Acórdão nº 17494/21.3T8SNT.L1-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 14-09-2023

Data de Julgamento14 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão17494/21.3T8SNT.L1-8
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa

A, S.A. instaurou ação declarativa de condenação contra SP, Lda., pedindo:
a) o reconhecimento da cessação do contrato de arrendamento para fins não habitacionais na data de 09 de outubro de 2021;
b) a condenação da Ré a restituir o imóvel entregando o mesmo à A. livre de pessoas e bens;
c) a condenação da Ré a indemnizar a A. no montante de € 2.247,80 por cada mês passado até à entrega efetiva do imóvel à A., livre de pessoas e bens, nos termos do disposto no artigo 1045º n.º 1 do CC, indemnização essa que nesta data ascende já à quantia de € 2.574,09, acrescida de juros de mora vencidos à taxa legal no montante de € 29,34;
d) a condenação da R. no pagamento de juros de mora vincendos até efetiva entrega do imóvel, livre de pessoas e bens.
Alegou, em síntese, que comunicou à R. que se opunha à renovação do contrato de arrendamento para fins não habitacionais celebrado a 13/10/1976, mais comunicando que em face da oposição, tal contrato cessaria no dia 09 de outubro de 2021. Mais alegou que o contrato transitou para o NRAU, passando a ter a duração de 5 anos, sendo renovável por 3 anos. A R. não procedeu à entrega do locado.
A R. apresentou contestação alegando, em síntese, que o contrato de arrendamento se encontra sujeito ao regime dos contratos de duração indeterminada, ao qual se aplica a regra da sua renovação automática ou forçada e não a faculdade prevista no artigo 1097.º, do Código Civil. A denominada oposição à renovação do contrato de arrendamento não é suscetível de operar a cessação do contrato de arrendamento para fins não habitacionais.
Conclui pela improcedência do pedido.
Foi proferido despacho saneador sentença, que julgou a ação improcedente e absolveu a R. dos pedidos.
A A. interpôs recurso desta decisão, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
“1. A sentença proferida pelo Tribunal a quo é nula porque, desde logo, contraria a decisão tomada pela Tribunal a quo quanto à matéria de facto provada.
2. Vem o Tribunal a quo considerar como provado que, segundo comunicação efetuada pelo senhorio à aqui Recorrida, o referido contrato de arrendamento celebrado entre as partes passou a ter um prazo certo de 5 anos,
3. No entanto, vem depois invocar, aquando da decisão de Direito, que o contrato em causa não tem prazo certo.
4. Ora, tal releva uma profunda contradição entre o facto que deu como provado – mormente o facto n.º 12 – e a decisão de direito que aplicou ao caso.
5. Atendendo à matéria de facto dada como provado, o Tribunal a quo deveria de ter considerado e decidido que o contrato de arrendamento em causa tem um prazo certo de 5 anos – veja Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 704/12.5TVLSB.L3.S1, datado de 29/04/2021
6. A sentença é por isso nula ao abrigo do disposto no art. 615.º al. c) do Código de Processo Civil, porquanto os fundamentos de facto estão em oposição com a decisão de direito, devendo, por isso, ser declarada a nulidade da sentença proferida pelo Tribunal a quo.
Sem prescindir, e caso assim não se entenda o que por mera cautela de patrocínio se equaciona,
7. A Sentença do Tribunal a quo também não esclarece nem precisa qual o comando normativo concreto que a Recorrente alegadamente violou.
8. O Tribunal conclui que “O contrato celebrado entre as partes, apesar de transitado para NRAU, não tem prazo certo por não ter sido cumprido o disposto nos artigos 50.º a 56.º do NRAU.”, mas questiona-se: por não ter sido cumprido o quê?
9. O Tribunal a quo não indicou – conforme legalmente lhe impedia – qual disposição concreta não cumpriu a aqui Recorrente,
10. Por outro lado, e mais avante na sentença do Tribunal a quo, pode ler-se “A comunicação da senhoria efectuada por carta datada de 05.05.2021, por desrespeitar o formalismo previsto nos artigos atrás referidos, não se pode considerar válida e eficaz e como tal não se considera caducado o contrato de arrendamento que vincula as partes a 09.10.2021.”., mais uma vez se questiona o Tribunal a quo: qual formalismo?
11. O Tribunal a quo apresenta uma decisão vaga e sem qualquer precisão, prescindindo de especificar qual as alegadas disposições legais concretas que a Recorrente alegadamente violou.
12. É por isso evidente que a sentença proferida não está devidamente fundamentada, não tendo o Tribunal a quo cumprido o dever de fundamentação a que está legalmente obrigado – veja-se Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo n.º 2431/09.1TMPRT-D.P1, de 19/11/2020.
13. Tal implica, nos termos do disposto do art. 615.º n.º 1 al. b) a nulidade da sentença, porquanto não estão especificados os fundamentos de direito que justificam a decisão que veio a ser proferida, devendo, por isso, ser declarada a nulidade da sentença proferida pelo Tribunal a quo.
Sem prescindir, e caso assim não se entenda o que por mera cautela de patrocínio se equaciona,
Da solução de direito
14. A Recorrente jamais se pode conformar com a decisão de direito aplicada ao presente processo, a qual, e salvo o devido respeito, não tem qualquer sustentação face aos factos dados como provados.
15. É facto assente – tendo até tal sido dado como provado e decidido pelo Tribunal a quo – que o contrato de arrendamento em causa no presente processo transitou para o NRAU;
16. E, salvo o devido respeito, também não merece discussão que, com a transição para o NRAU passou tal contrato a ter um prazo certo de 5 anos.
17. Aliás, é até contraditório vir o Tribunal a quo invocar na parte de Direito que o referido contrato não tem prazo certo quando, deu como provado, que o senhorio propôs à aqui R. determinadas condições, nomeadamente fixar o valor da renda mensal em € 1.112,90 e que o mencionado contrato passaria a ser a termo certo e pelo período de 5 anos,
18. Comunicação essa que, segundo considerou como provado o Tribunal a quo, a aqui Recorrida recebeu e respondeu
19. E, após essa resposta da Recorrida, - e conforme considerou o Tribunal a quo como provado - o senhorio comunicou à aqui Recorrida que o contrato passaria a ter um prazo certo de 5 anos, e que a renda seria atualizada para o montante de € 1.112,90.
20. Bem como considerou o Tribunal a quo como provado que, a partir de ter recebido tal comunicação, a Recorrida começou a pagar a renda pelo montante referido.
21. Pelo que, dúvidas não subsistem que o referido contrato de arrendamento, por força da sua transição para o NRAU operado pelo anterior senhorio, tem um prazo certo de 5 anos.
22. Transição essa que ocorreu nos termos do disposto nos arts. 33.º n.º 5 al. b) e 52.º do NRAU na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto.
23. Pelo que, por força da transição do contrato de arrendamento para o NRAU, o referido contrato passou a ter prazo certo, pelo período de 5 anos (de 10.10.2013 até 09.10.2018), tendo sido objeto de uma renovação pelo período de três anos nos termos legais.
24. Cumprindo o estatuído no referido artigo 1097.º n.º 1 al. b) do Código Civil, nomeadamente o prazo de pré-aviso necessário, a 05.05.2021 a Recorrente comunicou à Recorrida que se opunha à renovação do contrato de arrendamento para fins não habitacionais celebrado a 13.10.1976.
25. Mais comunicando que em face da oposição, tal contrato cessaria no dia 09 de outubro de 2021.
Sucede que,
26. Conforme resulta do facto provado n.º 17, até à data de hoje a Recorrida não desocupou o imóvel, nem procedeu à sua entrega, conforme está legalmente obrigada nos termos do disposto no art. 1081.º n.º 1 do Código Civil.
27. Pelo que, face ao exposto, deverá ser revogada a decisão proferida pelo Tribunal a quo e, consequentemente, ser reconhecido que o referido contrato de arrendamento, com a transição para o NRAU, passou a ter um prazo certo de cinco anos e,
28. Ainda, ser reconhecida a cessação do contrato de arrendamento para fins não habitacionais na data de 09 de outubro de 2021 e ser a aqui Recorrida condenada a: a) restituir o imóvel entregando o mesmo à aqui Recorrente livre de pessoas e bens; condenar a Recorrida a indemnizar a Recorrente no montante de € 2.247,80 por cada mês passado até à entrega efetiva do imóvel à Recorrente, livre de pessoas e bens, nos termos do disposto no artigo 1045º n.º 1 do CC, indemnização essa que nesta data ascende já à quantia de € 2.574,09, acrescida de juros de mora vencidos à taxa legal no montante de € 29,34 e c) condenar a Recorrida no pagamento de juros de mora vincendos até efetiva entrega do imóvel, livre de pessoas e bens.
Nestes termos, requer a Vossas Excelências se dignem a:
a) Julgar nula a sentença proferida pelo Tribunal a quo ao abrigo do disposto no art. 615.º n.º 1 al. c) do CPC;
Caso assim não se entenda, o que por mera cautela de patrocínio se equaciona,
b) Julgar nula a sentença proferida pelo Tribunal a quo ao abrigo do disposto no art. 615.º n.º 1 al. b) do CPC
Caso assim não se entenda, o que por mera cautela de patrocínio se equaciona,
c) Julgar procedente por provado o presente recurso, substituindo a decisão proferida pelo Tribunal a quo por outra que reconheça que o referido contrato de arrendamento, com a transição para o NRAU, passou a ter um prazo certo de cinco anos e, consequentemente, cessou os seus efeitos no dia 09 de outubro de 2021, com as legais consequências.”
A R. apresentou contra-alegações, terminando com as seguintes conclusões:
“Quanto às arguidas nulidades da sentença:
I. Dos factos enunciados nos números 11 e 12 do probatório da sentença, não resulta a conclusão de que «o contrato de arrendamento em causa tem um prazo certo de 5 anos», como entende a recorrente, uma vez que daqueles factos extrai-se a mera descrição de diversos actos praticados pelo senhorio da agora Recorrida e do respectivo conteúdo, sem, no entanto, se avançar com qualquer consideração sobre se «o contrato de
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