Acórdão nº 1671/18.7T8FIG-B.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 30-05-2023

Data de Julgamento30 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão1671/18.7T8FIG-B.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DA FIGUEIRA DA FOZ DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA)

Relator: Emídio Francisco Santos
1.ª Adjunta: Catarina Gonçalves
2.ª Adjunta: Maria João Areias


Processo n.º 1671/18.7T8FIG-B.C1

Acordam na ... Secção Cível do Tribunal da Relação ...

AA, residente na rua ..., ..., ..., ..., requereu contra BB, residente em 16 ..., 45100, ..., ..., no Juízo de Família e Menores ... do tribunal de Comarca ..., a alteração da regulação das responsabilidades parentais dos menores CC e DD, pedindo que os mesmos ficassem à guarda e cuidados da requerente, em Portugal, sem prejuízo do convívio com o pai, supervisionado por técnicos competentes.

O pedido foi deduzido ao abrigo do artigo 13.º da Convenção sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, concluída em ..., em 25 de Outubro de 1980.

Para o efeito alegou em síntese:
1. A requerente e requerido, ambos de nacionalidade portuguesa, são os progenitores dos menores, os quais têm residido em ... desde Agosto de 2013, primeiro e até 2015 em coabitação com o pai e com a mãe, depois, só com a mãe até ao Verão de 2018 e, a partir de Novembro de 2018 e até Julho do corrente ano, apenas com o pai;
2. Neste momento encontram-se em Portugal com a requerente e, não querem regressar a ... e à guarda e cuidados do pai;
3. Em 8/10/2017, o Tribunal de Grande Instância ... decidiu que o exercício das responsabilidades parentais caberia em conjunto a ambos os progenitores, sobre as questões de particular importância para a vida dos filhos - educação e orientação profissional, saídas do território nacional, religião, saúde, autorização para a prática de desportos perigosos - e fixou definitivamente a residência dos menores com a mãe e regulou o regime de convívios com o pai;
4. O requerido requereu em ... a alteração da regulação das responsabilidades parentais, no sentido de lhe ser atribuída a guarda exclusiva dos menores e fixada a residência dos mesmos no seu domicílio;
5. A aqui requerente contestou o pedido do progenitor e pediu, entre o mais, que fosse determinado o exercício conjunto das responsabilidades parentais dos menores e que fosse fixada a residência dos mesmos no domicílio dela em Portugal, sem prejuízo das visitas e convívios com o pai;
6. Os menores estão a passar férias com a mãe em Portugal, desde o dia .../.../2023 e deveriam ter sido entregues ao pai em 1de Agosto;
7. Apesar de estarem muito felizes por estarem com a mãe, os menores estão muito ansiosos, nervosos e receosos com o seu regresso a ... e à companhia do pai e recusaram-se a ir embora, implorando à requerente para que não os leve;
8. A Requerente não levou as crianças de regresso a ..., porque estas se recusaram a ir;
9. Existe o risco grave dos menores, no seu regresso a ... e à guarda do pai, ficarem sujeitos a perigos de ordem física e psíquica intoleráveis;
10.No superior interesse dos menores que impedir que os menores regressem à guarda e companhia do pai, em ..., onde correm risco sério quer quanto à sua integridade física, quer mental e que aos mesmos fiquem à guarda e cuidado da mãe, em Portugal, com quem se sentem seguros e tranquilos, regulando-se aqui o exercício das responsabilidades parentais.

A Meritíssima juíza do tribunal a quo julgou o tribunal português internacionalmente incompetente e, em consequência, absolveu o requerido da instância.

Justificou a decisão dizendo:
1. Que as crianças residiam em ...;
2. Que o seu regresso a ... já havia sido determinado no âmbito do processo n.º 1671/18.... (regresso na sequência da retenção ilícita ao abrigo da Convenção de ... de 1980 e do Regulamento (CE) n.º 2201/2033;
3. Que a questão da competência era regulada pelo Regulamento (CE) n.º 2201/2033, de 27 de Novembro;
4. Que a competência internacional pertencia ao Estado-Membro da residência habitual da criança, com referência à data da instauração do processo;
5. Que a norma invocada pela requerente não se aplicava à presente situação;
6. Que as considerações tendo em vista o não regresso das crianças a ... apenas podiam se deduzidas no processo de entrega dos menores a ...;
7. Que a competência internacional pertencia aos tribunais franceses;
8. Que as excepções previstas no Regulamento à regra da residência habitual da criança não se verificavam no caso;
9. Que a autora também não justificava a atribuição da competência aos tribunais portugueses com base no artigo 62.º, alínea c), do CPC.

A requerente não se conformou com a decisão e interpôs o presente recurso de apelação, pedindo se revogasse e substituísse a decisão recorrida por outra que julgasse o tribunal recorrido internacionalmente competente para julgar a causa.

Os fundamentos do recurso expostos nas conclusões consistiram na imputação à decisão recorrida da violação do disposto no artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa, no artigo 1.º, n.º 2 e artigo 12.º, n.º 1 al. al a), do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, e no artigo 13.º da Convenção da ... de 1980, de 25 Outubro de 1980, e ainda nos artigos 6.º, 59.º e 547.º do CPC (por remissão do art.º 33º, nº 1, do RGPTC).

Esta imputação assentou, em síntese, na seguinte alegação:
1. Que o tribunal a quo era internacionalmente competente para julgar a acção ao abrigo do disposto no artigo 12.º, n.º 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro de 2003;
2. Que sendo o tribunal a quo competente, ao abrigo do artigo 13.º da Convenção de ... de 25 de Outubro de 1980, para recusar o regresso das crianças ao país da residência da criança, caso exista "um risco grave de a criança, no seu regresso, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, a ficar numa situação intolerável", e/ou se a criança, com idade e maturidade para que as suas opiniões sejam consideradas, se opuser ao regresso, por maioria de razão, também é competente para alterar a regulação das responsabilidade parentais da criança que resida noutro estado contratante, in casu a ..., onde se encontra em perigo de ordem física e/ou psíquica ou para onde a criança se recusa a regressar;
3. Que foram alegados factos que, a provarem-se, indicavam com clareza que as crianças tinham ligação particular com Portugal, que, em ..., junto do pai, a saúde física e psíquica dos menores corria perigo e que o superior interesse das duas crianças era conseguido com a sua residência em Portugal e a viverem com a mãe, pelo que só após a produção da prova podia saber se era ou não competente para decidir o pedido formulado;
4. Que estando já nos autos, à data da sentença, o pedido para que o Tribunal ordenasse o regresso dos menores a ..., deveria o Tribunal recorrido fazer uso do disposto nos artigos 6.º e 547.º do CPC, na tramitação desse pedido, admitir a produção da prova oferecida pela requerente e decidir se estão ou não preenchidos os requisitos do artigo 13.º da Convenção da ... de 1980, de 25/10, que confere competência ao Tribunal a quo para o caso de se provarem os factos alegados pela requerente.

O Ministério Público respondeu ao recurso, sustentando a manutenção da decisão recorrida.

Para o efeito alegou em síntese:
1. Que no que diz respeito à competência internacional dos Tribunais portugueses para conhecerem das questões suscitadas pela presente acção, havia que atender ao Regulamento (CE) nº 2201/2003 do Conselho da União Europeia, de 27 Novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental;
2. Que nos termos do artº 8.º, nº 1, do citado Regulamento “os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data em que o processo seja instaurado no tribunal”.
3. Que as crianças têm a sua residência habitual em ..., dominam a língua francesa estavam a frequentar a escola em ..., foi aí que foi regulado o exercício das responsabilidades parentais e foi também em ... que lhes foi instaurado um processo de promoção e de proteção, onde foram sujeitas a medida protetiva.
4. Que no caso presente não deve ter lugar a regra da ”extensão da competência” resultante do artº 12º, nº 3, al. a) do Regulamento, pelo simples facto dos menores serem de nacionalidade portuguesa, porque as citadas regras de proximidade e do superior interesse da criança ditam que sejam os tribunais franceses os competentes internacionalmente para conhecer das questões da presente demanda e os melhor posicionados para aferirem da pretensão da Requerente e encetarem as diligências tidas por necessárias para esse efeito.

O requerido, citado para os termos do recurso e da causa, não respondeu ao recurso.


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Questões suscitadas pelo recurso:

Saber se, ao julgar internacionalmente incompetente o tribunal a quo, a decisão recorrida violou as disposições legais indicadas pela recorrente e, em afirmativo, se deve ser substituída por decisão a julgar internacionalmente competente o tribunal a quo para julgar o pedido de alteração da regulação das responsabilidades parentais dos menores.


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Factos relevantes para a decisão do recurso
1. CC, nasceu a .../.../2007, sendo natural da freguesia ..., concelho ....
2. DD, nascida a .../.../2009, é natural da freguesia ..., concelho ....
3. Os menores são filhos de BB e de AA, ambos de nacionalidade portuguesa.
4. Os pais dos menores estão separados.
5. Os menores residem em 36 rue ... St. EE, ....
6. De acordo com a decisão do tribunal de Grande Instância ..., de 22-10-2019, os menores ficaram confiados ao pai, mas exercendo os pais em conjunto as responsabilidades parentais, tendo sido fixada a residência das crianças junto do pai em ... e estabelecido um regime de convívios com a mãe.
7. Os menores vieram em 4 de Julho do corrente ano a Portugal com a mãe, para passar férias, e deviam ter sido entregues ao pai em 1de Agosto;
8. A
...

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