Acórdão nº 16892/22.0T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 21-11-2023

Data de Julgamento21 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão16892/22.0T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 16892/22.0T8PRT.P1

Relatora: Anabela Andrade Miranda
Adjunta: Anabela Dias da Silva
Adjunta: Ana Lucinda Cabral
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Sumário
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I—RELATÓRIO
AA e BB propuseram a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra “A..., Lda.”, pedindo que se declare a caducidade do contrato de arrendamento celebrado entre as partes, com efeito desde o dia 16 de Abril de 2022, bem como se condene a ré a desocupar o imóvel locado, entregando-o às autoras livre de pessoas e bens, e no pagamento da quantia de 4.520,00€ e da quantia de 1.600,00€ por mês desde o mês de Outubro de 2022 até efectiva entrega do imóvel.
Alegaram, para tanto, ter celebrado com a ré um contrato de arrendamento destinado a comércio pelo prazo de cinco anos, renovável por iguais e sucessivos períodos, com início no dia 17 de Abril de 2017 mas que, tendo-se oposto à renovação do contrato com a antecedência legalmente exigida, a ré não restituiu o imóvel locado, tendo, por isso, vindo as autoras a imputar as quantias pagas pela ré desde a data que sustentam ter o contrato cessado no valor devido a título de indemnização pela mora no cumprimento da obrigação de entrega. Sustentaram a sua posição na interpretação do art. 1110.º, n.º4, do Código Civil, na redacção introduzida pela Lei n.º13/2019, de 12 de Fevereiro, com referência à ratio legis que defenderam ser a de impor a duração mínima de cinco anos do contrato.
A ré contestou invocando uma diferente interpretação da mesma disposição legal, prevalecendo-se do argumento literal e da diferente redacção dada pelo mesmo diploma ao paralelo art. 1093.º, n.º3, do Código Civil relativo ao regime do arrendamento para habitação e defendendo, em suma, que o prazo de cinco anos não se refere ao período mínimo do contrato mas a um prazo em que ao senhorio está vedado de exercer o acto jurídico (a emissão da declaração) apto a exercer o direito de oposição à renovação do contrato.
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Proferiu-se sentença que julgou a acção procedente, e em consequência, declarou cessado o contrato de arrendamento celebrado entre as partes em 17 de Abril de 2017 relativo à fracção designada pela letra “B”, correspondente a uma loja com entrada pelo n.º... do prédio sito na rua ..., no Porto, identificado como inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., condenou a ré a restituir à fracção identificada às autoras e no pagamento de 4.520,00€, bem como de 1.600,00€ por mês desde Outubro de 2022 (inclusive) até à efectiva entrega do imóvel.
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Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso finalizando com as seguintes
Conclusões
1-Com a celebração do Contrato de Arrendamento, a Recorrente pagou às Recorridas 750,00€ Euros, para pagamento imediato da renda respeitante ao mês de Junho de 2017 e a importância de 750,00€ Euros a titulo de garantia, quantia esta que teria que ser devolvida no ato da entrega do Imóvel, encontrando-se este em boa condição de conservação.
2-O senhorio num contrato de arrendamento urbano para fins não habitacionais a termo certo só pode opor-se à renovação desse contrato depois de decorridos cinco anos após o início de vigência do mesmo, em virtude da aludida norma legal imperativa do n.º 4 do artigo 1110.º do Código Civil.
3-O Contrato de Arrendamento não tinha cessado a sua vigência em 16 de Abril de 2022, mas antes tinha-se renovado automaticamente por um período igual e sucessivo de cinco anos, com início em 17 de abril de 2022.
4-A Recorrente não procedeu à restituição do Imóvel em Abril de 2022 e continuou a ocupá-lo legitimamente como arrendatária, utilizando-o para as finalidades previstas no Contrato de Arrendamento e pagando tempestivamente a renda mensal devida com o valor ilíquido de 800,00 (oitocentos) euros, devendo as Recorridas emitir as faturas correspondentes.
5-Agindo de boa fé com base na transacção negociada que estava em conclusão com as Recorridas, mantendo a sua palavra – no dia 10 de Fevereiro de 2023 a Recorrente devolveu o Imóvel em bom estado de conservação e procedeu à devolução das respectivas chaves às Recorridas.
6-A Recorrente apenas devolveu o Imóvel porque tinha preparado essa devolução e a transferência do seu estabelecimento comercial para outra loja, com base na iminente conclusão de uma transacção judicial com as Recorridas, não porque concordasse com esse desfecho ou com o sentido da douta sentença recorrida.
7-O termo do contrato de arrendamento não habitacional em apreço com efeitos em 16 de Abril de 2022 só poderia acontecer se o senhorio pudesse deduzir oposição à renovação durante os primeiros cinco anos de vigência do contrato. O que é expressamente proibido pela norma do artigo 1110.º n.º 4 do Código Civil.
8-Não pode o intérprete afirmar que “o que decisivamente põe termo ao contrato é o decurso do prazo”, quando o legislador impõe expressamente que “o contrato celebrado por prazo certo renova-se automaticamente no seu termo” e que o senhorio não se pode opor à renovação naquele período inicial.
9-A oposição à renovação imposta pelas Recorridas foi manifestamente ilegal e carecia de fundamentação legal para o efeito.
10-A douta sentença recorrida fez incorreta valoração e interpretação da norma constante do n.º 4 do artigo 1110.º do Código Civil, devendo esta ser interpretada como restringindo o direito de realizar uma acção - de oposição à renovação pelo senhorio no contrato de arrendamento urbano para fins não habitacionais, nos cinco primeiros anos após o início do contrato, independentemente do prazo estipulado.
11-Não pode o intérprete interpretar esta norma e aplicá-la com o mesmo teor do artigo 1097.º n.º do Código Civil, que limita no tempo o efeito legal de qualquer acção de oposição à renovação, mas não restringe o direito de realizar essa acção.
12-Foi intenção do legislador que a interpretação das duas normas citadas deverá resultar em aplicações e cominações diferenciadas – uma das quais limitando um efeito no tempo e a outra restringindo no tempo a possibilidade de realizar uma acção.
13-O intérprete não pode desconsiderar esse sentido e inverter a lógica normativa por não concordar com a mesma e aplicar a norma com um sentido diverso do que está estatuído na norma.
14-No caso sub judice (a) a oposição à renovação feita pelas Recorridas nunca poderia ter sido realizada antes de 16 de Abril de 2022 inclusive
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