Acórdão nº 17389/23.6YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-09-28

Data de Julgamento28 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão17389/23.6YIPRT.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

RELATÓRIO

E..., S.A. apresentou requerimento de injunção contra S..., LDA. com vista a obter o pagamento de € 13 482,69 de capital, € 518,86, de juros e € 102,00 de taxa de justiça invocando um contrato de fornecimento de bens ou serviços, celebrado em 22.5.2019, e referindo tratar-se de obrigação emergente de transação comercial (DL nº 62/2013, de 10 de maio).
Em síntese, alega que a requerida não procedeu ao pagamento do valor das diversas faturas referentes aos serviços de arqueologia que lhe prestou, nas datas dos respetivos vencimentos.
*
A requerida deduziu oposição e reconvenção.
Alegou, em síntese, que pessoas que atuavam como comissários da requerente na execução do contrato de prestação de serviços invocado nos autos deslocaram e removeram um grande vaso em granito, com cerca de 200 kg de peso, que se encontrava no Convento de ..., local onde estavam a ser prestados os serviços contratados, o que fizeram com intenção de dele se apropriarem.
Pese embora o vaso tenha sido posteriormente devolvido, durante o processo da sua remoção foram causados vários danos no pavimento dos pisos e na escadaria principal do Convento, cuja reparação considera que é da responsabilidade da requerente, na qualidade de comitente.
Pretende que lhe seja reconhecido que possui um crédito sobre a requerente no valor de € 81 708,90 relativo aos danos causados e que seja operada a compensação desse seu crédito com o crédito invocado pela requerente, sendo esta condenada, por via reconvencional, no pagamento do valor remanescente.
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Os autos foram remetidos à distribuição como ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, após o que, em 24.4.2023, foi proferida decisão (ref. Citius ...41), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, que considerou que o crédito invocado pela requerida não podia ser apreciado nos autos, devendo a questão ser discutida em ação própria e autónoma, e, nos termos do art. 2º do Anexo ao DL nº 269/98, de 1.9, conferiu força executiva à petição.
A referida decisão fixou ainda o valor da causa em € 14 001,55.
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A requerida não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

“1. A ora Apelante, em sede de oposição a requerimento de injunção contra si dirigido, deduziu reconvenção contra a Apelada, invocando ter contra esta um crédito de € 81.708,90, que pretende ver compensado com o crédito da requerente no montante de € 14.103,55;
2. Sucede que, o Tribunal a quo, não admitiu a reconvenção, por entender que o pedido formulado pela Apelante, não se coaduna com a simplicidade de tramitação e celeridade que o legislador pretendeu imprimir às acções especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias;
Posto isto,
3. Dispõe o art. 266º, nº 1: “O réu pode, em reconvenção, deduzir pedidos contra o autor.”, acrescentando o nº 2, al. c): “a reconvenção é admissível (…) quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor.”;
4. Com tal disposição pretendeu o legislador estabelecer a necessidade de recurso à via reconvencional para dedução da compensação;
5. Assente a necessidade de recurso à via reconvencional para dedução da compensação, surge uma outra questão: Admissibilidade de dedução da Reconvenção em sede de acção especial para cumprimento das obrigações pecuniárias;
Desta forma,
6. As ações para cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, nos termos previstos no Decreto-Lei 269/98, de 01.09, seguem os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos quando o valor do pedido não seja superior a metade da alçada da Relação, o que sucede no caso em apreço;
7. Deduzida oposição, o presente procedimento de injunção passou a seguir os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias - Decreto-Lei 269/98, de 01.09 - forma de processo especial, que só comporta dois articulados: requerimento de injunção e oposição;
8. Todavia, o regime previsto no art. 266º, nº 2, al. c) do CPC, que impõe que a compensação deve ser deduzida por via da reconvenção, é aplicável quer no âmbito da acção declarativa comum, quer no âmbito da acção especial prevista no Decreto-Lei 269/98, de 01.09;
9. Nesse sentido, Prof. Dr. Miguel Teixeira de Sousa (in blogue do IPPC em 26.4.2017 sob o título “AECOPs e compensação”) e Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 6.6.2017, Ac. Relação do Porto de 13.06.2018 e 10.11.2020, Ac. Da Relação de Lisboa 23.02.2021 e 9.10.2018, todos disponíveis in www.dgsi.pt;
Por conseguinte,
10. Tendo a compensação de créditos de ser efetuada por via da reconvenção – art. 266º, nº 2, al. c) do CPC, - articulado não admissível em sede de ação especial de cumprimento de obrigações pecuniárias - por razões de justiça material, não poderia o Tribunal a quo negar à Apelante a possibilidade de invocar a compensação de créditos através da dedução da reconvenção.
11. Nessa medida violou a sentença recorrida, entre outros, o art. 266º, nº 2, al. c) do CPC.”

Termina pedindo que a decisão recorrida seja revogada e seja admitida a reconvenção.
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A requerida contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões:

“1. A ora Recorrida propôs contra a ora Recorrente uma ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, peticionando o valor de 14.103,55€ relativo a faturas emitidas e não pagas relativos a serviços de arqueologia que foram efetivamente prestados;
2. A Recorrente, em sede de oposição ao requerimento de injunção contra si dirigido, deduziu reconvenção contra a Recorrida, invocando ter contra esta um crédito de € 81.708,90, baseado em alegadas atuações por parte da Recorrida que alegadamente provocaram danos no imóvel explorado pela Recorrente, crédito este que pretende ver compensado com o crédito da requerente no montante de € 14.103,55;
3. O Tribunal a quo não admitiu (e bem) a reconvenção, pois o pedido formulado pela Recorrente não se coaduna com a simplicidade de tramitação e celeridade que o legislador pretendeu imprimir às acções especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias;
4. A reconvenção não deverá ser admitida, pois o presente procedimento de injunção segue os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações emergentes de contratos - Decreto-Lei 269/98, de 01.09 - forma de processo especial, que só comporta dois articulados: requerimento de injunção e oposição;
5. Sendo que a própria legislação não admite a possibilidade de reconvenção, até porque a simplificada tramitação processual legalmente estabelecida para a acção em causa, cuja particular especificidade se centra na celeridade derivada da simplificação, não se compatibiliza com a admissibilidade de formulação de qualquer pedido reconvencional.
6. Neste sentido, Ac. deste Douto Tribunal da Relação de Guimarães de 22.06.2017, proc. n.º 69039/16.0YIPRT.G1, e de 17.12.2018, proc. n.º 47652/18.1YIPRT-A.G1; e ainda, Ac. do Tribunal da Relação de Évora de 10.07.2019, proc. n.º 81643/18.8YIPRT-A.E1, ou ainda o Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 10.07.2019, proc. n.º 4843/19.3YIPRT-A.P1, bem como, mais recentemente, de 21.06.2021, proc. n.º 83857/20.1YIPRT-A.P1, e Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 28.09.2022, proc. n.º Proc. 9423/21.0YPRT-A.C1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
7. Também a melhor das doutrinas vota e alinha pelo mesmo diapasão.
8. Por outro lado, é totalmente infundado o argumento de que ao negar-se a possibilidade de reconvenção se violaria o disposto no art. 266º, nº 2, al. c) do CPC, a qual simplesmente não é aplicável no caso deste tipo de ação especial,
9. Improcedente é também o argumento que desta forma se nega o direito a uma justiça material, uma vez que, não está nunca impedida a Recorrente de dar entrada de acção declarativa condenatória com a causa de pedir e o pedido que é a base da sua reconvenção.”
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O recurso foi admitido na 1ª instância como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito devolutivo, não tendo sido objeto de alteração neste Tribunal da Relação.
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Foram colhidos os vistos legais.

OBJETO DO RECURSO

Nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC, o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações do recorrente, estando vedado ao Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas,...

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