Acórdão nº 190/19.9YHLSB.L2-PICRS de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-10-12

Ano2022
Número Acordão190/19.9YHLSB.L2-PICRS
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam em conferência, na 10ª Secção (Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão) do Tribunal da Relação de Lisboa


I–Relatório:


Livedrive, Lda. (autora ou A., adiante também designada ‘Livedrive’) instaurou em 3.06.2019 contra Extreme Solutions, Lda. e Casr.Co, Civil Aviation Software, Lda. (ré ou R., adiante também designada ‘Casr.Co’) a presente acção declarativa de condenação, pedindo, quanto a esta ré (a autora e a ré Extreme Solutions, Lda. juntaram em 24.07.2019 transação, homologada por sentença de 7/10/2019) a respectiva condenação:
a.-na resolução do contrato de licenciamento que se venha a considerar ter existido entre a ITDS e a própria CASR para utilização do XEO.
b.-a abster-se de utilizar o programa de computador XEO em qualquer uma das versões.
c.-a manifestar no processo, num prazo a fixar pelo prudente critério do tribunal, ter informado os seus clientes: SAVIT e ou GACA, Regulador Nacional da Aviação Civil da Arábia Saudita; Agência de Aviação Civil, Regulador Nacional da Aviação Civil de Cabo Verde; IACM – Instituto de Aviação Civil de Moçambique, Regulador Nacional da Aviação Civil de Moçambique que deverão deixar de usar o XEO.
d.-a pagar uma indemnização diária a fixar pelo prudente critério do tribunal enquanto não cumprir a obrigação reportada na alínea anterior;
e.- a pagar um valor igual ao prejuízo incorrido pela autora, que deverá ser igual ao valor que esta deixou de cobrar caso tivesse licenciado a utilização do programa de computador XEO às seguintes entidades:
1.–Extreme Solutions Lda;
2.–GACA, Regulador Nacional da Aviação Civil da Arábia Saudita.
3.–Agência de Aviação Civil, Regulador Nacional da Aviação Civil de Cabo Verde e;
4.–IACM – Instituto de Aviação Civil de Moçambique, Regulador Nacional da Aviação Civil de Moçambique.
f.-no montante de 70% do valor que lhes cobrou pelo licenciamento do programa CASR, e que caso não se venha a determinar, deverá ser igual ao valor que seria o preço do licenciamento do XEO a para cada uma delas, no montante de 400.000 euros, conforme quadro identificado no n.º 242 desta peça;
g.-a pagar um valor igual ao montante que cobrou a estas entidades pela permissão, instalação e utilização do programa de computador XEO, o qual deverá ser pelo menos igual a 50% do valor cobrado pela venda do licenciamento do programa de computador CASR a liquidar em execução de sentença;
h.-a pagar uma indemnização diária igual ao valor que por critérios de equidade se venha a considerar correto pela utilização do XEO desde a data da citação entendendo-se como correto a importância de 6.000 euros mês, isto é, 200 euros / dia, por cada cliente onde se verificar estar a permitir que seja usado o XEO.
3.–Quando se venha a entender que a Autora não terá direito às indemnizações referidas, que as RR sejam então condenadas a pagar um valor a liquidar por recurso a critérios de equidade.

Alegou, em síntese, que é titular do programa de computador XEO - por o ter adquirido à empresa que o criou, a ITDS INTERNET, TECNOLOGIAS E DESENVOLVIMENTO DE SOFTWARE, S.A. (ITDS) - , programa que serve de base à construção de outros programas de computador, tendo sido a base do programa de computador CASR que se destina a reguladores de aviação civil. Que o programa CASR foi vendido à ré com o licenciamento do programa XEO, sendo que a ré instalou o programa XEO em clientes que angariou, tendo cobrado o licenciamento XEO, mas sem o pagar à autora, titular dos direitos de propriedade intelectual sobre o referido programa.

A ré contestou, pedindo:
a)-Deverá a exceção perentória invocada relativamente à desistência do pedido ser considerada integralmente procedente, por provada e, em consequência, ser a CASR.CO absolvida do pedido;

Caso assim não se entenda,
b)-Deverá a exceção perentória invocada relativamente à invalidade e ilegalidade do contrato ser considerada integralmente procedente, por provada e, em consequência, ser a CASR.CO absolvida do pedido;
Caso assim não se entenda,
c)-Deverá a exceção perentória invocada relativamente ao abuso de direito da autora ser considerada integralmente procedente, por provada e, em consequência, ser a CASR.CO absolvida.

