Acórdão nº 18281/21.0T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 25-10-2022

Data de Julgamento25 Outubro 2022
Ano2022
Número Acordão18281/21.0T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 18381/21.0T8PRT.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório
1. AA, residente na Avenida ..., ..., ... Matosinhos, e BB, residente na Avenida ..., ... ..., intentaram contra CC, residente na Rua ..., ... Porto, execução para entrega de coisa certa, baseada em sentença judicial que condenou a ora executada, para além do mais, a despejar o imóvel locado, sito na referida Rua ..., ..., Porto.
2. Em 14.12.2021 o tribunal proferiu o seguinte despacho:
«Requerimento da executada, ao qual responderam os exequentes em 16/11/2021.
Tendo a executada suscitado incidente de suspensão/diferimento da desocupação, foi já sustada pelo Sr. AE execução para entrega do locado, nos termos do disposto no art.º 863.º, n.ºs 3 e 4, do CPC.
Todavia, a presente execução para entrega de coisa certa/locado deve ser suspensa em virtude da pandemia da doença Covid-19 e ao abrigo da Lei n.º 1-A/2020, de 19/03.
Com efeito, estando em causa a habitação/casa de morada de família da executada, impõe-se a suspensão da entrega judicial de tal habitação/locado/casa de morada de família, situação que ainda se mantém, sem prejuízo da sua entrega voluntária pelo executado, e face ao disposto no art.º 6.º-E, n.º 7, als. b) e c), da Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, na versão da Lei n.º 13-B/2021, de 05/04, que se aplica neste caso.
Por outro lado, conforme consta da sentença dada à execução, as rendas mensais do locado continuam a ser devidas pela executada, podendo ser exigidas pelos exequentes.
Por sua vez, tendo a presente execução para entrega de coisa certa/locado de ficar suspensa em virtude da pandemia da doença Covid-19 e ao abrigo da referida Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, cremos que tal situação leva à extinção do objeto e da causa de pedir do incidente de suspensão/diferimento da desocupação do imóvel/locado, deixando este de se justificar e de ser necessário, pelo que se tornou também inútil/impossível a continuação de tal incidente de diferimento da desocupação do imóvel (art.º 277.º, al. e), do CPC).
Pelo exposto, por ora, quanto à entrega do locado, os autos não podem prosseguir, mantendo-se a suspensão dos atos de execução a realizar para concretização da entrega da casa de morada de família/locado, nos termos e para os efeitos previstos no citado art.º 6.º-E, n.º 7, als. b) e c), da Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, na versão da referida Lei n.º 13-B/2021, de 05/04.
Atenta a decisão que antecede, julgo extinto e improcedente o incidente de suspensão/diferimento da desocupação do imóvel/locado.
Notifique.
Comunique ao Sr. AE, devendo ter-se ainda em conta futuramente o disposto no art.º 861.º, n.º 6, do CPC, tomando o Sr. AE todas as cautelas aí prescritas e devendo respeitar todo o regime previsto no art.º 6.º-E, n.º 7, als. b) e c), da Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, na versão da Lei n.º 13-B/2021, de 05/04, em conformidade com o apurado neste caso concreto.
Perante as dificuldades alegadas pela executada, incluindo de realojamento, adverte-se desde já a mesma para de imediato diligenciar e ter uma atuação proactiva junto das competentes entidades municipais e sociais para, com o seu apoio, melhor resolver o seu invocado problema de habitação/realojamento.
Notifique.
DN.»
3. Por requerimento de 17.02.2022, os exequentes requereram o levantamento da suspensão do processo executivo e o prosseguimento dos ulteriores termos processuais, alegando o seguinte:
- De acordo com a informação prestada pela “D...”, em 24.11.2021 foi oferecida ao agregado familiar da executada uma habitação T4, adequada à sua composição, requalificada e com obras de beneficiação, situada na freguesia ..., o que aquele agregado recusou, por se situar muito distante da área da sua actual residência, mais solicitando se aguarde por nova oportunidade de alojamento na freguesia ...;
- De acordo com a mesma informação, não há previsão de disponibilidade de habitação da tipologia 4;
- Esta factualidade altera totalmente a situação que levou ao decretamento da suspensão da instância, na sequência de requerimento apresentado pela executada em 12.11.2021, fundamentado, entre outras coisas, na seguinte alegação: «Acontece que a atribuição de habitações sociais na região do Grande Porto é, infelizmente, nos tempos que correm, muito concorrida, e tem, por via disso, longas filas de espera, podendo demorar largos meses ou vários anos, até, para que seja possível a atribuição de uma habitação social para a executada e para o seu agregado familiar»;
- A manutenção da suspensão da instância executiva configura, face a esta factualidade, um abuso de direito, nos termos do artigo 334.º do CC.
4. A executada pugnou pela manutenção da suspensão alegando, em síntese, o seguinte:
- A executada é viúva, tem 82 anos de idade e padece de diversas doenças graves, tendo recentemente sofrido um acidente vascular cerebral sequelar;
- Três dos filhos da executada que consigo habitam, todos com mais de 50 anos de idade, padecem, também eles, de doenças gravíssimas, que lhes conferem a todos incapacidades superiores a 60%, facto que piora ainda mais o estado de saúde da executada devido às preocupações acrescidas;
- Todo este agregado familiar da executada vive há mais de 50 anos na habitação em causa;
- Todos os seus membros se encontram inscritos na Unidade de Saúde Familiar ... e ali têm atribuído o seu Médico de Família, que consultam há mais de 30 anos e que, por isso, é perfeitamente conhecedor dos diferentes problemas de saúde de todos os elementos que compõe este agregado familiar e no qual que estes depositam toda a confiança;
- Um dos filhos da executada, DD, padece, entre outras doenças, de esquizofrenia e carece de acompanhamento próximo e periódico do Hospital ... (Dra. EE), sito na União de Freguesias ..., ... e ..., no Porto, na região ocidental da cidade do Porto e contíguo à freguesia ...;
- A filha da executada, FF, padece de doenças graves do foro psiquiátrico e também carece de acompanhamento próximo e periódico do mesmo Hospital ... (Dra. GG);
- Foram estes os principais motivos que levaram a executada a recusar a proposta da D... para uma habitação na freguesia ..., na zona oriental da cidade do Porto, que obrigaria o agregado familiar a perder todos os elos de ligação a estas unidades e respetivos profissionais de saúde;
- Na zona ocidental da cidade do Porto existem 21 bairros sociais, o que permite à executada acalentar fundadas esperanças de que possa vir a ser atribuída ao seu agregado familiar, em pouco tempo, uma casa nesta região ocidental da cidade do Porto;
- Não ocorre, portanto, qualquer abuso de direito por parte da executada.
5. Em 22.04.2022 foi proferido o seguinte despacho:
«Requerimento dos exequentes de 17.02.2022.
Foi aqui já decretada pelo despacho de 14.12.2021 a suspensão da entrega judicial da habitação/casa de morada de família, situação que ainda se mantém, sem prejuízo da sua entrega voluntária pela executada, e face ao disposto no art.º 6.º-E, n.º 7, al. b) e c), da Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, na versão da Lei n.º 13-B/2021, de 05/04, que se aplica neste caso, pelo que, por ora, os autos não podem prosseguir como solicitado pelos exequentes, mantendo-se a suspensão da entrega.
Por outro lado, conforme consta da sentença de despejo dada à execução, as rendas mensais do locado continuam a ser devidas pela executada, podendo ser exigidas pelos exequentes.
Por sua vez, cremos que a informação prestada pela D... não vem alterar a situação, pois ainda não foi concretizada a atribuição de uma habitação social à executada, questão que depende da atuação voluntária dos interessados, não podendo ser aqui imposta, estando aqui em causa a entrega coerciva do locado, estando a posição da arrendatária tutelada na referida Lei n.º
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