Acórdão nº 17/09.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 13-09-2023

Data de Julgamento13 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão17/09.0BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I – RELATÓRIO

Vem a Autoridade Tributária e Aduaneira interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por N....... e R......., com referência à liquidação de IRS de 2006 bem como ao indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra essa liquidação no montante de € 19.305,52.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“I- Visa o presente Recurso reagir contra a douta Sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada pelos ora Recorridos e, que mandou anular parcialmente a liquidação na parte correspondente ao excesso na determinação da matéria tributável do imposto, bem como anular parcialmente a decisão de reclamação graciosa, por falta de fundamentação quanto ao pedido, nessa sede, de consideração na determinação da mais-valia de despesas incorridas nas operações de alienação o aquisição dos imóveis, bem como o direito a juros indemnizatórios.
II- A decisão ora recorrida deu como provados os factos constantes do nº 1. a 11. da matéria de facto da Sentença.
III- Refere o tribunal “a quo” «formou-se jurisprudência reiterada do STA no sentido de que, o n ° 2 do art. 43.° do Código do IRS, ao limitar a residentes em território nacional, para efeitos de determinação da matéria tributável em IRS, a redução de 50% do saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas em cada ano é incompatível com o referido art. 56º do Tratado CE».
V- «Razão pela qual o acto tributário que aplica o referido art 43 ° n.° 2 do CIRS enferma do vicio de violação do supra citado normativo, o que consubstancia ilegalidade, que justifica a sua anulação na medida do excesso, nos termos do disposto no art 135 ° do Código do Procedimento Administrativo».
VI- Por via da Lei n.° 67-A/2007 de 31 de Dezembro (Orçamento de Estado para 2008), procurou obviar a esse tratamento de favor dos não residentes comunitários e do espaço económico europeu que obtivessem em Portugal mais-valias imobiliárias, permitindo-lhes a opção pela tributação desses rendimentos em condições similares às aplicadas aos residentes em Portugal (cfr. o aditamento ao art. 72.° do CIRS, nomeadamente nos seus números 7 e 8.
VII- Ora, a liquidação de IRS n.° ……..32 no montante de € 19.305.52, que está subjacente à presente decisão foi emitida pelos Serviços em 04/08/2007. ou seja, em data anterior ao Acórdão do TJCE de 11 de Outubro do 2007 (Processo C-443/06) que veio a considerar que o art. 43.°, n.° 2 do CIRS violava o art. 56.° do TCE e. consequentemente, também, em data anterior à publicação da Lei n.° 67 - A/2007 de 31 de Dezembro.
VIII- Pelo que na liquidação de IRS em crise não se vislumbra a existência de qualquer erro de facto ou de direito praticado pelos serviços, uma vez que o TJCE só emitiu pronúncia em data posterior à liquidação.
IX- Do supra exposto resulta que não deve ser reconhecido aos impugnantes o direito ao pagamento dos juros indemnizatórios peticionados, uma vez que, o direito a juros indemnizatórios previsto no n.° 1 do art. 43.° da LGT, derivado de anulação judicial de um acto do liquidação, depende de ter ficado demonstrado no processo que esse acto está afectado por erro - sobre os pressupostos de facto ou de direito - imputável aos serviços, de que tenha resultado pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
X- Ora, no caso ‘sub judice" não são devidos juros indemnizatórios, por não se apurar a existência de erro imputável à AT sobre os pressupostos de facto e de direito do acto do liquidação.
XI- Já no que se refere ao sentenciado, nomeadamente que o acto de reclamação graciosa está, pois, inquinado do vicio de forma invalidante por falta de fundamentação, cumpre referir que, estabelece o art. 77° da LGT que «A decisão do procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram (...) (nº 1). »
XII- A fundamentação dos actos tributários deve conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e a quantificação dos actos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.
XIII- Conclui-se, portanto, pelo cumprimento do dever de fundamentação, quer quanto ao acto de liquidação, quer quanto ao acto de determinação do imposto, uma vez que a fundamentação observada pela AT observou todos os requisitos legais.
XIV- Pelo que, decidindo como foi efectivamente decidido, é convencimento da Fazenda Pública que a douta sentença incorreu em erro de julgamento sobre a matéria do facto e de direito, consubstanciando este em errada interpretação e aplicação das normas legais já citadas e da “ratio legis” que as fundamentam, violando o disposto no art. 43,°. n.° 2 do CIRS, devendo por esse motivo ser anulada e substituída por outra que aprecie o mérito da causa.

