Acórdão nº 19/20.5PJAMD.L1-3 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-02-08

Ano2023
Número Acordão19/20.5PJAMD.L1-3
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Lisboa:

I - RELATÓRIO:

1.- No processo supra referenciado do Juízo Central Criminal de Sintra, J5, do Tribunal da Comarca de Sintra, foi o arguido DRS, com o sinais dos autos, condenado na pena de cinco (5) anos de prisão, pela prática, em autoria material e concurso real, de um crime tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º , nº 1 do D.L. 15/93 , de 22.01 , com referência à tabela anexa I-B do mesmo diploma, na pena de 5 (cinco) anos de prisão;
2. Inconformado, veio interpor o presente recurso, que rematou com a formulação das seguintes conclusões (transcrição):
I – Vem o presente recurso, que é de facto visando impugnar dois pontos da matéria assente e bem assim, de direito, visando sindicar a não aplicação do regime especial para jovens; a medida da pena e a sua não suspensão, atenta a idade do arguido, a sua confissão praticamente integral dos factos; o seu arrependimento e plena recuperação enquanto pessoa que está determinada a não cometer mais crimes.
II – Foram dados por assentes os pontos 11 e parte do ponto 14 da matéria assente, o que, salvo o devido respeito, não espelham o que a audiência de julgamento demonstrou e da prova produzida.
III – O arguido, foi detido ainda com 19 anos e hoje tem 21, estando em reclusão há perto de dois anos, e, amadureceu neste tempo de cadeia, tendo assumido uma postura diferente na vida e perante a vida, interiorizando plenamente que ia por mau caminho, voltou a estudar e assumir responsabilidades.
IV – Ingressou nas actividades da cadeia, nomeadamente culturais, como ópera, estudando, sendo figura de referência na cadeia, pela sua disponibilidade e ressocialização, onde foi assim apresentado à Ministra da Justiça, em visita feita por esta, assumindo optar pela via da verdade e por isso, em audiência, onde quis estar presencialmente, quis falar e confessou tudo o que fez. Mas mesmo tudo, não deixando nada por dizer, tendo a prova dada por assente resultado da confissão integral e sem reservas do arguido.
V - Por isso mesmo, não consegue perceber como pode o Tribunal, em duas questões não aceitar que tudo o que o arguido disse foi com verdade absoluta. Porque é essa mesmo a verdade. E, como se assume pela verdade, questiona a decisão do Tribunal nestes dois pontos.
VI – Existiu assim erro na apreciação da prova. No que tange aos dois referidos pontos de facto.
VII – Não existe prova de que a quantia em dinheiro que estava no colchão do quarto em casa do arguido fosse produto da venda de droga. O que era produto da venda de droga o arguido tinha consigo e confessou-o integralmente. O valor que estava na cama onde dormia o seu primo, era deste fruto de pagamento recebido enquanto jogador de futebol.
VIII – Este primo declarou como testemunha isso mesmo. Se o dinheiro fosse do arguido, teria assumido essa posse sem qualquer problema, porque tudo o que fez assumiu. Mas por amor à verdade não podia confessar algo que não é verdadeiro. E também não poderia, nem quer prejudicar o primo.
IX – Aliás o arguido, jovem de 19 anos à data dos factos, consumia e vendia, e nunca tinha grandes quantidades de droga nem de dinheiro.
X - Tudo isto foi referido pelo arguido, de forma clara e em manifestação confessória de sincero arrependimento, sendo claro e verdadeiro, tendo dito, que, além do dinheiro que estava no colchão não era seu, mas do primo, tendo confessado que todo o outro era seu e proveniente da venda da cocaína, igualmente a droga que estava no quarto que alugou a testemunha PR, não era toda de sua pertença. Se fosse, não teria qualquer problema em o assumir. Mas não era. Se fosse tê-lo-ia dito, até porque não seria isso que iria implicar uma pena mais grave, certamente.
XI - Como igualmente o declarou a testemunha policial JP, que efectuou a busca a casa, o dono da casa e também testemunha PR, tinha a chave do quarto onde o arguido guardava a droga depois de arrombar a porta o PR lhe disse que não precisava de a ter arrombado porque tinha a chave. Ouçam-se as declarações desta testemunha.
XII - O arguido vendia cocaína (éster metílico - Crack), que era o estupefaciente que estava no quarto, em cima da cómoda e tinha consigo na rua e a cocaína que estava na prateleira, era cocaína (cloridrato - pó).
XIII - O arguido nenhuma vantagem tinha em assumir ou não a totalidade da droga encontrada, posto que o crime de trafico foi integralmente confessado e a confissão foi livre e claramente verdadeira, restando a dúvida sobre se propriedade da cocaína que estava na prateleira, não devia tal quantidade de droga ser imputada ao arguido, que não assumiu como sua.
XIV – Na duvida, esta milita a favor do arguido, como nisso aliás concluiu, e bem, a Exma. Procuradora, nas suas alegações quando referiu, não se poder afirmar, sem duvidas, que a droga que estava na prateleira do quarto, fosse do arguido, atento que este referiu não ser sua e era de diferente tipo da que o arguido tinha consigo e da que estava em cima da cómoda e que o arguido disse ser sua e só vendia desta, atento desde logo, ao principio in dubio pro reo.
XV – Mais avisado andaria o Tribunal a quo se concluísse que o arguido foi integralmente verdadeiro, em tudo o que disse.
XVI – Basta ouvir toda a gravação do depoimento do arguido; do agente policial que efectuou a busca a casa da testemunha PR; verificar a diferente qualidade da droga apreendida nesta casa e bem assim ouvir o depoimento da testemunha C, primo do arguido.
XVII – Assim se chegará, nestes pontos, a conclusão diversa, afirmando-se claramente que o Arguido falou verdade em tudo o que disse e, que demonstrou arrependimento sincero, admitindo como errado o seu comportamento, o que resulta também desde logo pela sua atitude perante a vida em reclusão e os passos sérios que tem dado com vista a sua pela ressocialização.
XVIII – O princípio da livre apreciação da prova (art.º 127.º do CPP) encontra limite na prova concreta que somente pode ser apreciada segundo as regras da experiência e valorada numa direcção e não em direcções díspares e muito menos contrárias ao que se disse em audiência, e o Acórdão ora posto em crise, a nosso ver, violou o artigo 127.º do CPP e bem assim, violou, nesta parte o principio “in dubio pró reo”, que tem consagração constitucional, o que traduz violação de preceitos constitucionais.
XIX - Tendo o presente recurso como objecto a reapreciação da matéria de facto, nos termos do artigo 412.º, n.º 3 do CPP, o recorrente deve especificar:
a) os pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) as provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) as provas que devem ser renovadas;
XX - Nos termos do n.º 4 da mesma disposição, quando as provas forem gravadas, as especificações dos pontos “b” e “c” do n.º 3 desta mesma disposição, fazem-se por referência ao consignado na acta e devem ser indicadas as passagens em que se funda a funda a impugnação.
XXI - As provas que implicam diversa decisão da matéria de facto, nos dois pontos impugnados, são todas as que se encontram gravadas que devem ser integralmente renovadas, para se poder verificar a confissão do arguido foi sincera e integral e que falou verdade no que disse, devendo o seu depoimento ser valorado, até para lhe ser aplicado o regime especial para jovens de idade inferior a 21 anos, o que somente se pode ver com integral renovação da prova, o que requer.
XXII - Foram erradamente dados como provados os seguintes pontos dos factos assentes: “...
11. Nesta mesma data, no interior da residência do arguido, sita na Rua (…) Amadora, o mesmo detinha debaixo do colchão da cama do seu quarto, envolto numa meia, a quantia monetária de €5.950,00, fracionada numa nota de 100 euros, 44 notas de 50 euros, 182 notas de 20 euros e 1 nota de 10 euros.
...
14. ... Na mesma data, no interior do quarto de que o arguido fazia uso sito na Rua (…) Amadora e relativamente ao qual era a única pessoa que acedia ao seu interior, o arguido detinha:
a. Em cima da prateleira: Uma embalagem em plástico contendo no seu interior cocaína (cloridrato) com o peso líquido de 49,630gramas, com o grau de pureza de 72,6%, equivalente a 180 doses; assim como a quantia de €8.50, fraccionado em moedas;
...”
XXIII - No ponto 11 não se pode dar como provado que era o arguido que detinha a quantia ali indicada, porque referiu que tal quantia era de seu primo, o quer este confirmou claramente afirmando ser sua e no ponto 14, a alínea “a” não se pode dar por provada, nem a parte do ponto 14 onde se refere que era o arguido a única pessoa que acedida ao interior do quarto.
XXIV- Devendo, em consequência ser retirados tais factos da matéria assente.
XXV - As provas que impõem decisão diversa estão gravadas e são, essencialmente, o depoimento do arguido; da testemunha policial JP e da testemunha CD:
XXVI – Tais depoimentos estão consignados na acta da audiência, com referência n.º 134552896 e especificam-se todos de seguida:
“Pelo arguido foi dito que desejava prestar declarações, tendo as mesmas sido gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 14h50m32s horas e o seu termo pelas 15h14m07s horas.
O recorrente, indica que todo o seu depoimento é relevante para ser aferida da bondade da impugnação, e que junta transcrição, mas indica aqui umas breves passagens que são esclarecedoras:
...
Juiz- qual era a modalidade que o Sr. não praticava?
DRS- não ia a casa dos consumidores, eu metia-me no ponto de referência, sabiam onde era o local, muitas vezes tinha a quantidade necessária ou muitas vezes deslocava-me à residência para ir buscar a quantidade necessária
....
Juiz- o Sr. o que é que vendia?
DRS- cocaína
Juiz- ok, o Sr. a ter entregado alguma coisa entregou sempre cocaína, é isso?
DRS- sim
----
DRS- não, na casa d
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT