Acórdão nº 1644/22.5T8VNG.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-20

Ano2024
Número Acordão1644/22.5T8VNG.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 1644/22.5T8VNG.P1- APELAÇÃO
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Sumário (elaborado pela Relatora):
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I. RELATÓRIO:

1. A..., Lda intentou ação declarativa de condenação com processo comum, contra B..., SA, peticionando a condenação da Ré a pagar à Autora a quantia de € 7.596,25 (sete mil quinhentos e noventa e seis euros e vinte e cinco cêntimos) acrescida de juros vincendos à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento, com todas as consequências legais, sendo que o montante global decomposto é o seguinte:

- € 6.119,14, por ter pago valores a que não estava obrigada por não existir qualquer prestação da Ré;

- € 1.012,66 (respeitante à nota de crédito ...) pois, não existe qualquer crédito efetivo para a compensar, sendo que tal montante respeita ao saldo de quilómetros a favor da Autora;

- € 464,45 a título de danos emergentes.

Como fundamento da referida pretensão, alegou em síntese que celebrou com a Ré um contrato-quadro de aluguer de veículos e de prestação de serviços, com início em 17/02/2017 e termo em 16/02/2021, mediante o qual a Ré se obrigou a proporcionar-lhe o gozo da viatura Ford (...), com a matrícula ..-SN-.. e a prestar os serviços de gestão de seguro, reparação de danos no veículo em caso de sinistro, manutenção, pneus, viatura de substituição, entre outros, contrato esse que a Ré incumpriu não lhe tendo proporcionado o gozo da viatura durante 90 dias em virtude de avaria apesar de nesse período lhe ter cobrado as rendas respectivas, assim como lhe cobrou valores alegadamente respeitantes a danos na viatura que não são imputáveis à Autora, assim como outros valores que não lhe são devidos, que foram pagos pela avalista a quem a Autora reembolsou desses valores.

Mais alegou que o incumprimento contratual da Ré causou-lhe um dano emergente de € 464,45, que aquela terá de ressarcir, tendo ainda direito a receber da Ré o saldo dos quilómetros a seu favor no montante de € 1.012,66.

2. A Ré deduziu contestação, defendendo que segundo o clausulado do contrato quadro apenas estava obrigada, no caso de avaria do veículo locado, a entregar um veículo de substituição durante 15 dias ou a suportar os correspondentes custos despesas, obrigação que cumpriu, sustentando que a Autora não estava desobrigada de pagar as rendas relativas ao período da reparação do veículo apesar de não o ter utilizado e, relativamente aos danos que o veículo apresentava quando regressou á sua posse, alegou que os mesmos são consequência do uso que lhe foi dado pela Autora, tendo direito a deles ressarcir-se através da caução paga inicialmente pela Autora.

Mais invocou a falta de dedução da excepção de não cumprimento do contrato, quer pela avalista, quer pela Autora, assim como o abuso de direito por parte desta para impedir o exercício do direito a que a Autora se arroga nesta ação.

3. Por requerimento de 26.04.2022, Ref Citius 4203398, a Autora respondeu à matéria da contestação, suscitando a nulidade da cláusula do contrato quadro de aluguer que estipula o pagamento das rendas mesmo que o veículo fique imobilizado sem culpa do locatário, ao abrigo do regime das cláusulas contratuais gerais (aprovado pelo Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro), por excessiva e abusiva à luz do exercício da liberdade contratual e do princípio da boa fé.

4. Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador, no qual foi fixado o objeto do litigio e enunciados os temas de prova, que não foi objecto de reclamação.

5. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“Nos termos e com os fundamentos expostos, decido julgar parcialmente procedente, por provada na mesma medida, a presente acção e, em consequência, decido:
1.- condenar a R.:
a)- a pagar à A. as importâncias de € 2.360,70 (dois mil, trezentos e sessenta euros e setenta cêntimos), € 337,29 (trezentos e trinta e sete euros e vinte e nove cêntimos) e de € 1.012,66 (mil e doze euros e sessenta e seis cêntimos);
b)- a pagar à A. o valor dos estragos na carroçaria ou na parte exterior da viatura objecto do contrato referido em 2) dos factos provados, com excepção dos riscos, assinalados no relatório de peritagem junto com a petição inicial como doc. 19, a determinar em sede de liquidação;
c)- a pagar os juros sobre as importâncias referidas nas als. a) e b), à taxa de juro comercial, desde a data da citação até integral pagamento;
2)- absolver a R. do demais peticionado pela A. .
Custas pela A. e R. na proporção dos respectivos vencimentos (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC), que se fixam provisoriamente em 25% e 75%.
Registe e notifique.”