Nestes termos, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência a douta sentença ora recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo por Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA.
* * *
Os Recorridos apresentaram alegações formulando as seguintes conclusões:

A - Deverão as presentes contra-alegações ser admitidas, por tempestivas, nos termos do disposto no artigo 282.°, nº 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
B - Entende a Fazenda Pública que a Sentença Recorrida enferma de vício, porquanto "(...) à data dos factos a legislação fiscal nacional previa uma limitação da tributação a 50% das mais valias realizadas, apenas, para os residentes em Portugal, e não para os não residentes (...)" e "(...) a liquidação de IRS nº …….32 no montante de € 19.305,32, que está subjacente à presente decisão foi emitida pelos serviços em 04/08/2007, ou seja, em data anterior ao Acórdão do TJCE de 11 de Outubro de 2007 (...) pelo que na liquidação de IRS em crise não se vislumbra a existência de qualquer erro de facto ou de direito praticado pelos serviços, uma vez que o TJCE só emitiu pronúncia em data posterior à liquidação".
C - Ademais, entende a Fazenda Pública que inexiste falta de fundamentação, porquanto foram cumpridos todos os requisitos do art. 77º da LGT, i.e. "A fundamentação dos actos tributários deve conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e a quantificação dos actos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo", pelo que, conclui a Fazenda Pública que “(...) a douta sentença incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito, consubstanciando este em errada interpretação e aplicação das normas legais já citadas e da ratio legis que as fundamentam, violando o disposto no art. 43º, nº 2 do CIRS, devendo por esse motivo ser anulada e substituída por outra que aprecie o mérito da causa".
D - Porém, os Recorridos, convictos da razão que lhes assiste, não podem concordar com as alegações de recurso apresentadas pela Fazenda Pública da Douta Sentença. Senão vejamos:
E - A norma em crise (Art. 43º, nº 2 do CIRS) era, efectivamente, ilegal - por violação do direito comunitário - desde a sua entrada em vigor. Ora, o facto da declaração de ilegalidade da norma ter ocorrido apenas em 11/10/2007 não significa - conforme pretende a Fazenda Pública - que a sua ilegalidade apenas produza efeitos com a sua declaração.
Ademais,
F - Importa ter presente que uma norma com a redacção - então vigente - do artigo 43º do CIRS era ilegal não por força da declaração de ilegalidade do TJUE, mas sim, por violação do Art. 56º do TCE.
Sem conceder,
G - Conforme se refere, entre outros, no Acórdão Santander Asset Management SGIIC, SA (Processos apensos C-338/11 e C-347/11, datado de 10/05/2012), a decisão de TJUE sobre a compatibilidade de uma determinada norma com o Direito da União é, também, aplicável "(...) às relações jurídicas surgidas e constituídas antes de ser proferido o acórdão que decida o pedido de interpretação (...)" (vide, considerado 58).
Ademais,
H - É possível ao TJUE limitar no tempo os efeitos de um determinado Acórdão, porém, conforme se refere no Acórdão supra citado, "Só a título excepcional é que o Tribunal de Justiça pode, em aplicação do princípio geral da segurança jurídica inerente à ordem jurídica da União, ser levado a limitar a possibilidade de qualquer interessado invocar uma disposição por si interpretada para pôr em causa relações jurídicas estabelecidas de boa fé" (considerando 59 dos Processos apensos C-338/11 e C-347/11).
Porém,
I - Tal limitação temporal, indubitavelmente, não foi aplicada, no Acórdão Hollmann (Processo C-443/06, datado de 11/10/2007) - i.e. a decisão invocada pelo TT de Lisboa para fundamentar a sua decisão - desde logo, porque não se encontravam reunidos os requisitos para a sua aplicação.
Sem conceder,
J - A Fazenda Pública refere que inexiste falta de fundamentação, porquanto foram cumprimentos todos os requisitos do art. 77° da LGT, i.e. "A fundamentação dos actos tributários deve conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e a quantificação dos actos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo".
Sucede, porém, que,
K - O cumprimento do dever de fundamentação não se limita à indicação das despesas legais, qualificação e quantificação. Efectivamente, conforme se refere na Sentença ora recorrida a Autoridade Tributária "(...) não esclarece minimamente os impugnantes dos motivos por que a administração tributária assim entende, qual o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido na prática do acto" (cfr. fl. 8 da Sentença recorrida).
Ademais,
L - Em conformidade com Acórdão proferido em 22/01/2013, pelo Tribunal Central Administrativo - Sul, no âmbito do Processo n.° 06048/12, a "(...) fundamentação do acto tributário (...) constitui uma garantia específica dos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT