Acórdão nº 1631/13.4TBVCT-D.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2022-06-30

Ano2022
Número Acordão1631/13.4TBVCT-D.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório

R. C., residente na Rua …, ..., A. M., M. M., M. C., estas últimas três todas residentes em Place …, Bélgica, instauraram a presente acção especial para prestação de contas contra M. G., C. A. e D. C., todos residentes na Quelha …, n.º …, em …, Viana do Castelo, pedindo:

- a condenação dos réus a prestarem contas aos autores do período em que eram tutor e membros do conselho de família da interdita I. C., devendo a final os réus serem condenados a pagar aos autores, enquanto herdeiros da dita I. C., a importância que, da quantia de € 86.197,49 não vier a ser aprovada, quantia acrescida de juros legais a contar da citação, até integral e efectivo pagamento.
Para tanto, em síntese, alegam que, a partir de 22/07/2012, I. C. foi entregue aos cuidados da primeira ré, M. G.. Ao longo dos anos, a primeira ré gastou o dinheiro das pensões da interdita/beneficiária. Nos anos de 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019, a primeira Ré gastou respectivamente € 5.037,12, € 12.929,68, € 9.291,22, € 16.445,68, € 10.002,73, € 9.504,35, € 11.386,66, € 11.029,95 e € 569,98 da conta de I. C. e que terá de justificar.
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Os réus apresentaram contestação, sendo que, por excepção, invocaram a falta de legitimidade dos réus C. A. e D. C.. Impugnaram a obrigação de prestar contas fora do período compreendido entre a nomeação como tutora, em 12/03/2014, e a sua substituição, em 11/11/2019. Mais sustentaram que a ré não tem de prestar contas do dinheiro que o irmão da interdita, C. M., lhe entregou como gratificação pelos cuidados prestados, entendendo que apenas tem de prestar contas do dinheiro que recebeu e pertencente a I. C., no período em que exerceu as funções como tutora. Assim, as receitas, no aludido período temporal, ascenderam a € 46.218,51. Relativamente às despesas, sustenta que a ré suportou todas as despesas inerentes ao alojamento, alimentação, vestuário, higiene e cuidados de saúde, transportes, obras e impostos. Considerando que a receita total foi de € 46.218,51 e a despesa total foi de € 71.976,33, sustenta ter direito a receber dos autores € 25.757,82.
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Os autores apresentaram resposta às excepções invocadas pelos réus.
Os autores apresentaram contestação às contas apresentadas.
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Foi proferido despacho a convidar a ré a apresentar as contas com observância do estabelecido no artigo 944º, do C.P.C. (apresentação das contas em forma de conta-corrente, onde se especifique a proveniência das receitas, a aplicação das despesas e o respectivo saldo, instruídas com os documentos justificativos).
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A ré apresentou requerimento acompanhado de conta corrente.
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Foi proferido despacho saneador, no qual foram os réus C. A. e D. C. considerados partes ilegítimas e, consequentemente, absolvidos da instância.
Foi determinado que a obrigação de prestar contas por parte da ré abrangia o período temporal que se iniciou com a sua nomeação e terminou com a sua substituição.
Foi identificado o objecto do litígio e foram enunciados os temas da prova.
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Após audiência de julgamento, em 23/01/2022, foi proferida a seguinte sentença, cuja parte dispositiva se reproduz:
“Em face de todo o exposto, julga-se a presente acção parcialmente procedente, aprovando-se as contas nos termos acima expostos, aprovando-se receitas no valor global de € 57.048,68 (cinquenta e sete mil e quarenta e oito euros e sessenta e oito cêntimos) e despesas no valor global de € 57.376,24 (cinquenta e sete mil, trezentos e setenta e seis euros e vinte e quatro cêntimos). (…)”
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Não se conformando com esta decisão veio o autor, em 28/02/2022, dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

