Acórdão nº 17600/21.8T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-09-18

Ano2023
Número Acordão17600/21.8T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Procº nº 17600/21.8T8PRT.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1349)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório

AA, de ora em diante designado como Autor (A), intentou, aos 29.10.2021, ação declarativa de condenação, com processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, contra A..., Ldª de ora em diante designada de Ré, tendo apresentado, ao abrigo do disposto nos arts. 98º-C e 98º-D, ambos do CPT (aprovado pelo DL n.º 295/09 de 13/10), o respetivo formulário opondo-se ao despedimento.

A Ré apresentou articulado motivador do despedimento, pugnando pela regularidade e licitude do despedimento, considerando a existência de justa causa para o mesmo.

O A. contestou e formulou pedido reconvencional, alegando em síntese, que o articulado motivador do despedimento, que reproduz a decisão disciplinar, enferma, quanto aos pontos que indica, de generalidades e juízos e conclusivos, mais impugnando, no essencial, a matéria imputada, e concluindo no sentido da inexistência de justa causa para o despedimento que, segundo diz, teve lugar num quadro de assédio moral, que descreve, e que é abusivo. Reconvencionalmente, invoca os danos não patrimoniais sofridos, reclamando o pagamento a título de indemnização pelos mesmos, de quantia não inferior a €12.500,00, mais alegando que a Ré não lhe concedeu a formação profissional devida, nem lhe pagou o crédito de formação dos últimos 3 anos, reclamando a quantia de 563,94€ (115 horas).
Mais diz que a Ré também não lhe pagou:
“i- férias e subsídio de férias de 2018 (proporcionais, artº 239º, nº 1, do CT): 85€ x 2 = 170€
ii- férias (não gozadas) e subsídio de férias vencidos em 1.1.2019 = 2.040€
iii- férias (não gozadas) vencidas em 1.1.2020 = 1.020€
iv- indemnização pelo não gozo de férias (artº 246º do CT) em 2019 e em 2020: 1.020€ x 6 = 6.120€
v- a remuneração da isenção de horário de trabalho desde novembro de 2019, tendo pago neste mês apenas o valor de 15,45€ (faltam 154,55€)
Pronuncia-se ainda pela improcedência da oposição à reintegração aduzida pela Ré.
Termina formulando o seguinte pedido:
“i- DEVE O DESPEDIMENTO DO TRABALHADOR SER DECLARADO ILÍCITO E ABUSIVO, COM AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS DA CONDENAÇÃO DA R. NA REINTEGRAÇÃO DO A. OU, SE POR ELA OPTAR (AO ABRIGO DO ARTº 331º, Nº 4, DO CT), NO PAGAMENTO DA INDEMNIZAÇÃO POR DESPEDIMENTO, EM DOBRO (ARTº 392º, Nº 3, DO CT), E DAS REMUNERAÇÕES DESDE O DESPEDIMENTO ATÉ AO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO FINAL, INCLUINDO O VALOR PATRIMONIAL DAS REGALIAS DE QUE BENEFICIAVA (AUTOMÓVEL E TELEMÓVEL);
ii- DEVE A RECONVENÇÃO PROCEDER E A EMPREGADORA SER CONDENADA A PAGAR AO TRABALHADOR UMA COMPENSAÇÃO POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS, NO VALOR DE 12.500,00€, O CRÉDITO DE FORMAÇÃO DOS ÚLTIMOS 3 ANOS (563,94€), A REMUNERAÇÃO DAS FÉRIAS E DO SUBSÍDIO DE FÉRIAS DE 2018 (170€), DOS VENCIDOS EM 1.1.2019 (2.040€), DAS FÉRIAS VENCIDAS EM 1.1.2020 (1.020€), A INDEMNIZAÇÃO PELO NÃO GOZO DE FÉRIAS EM 2019 E EM 2020 (6.120€) E 154,55€ DA IHT DE NOVEMBRO DE 2019;
iii- TUDO COM JUROS LEGAIS DESDE A DATA DO VENCIMENTO DAS CORRESPONDENTES QUANTIAS.”

A R. respondeu, impugnando a factualidade alegada pelo e reiterando a validade do despedimento, mais contestando o pedido reconvencional, que considera dever ser julgado improcedente.

Realizou-se audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador, indicado o objeto do litígio e consignada a matéria de facto assente e os temas da prova, da qual foram apresentadas reclamações pela Ré e pelo A., decididas por despacho de 23.09.2022 (indeferida a da Ré, deferida a do A.).

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento (sessões de 27.09.2022 e 11.11.2022).

Aos 03.10.2022 o A. apresentou requerimento referindo o seguinte:
“1. O A. encontra-se desempregado, nesta data. Como tal, opta pela reintegração ao serviço da R. [artº 389º, nº 1, b), do CT], nas mesmas condições de trabalho em que se encontrava, com a utilização de viatura ligeira, de 5 lugares, como a que utilizava, e requerer a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no cumprimento dessa obrigação.
“2. Requer igualmente que fique consignado como facto provado que ao vendedor da R. BB, colega do A., igualmente residente na zona norte do país, em Barcelos, e de admissão posterior ao A., em outubro de 2020, que, tal como o A., não fazia entrega de mercadorias e também tem atribuída viatura ligeira, de 5 lugares, uma carrinha Opel ..., não foi ordenado pela R. que a restituísse, para substituição por uma viatura mista, de 2 lugares, de caixa alta e com publicidade de lubrificantes, ao contrário do A. – para efeitos dos artºs 29º e 31º do CT, do artº 72º do CPT e do artº 5º, nº 2, a) e b), do CPC”, sobre o qual foi proferido o seguinte despacho “ Ora, encontra-se pendente a audiência de julgamento, com data de sessão já agendada e sendo certo que a reintegração no posto de trabalho é a regra legalmente prevista, não se vislumbra qualquer fundamento para a junção do requerimento em causa, pelo que se indefere a mesma”.
E, na sessão da audiência de julgamento de 11.11.2023. conforme decorre da respetiva ata conjugado com a audição da gravação, a que se procedeu, o A. formulou requerimento idêntico ao apresentado a 03.10.2022, tendo-se a Ré oposto ao seu ponto 2, na sequência do que foi proferido o seguinte despacho:
“Relativamente à opção consignada pelo autor o Tribunal ressalva apenas que de acordo com as regras legais previstas a reintegração do posto de trabalho é a regra enquanto consequência da declaração de ilicitude de um despedimento, pelo que o trabalhador opta pela indemnização e não pela reintegração, contudo, esta indicação não deixará de ser atendida oportunamente pelo Tribunal.
Quanto à matéria de facto que o autor pretende que seja atendida apenas na decisão final o Tribunal irá apreciar a factualidade que resultou demonstrada, quer relativamente à que vem vertida nos temas de prova, quer outros factos instrumentais ou acessórios que considere relevantes, pelo que por ora se relega esta apreciação para esse momento.”

Foi, após (aos 13.12.2022), proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
“Tudo visto e nos termos expostos, julga-se a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência, julga-se lícito o despedimento aplicado pela R. ao A. enquanto sanção disciplinar, absolvendo-se o demandado do demais peticionado.
Condena-se a R. a pagar ao A. a quantia de € 637,20 (seiscentos e trinta e sete euros e vinte cêntimos) devida a título de créditos por horas de formação não ministrada.
Fixam-se aos presentes autos o valor de € 27.668,49.
Custas por ambas as partes na proporção do respectivo decaimento.”

Inconformado, o A. recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:
“I- Impugnação da matéria de facto
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A Ré contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
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O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso no que toca à questão da (i)licitude do despedimento e, bem assim, referindo, no que toca aos demais créditos, o seguinte:
“6. Quanto aos demais créditos, nomeadamente férias, subsídio de férias e de Natal, entende-se que estes direitos nascem com o contrato de trabalho.
Assim bastaria ao trabalhador alegar a sua relação de trabalho e o não pagamento, devendo ser a Ré a provar o pagamento.
Nos factos provados não vem este referido.
Vem dito, nos factos não provados, que não se provou que “A R. também não pagou ao A.:
i- férias e subsídio de férias de 2018; ii- férias (não gozadas) e subsídio de férias vencidos em 1.1.2019; iii- férias (não gozadas) vencidas em 1.1.2020, e iv- indemnização pelo não gozo de férias v- a remuneração da isenção de horário de trabalho desde novembro de 2019, tendo pago neste mês apenas o valor de 15,45€.”
Cabendo, como se disse, à Ré provar o pagamento. Assim não acontecendo deveria ser condenada no pagamento.
Já quanto à violação do direito a férias cabe ao Autor a sua prova.
Como se lê no Ac. do STJ de 19.05.2021, proc. n.º 27885/17.9T8LSB.L1.S1, (Júlio Gomes) O direito a férias remuneradas nasce com a celebração do contrato de trabalho e não com a sua violação, pelo que o trabalhador tem apenas de provar que é trabalhador subordinado para exigir a retribuição correspondente ao período de férias. E, mais à frente “face às regras de distribuição do ónus da prova citadas [as constantes do artigo 242.º do Código Civil], dúvidas não existem de que alegando o A. o não pagamento de férias vencidas e não gozadas (o segundo dos factos essenciais de que depende a verificação do seu direito de crédito), o ónus da prova do correspondente facto extintivo, i.e., de que o pagamento ocorreu, pertence aos RR (…) só se irá equacionar o pagamento das férias vencidas caso as mesmas não tenham sido gozadas (…) o ónus da prova da falta de gozo das férias é do A., porquanto consubstancia facto constitutivo do direito invocado (o direito ao pagamento das mesmas)”.
Assim entende-se que estes créditos referentes a férias, subsídio de férias e de Natal pedidos deveriam ser reconhecidos ao Autor/recorrente e a Ré condenada no seu pagamento.
*
7. Nestes termos, ressalvando sempre diferente e melhor opinião, emite-se parecer no sentido de ser dado provimento parcial ao recurso do A., nos termos referidos.”
As partes responderam ao mencionado parecer: o A/Recorrente, dele discordando no que toca à questão da (i)licitude do despedimento e da violação do direito a férias; a Ré, dele discordando no que toca à questão do pagamento das férias e dos subsídios de férias e de Natal.

Colheram-se os vistos legais.
***
II. Decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância [a decisão da matéria de facto dada como provada e não
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