Caso assim não se entenda
d)-Deverá a exceção dilatória de ilegitimidade da autora ser julgada procedente, sendo em consequência, a CASR.CO absolvida da instância para todos os devidos e legais efeitos;

Caso assim não se entenda,
e)-Deverá a presente ação ser julgada totalmente improcedente, por não provada, negando-se as os efeitos jurídicos pretendidos pela autora, com a consequente absolvição da CASR.CO de todos os pedidos;
em qualquer caso,
f)-Deverá a Autora ser condenada em litigância de má-fé e ao pagamento de multa ao tribunal a fixar por este e de justa indemnização à CASR.CO em valor não inferior a € 50.000,00.
A ré alegou, em síntese, que a autora é parte ilegítima, porquanto o XEO pertence à empresa ITDS, sendo inválido o contrato que a autora alega ter celebrado com aquela para aquisição do XEO, na medida em que foi uma aquisição realizada em incumprimento do PER a que a ITDS estava sujeita, foi um ato simulado e foi um negócio consigo mesmo. Impugnou ainda os factos alegados pela autora relativamente ao facto do XEO ser um programa de computador e relativamente à alegada utilização indevida, impugnando que tenha vendido o programa XEO aos seus clientes.
A ré pediu a condenação da autora como litigante de má fé, alegando que esta deduziu pretensão para a qual não tinha fundamento.
Por decisão de 4/2/2020, este tribunal proferiu saneador sentença, no âmbito do qual julgou a autora parte ilegítima, quanto ao 1º pedido enunciado no ponto 2 al a) da petição inicial, de resolução do contrato de licenciamento, por preterição de litisconsórcio necessário, absolvendo a Ré Casr.Co da instância.
O tribunal julgou ainda procedente a exceção perentória de extinção dos direitos pretendidos fazer valer pela autora nos presentes autos na senda da desistência dos mesmos pedidos deduzidos em sede cautelar, absolvendo a Ré CASR.Co do pedido.
Na sequência de recurso interposto pela autora, o Tribunal da Relação de Lisboa revogou a decisão da primeira instância, após o que foi requerida a intervenção provocada de ITDS.
Foi designada data para realização de audiência prévia, fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova. Em sede de despacho saneador, foi relegado o conhecimento das exceções invocadas, e ainda não decididas, para final.

Após audiência de discussão e julgamento foi proferida decisão que, julgando improcedente e não provada a acção, absolveu a ré dos pedidos.

Inconformada, apelou a A., formulando as seguintes conclusões:
1.–Encontra-se provado nos autos que a autora é a titular dos direitos de autor de um programa de computador ou software, designado de XEO – Extensible Enterprise Objects,

2.–e que vendeu à ré duas licenças,

3.–nos exatos termos que consta da fatura que se encontra junta aos autos, isto é, para que a ré pudesse usar as versões designadas de XEODEV e XEOSUIT, e apenas numa máquina física ou virtual.

4.–Para além do que consta da fatura, não se encontra angariado nos autos quaisquer outros específicos termos sobre a forma pela qual ré poderia utilizar o programa de software da autora.

5.–A autora vende o programa de computador XEO através de licenciamentos.

6.–No que se refere à matéria de fato provada deve:
i.-Proceder-se à eliminação de um fato;
ii.-e serem acrescentados outros fatos, a saber:

7.–Nos termos da matéria de fato provada e não provada, deve considerar-se não provado o fato provado e identificado em ff) da douta sentença, quando se refere que A licença para uma máquina virtual é uma licença que não é instalada num equipamento físico, mas num repositório central que pode ser um servidor ou numa cloud, para poder ser acedida em simultâneo por vários utilizadores, e para a qual não está estabelecida qualquer limitação de utilizadores.” dado que, em momento algum ficou demonstrado que a instalação numa máquina virtual é idêntico à instalação numa Cloud, e em especial, que poderia ser acedida em simultâneo por vários utilizadores, e para a qual não está estabelecida qualquer limitação de utilizadores”,

8.–e isto porque, desde logo, o simples fato de se ter feito expressa referência ao número de máquinas em que o programa de computador da autora e objeto de licenciamento, poderia ser utilizado, demonstra, por um lado, preocupação e restrição quanto ao número / tipo de utilizadores que poderiam usar o programa, pelo que, seria no mínimo sempre necessário que tivesse sido produzida prova, e que fosse expressiva, no sentido em que se deu o fato como assente, o que não ocorreu,

9.–e por outro lado, da prova testemunhal, pode afirmar-se que uma máquina virtual é apenas um computador neste caso designado de servidor, isto é um computador com características distintas dos computadores que utilizamos diariamente, mas sempre um computador físico e não uma Cloud.

10.–e ainda porque nada no processo permite concluir como se concluiu, dado inexistir prova testemunhal ou documental com aquele sentido.

11.–Por outro lado, devem considerar-se provados os fatos identificados sob os números:
i.-169, 170, 171º e 172º da petição inicial;
ii.-e ainda, em conjugação, os fatos referidos nos artigos 228º, 229º e 230 da mesma peça processual, nos exatos termos expostos na motivação deste recurso, e que se repetem:

“169.
A licença XEODEV adquirida pela Ré permite-lhe adaptar o software CASR, quando os clientes pretendem usar o Software CASR, mas não permite que se opere qualquer modificação do XEO,

170.
Muito menos permite que os clientes utilizem o XEO,”

171.
Por outro lado, quando os clientes adquirentes do Software CASR pretendem adaptá-lo as suas especificas necessidades, isto é, customizá-lo, têm de usar o XEODEV

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