Acórdão nº 164/22.2YRPRT de Tribunal da Relação do Porto, 2022-11-14

Data de Julgamento14 Novembro 2022
Ano2022
Número Acordão164/22.2YRPRT
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 164/22.2YRPRT
Origem: Centro de Informação de Consumo e Arbitragem do Porto
Relator: Miguel Baldaia Morais
1º Adjunto Des. Jorge Miguel Seabra
2ª Adjunta Desª. Maria de Fátima Andrade
*

SUMÁRIO
……………………………………………..
……………………………………………..
……………………………………………..
*

I - RELATÓRIO

K... - Companhia de Seguros, S.A. intentou a presente ação de anulação da sentença proferida por tribunal arbitral constituído no âmbito do Centro de Informação de Consumo e Arbitragem do Porto, na sequência de reclamação contra si apresentada por AA, a qual foi julgada procedente “condenando-se a requerida [a ora autora] no pagamento de todos os prejuízos verificados na esfera jurídica do requerente como resultado do sinistro dos autos, em montante a liquidar em execução de sentença”.
Filia a sua pretensão anulatória em dois fundamentos, concretamente: (i) ser o Tribunal Arbitral materialmente incompetente para o conhecimento do litígio que foi submetido à sua apreciação, por não estar em causa um conflito de consumo, mas antes um litígio decorrente de contrato de seguro; (ii) a decisão arbitral ter sido proferida e notificada já para além do prazo legalmente estabelecido para o efeito.
*
Citado o réu apresentou contestação, sustentando, desde logo, que a questão da competência material do tribunal arbitral já havia sido decidida por despacho datado de 3 de fevereiro do corrente ano - onde se considerou ser o tribunal materialmente competente para o conhecimento do litígio -, o qual não foi objeto de oportuna impugnação, razão pela qual a autora não pode suscitar novamente essa questão; já no concernente ao prazo para proferir a decisão arbitral, advoga que o mesmo é meramente ordenador, sendo que o seu decurso não inutiliza o julgado.
*
Cumpridos os vistos, cumpre decidir.
***

II – DEFINIÇÃO DO OBJECTO DA AÇÃO

Face aos fundamentos em que a autora faz assentar o pedido de anulação da decisão arbitral, são as seguintes as questões solvendas:
- apurar se o tribunal arbitral que proferiu essa decisão é (ou não) materialmente competente para conhecer do ajuizado litígio;
- dilucidar se foi excedido o prazo para a prolação e notificação da sentença anulanda e, em caso afirmativo, quais as consequências desse facto.
***

III- FUNDAMENTOS DE FACTO

Para efeito de apreciação das questões acima enunciadas, é a seguinte a materialidade a considerar:
1º - A Autora é uma sociedade que se dedica à atividade seguradora.
2.º- No exercício da sua atividade, a Autora celebrou com a “Banco 1..., S.A.” o contrato de seguro, titulado pela apólice n.º ..., nos termos do qual, aquela segurou a cobertura, entre outros, dos riscos de tempestades, inundações, pesquisas de avarias, furto ou roubo do prédio situado na Rua ..., no Porto.
3.º- Com fundamento no contrato de seguro referido em 2º, o Réu, em 5 de novembro de 2019, participou a ocorrência de um sinistro, descrevendo-o como uma infiltração de água no teto e parede no escritório, alegadamente resultantes de um “forte caudal das águas decorrentes da intempérie”.
4.º- A Autora não regularizou os danos reclamados pelo Réu, invocando a exclusão das garantias do contrato de seguro.
5.º- Nessa sequência, o Requerente/Réu, em 6 de julho de 2020, apresentou reclamação junto do Centro de Informação de Consumo e Arbitragem do Porto (CICAP), pedindo a condenação da Requerida/Autora no pagamento de uma indemnização no montante de €3.000,00 para reparação do sinistro referido em 3º.
6.º- Na reclamação referida em 5º o requerente declarou expressamente que pretendia “que o conflito objeto da presente reclamação seja submetido à arbitragem”.
7.º- Na contestação que apresentou no processo arbitral iniciado após a reclamação a que se alude em 5º, a Requerida (e ora Autora) defendeu-se invocando, desde logo, a incompetência absoluta do CICAP.
8.º- Por decisão proferida em 3 de fevereiro de 2021, considerou-se “improcedente a exceção invocada pela Requerida, pugnando-se pela competência material do presente Tribunal Arbitral”.
9º- A decisão referida em 8º foi notificada às partes, não tendo sido objeto de impugnação por qualquer delas.
10º- Realizou-se julgamento vindo a ser proferida, em 6 de fevereiro de 2022, a decisão anulanda, em cujo dispositivo se condenou “a requerida [a ora autora] no pagamento de todos os prejuízos verificados na esfera jurídica do requerente como resultado do sinistro dos autos, em montante a liquidar em execução de sentença”.
11º- A decisão referida em 10º foi notificada às partes no dia 24 de março de 2022.
***

IV - FUNDAMENTOS DE DIREITO

A autora intentou a presente ação de impugnação/anulação da ajuizada sentença arbitral[1] ao abrigo do artigo 46º da Lei nº 63/2011, de 14.12 (Lei da Arbitragem Voluntária - LAV), normativo que no seu nº 3 estabelece um elenco fechado ou taxativo de fundamentos de anulação, sendo certo que a competência atribuída a este Tribunal da Relação neste tipo de ação surge como forma de controlo estadual da arbitragem enquanto contrapartida necessária da atribuição de eficácia jurisdicional àquela decisão[2].
Dentre esses fundamentos contam-se, no que ao caso releva, os invocados pela demandante como causas invalidantes desse ato decisório, concretamente a incompetência material do tribunal arbitral para a apreciação do litígio surgido entre as partes e bem assim ter sido excedido o prazo para a prolação e notificação da decisão arbitral.
Começando pelo primeiro dos apontados vícios, dispõe a subalínea iii) da alínea a) do nº 3 do citado preceito legal que o mesmo ocorre quando “[a] sentença se pronunciou sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam o âmbito desta”.
Importa, assim, determinar se efetivamente o Tribunal Arbitral constituído no âmbito do Centro de Informação de Consumo e Arbitragem do Porto detém competência material para conhecer do litígio que foi submetido à sua apreciação.
Como emerge do nº 1 do art. 18º da LAV, reconhece-se ao tribunal arbitral competência para decidir “
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT