Acórdão nº 1643/08.0TBOAZ-F.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-03-28

Data de Julgamento28 Março 2023
Ano2023
Número Acordão1643/08.0TBOAZ-F.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. nº 1643/08.0TBOAZ-F.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro
Juízo de Família e Menores de São João da Madeira


REL. N.º 760
Relator: Rui Moreira
Adjuntos: João Diogo Rodrigues
Anabela Andrade Miranda
*


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO


1 – RELATÓRIO
(Transcrição do relatório da sentença)

“Por apenso aos Autos de Processo de Execução nº 1643/08.1TBOAZ, veio AA propor a presente ação contra BB, ambos melhor identificados nos autos, peticionando a cessação da sua obrigação de alimentos a favor da Requerida, seu ex-esposa, no montante atual de €225,00 mensais.
Para tanto, alega, em síntese, que a Requerida deixou de precisar de quaisquer alimentos, não havendo qualquer razão para a sua manutenção, e que o próprio, por sua vez, não tem possibilidade de os prestar, sem grave desequilíbrio da sua situação financeira.
Foi efectuada a conferência a que alude o nº 3 do art.º 936º do C. P. Civil, em cuja qual não foi possível o acordo.
Em contestação pugna então a Requerida pela improcedência da ação, alegando, em síntese, continuar a necessitar de receber a prestação de alimentos para a sua subsistência, e pede a condenação do Requerente como litigante de má fé em multa e indemnização a seu favor em montante não inferior a €5.000,00.”
Instruído o processo, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, no termo da qual foi proferida sentença que julgou a acção procedente, declarando cessada a obrigação alimentar a cargo do aqui Requerente a favor da Requerida.
É desta decisão que vem interposto o presente recurso, que a requerida termina formulando as seguintes conclusões:
“1. O Tribunal "a quo" proferiu sentença que julgou procedente o pedido de cessação de alimentos a pagar à ex-cônjuge, aqui Recorrente, pelo Recorrido.
2. Não se conforma a Recorrente, tendo o presente recurso por objeto, a legítima pretensão à manutenção da pensão mensal de alimentos no valor de 225€, porquanto se encontra preenchido o critério de dupla proporcionalidade da necessidade de receber alimentos e da possibilidade de os pagar, nos termos dos artigos 2003º, 2004º e 2016º e 2016- A do Código Civil.
3. Verifica-se uma errónea decisão sobre a matéria de facto, nos termos do artigo 639° n°1 e 640° n°1 alíneas a), b) e c) do C.P.C, porque resultam dos elementos carreados para os autos, meios probatórios, em sede documental e testemunhal gravada, que impunha uma decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da recorrida.
4. O Digno Tribunal recorrido não considerou como matéria de facto provada, matéria essencial à boa decisão da causa, não tendo merecido sequer apreciação em sede de motivação de sentença:
5. Para decidir a primeira questão - "A) Está em causa saber se a Requerida tem agora possibilidades económicas de se bastar a si própria" - cfr, a fls. 11 da douta sentença, que consubstancia o critério da necessidade de alimentos, importava ao Tribunal avaliar e decidir ponderadamente, sobre os seguintes pontos relativos à Recorrente:
5.1 pensão de reforma
5.2 situação financeira do estabelecimento comercial
5.3. concessão do benefício do apoio judiciário
5.4. herança humilde
5.5. estado de saúde débil
o que não se verificou.
6. Em cumprimento do artigo 640 n° 1, alíneas a), a Recorrente especifica os CONCRETOS PONTOS DE FACTO QUE CONSIDERA INCORRETAMENTE JULGADOS:
6.1 Entende-se por incorreto a não inclusão da seguinte matéria alegada e provada:
33. A Requerida exercia a profissão de professora em Angola e deixou de a exercer para se dedicar ao negócio do extinto casal, "Galerias A...", desde a sua criação.
34.Os lucros provenientes das vendas do estabelecimento não cobrem as despesas mensais correntes em condomínio, água, luz, telefone e internet.
35. A Requerida beneficia de apoio judiciário na modalidade de isenção de taxa de justiça e demais encargos com o processo, por decisão do ISS datado de 05.04.2022
36. A casa da mãe da Requerida, bem da herança, sita em Vale de Cambra está em ruínas.
37. A Requerida sofre de depressão e artrite reumatoide, que implica sérias dificuldades no exercício das funções normais no estabelecimento onde trabalha sozinha.
7. Em cumprimento do artigo 640º nº 1, alíneas b) do C.P.C, a Recorrente especifica Os CONCRETOS MEIOS PROBATÓRIOS, CONSTANTES DO PROCESSO OU DE REGISTO OU GRAVAÇÃO NELE REALIZADA, QUE IMPUNHAM DECISÃO SOBRE OS PONTOS DA MATÉRIA DE FACTO IMPUGNADOS DIVERSA DA RECORRIDA:
7.1 Em sede documental resulta dos autos:
a) decisão de deferimento de apoio judiciário datada de 05.04.2022 (Requerimento ref.43661658, datado de 24.10.2022) e declaração médica (Requerimento ref. 39129348 datado de 09.06.2021) devidamente confrontada com a prova testemunhal produzida relativa ao estado de saúde.
7.2 E, em sede testemunhal: os depoimentos das testemunhas CC CD ...53 e DD CD 20221107105340, cujas passagens estão atrás devidamente identificadas e transcritas e que aqui se reproduzem, para os devidos efeitos.
8. Em cumprimento do artigo 640° nº 1, alíneas c) do C.P.C, a Recorrente especifica A DECISÃO QUE DEVE SER PROFERIDA SOBRE AS QUESTÕES DE FACTO IMPUGNADAS: "Considera-se provada a seguinte matéria de facto:
33. A Requerida exercia a profissão de professora em Angola e deixou de a exercer para se dedicar ao negócio do extinto casal, "Galerias A...", desde a sua criação.
34.Os lucros provenientes das vendas do estabelecimento não cobrem as despesas mensais correntes em condomínio, água, luz, telefone e internet.
35. A Requerida beneficia de apoio judiciário na modalidade de isenção de taxa de justiça e demais encargos com o processo, por decisão do ISS datado de 05.04.2022
36. A casa da mãe da Requerida, bem da herança, sita em Vale de Cambra está em ruínas.
37. A Requerida sofre de depressão e artrite reumatoide, que implica sérias dificuldades no exercício das funções normais no estabelecimento onde trabalha sozinha."
9. Verifica-se uma errónea decisão sobre a matéria de direito, nos termos do artigo 639° n°1 alínea b) do C.P.C, em virtude de uma incorreta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 2003, 2004 e 2016" do C.C, porquanto os requisitos da necessidade aos alimentos e da possibilidade de os pagar estão cumpridos.
9.1. Partindo da matéria de facto não impugnada nos pontos 9, 11, 8, 20, 28, 29, 30, 31, 14 e 22 a fls. 4 a 8 da sentença e dos supra enunciados e acrescidos pontos 34 a 37, deve entender-se por preenchido o critério da necessidade de alimentos, avançando para a apreciação do critério subsequente da possibilidade de os pagar.
9.2 Partindo da matéria de facto dada por provada nos pontos 10, 15, 16, 24, 25 e 27 a fls. 4 a 8 da sentença, que reflete o património imobiliário, veículos automóveis e rendimentos do Recorrido, o Digno Tribunal Superior deve chegar à conclusão que o mesmo tem plenas condições económicas para continuar a pagar a pensão de alimentos de 225€ à Recorrente.
10. Decorre do teor do Acordão da Relação de Lisboa, datado de 11.12.2019 Proc. nº 21/19.0TSAMD.L1-7, um conjunto de exemplos relativos aos artigos 2016 e 2016- A do C.C, designadamente o Ac. do CTJ de 23/10/2012, proc. 320/10.6TBTMR.C1.S1 onde consta no seu sumário, ponto IV- Esta obrigação alimentar genérica (...) representado apenas um direito de crédito da pessoa carente, de carater alimentar, sobre outra pessoa, sujeita a um critério de dupla proporcionalidade, em função dos meios que houver de prestá-los e da necessidade daquele que houver de recebê-los, com o limite fixado pela possibilidade e o alimentado prover à sua subsistência.
10.1 A Recorrente reclama a manutenção do valor indispensável para se alimentar, vestir, fazer face às despesas correntes da casa e da loja, da farmácia, das deslocações, porque nesta fase da sua vida, em que tem a sua capacidade de trabalho muito prejudicada pela doença, a reforma de 484,91€, única fonte de rendimento, é manifestamente insuficiente à sua subsistência com o mínimo de dignidade.
11. De igual modo, deve ser revogada a absolvição do Recorrido como litigante de má fé, visto que, o mesmo, de forma dolosa, deduziu uma pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar, fazendo do processo um uso manifestamente reprovável, visando um objetivo ilegal que conseguiu - nos termos do artigo 542° n°2, alíneas a), 1 b) e d) do C.P.C, porquanto alegou:
11.1. um hipotético acordo verbal de divórcio relativo a alimentos que nunca existiu sendo manifesta a confusão da prova testemunhal produzida.
11.2. uma descrição falseada do património da Recorrente, dizendo que era herdeira de um vasto património imobiliário quando sabia do acervo da herança tão humilde da ex-cônjuge.
11.3 que os rendimentos da Recorrente e do Recorrido eram semelhantes, o que manifestamente sabia não ser verdade - cfr. ponto 27 e 28 dos factos provados declarações de IRS de 2020 com rendimentos declarados de €33.551,98 e 7.236,54€, respetivamente! e
11.4 omitiu o seu próprio património e rendimentos, ficando os relativos às rendas da loja chinesa arrendada, por apurar.
12. O não cumprimento do dever de fundamentação a que o Julgador está obrigado, que implica uma ponderação conscienciosa e aprofundada dos elementos dos autos, quer pela fixação da matéria de facto, quer pela interpretação e aplicação das normas legais, resultou numa decisão que viola a lei.
13. A sentença incorre em incorreta fixação da matéria de facto provada, assim como, incorreta interpretação e aplicação das normas legais à factualidade apurada, que culminou na decisão de cessar a obrigação de alimentos.
13.1 Ao não decidir manter a obrigação de alimentos, o Tribunal "a quo" violou as normas constantes dos artigos 2003º, 2004º e 2016" e 2016"-A do C.C.
Termos em que deverá dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença, decidindo manter a obrigação de alimentos a cargo do Recorrido a favor da Recorrente.
Assim, V. Exas. farão JUSTIÇA.
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O
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