“A- O presente recurso incide sobre a douta sentença proferida que julgou parcialmente procedente a ação, aprovando, no período compreendido entre 12 de março de 2014 e 15 de novembro de 2019, receitas no valor global de € 57.048,68 e despesas no valor global de € 57.376,24.
B- Discorda-se, porque incorretamente julgados, dos factos provados das alíneas 28), 33), 38), 42) e 50), assim como do entendimento feito no “Enquadramento jurídico” que entendeu aprovar despesas mensais do montante de € 550,00 a título de despesas não documentadas com ao alojamento, alimentação, vestuário e higiene da interdita.
C- Quantos aos factos provados das alíneas 28) e 42), consta dos extratos juntos aos autos que, no ano de 2016, o irmão da interdita fez 12 transferências de € 250,00 cada uma e uma de € 1.500,00, num total de € 4.500,00.
D- Pelo que o facto provado da alínea 28), deverá ficar a constar que no ano de 2016, o irmão da interdita, C. M., transferiu-lhe mensalmente quantias, num total de € 4.500,00.
E- Consequentemente deverá o facto provado da alínea 42) ficar a constar que entre o dia 12 de março de 2014 e o dia 15 de novembro de 2019, a interdita recebeu do seu irmão C. M. a quantia total de € 12.000,00.
F- Quanto ao facto provado da alínea 33), somados os valores recebidos pela Segurança social no ano de 2018 e que constam dos extratos bancários juntos aos autos, constata-se que nesse ano, a interdita recebeu da Segurança um total de € 7.731,10 e não somente € 7.467,10.
G- Pelo que, o facto provado da alínea 33) deverá ser retificado de modo a ficar a constar que, no ano de 2018, a interdita recebeu da segurança social a quantia global de € 7.731,10.
H- Quanto ao facto provado da alínea 38), a douta sentença recorrida julgou provado esse facto do confronto dos recibos de renda juntos aos autos com os depoimentos das testemunhas C. C. e A. P..
I- O Tribunal a quo entendeu que o depoimento da testemunha A. P. não foi convincente quanto ao montante da renda mensal paga e que competia aos autores provar que a renda recebida era superior àquela que constava do contrato de arrendamento.
J- No entanto e quanto a duração do arrendamento e montantes pagos nesse período ou eventual valores em divida, a douta sentença nada diz.
K- Ora, do confronto dos depoimentos das testemunhas C. C. e A. P., dúvidas não pode haver de que o contrato de arrendamento se iniciou em março de 2018 e cessou em finais de dezembro de 2019.
L- Tal como dúvidas não poderão haver da conjugação desses dois depoimentos que foram pagas a ré rendas até novembro de 2019, dizendo o pagamento feito em novembro de 2019 respeito à renda de dezembro de 2019.
M- Assim e pelos motivos expostos, deverá considerar-se que a interdita recebeu de A. P. rendas do montante de € 100,00 mensais, no período compreendido entre março de 2018 e novembro de 2019, num montante total de € 2.100,00.
N- Nessa medida, o facto provado da alínea 38) deverá ser corrigido de modo a ficar a constar que nos anos de 2018 e 2019, a interdita auferiu um total de € 2.100,00 a título de rendas.
O- Consequentemente, deverá ficar a constar que se apuraram receitas no valor global de € 60.412,68.
P- Passando para as despesas, dir-se-á que do que resulta do facto provado 46), as despesas apuradas no ano de 2014 não totalizam € 990,44 conforme erradamente se escreveu na douta sentença recorrida, mas sim um total de € 984,44.
Q- Quanto ao facto provado da alínea 50), consta da fundamentação que a douta sentença recorrida deu esse facto provado como verdadeiro pelo documento junto aos autos de fls. 314v dos autos.
R- Ora, em sede de contestação às contas apresentadas pela ré, o recorrente expressamente impugnou a despesa de € 1.600,00 a que se refere o dito documento 197 de fls 314v.
S- Pelo que, não poderia o Tribunal a quo ter dado tal documento como provado de per si porquanto deveria ter sido feito outra prova que viesse corroborar a versão trazida aos autos por esse documento.
T- E competia a ré o ónus da prova da veracidade dos factos constantes desse documento, o que não fez.
U- Assim, não poderá esse montante de € 1.600,00 de obras ser considerado.
V- Nessa medida, o facto provado da alínea 50) deverá ser retificado de modo a ficar a constar que no ano de 2018, a ré pagou € 192,07 em produtos adquiridos em farmácia, € 650,35 em cuidados específicos, € 14,56 em anuidade de cartão multibanco, € 134,80 em Energia ... e € 3.957,72 em pagamentos à Segurança Social.
W- Pelo que e nessa medida apuraram-se despesas que totalizam € 18.380,62.
X- Quanto as despesas não documentadas com o alojamento, alimentação, vestuário e higiene da interdita em valores não concretamente apurados, não se põe em causa que a interdita tivesse necessitado de alguma roupa, produtos de higiene, alimentação (para além das papas que constam das faturas de farmácia juntas aos autos) e tenha feito incorrer a ré em gastos com água e eletricidade.
Y- No entanto, tendo as contas sidas apresentadas por quem competia apresentar, entende-se que o Tribunal a quo só teria de julgar boas ou não as diversas rubricas das receitas e despesas apresentadas pela ré.
Z- Ora, no caso das despesas não documentadas, o Tribunal a quo não aprovou o montante mensal de € 700,00 apresentado pela ré e,simultaneamente, fixou o valor dessas despesas em € 550,00 mensais.
AA- Mas fê-lo sem qualquer suporte probatório que sustente o valor por si fixado.
BB- Na verdade, a Meritíssima Juíza não ordenou quaisquer diligências de prova para além das trazidas aos autos pelas partes.
CC- Para além disso, não justifica as verbas de despesas de € 550,00 mensais com o facto de não ser costume a exigência de documentos dessas verbas.
DD- Tão pouco justifica ou fundamenta, o porquê de chegar a esse valor e não a qualquer outro. Porquê € 550,00 mensais e não os € 700,00 reclamados pela ré? Porquê € 550,00 e não € 300,00? Ou € 100,00?
EE- Pelo que, pela total ausência de fundamentação, entende-se que a douta sentença é nula nessa parte.
FF- No entanto e mesmo que assim não se entenda sempre se dirá que essa norma não é de aplicabilidade ao caso concreto porquanto a ré foi nomeada tutora da interdita e nessa...

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