Acórdão nº 1907/08.2 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 2024-01-24

Ano2024
Número Acordão1907/08.2 BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I. RELATÓRIO

V…., Lda (doravante Recorrente ou Impugnante) veio recorrer da sentença proferida a 31.05.2012, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada improcedente a impugnação por si apresentada, que teve por objeto a liquidação aduaneira no valor de 22.173,93 Eur., emitida em 25.o9.2008.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo.

Nas suas alegações, a Recorrente concluiu nos seguintes termos:

“1. A douta sentença considerou errada a classificação pautal de três lotes distintos de proteína de leite concentrada, declarada com a designação outras substâncias proteicas, código 350400 00 90, onerada com a taxa de 3,4% de direitos aduaneiros, o que deu azo a que a classificação da mercadoria se fizesse pelo código pautal 040490 2100, à taxa de € 100,40, por 100Kgs,;

2. O que determina a classificação é o facto de a mercadoria ser um concentrado de proteína de leite contendo, em peso, calculado sobre a matéria seca, mais de 85%.

3. Da documentação presente à Alfândega, quando da chegada da mercadoria, processada na Austrália, pelo fabricante e pelo Ministério da Agricultura australiano, faziam parte o certificado sanitário e outra documentação segundo a qual a mercadoria era constituída por três lotes diferentes com o teor de proteína de 86,52%, no lote 6114. e 85.70% nos lotes 6177 e 6180.

4. Esta composição proteica foi posta em causa pelo conferente, que, sem a participação do despachante interveniente mandou recolher um saco de mercadoria e mandou analisá-lo como se se tratasse de alimentos para animais, pelo método Kjedahl, identificado como sendo método de rotina, tendo apurado um teor proteico de apenas 83,2%.

5. Esta análise incidiu sobre amostra, constituída por um só saco, colhida sem a presença de representante da ITE, sem entrega de duplicado da amostra aos despachante oficial ou de conservação no próprio Laboratório. (Reg (CE) n° 213/2001 da Comissão de 9 de Janeiro de 2001, artigo 7o e Anexo VIII; Dec Lei n° 39279 de 17/JUL/1953)

6. A Alfândega reconheceu a inadequação do método analítico seguido nesta primeira análise.

7. Efetuada segunda colheita da mercadoria, voltou a não ser entregue ao despachante ou à Rte qualquer duplicado da amostra, o que cerceou o direito de recurso.

8. Esta amostra voltou a ser realizada pelo método Kjedahl, agora identificado como método de referência tendo o teor de proteína subido para 84,26%.

9. A douta sentença deixa sem censura a ausência de um verdadeiro relatório na primeira e na segunda análises.«O relatório laboratorial de análise deve incluir elementos suficientes para permitir a avaliação dos resultados em conformidade com os anexos IV e VIII» do Reg (CE) n° 213/2001 (art. 5o, 3).

10. A Rte recorreu desta segunda análise propondo que a análise de recurso se fizesse no Laboratório da Agroleico. Porém, logo se verificou que não havia duplicado de amostra para analisar, o que liminarmente invalida a segunda análise de que foi interposto recurso.

11. Com intervenção da analista da Agroleico e na presença da analista representante da Alfândega, foi colhida uma amostra, com várias tomas diferenciadas.

12. Ao tomar conhecimento do relatório da análise, a Rte constatou que apenas havia sido analisado 1 dos 3 lotes da mercadoria, que têm com composição distinta. Consequentemente a análise só é válida para 1 lote e inexistente para 2 lotes.

13. Na colheita das amostras e na análise não esteve presente nenhum analista em representação da Rte, pelo que a douta sentença não faz boa pronúncia quando incompreensivelmente censura a Rte por esta omissão.

14. O Laboratório da Agroleico procedeu «análise efectuada com o analisador LECO — FP528» tendo apurado que o teor de proteína bruta em base seca era de 86,7% ou seja acima do legalmente exigido para a classificação da mercadoria pelo capítulo 35° da Pauta, como pretende a RTE;
15. Perante este resultado, que confirmava o teor proteico apurado na Austrália, segundo o relatório da A……, «por exigência do laboratório da Alfândega de Lisboa pelo método FIL 20 B 1993 que se baseia no método Kjedahl» tendo agora sido apurado um teor proteico de 84,9%, próximo do limiar de 85%, bem superior aos apurados nas duas anteriores análises em que o mesmo método apresentava valores teores de proteína de 83,2% e 84,26%.

16. A douta sentença secunda o entendimento da Alfândega, sem explicitar as razões, o que muito se estranha porquanto os resultados analíticos devem ser aferidos com base em critérios científicos, objetivos, não sendo tolerável que sejam adotados os resultados que convêm ou que são decretados pela Alfândega ou que são aceites na condição de serem convenientes.

17. A douta sentença erra a pronúncia quando menospreza os efeitos da exposição do contentor no cais, ao ar livre e à invernia, durante 5 meses, e menospreza o depoimento do Prof Boudier. Este reputado académico, autoridade respeitada em França e nas instâncias comunitárias ligadas ao setor do leite e da produção alimentar, depôs no sentido de o resultado da análise pode ter sido afetado já que um dos elementos analisados foi o teor de humidade. A douta sentença, aliás, não faz a menor referência sobre o depoimento desta credenciada testemunha, o mesmo sucedendo sobre depoimento do Eng L...18. Segundo o relatório da A…, esta laboratório adoptou «o método tradicionalmente executado em rotina, método validado e acreditado. que se baseia na utilização do analisador elementar de azoto “LECO” — FP-528»

19. E o relatório da A... diz ainda: «2- O produto foi submetido a análise segundo o método interno desenvolvido para o analisador de Azoto Total LECO — FP-528, que conforme foi dito é método acreditado pelo IPAC».

20. Este método é mais rigoroso que o método Kjedahl porque «A quase total automatização no método, reduzindo a intervenção do analista à pesagem da toma para ensaio e rigoroso controlo da calibração e condições operatórias tornam o método preciso como on tratamento do número de réplicas efectuadas permite evidenciar».

21.- Como o boletim de análise deixa transparecer a análise segundo os dois métodos apresenta disparidade acentuada nos resultados obtidos.22. Segundo o método de combustão lenta o resultado é substancial superior.

23. A justificação para o sucedido e tendo sido tomadas para os dois protocolos analíticos todos os procedimentos de controlo de qualidade parece residir nalguma inadequação do método Kieldahl utilizado dada a natureza altamente proteica do produto em análise», (transcrito do relatório com sublinhado da Rte)

24. A douta sentença não atentou que as autoridades aduaneiras fixaram um objetivo e ajustaram a análise à sua obtenção. Os resultados analíticos não se encomendam, verificam-se com independência pelos processos técnicos mais fiáveis e nos termos da lei.

25. O «Reg (CE) n° 213/2001 da Comissão de 9 de Janeiro de 2001, ... estabelece as normas de execução do Regulamento (CE) n° 1255/1999, no que respeita aos métodos a utilizar para a análise e avaliação da qualidade do leite e dos produtos lácteos», não estabelece a obrigação da adoção do método Kjedahl, ou outro método nominalmente identificado. Pelo contrário prevê dois tipos métodos: métodos de rotina e métodos de referência.

26. Os métodos de referência constam do Anexo I ao Reg (CE) n° 213/2001 e para ser validados têm de estar conforme «a critérios de precisão pré-estabelecidos, relativos aos limites de repetibilidade e de reprodutibilidade» ( cfr art 4o, 1 do Reg (CE) n° 213/2001).

27. Tanto o método Kjedahl como o método LECO- FP- 528 são métodos validados e considerados de referência, por terem sido validados e acreditados junto da LHE, pelas entidades identificadas no «Anexo I (artigo 2o) LISTA DOS MÉTODOS DE REFERÊNCIA, índice» são mencionados os métodos de referência por remissão para a acreditação pelas entidades internacionais cujos métodos analíticos são reconhecidos pela União Europeia, entre elas a IUPAC (LECO FP-528) e a ISO.
28. Do ponto de vista estritamente técnico-analítico, face às oscilações do método Kjedahl, que apresentou valores de 82,3%. 84,26% e 84,9% , o método LECO - FP-528 deve prevalecer por ser mais fiável e menos susceptível de erro humano por ser feito num aparelho próprio para o efeito, por quase não exigir intervenção do analista e porque o alto teor proteico da mercadoria desaconselha o uso do método Kjedahl. como expressamente refere o relatório do Laboratório da análise da A....

29. Se todas as análises tivessem sido efetuadas de acordo com a lei, em caso de contradição de resultados obtidos por métodos distintos, ambos acreditados, deve tirar-se a média de acordo com a fórmula expressa no Anexo VIII do Reg

31. Pela aplicação da fórmula, no único lote analisado validamente, o teor proteico situa-se em 85.75%.

32. A douta sentença é omissa quanto à falta de idoneidade técnica do Laboratório da Alfândega. A mera inclusão do Laboratório na rede comunitária de laboratórios das Alfândegas não dispensa a prova dos requisitos de repetibilidade ou de reprodutibilidade.

33. O Reg (CE) n° 213/2001, art 5.º dispõe que «as análises são efectuadas em laboratórios que aplicam um método interno de qualidade conforme descrito na alínea a) do anexo V, ou um método comparável». «.Deve encontrar-se disponível no laboratório uma descrição pormenorizada do método aplicável».

34. Incumbia à FP ou à DGÀIEC o ónus da prova de satisfação dos requisitos técnicos exigíveis à luz do artigo 5.º do Reg (CE) n° 213/2001 da Comissão, A conduta errática daquele laboratório é a prova acabada do não preenchimento de requisitos mínimos de fiabilidade. A douta sentença nada diz sobre esta matéria.

35. Não tendo sido realizadas análise válidas, com excepção da que foi feita na A... para 1 lote, não existem quaisquer fundamentos para não revogar a liquidação que deveria ser efetuada em conformidade com a...

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