Acórdão nº 18154/19.0T8LSB.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 18-04-2024

Data de Julgamento18 Abril 2024
Número Acordão18154/19.0T8LSB.L1-2
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:

O Condomínio de um Lote 8, sito em Lisboa, intentou uma acção declarativa comum contra o F pedindo que este fosse condenado a pagar-lhe (a) uma compensação, à razão de 5.000€ anuais, no valor total de 21.666,66€, em virtude do enriquecimento sem causa, calculado desde a data do trânsito em julgado, em Maio de 2015, da sentença proferida no âmbito do processo 2684/10 até à presente data; (b) A pagar a pagar anualmente até ao dia 30 de Janeiro do ano a que disser respeito, 5.000€, valor actualizável anualmente de acordo com o quociente de índice de preços publicado pelo Ministério da Economia.
Para tanto alega, em síntese, que o prédio do autor confina na parte do logradouro com o prédio do réu, designado por lote 6; este invade o espaço aéreo do prédio do autor; os trabalhadores das empresas instaladas no prédio do réu ocupam o logradouro do lote 8 sem que aquele comparticipe nas despesas de manutenção, segurança e conservação; numa outra acção intentada pelo autor contra o réu, este foi condenado a demolir a laje de cobertura do seu edifício na parte em que a mesma ocupa o espaço aéreo, bem como a remover armações metálicas; quando quis executar a referida sentença (3565/16), o réu deduziu embargos de executado que foram declarados procedentes, porquanto se entendeu que as obras objecto da execução estavam dependentes de aprovação por parte da Câmara Municipal; a situação mantém-se; numa situação idêntica à dos autos, o Condomínio do prédio do Lote 9 logrou alcançar transacção judicial com a proprietária do prédio contíguo, devendo o autor ser indemnizado nos mesmos termos e com base no instituto do enriquecimento sem causa (art.º 473 do CC, por intromissão ilegítima na afectação exclusiva do imóvel ao autor).
A 21/10/2019, o réu contestou a acção, excepcionando o caso julgado resultante da anterior acção, falando dele quer como excepção quer como autoridade; invocou também a existência de uma causa prejudicial para pretender suspender a instância até que fossem decididos com trânsito em julgado os embargos que deduziu à execução instaurada pelo autor; invocou também a violação do princípio da subsidiariedade do instituto do enriquecimento sem causa, pois que a pretensão indemnizatória requerida pelo autor, deveria ser enquadrada no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, na medida em que, segundo a sua (do autor) teoria, estamos perante um acto ilícito (violação do direito de propriedade), violação essa perpetuada pelo réu de forma consciente e culposa, a qual lhe provoca directamente um dano indemnizável (danos provocados na cobertura do seu edifício); ora, conforme se pode comprovar pelos articulados e pelas decisões judiciais proferidas na anterior acção, as referidas pretensões indemnizatórias já foram requeridas com base no instituto da responsabilidade civil extracontratual e foram expressamente julgadas improcedentes, motivo pelo qual, é inadmissível que o autor venha de uma forma abusiva e ardilosa, tentar contornar a referida situação, propondo a presente acção pela via do instituto do enriquecimento sem causa, como se não existisse outro meio de tutela específico para apreciação das suas pretensões e, ainda, como se não o tivesse já exercido; ainda impugnou, alegando, entre o mais, que i\ desde a data da sua aquisição do prédio, em 2002, à antiga proprietária, nunca procedeu à execução de qualquer obra; ii\ é falso que os empregados das empresas instaladas no prédio do réu acedam ao logradouro do autor pelas portas do lote 6; iii\ não utiliza, nem procede à fruição da referida cobertura de uma forma exclusiva, em benefício próprio ou exclusivo, nem utiliza os referidos espaços de uma forma abusiva e ilícita; iv\ as supostas “violações” não tiveram na sua génese qualquer irregularidade, ilicitude, perpetuadas pelo réu ou pelo primitivo proprietário do lote 6, mas sim, correspondem à concretização de um projecto definido por uma terceira entidade – Município de Lisboa – em prol de um interesse público e de dinamização de toda uma determinada região de Lisboa; e v\ o réu é alheio à transacção firmada com o Condomínio do lote 9; conclui no sentido “da procedência da excepção dilatória do caso julgado e autoridade do caso julgado, dando lugar à absolvição da instância do réu, ou no da procedência das excepções peremptórias invocadas – causa prejudicial e violação do princípio da subsidiariedade do instituto do enriquecimento sem causa - devendo, por conseguinte, a presente instância ser declarada suspensa, ou, deverá o réu ser absolvido do pedido;” ou, com o mesmo efeito, pela improcedência da acção por falta de prova.
A 03/12/2019, o autor foi convidado a responder desde logo às excepções, o que o autor fez a 10/01/2020, impugnando os factos base das mesmas e os efeitos que o réu tirava desses factos.
A 19/02/2020, o tribunal determinou que, antes de mais, se oficiasse ao processo 3565/16-B, que informasse o estado dos autos, e como aquele tribunal informou que os embargos de executado se encontravam a aguardar decisão do recurso de apelação, tendo sido enviados ao TRL a 15/11/2019, nada mais se fez até que, a 09/09/2020, o autor juntou aos autos cópia do acórdão do TRL de 21/05/2020 a julgar o recurso improcedente.
A 10/09/2020, o tribunal solicitou ao processo 3565/16 que informasse se os autos já baixaram à 1ª instância e, consequentemente, se a decisão do TRL transitou em julgado.
A 28/09/2020, foi obtida informação de que o acórdão do TRL tinha transitado em julgado a 06/07/2020.
A 26/11/2020, apesar de elas já estarem juntas aos autos, o tribunal determinou que se oficiasse ao referido processo o envio de cópia da decisão recorrida e da respectiva decisão do TRL.
A 15/12/2020, foram juntas tais decisões.
A 14/04/2021, foi proferido o seguinte despacho: “os autos encontram-se na fase de marcação da audiência prévia. Contudo, considerando que em virtude da suspensão de prazos previst[a na legislação Covid-19] não foram realizadas audiências prévias agendadas em alguns processos, importa que se proceda primeiramente ao reagendamento de todas aquelas diligências por ordem cronológica de antiguidade e só após se designe data para realização de audiência prévia nos presentes autos. Assim, oportunamente abra conclusão nos presentes autos por ordem cronológica de antiguidade.”
A 02/06/2021, foi designado o dia 09/09/2021 para a audiência prévia.
A 09/09/2021, já com outro juiz, os mandatários das partes “pediram a suspensão de 60 dias visando a obtenção de acordo o que lhes foi deferido”, determinando-se que, “volvido o prazo de suspensão, sem que nada seja dito, deve a seção notificar as partes para virem, em 10 dias, as partes virem dizer o que tiverem por conveniente, quanto ao almejado acordo.”
A 06/01/2022, o autor veio dizer que “verifica-se na presente data inexistir qualquer princípio de acordo entre as partes relativamente ao objecto do litígio. Assim sendo, lograda que está a possibilidade de se alcançar um acordo requer-se que [se] promova os demais termos do processo.”
A 08/02/2022 foi proferido o seguinte despacho: “Indiquem as partes se prescindem de remarcação de audiência prévia (uma vez que não se me afigura claro da leitura da acta).”
A 21/02 e 13/04/2022, as partes vieram dizer que prescindiam da remarcação da audiência prévia.
A 27/06/2022, o autor veio dizer que os autos “apesar de tal declaração [a feita a 21/02 e 13/04], não foram objecto de despacho saneador, nem conheceram qualquer andamento processual. Pelo que, se requer que […] sejam objecto do devido despacho saneador, correndo os respectivos termos subsequentes.”
A 29/12/2022, quase três anos depois da réplica do autor, foi proferido despacho saneador, julgando improcedente a excepção de caso julgado. Decidiu-se ainda não suspender a instância por não se mostrar pendente causa prejudicial.
O despacho foi notificado por carta elaborada a 02/01/2023, presumindo-se notificada a 05/01/2023.
A 15/01/2023, o réu veio requerer “que, seja declarada a nulidade do despacho saneador, por violação do disposto no nº 1 do art.º 595º do CPC, atendendo a que, não foi proferida decisão sobre a excepção de autoridade do caso julgado [sic], nem tão-pouco, à [sic] violação do princípio da subsidiariedade do instituto do enriquecimento sem causa.”
Por despacho de 06/02/2023, foi indeferido o requerido.
A 09/02/2023 (com pagamento de multa), o réu recorreu do saneador, na parte em que “julgou improcedente a autoridade de caso julgado” [sic].
O autor contra-alegou no sentido da improcedência do recurso.
Tal recurso foi admitido “com subida em separado, com efeito devolutivo e a subir a final”, do que as partes foram notificadas sem dele terem reclamado, pelo que só agora pode ser conhecido.
A 16/10/2023, depois da audiência final, foi proferida sentença a julgar verificada a excepção peremptória de subsidiariedade do instituto do enriquecimento sem causa e, em consequência, absolveu-se o réu do pedido.
O autor recorreu contra esta sentença – para que seja revogada e substituída por outra que considere verificado o requisito de subsidiariedade do instituto do enriquecimento sem causa e para que fosse aditado um facto aos factos provados.
O réu contra-alegou no sentido da improcedência do recurso.
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Questões a decidir: se a autoridade do caso julgado anterior devia ter levado a que o réu fosse absolvido da instância (1.º recurso); se deve ser aditado um facto aos factos provados; se a excepção da subsidiariedade do enriquecimento sem causa devia ter sido julgada improcedente e, se sim, consequências a tirar disso (2.º recurso)
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Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos [o 14 foi acrescentado para ter em conta a data do trânsito que não foi posta em causa pelo réu]:
1\ O Condomínio autor, ou Condomínio do Lote 8,
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