Sentença ou Acórdão nº 0000 de Tribunal Central Administrativo, 01 de Janeiro de 2022 (caso Acórdão nº 170/21.4BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-01-13)

Data da Resolução01 de Janeiro de 2022
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I. RELATÓRIO

ROSA (...), com os demais sinais dos autos, apresentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, ao abrigo do disposto nos artigos 89°-A, n° s 7 e 8 da Lei Geral Tributária (LGT) e 146°-B, n°5 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), recurso judicial contra a decisão do Director de Finanças de Santarém que, para efeitos de IRS e em conformidade com o disposto na alínea f) do n.º 1 do art.º 87º, conjugado com o nº 5 do art.º 89º-A, ambos da LGT, lhe fixou, por avaliação indirecta, o rendimento tributável do ano de 2016.

Por sentença do TAF de Leiria o recurso judicial foi julgado improcedente e mantida a decisão recorrida.
Inconformada com o assim decidido, apelou o recorrente para este Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), tendo na sua alegação formulado as seguintes e doutas conclusões:
«
A) Salvo o devido respeito, entende a Recorrente, que há na decisão recorrida erro de julgamento de facto e de Direito, respectivamente, quer quanto à matéria de facto dada como (não) provada, quer no que concerne à violação de normas jurídicas, as quais obstam ao decidido.
B) Os autos encontram-se instruídos com um contrato denominado de “contrato de mútuo” celebrado entre a sociedade comercial de direito angolano “Loo(...), SA”, a sociedade comercial de direito português denominada “Livre (...), SA” e a Recorrente (Cfr. ponto 58 da matéria de facto assente). 
C) O designado “contrato de mútuo" traduz, outrossim, um contrato de abertura de crédito, ao abrigo do qual a Recorrente recebeu, em Portugal, diversas tranches de dinheiro (cfr. pontos 5) a 20) da matéria de facto assente), que lhe foram emprestadas pela sociedade LOO(...), ainda que entregues pela sociedade LIVRE (...), nos termos do acordado entre as Partes na cláusula 4.a do contrato junto a estes autos (cfr. ponto 58) da matéria de facto dada como assente).
D) As importâncias recebidas, em Portugal, na conta da Recorrente, resultam de cheques bancários emitidos pela sociedade LIVRE (...) e relativamente aos quais, não só ficou demonstrada a sua origem (pontos 5) a 20) da matéria de facto provada), como ficou, igualmente, provado que a sociedade LIVRE (...) fez constar da sua contabilidade aqueles cheques, atribuindo-lhes a natureza de mútuo e enumerando as datas e montantes dos valores recebidos por parte da LOO(...) (cfr. ponto 22) da matéria de facto assente).
E) A sociedade LOO(...) emitiu recibo de quitação dos valores “mutuados” à Recorrente (cfr. ponto 21) da matéria de facto), onde se incluem os valores entregues em Portugal.
F) Ora, salvo o devido respeito e não se desconsiderando, por um lado, o âmbito/extensão da livre apreciação das provas pelo Tribunal e, por outro lado, o ónus probatório a cargo da Recorrente acerca da natureza e montantes em questão nestes autos, o certo é que a Recorrente carreou a estes autos todos os suportes documentais e probatórios que se encontravam na sua disponibilidade,
G) Documentos esses que entende serem suficientes e bastantes para atestar a sua versão dos factos e com isso ser possível ao Tribunal alcançar a verdade material.
H) O que não pode suceder, no entanto, é que a Recorrente seja penalizada (em termos probatórios, senão mesmo de resultado) porque o administrador da LOO(...) não juntou a estes autos o suporte documental que atestasse, para além das suas declarações, que efectivamente aquele mútuo se encontrava reflectido na contabilidade daquela sociedade comercial.
l)Os movimentos das contas bancárias da Recorrente encontram-se evidenciados e demonstrados nos autos (designadamente pontos 5) a 20) da matéria de facto provada).
J) A sociedade comercial LIVRE (...), entidade emissora dos cheques, reflectiu na sua contabilidade, quer os montantes, datas e natureza das entregas (ponto 22) da matéria de facto provada).
K) Os autos encontram-se instruídos com o contrato que serviu de base àqueles movimentos (ponto 58) da matéria de facto provada).
L) Foi, ainda, junto documento de quitação emitido pela LOO(...), que atesta que aquela sociedade recebeu o reembolso da totalidade do valor mutuado à Recorrente (ponto 21) da matéria de facto provada).
M) O Administrador da sociedade LOO(...), ouvido na qualidade de testemunha, atestou ter-se tratado de um empréstimo da sociedade sua administrada à Recorrente, empréstimo esse que, nos termos das suas declarações foi reembolsado à LOO(...).
N) Ora, salvo o devido respeito - e, mais uma vez não se descurando o ónus probatório que impende sobre a Recorrente - exigir mais (e melhor) prova à Recorrente que aquela que produziu é impor aqui aquela que se pode ter por prova diabólica, na exacta medida em que, na prática é impossível.
O) A imposição da realização de uma prova diabólica mostra-se, já se sabe, inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade, da tutela judicial efectiva e do processo equitativo, consagrados nos artigos 2.° e 20.°, ambos da Constituição da República Portuguesa (CRP).
P) O objecto dos presentes autos reconduz-se aos valores recebidos pela Recorrente em Portugal, pelo que, mostra-se irrelevante apurar se a Recorrente reembolsou, ou não, o valor mutuado de 1.000,00 USD e, na mesma sequência lógica, irreleva, igualmente, apurar qual o valor mutuado na sua totalidade.
Q) O contrato (designado) de mútuo junto aos autos prevê que o valor a mutuar pudesse ascender a 1.000,00 USD (cfr. ponto 58)).
R) A partir do momento em que se encontra demonstrado categoricamente nestes autos, quais os valores efectivamente recebidos pela Recorrente em Portugal, não releva se ao abrigo daquele mesmo contrato a Recorrente recebeu outros valores - por exemplo, em Angola - até perfazer o fixado tecto máximo de 1.000,00 USD (cfr. pontos 5 a 20 e 58) da matéria de facto).
S) Aliás, tratando os presentes autos de alegadas manifestações de fortuna, o Tribunal a quo dispunha de todos os elementos necessários à descoberta da verdade material, já que dispõe, por um lado, de informação completa relativamente às quantias recebidas em território português (cfr. pontos 5 a 20 da matéria provada) e, por outro lado, dos elementos contábilísticos da sociedade LIVRE (...) (cfr. ponto 22) da matéria de facto provada).
T) Salvo o devido respeito, em nada releva para a apreciação do thema decidendo, os elementos que possam constar da sociedade LOO(...), porquanto o que aqui releva são (i) os recebimentos da Recorrente em território português e (ii) a proveniência desses valores e a que título foram feitos (cfr. pontos 5 a 20), 22) e 58) da factualidade provada).
U) Impunha-se ao Tribunal a quo ter dado, também, como provados (pelo menos, os pontos B) e C) da matéria identificada na sentença recorrida como correspondendo a matéria de facto não provada (a fls. 57 da sentença recorrida).
V) Considerando o recibo de quitação que integra fls. 74 do processo físico (vide ponto 21) da matéria de facto dada como assente), impunha- se ao Tribunal a quo ter dado como provado que “A Recorrente pagou à sociedade de direito angolano “Loo(...), S.A.” a importância mutuada nos termos do contrato de mútuo mencionado no ponto 58) da factualidade provada".
W) Deveria, também, o Tribunal a quo ter dado como provado que “Os cheques mencionados nos pontos 5) a 20) da factualidade assente resultaram do contrato de mútuo mencionado no 58) da factualidade provada”, como, aliás, resulta dos seguintes elementos probatórios:
• Cheques e comprovativos de depósito, de fls. 17, 16/verso, 18/verso e 19, fls. 78, fls 20, fls 78/verso, fls. 21/verso e 22, fls. 79, fls. 23, fls. 79/verso, fls. 24/verso e 25, fls. 80, fls 26, fls. 80/verso, fls. 27/verso, 28 e fls. 81 do processo físico (vide pontos 5) a 20) da matéria de facto provada);
• Elementos que permitem atestar os registos contabilísticos feitos na sociedade comercial denominada LIVRE (...), de fls. 164 a 167 do processo físico (vide ponto 22) da matéria de facto provada);
• Contrato de mútuo junto com a PI (vide ponto 58) da matéria de facto provada).
X) Por outro lado, a conclusão extraída pelo Tribunal a quo, relativamente à incompetência territorial para tributação, não respeita os preceitos legais em vigor, uma vez que aquele enquadramento só seria possível se o rendimento em causa fosse de origem nacional - o que não corresponde à realidade - e se o sujeito passivo em causa fosse residente fiscal em Portugal - o que não se encontra em crise (cfr. ponto 1) da matéria de facto provada), pelo que sempre se teria de recorrer às normas internas de Direito Angolano e às normas internacionais para resolver o litígio apresentado.
Y) Nos termos da Convenção entre a República Portuguesa e a República de Angola para Eliminar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e Prevenir a Fraude e a Evasão Fiscal (“Convenção para Eliminara Dupla Tributação Portugal-Angola"), em vigor desde 22-09-2019, este rendimento poderá, em princípio, ser enquadrado como “outros rendimentos”, uma vez que não existe uma norma específica para os incrementos patrimoniais.
Z) Os montantes em análise não são enquadráveis na norma da Convenção para Eliminara Dupla Tributação Portugal-Angola, no que, em concreto, se reporta às mais - valias (artigo 13.°, da Convenção para Eliminar a Dupla Tributação Portugal-Angola).
AA) E mesmo que assim não se entendesse, sempre esta hipotética mais-valia recairia no n.° 5, do artigo 13.°, que prevê a regra supletiva.
BB) Ademais, tais rendimentos seriam tributáveis na esfera jurídica do alienante e não na do seu beneficiário, como é qualificada a Recorrente, pelo que a tributação deste rendimento pelo Estado português e na esfera da Recorrente estaria, também por esta via, afastada. 
CC) Em todo o caso, o rendimento em causa não preenche os requisitos para ser...

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