fracionamento do objeto do contrato e parcelamento da despesa; e (ii) as diligências assumidas – ou não – pela Entidade Demandada em relação ao cumprimento das regras aplicáveis em matéria de despesa e assunção de compromissos plurianuais.
Para a apreciação das referidas questões centrais, revela-se conveniente, ainda que a Recorrente considere que a prova já carreada para os autos permite responder às referidas questões, a produção de prova testemunhal e de depoimentos de parte da Entidade Demandada. Uma vez que os documentos que integram o probatório foram votados à irrelevância pelo Tribunal a quo, que se recusou a deles extrair as ilações pertinentes, é, pois, determinante a sua aquisição por outros meios probatórios. De outra forma, os autos serão privados de factos indispensáveis à apreciação das questões suscitadas. Trata-se, é certo, de uma faculdade do Tribunal ad quem – e não de um seu dever –, mas que deve, em face do estado dos autos, ser exercida.
18. Requer-se, pois, em face do exposto, que no uso da faculdade concedida por lei, mande o Tribunal ad quem a produção de prova, por via da inquirição das testemunhas arroladas pela Recorrente na sua petição inicial e depoimentos de parte de todos os responsáveis e representantes da Entidade Demandada pela aprovação e lançamento dos procedimentos pré-contratuais lançados para aquisição de 18FDG, nas pessoas de todos os membros do Conselho Diretivo da Entidade Demandada.
Requerendo-se, neste âmbito:
1. Que seja dado como não provado, o facto de ter sido enviado à tutela o pedido de reescalonamento para o período previsto de execução do contrato de 2022 a 2024;
2. Que seja dado como provado que a Entidade Demandada procedeu ao parcelamento de um objeto contratual unitário, por via da celebração de com a...

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