6. Inconformada, a interpôs recurso de apelação da sentença final, formulando as seguintes

CONCLUSÕES
I - O presente recurso versa sobre matéria de facto e de direito, e incide sobre a sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância no âmbito do processo n.º 1644/22.5T8VNG, que correu os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Cível de V. N. de Gaia, Juiz 1, através da qual o Tribunal a quo julgou por parcialmente provada e procedente a acção, e, em consequência, decidiu condenar a Ré a pagar/restituir à Autora uma série de quantias, decisão essa que merece a nossa inteira censura.
II - Entende a Apelante que a sentença, ora em crise, padece de uma série de vícios que a inquinam de nulidade, nos termos do disposto nas alíneas b), c) e d), do n.º 1, do art. 615.º do CPC, bem como apresenta ainda, paralelamente, uma série de erros materiais e de direito que condicionam e tornam obscura e ambígua a sua fundamentação e respetiva decisão.
III - Em primeiro lugar, cabe referir que, na contestação que apresentou, a Recorrente suscitou uma série de questões de direito, que, em nenhum momento, foram alvo de pronúncia por parte do Douto Tribunal, nomeadamente: o Incumprimento da Autora quanto ao disposto na cláusula 19.ª do contrato, ao ter abandonado o veículo automóvel; Que tendo a avalista – legal representante da Autora - celebrado e outorgado o respetivo pacto de preenchimento de letra, competia-lhe invocar perante o sacador (ora Apelante) a exceção de não cumprimento do contrato, isto é, de não pagamento dos montantes em dívida; Abuso de direito da Autora, ao vir, após ter procedido à liquidação integral do valor vencido e cujo pagamento lhe foi exigido pela Ré, manifestar a sua discordância quanto aos valores e, ainda, exigir da Ré a restituição dos aludidos valores (artigos 70 a 89.º da contestação)
IV - Sucede que, apesar de tais questões de direito terem sido suscitadas pela Ré, na sua contestação, o Tribunal a quo não se pronunciou quanto às mesmas, o que torna a sentença nula, nos termos do disposto na alínea d), do n.º 1, do art. 615.º do CPC.
V – A sentença é, ainda, nula por omissão de pronúncia e, simultaneamente, excesso de pronúncia.
VI - É que a Autora, sem que o pudesse fazer, veio apresentar um requerimento anómalo (datado de 26/04/2022, com ref.ª 4203398), em que, invoca uma série de novas questões (não lhe foi dada alegadamente a oportunidade de negociar previamente as cláusulas contratuais gerais; nulidade das cláusulas contratuais invocadas na contestação e falta de comunicação e informação sobre o teor do contrato), requerimento esse sobre o qual o Tribunal não se pronunciou diretamente, tendo sido com surpresa que a Ré constatou, aquando da leitura da sentença, que não só o Tribunal não se pronunciou sobre a manifesta inadmissibilidade do requerimento anómalo apresentado pela Autora, que impunha o seu desentranhamento ou que se tivesse por não escrita toda a matéria que não se relacionasse com a impugnação de documentos, como também fez constar as nova questões do objeto do litígio e dos factos com alegado interesse para a decisão da causa.
VII - Omitiu por isso a pronúncia sobre a apresentação de um requerimento manifestamente infundado e inoportuno, atento o disposto no artigo 584.º do CPC, e ao fazê-lo, ao mesmo tempo, pronuncia-se em excesso sobre questões de facto e de direito sobre os quais não se podia pronunciar por as mesmas não serem de conhecimento oficioso. – Cfr. artigos 195.º e 615.º do CPC.
VIII - Mais, existe, ainda, uma questão de conhecimento oficioso, que deveria ter sido conhecida pelo douto Tribunal, noutro caso de nulidade de sentença por omissão de pronúncia, atento todos os elementos factuais constantes dos autos e até a própria matéria de facto dada por assente, e que implicava a absolvição parcial da Ré.
IX - É que conforme resulta do doc. 28-A junto na petição inicial, e do artigo 50.º da contestação, bem como consta dos factos provados 45, 46) e 48), com exceção do valor da caução prestada de 3.000,00€, todos os demais valores foram pagos por terceiro que não intervém na acção.
X - E quando nos referimos a demais valores, e conforme resulta do cruzamento do mencionado doc. 28-A (junto pela própria Autora na petição inicial), dos factos provados 46) e 48), facilmente se constata que os valores de renda referentes ao período de 1 de Janeiro a 16 de Fevereiro de 2021 (o valor parcial de 561,32€ com referência ao mês de Janeiro e 449,71€ referente aos 16 dias de fevereiro) de que pretende a devolução a Autora, bem como o valor de 337,29€ e ainda 421,71€, foram liquidados pela garante/avalista quando remeteu à Ré o cheque de 2.784,47€ para o efeito, não existindo, nos autos, qualquer prova/documento e/ou é sequer alegado que a Autora reembolsou a garante e/ou que esta exerceu o seu direito de regresso, ou tal sequer consta da matéria de facto dada por provada.
XI - Logo, não se confundido a Autora com a sua garante, por serem pessoas distintas e com personalidade jurídica distinta, facilmente se entende que não tinha, nem tem, a Autora legitimidade, para pedir a devolução daquilo que não foi por si pago, mas antes por um terceiro que consigo – jurídica e
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