Acórdão nº 1699/20.7T8MTS.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-03-14

Data de Julgamento14 Março 2022
Ano2022
Número Acordão1699/20.7T8MTS.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 1699/20.7T8MTS.P1
Origem: Comarca Porto-Matosinhos-Juízo Trabalho – J3
Relator - Domingos Morais – Registo 938
Adjuntos - Paula Leal Carvalho
Rui Penha

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

IRelatório
1. - AA intentou a presente acção declarativa com processo comum na Comarca de Porto-Matosinhos-Juízo Trabalho-J3, contra
BB e CC, nos autos identificados, alegando, em resumo, que:
Em dezembro de 2008 foi admitida ao serviço dos réus, como trabalhadora doméstica, para exercer as funções na casa de morada de família dos réus, mediante uma retribuição mensal que em 2019 ascendia a €650,00; e que em Setembro de 2019 a ré mulher a despediu, mandando-a embora de casa, por ter ficado desagradada pelo modo como executou suas funções. Mais alegou que com a conduta dos réus se sentiu maltratada, humilhada e desrespeitada.
Terminou, concluindo: “deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e em consequência, declarando-se ilícito o despedimento da autora, trabalhadora, devem os réus serem condenados a reconhecer e/ou a pagar à autora o seguinte:
a) A pagar à autora a quantia de 130,20€, a título de subsídio de natal do ano de 2019, remanescente ainda em falta.
b) A pagar à autora a quantia de 1,516,66€ a título de prejuízos e danos patrimoniais sofridos com a privação das retribuições dos meses de Fevereiro e Março de 2020 e respetiva quota parte de subsídio de férias e subsídio de natal.
c) A pagar à autora a quantia de 758,33€ (650,00€ x14:12) por cada mês, a título de prejuízos e danos patrimoniais sofridos com a privação das retribuições dos meses de Abril de 2020 e respetiva quota parte de subsídio de férias e subsídio de natal até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, que é o equivalente ao que autora teria direito a receber a título de retribuições, incluindo férias, subsídio de férias e subsídio de natal e que auferiria se não fosse despedida, até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, sendo este final apontado por razões de equivalência os demais contratos de trabalho e por razões de equidade.
d) A pagar à autora a quantia de 650,00€ a título de férias adquiridas em 01.01.2020 reportados ao ano de trabalho de 2019.
e) A pagar à autora a quantia de 650,00€ a título de subsídio de férias adquiridas em 01.01.2020 reportados ao ano de trabalho de 2019.
f) A pagar à autora a quantia de 162,51€ a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, relativamente ao mês de Janeiro de 2020, na proporção de 1/12 avos para cada um dos mencionados proporcionais, correspondendo 54,17€ proporcionais de férias, 54,17€ proporcionais de subsídio de férias e 54,17€ proporcionais de subsídio de natal.
g) A pagar à autora a quantia de 15.600,00€ [650,00€ (remuneração base) x 12 (11 anos de serviço e 1 mês) = 7.800,00€ x 2 = 15.600,00€] a título de indemnização devida pelo despedimento ilícito e doloso.
h) A pagar à autora a quantia de 5.000,00€, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais.
i) A ré mulher ser condenada a efetuar os pagamentos à Segurança Social de todas as contribuições relativas à autora, nas taxas legais respetivas sobre o valor da retribuição da autora, até à data do despedimento, assim como todos e quaisquer outros pagamentos que se mostrem devidos à Segurança Social relativamente à relação laboral aqui em causa.
j) A pagar à autora os juros vencidos e vincendos, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento.”.
2. – Frustrada a conciliação na audiência de partes, os réus contestaram, impugnando a factualidade alegada pela autora e afirmando ter sido a autora quem se despediu.
Terminou, concluindo: “deve a presente contestação ser julgada provada e procedente e os Réus absolvidos dos pedidos.”.
3. - Foi proferido despacho saneador e fixado o valor da acção em € 23.709,37.
4. – Realizada a audiência de discussão e julgamento e decidida a matéria de facto, a Mma Juiz proferiu decisão:
julgo parcialmente procedente o pedido formulado pela autora, pelo que:
a) condeno os réus no pagamento à autora da quantia de €464,79, a título de proporcionais de retribuição de férias referente ao ano da cessação do contrato de trabalho, acrescido de juros de mora vencidos no montante de €6,93;
b) absolvo os réus dos demais pedidos formulados pela autora.”.
5. – A autora apresentou recurso de apelação, concluindo, após convite de aperfeiçoamento:
………………………………
………………………………
………………………………
Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que condene os réus nos pedidos formulados pela autora, assim, concedendo provimento ao presente recurso V. Exºs farão, como sempre, inteira e sã JUSTIÇA.
6. - Os réus contra-alegaram, concluindo: “deve ser negado provimento ao recurso e em consequência ser a Douta Sentença Confirmada”.
7- O M. Público, junto deste Tribunal, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
8. - Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. - Fundamentação de facto
1. - Na 1.ª instância foi proferida a seguinte decisão sobre a matéria de facto:
Estão provados os seguintes factos:
1. A autora é trabalhadora e empregada de serviços domésticos na casa de morada de família e habitação dos réus, onde presta os referidos serviços domésticos, sita na ..., n.º ..., ..., Matosinhos.
2. A ré mulher é a pessoa individual que tem o seu contribuinte e NISS associado à Segurança Social enquanto empregador e entidade patronal da autora.
3. Os réus são casados em regime de bens diferente da separação de bens, vivem em comum e em economia comum na mesma casa e habitação onde a autora trabalha como empregada de serviços domésticos.
4. A autora é, assim, empregada de serviços domésticos na casa de morada de família e habitação dos réus, sendo que estes beneficiam enquanto casal dos serviços domésticos prestados pela autora.
5. O contrato de trabalho de serviço doméstico celebrado com a autora foi negociado, é do conhecimento e do consentimento do casal, aqui réus, aliás cujos pagamentos à autora do respetivo vencimento é pago pelas contas comuns do casal e, na sua maioria das vezes, pelo punho do réu marido.
6. Na data de 10 de dezembro de 2008 e com inicio nessa data de 10 de dezembro de 2008, autora e réus acordaram verbalmente que a autora assumia as funções de empregada doméstica dos réus.
7. Autora e réus acordaram numa retribuição/remuneração mensal fixa ou certa que, atualmente e no ano de 2019 era de €650,00 por mês.
8. A autora não recebia qualquer quantia pecuniária a título de subsídio de refeição, mas almoçava e lanchava em casa dos réus.
9. A autora em 18 de Setembro de 2019 encontrava-se ao serviço dos réus e a prestar regularmente o seu trabalho e tarefas de serviços domésticos, conforme orientações e instruções destes.
10. A autora em 19 de setembro de 2019 iniciou um período de Incapacidade Temporária para o Trabalho por doença natural e incapacitante para a sua actividade profissional e que perdurou de forma ininterrupta até, pelo menos, 21/3/2020.
11. Neste período de Incapacidade Temporária para o Trabalho a autora foi intervencionada cirurgicamente em 08.02.2020 para Artrodese L4 e L5 PL instrumentada + laminectomia, por espondilolistese L4-L5.
12. Os documentos comprovativos das baixas médicas foram entregues pessoalmente pelo marido da autora, DD, que, também, trabalha para os réus e na habitação dos réus, sita na ..., n.º ..., ... ....
13. Por carta datada de 13 de dezembro de 2019, enviada pela ré mulher à autora a 18/12/2019 e de novo a em 31/1/2020 (por não ter sido anteriormente rececionada) e recebida pela autora em 3/2/2020, sob o assunto “Liquidação Créditos Laborais e aceitação de demissão.”, a ré mulher comunicou à autora o seguinte:
Venho por este meio enviar o pagamento de todos os seus créditos laborais em virtude da demissão que me comunicou no dia 19 de setembro de 2019. Uma vez que até à presente data não voltou ao local de trabalho nem se retractou perante a minha pessoa, informo desde já que considero quebrada a confiança que existia entre nós e pilar fundamental para a relação laboral”.
14. Anexou e juntou, à aludida missiva, um cheque do Banco ..., com o n.º ....., datada do 16/12/2019, assinado pela ré mulher e com o montante inscrito de €1.559,40.
15. A autora, através de mandatário a quem incumbiu de responder à referida carta da ré mulher, por carta datada de 10/2/2020, enviada no mesmo dia por correio registado com aviso de receção, e recebida pela ré mulher em 13/2/2020, comunicou à ré mulher, o seguinte:
“(…)
A minha representada estranha, não compreende e não aceita o conteúdo da aludida carta, sendo que apenas não conseguiu (ainda) descortinar se tal conteúdo é apenas um mero lapso e equívoco ou se é má fé de V. Exª, sendo que no caso de mero lapso poderá ser corrigido, se não o for, então será má fé de V. Exª, que pela criação de um conteúdo falso serão pedidas todas as responsabilidades a V. Exª.
A minha cliente e representada nunca comunicou a V. Exª qualquer demissão, nem em 19 de Setembro, nem em qualquer outra data.
A minha cliente e representada desde que deixou de comparecer ao trabalho foi por motivo exclusivo de doença, estando em situação de baixa médica, incapacidade temporária por doença, situação e certificados de incapacidade por doença que sempre foram comunicados e entregues a V. Exª, pelo marido da minha cliente que, também, é trabalhador de V. Exª.
Aliás, situação de incapacidade que culminou com chamada da minha representada para cirurgia em estabelecimento hospitalar.
E, sempre com o único intuito de quando cessar a incapacidade por doença a minha representada regressar ao trabalho.
A carta e o conteúdo da mesma é tão falso que a vossa carta apresenta incongruências, pois refere
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT