Acórdão nº 1825/16.0T8STR-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-03-02

Ano2023
Número Acordão1825/16.0T8STR-B.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora

I – RELATÓRIO
Por apenso à ação declarativa, sob a forma de processo comum, em que é Autora OBRA DO TRIUNFO DO IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA e Rés AA e CIRCLEXCLUSIVE, LDA, veio LAÇOS D´HONRA, UNIPESSOAL, LDA, ao abrigo do artigo 356.º do CPC, deduzir o incidente de habilitação de adquirente alegando que, por escritura outorgada no dia 13-05-2020, adquiriu por contrato de compra e venda a CIRCLEXCLUSIVE, LDA, o imóvel identificado na ação principal, que corresponde ao prédio urbano sito em Moita Redonda, na rua dos Álamos e Rua da Moita de Baixo, na freguesia de Fátima, concelho de Ourém, composto por casa de habitação de rés-do-chão, primeiro, segundo e terceiro andares, com logradouro, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...73, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ourém sob o n.º ...28-Fátima.
Concluiu pedindo que seja declarada habilitada a intervir na qualidade de aquirente e em substituição da primitiva Ré CIRCLEXCLUSIVE, LDA.

Contestou o incidente de habilitação a Autora OBRA DO TRIUNFO DO IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA alegando, em suma, que tem sérias razões para crer que a venda do prédio é um negócio simulado, celebrado com a intenção de prejudicar ou tornar mais difícil a sua posição processual, pelo que impugna as declarações constantes da escritura por se tratarem de falsas declarações.
Acresce que desconhece se houve tradição da coisa e que, atendendo aos pedidos formulados na petição inicial e no articulado superveniente, a substituição das Rés ou só da Ré CIRCLEXCLUSIVE, LDA pela adquirente prejudicaria a sua posição, uma vez que esta nada teve a ver com os artifícios criados para a duplicação da descrição predial, não foi autora do esbulho nem auferiu os frutos civis até à data da venda.
Deste modo, alega que, em face da condição resolutiva aposta no contrato de compra e venda, se Ré transmitente não permanecer na ação principal, a sentença não produzirá o efeito útil pretendido pela Autora.

Foi proferida sentença que julgou procedente o incidente de habilitação e, consequentemente, declarou a Requerente LAÇOS D´HONRA UNIPESSOAL, LDA habilitada, como adquirente, para intervir na ação principal, passando a ocupar, para todos os efeitos legais e processuais, a posição da Ré CIRCLEXCLUSIVE, LDA.

Inconformada, apelou a Autora/Requerida pugnando pela improcedência do referido incidente, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
«1. Ao abrigo do art.º 644.º, n.º 1, al. a) do CPC, vem o presente recurso interposto da douta sentença de 10/10/2022, que julgou o incidente de habilitação de adquirente totalmente procedente e declarou a requerente Laços D’Honra Unipessoal, Lda. habilitada, como adquirente, para intervir na acção principal, passando a ocupar, para todos os efeitos legais e processuais, a posição da Ré Circlexclusive, Lda.
2. Da escritura pública de compra e venda de 13/05/2020, outorgada a fls. 66 a 69 do livro de notas para escrituras diversas n.º 104 do Cartório Notarial ..., situado na Av. ..., ..., ..., ..., apenas decorre que a 2.ª Ré declarou vender a “Laços D’Honra Unipessoal, Lda.” o predito prédio urbano;
3. Contrariamente ao plasmado na douta sentença recorrida, daquele título não decorre que a “Circlexclusive, Lda.” tenha transmitido à “Laços D’Honra, Unipessoal, Lda.”, todos os direitos e deveres inerentes à relação material controvertida discutida na acção;
4. A única coisa que é transmitida, por compra e venda, é o prédio urbano cuja propriedade é reivindicada pela A., ainda que o negócio tenha ficado sujeito à condição resolutiva;
5. O que sucederá em caso de procedência da presente acção, é a destruição dos efeitos daquele contrato de compra e venda, com a consequente restituição do prédio à esfera jurídica da “Circlexclusive, Lda.”, por decorrência da condição resolutiva inserta naquele título;
6. E é precisamente esse efeito jurídico que prejudica – e sobremaneira – a posição jurídica da A. na presente acção, determinando que a sentença final de mérito a proferir nos presentes autos, não possa produzir, na sua plenitude, o efeito útil pretendido pela A., porquanto:
a. A terceira adquirente (“Laços D’Honra, Unipessoal, Lda.”) não foi a autora do esbulho (acto ilícito) e nem auferiu ou privou a A. dos frutos civis gerados pelo prédio desde a data da propositura da acção (04/07/2016) até à data da escritura de compra e venda (13/05/2020), donde, não encontramos fundamento jurídico para a A. exigir da “Laços D’Honra, Unipessoal, Lda.” indemnização pelos frutos civis gerados naquele período;
b. Sendo a “Circlexclusive, Lda.” retirada do processo e não ficando abrangida pelos efeitos jurídicos da sentença na parte em se pretende a condenação na restituição do prédio ocupado, não fica obrigada a proceder à sua restituição à A. logo que se verifiquem os efeitos jurídicos da condição resolutiva do contrato de compra e venda.
7. Daqui decorre que a transmissão foi feita para tornar mais difícil a posição da A. no processo;
8. Tanto mais que a Requerente não alegou ter ocorrido a transmissão do prédio e, atentos os artifícios já descritos na petição inicial e a total falta de colaboração já demonstrada pelas RR. nos autos principais, a A. tem sérias razões para crer que o negócio possa ser simulado, com a finalidade de prejudicar ou tornar mais difícil a sua posição processual;
9. E daí a A. ter impugnado por falsas as declarações prestadas pelos outorgantes naquele instrumento.
10.A douta sentença recorrida viola o art.º 356.º, n.º 1, al. a), in fine, do CPC.»

Não foi apresentada resposta ao recurso.

II- FUNDAMENTAÇÃO
A- Objeto do recurso
Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões apresentadas, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), a única questão a apreciar é a da (im)procedência do incidente de habilitação da adquirente.

B- De Facto
A 1.ª instância deu como provada a seguinte factualidade:
1. Por escritura pública outorgada em 13 de Maio de 2020, a requerente Laços D´Honra Unipessoal, Lda declarou comprar a Circlexclusive, Lda, que por sua vez declarou vender àquela, o prédio urbano sito em Moita Redonda, na Rua dos Alamos e Rua da Moita de Baixo, na freguesia de Fátima, concelho de Ourém, composto de casa de habitação de rés-do-chão, primeiro, segundo e terceiro andares, com logradouro, inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...73, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ourém sob o n.º ...28-Fátima, pelo preço de € 225.000,00.
2. Na mesma escritura os outorgantes declararam ainda o seguinte:
“Que submetem esta compra e venda (…) à condição resolutiva, destruindo-se automática e retroativamente os efeitos do negócio condicionado, no caso de haver procedência da ação acima mencionada (…).
“Que este contrato de compra e venda produz os seus efeitos normais, mas está
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