Acórdão nº 1765/21.1T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06-10-2022

Data de Julgamento06 Outubro 2022
Ano2022
Número Acordão1765/21.1T8VRL.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I – RELATÓRIO:

X Seguros – Companhia de Seguros Vida, SA intentou ação de processo comum contra M. F., R. M. e A. F., pedindo a condenação destes a devolverem à Autora os prémios de seguro não pagos, e devidos pela eficácia e validade do contrato, desde janeiro de 2009 até à data do sinistro – outubro de 2016 – cujo montante se cifra em € 10.541,98 (dez mil quinhentos e quarenta e um euros e noventa e oito cêntimos), acrescido dos respetivos juros de mora contados da data da citação.
Alega, para o efeito que os réus são familiares e legítimos herdeiros de M. B., falecido a 14 de outubro de 2016, sendo a ré M. F. herdeira legitimária na qualidade de cônjuge e os réus A. F. e R. M. herdeiros legitimários na qualidade de filhos.
Na data de 22 de julho de 2004, M. B. e a sua esposa, aqui Ré M. F. contraíram um empréstimo bancário (mútuo com hipoteca) para financiamento da quantia de € 62.500,00 (sessenta e dois mil e quinhentos euros), que receberam, tendo constituído hipoteca da fracção autónoma designada pela letra “L”, do prédio descrito sob o n.º ..., da freguesia de ..., da CRP de ..., inscrita na matriz predial sob o art. ....º, situada no Bairro ..., …, em ..., Vila Real, a pagar em 240 meses, com pagamento da primeira prestação a 02.09.2004, identificado pelo n.º ..............40.
Como condição da concessão do referido crédito, M. B. e a aqui Ré M. F. subscreveram um seguro de vida junto da companhia de seguros “X Seguros – Companhia de Seguros de Vida, S.A.” (na altura X Seguros – Companhia de Seguros de Vida, S.A.), titulado pela apólice ......99 e tinha como coberturas contratadas a Morte e Invalidez Total e Permanente.
Em fevereiro de 2019 os aqui réus intentaram uma ação, que correu termos no Juízo Local Cível de Lisboa – Juiz 3, com o número de processo 3928/19.0T8LSB, para que o contrato de seguro em causa (apólice .......02) fosse considerado válido e eficaz e a ré, aqui autora, fosse condenada a liquidar ao Banco o valor do capital em dívida do empréstimo associado, com o consequente reembolso aos autores, agora réus, dos montantes pagos desde essa data até trânsito em julgado da sentença, acrescido de juros moratórios.
Em sede de contestação, a aqui autora, alegou, desde logo, a anulação da apólice por falta de pagamento dos prémios de seguro, desde 31.03.2009.
Sucede que, a pretensão dos ali autores foi julgada parcialmente procedente por sentença proferida a 19.02.2020 e a ali ré foi condenada “a pagar ao Banco X, SA o remanescente capital em dívida do empréstimo contraído em 22/07/2004 pela 1ª Autora e seu falecido marido e aos Autores a quantia que estes despenderam para amortização do mesmo empréstimo, desde a data do falecimento de M. B. até à actualidade, acrescida de juros de mora a contar da data do respectivo pagamento até integral pagamento, tudo a apurar em incidente de liquidação de sentença.”, sendo a ré, aqui autora, foi absolvida do demais peticionado pelos Autores.
Da decisão recorreu a aqui autora, nomeadamente alegando “abuso de direito”, porquanto se considerava ofensivo da boa-fé pretender fazer valer “direitos” emergentes de um contrato de seguro, quando a pessoa segura há anos que deixara de cumprir com a obrigação de pagamento dos prémios, pugnando ainda pela dedução dos respectivos montantes mensais não pagos desde janeiro de 2009 até à data da prolação da sentença, no quantum condenatório, só assim fazendo sentido a condenação da Seguradora, sob pena de violação do dever de boa-fé contratual.
A referida sentença foi confirmada pelo douto acórdão do Tribunal de Lisboa, proferido a 21.01.2021, entretanto transitado em julgado, por se entender tratar-se de uma questão nova não suscitada nem apreciada anteriormente no processo.
Sucede que, resultou, igualmente, provado naqueles autos, que a prestação mensal do seguro a pagar pelo M. B. e pela autora M. F. era descontada directamente na conta associada ao empréstimo; em janeiro de 2009 o falecido marido da autora não liquidou o prémio de seguro correspondente à apólice em causa; de acordo com as cláusulas contratuais do seguro em apreço nos presentes autos os prémios de seguro correspondentes ao contrato são antecipadamente devidos pelo Tomador de Seguro no dia do seu vencimento, ponto 8.1 das Condições do Contrato; na sequência do não pagamento do prémio referido no artigo anterior, a Ré Seguradora, efectuou quatro tentativas de cobrança do recibo referente ao mês de Janeiro de 2009; em 19/02/2009, após a última devolução do recibo com registo de incobrado, a Ré Seguradora enviou uma carta de pré-aviso de anulação dirigida ao falecido marido da 1ª A., à qual não obteve resposta; em 23/03/2009, pela Ré Seguradora foi remetida nova carta dirigida ao falecido marido da 1ª A., comunicando a resolução do contrato a partir de 31/03/2009.
Assim, desde janeiro de 2009 que não foram liquidados quaisquer prémios de seguro no âmbito da apólice em apreço nos presentes autos, não recebendo a aqui autora, seguradora, qualquer compensação pelo risco assumido, pelo que é legítimo à autora vir agora peticionar, face à declarada validade e eficácia do contrato de seguro, a condenação dos réus na devolução à autora dos montantes em dívida, a título de prémios de seguro não pagos, desde janeiro de 2009 até à data do sinistro – outubro de 2016 – cujo montante se cifra em € 10.541,98.
Alega ainda a mesma que está em causa um contrato de seguro do ramo vida, no âmbito de um contrato de mútuo, com a obrigação de subscrição, nas condições e valor a indicar pelo banco mutuante, de um seguro de vida tendo como beneficiário e credor o Banco, cabendo aos mutuários pagar os respectivos prémios, ou seja, uma relação triangular, sendo intervenientes neste contrato de seguro, a seguradora, o banco mutuante, como beneficiário irrevogável do seguro (a favor de quem reverte a prestação da entidade seguradora em caso de morte ou de invalidez definitiva dos segurados), e as pessoas seguras, um seguro de grupo ou seguro coletivo
Perante a verificação do risco previsto (morte ou invalidez total e definitiva), a seguradora fique adstrita à realização de uma prestação pecuniária (pelo valor do capital mutuado em dívida) ao beneficiário indicado no contrato de seguro e, na medida em que são as pessoas seguras, destinatárias do crédito, que assumem o encargo de pagar os prémios, estamos perante um seguro de grupo contributivo.
Ora, nos termos do disposto no nº 2 do art. 121º do DL 72/2008: “Os restantes direitos emergentes do contrato de seguro prescrevem no prazo de cinco anos a contar da data em que o titular teve conhecimento do direito…”. Fazendo a primeira parte do n.º 1 do art.º 306º do Código Civil a seguinte referência “O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido…”.
Ou seja, enquanto o art.º 121º faz depender a contagem do prazo de prescrição do conhecimento do direito por parte do seu titular, o art.º 306º estabelece como regra para o seu início a possibilidade de exercício do direito, pelo que, a ora autora tem direito, desde a data do trânsito em julgado da sentença proferida no âmbito do processo 3928/19.0T8LSB, a qual decidiu manter o contrato de seguro válido e eficaz, sem quaisquer restrições, ao pagamento dos prémios de seguro, pelo risco coberto, pois que, só nessa data é que o direito estava em condições (objectivas) de o titular o poder actuar, portanto, só a partir dessa data era possível exigir do devedor o cumprimento da obrigação.
Assim, apenas na data do trânsito em julgado da decisão que considerou válido e eficaz o seguro de vida em causa (que a aqui autora considerava já devidamente resolvido) é que a autora se encontrava em condições de exigir aos devedores, aqui réus, o cumprimento da obrigação – devolução dos prémios não liquidados.

Em sede de contestação vieram os réus invocar a excepção de caso julgado com os autos n.º 3928/19.0T8LSB que correram termos no Juízo Local Cível de Lisboa (J3), e ainda a prescrição da obrigação principal, pugnando pela aplicação do disposto no artº 121º, nº 1 do Decreto-Lei n.º 72/2008 de 16/04, por força do disposto no art 2º do mesmo diploma, alegando que já decorreram dois anos a partir da data do vencimento do crédito peticionado.
Na medida em que a última mensalidade vencida era de 10/2016, o direito da autora terá prescrito em 10/2018; subsidiariamente pugna pela aplicação do prazo prescricional previsto no art 310º, al.d) e g) do Cód Civil, em relação ao crédito peticionado e respectivos juros.

A autora, em sede de contraditório, nada disse.

Foi proferida sentença em que se julgou improcedente a exceção do caso julgado e procedente a invocada prescrição da obrigação principal, pelo que a acção foi julgada totalmente improcedente, pela verificação da excepção peremptória de prescrição.
Em relação aos juros peticionados a contar da data da citação, na medida em que o crédito principal não existe, também não serão devidos juros, por força do disposto no art 804º, n.º 1 do Cód de Proc Civil.

Inconformada veio a autora recorrer da decisão apresentando as seguintes conclusões:

1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância a fls._ dos autos de acção de processo ordinário que correram termos no Juízo Local Cível de Vila Real, da Comarca de Vila Real, sob o número de processo 1765/21.1T8VRL, que julgou a acção totalmente improcedente.
2. Assim, as presentes alegações de recurso terão por objecto a alteração da matéria de direito.
3. Pela presente acção pretendeu a ora Recorrente a condenação dos Réus, aqui recorridos, no pagamento da quantia de € 10.541,98 a título de prémios de um contrato de seguro vencidos e não pagos.
4. Desde logo, o douto Tribunal a quo entendeu inexistir qualquer situação de caso julgado, nos termos...

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