Acórdão nº 16216/23.9T8LSB-A.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 25-01-2024

Data de Julgamento25 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão16216/23.9T8LSB-A.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


I.–Relatório[1]


Foi dada à execução a sentença proferida na acção de processo comum n.º 11476/20.0T8LSB, proferida em 14.3.2023, transitada em julgado[2], com o seguinte teor que aqui releva transcrever:
“I.–Relatório:
I… intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra:
- F…, e
- M …
Pedindo:
a)-Seja declarado que o contrato de arrendamento outorgado em 1 de Maio de 2016 se mantem em vigor, não estando afectado de qualquer nulidade;
b)-Serem os RR. condenados a pagar à A. a titulo de indemnização pelas benfeitorias necessárias a quantia de 10.800,00€ e a titulo de indemnização por danos não patrimoniais a quantia de €4.000,00.
c)-Mais declarando que com base na figura da compensação a A. tem direito a que sejam consideradas pagas as rendas vencidas desde Fevereiro de 2020 como das vincendas até Setembro de 2020;
d)-Serem os RR. condenados a absterem-se de por qualquer forma perturbarem a posse e normal gozo do locado até Maio de 2026, sob pena de ser condenados a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia em que por qualquer forma impeçam ou Perturbem o normal gozo do locado no pagamento da quantia de 500,00€ bem como custas e procuradoria.
e)-declare resolvido o contrato de arrendamento dos autos;
f)-Se condene os RR. a entrega-lo à Autora livre e devoluto de pessoas;
g)-Se condenem os RR., no pagamento das rendas vencidas e não pagas no valor de 9.000,00€ e vincendas até efectiva entrega do locado.

Alega para tanto e em síntese que:
-em 1 de maio de 2016 celebrou com MF um contrato de arrendamento do 3º andar do prédio sito na Rua, em Lisboa, pelo período de 5 anos, assinando uma adenda pelo qual o senhorio autorizou a A. a utilizar o locado para fim ou ramo de negócio diferente daquele a que se destina, autorizando o subarrendamento.
-as rendas eram pagas todos os meses ao senhorio, em dinheiro vivo.
-A A. sempre contou com a presença do senhorio para acompanhar a realização de obras no locado necessárias à exploração do mesmo como hospedagem, nas quais a A. despendeu 10.800,00€
-com a morte do senhorio e de sua esposa os RR. invocaram a caducidade do arrendamento por extinção do usufruto.

Os RR. contestaram, impugnando a factualidade invocada pela A.

Deduzem pedido reconvencional no qual peticionam:
-A condenação da A. a reconhecer o direito de propriedade dos RR. sobre o prédio dos autos;
-A reconhecer a caducidade do contrato de arrendamento de 01/05/2016 tendo por objecto o 3º andar do prédio sito na Rua ...
-A restituir imediatamente aos RR. o referido imóvel livre de pessoas e bens e em bom estado de conservação, sob cominação de sanção pecuniária compulsória.
-a pagar aos RR. os valores correspondentes às rendas e indemnizações legais que lhes eram devidas em 30/09/2020, data em que a entrega do locado deveria, no limite, ter ocorrido, no total de 7.700,00€;
-A pagar aos RR. a quantia de 1.100,00€ por cada mês de atraso na entrega do imóvel desde 1 de Outubro de 2020 até efectiva entrega do locado.
-subsidiariamente, a entregar aos RR. o locado em 01/05/2021;
-condenar a A. como litigante de má-fé em multa e indemnização a favor dos RR.

Alegam que:
-são os únicos donos e legítimos proprietários do imóvel em causa, que lhes adveio por doação dos anteriores proprietários MF e BF, por escritura de 25/02/2009, com reserva de usufruto simultâneo e sucessivo a favor destes.
-MF faleceu em 21/08/2017 e BF faleceu em 14/12/2019, consolidando-se a propriedade do prédio nos RR.
-MF deu de arrendamento à A. a 1/05/2016 o 3º andar do prédio sito na Rua, em Lisboa pela renda mensal de 550,00€ e pelo prazo de 1 ano, que a A. alega ter sido prorrogado para 5 anos.
-O contrato de arrendamento caducou em 14/12/2019.
-Por carta de 03/03/2020 os RR. notificaram a A. da ocorrência de tal caducidade e interpelaram-na para entregar o locado até 15/06/2020 e para pagar as rendas vencidas e vincendas.
-A A. recebeu a carta mas não entregou o locado nem pagou quaisquer quantias.

A A. não replicou.

Por despacho de 12.01.2022 foi admitido o pedido reconvencional e corrigido o valor da causa.

A A. não procedeu ao pagamento da taxa de justiça devida, nem quando notificada nos termos do art.º 570º, n.º 3 do Código de Processo Civil, o que determinou o desentranhamento da petição inicial, prosseguindo os autos apenas para apreciação do pedido reconvencional.

Face à não contestação da A/reconvinda, consideraram-se confessados todos os factos articulados pelos reconvintes no seu pedido reconvencional (cfr. art. 587.º, n.º 1 e 574º do NCPC).
Os reconvintes apresentaram alegações de direito.
(…)

II–Fundamentação de facto:
Nos termos do n.º 1 do art.º 587º do Código de Processo Civil, não tendo a A/reconvinda contestado, tendo sido notificada da contestação, consideram-se confessados os factos articulados pela R/reconvinte. Nessa sequência, com base na confissão do Reconvinda. e nos documentos juntos aos autos (dotados de força probatória plena e/ou não impugnados), resultam provados todos os factos alegados no pedido reconvencional (expurgadas as considerações conclusivas e de direito).

III–Fundamentação de direito:
(…)
No caso vertente provou-se, face à ausência de contestação da Ré, que o imóvel identificado na PI pertence aos reconvintes e que a reconvinda não tem qualquer título que legitime a sua detenção.
Efectivamente, aquela ocupava o imóvel em causa com base num contrato de arrendamento, celebrado em 2016 com o usufrutuário do imóvel. Com a morte da última usufrutuária, BF, em 14/12/2019, extinguiu-se o direito de usufruto como prescreve o art.º 1476º, n.º 1 al. a) do Código Civil.
Nos termos do art.º 1051º, al. c) do Código Civil “o contrato de locação caduca quando cesse o direito ou findem os poderes legais de administração com base nos quais o contrato foi celebrado”.
Consequentemente, o contrato de arrendamento em que era senhorio o usufrutuário caduca com o óbito deste.
Importa referir que, nos termos do art.º 1053º do Código Civil, a restituição do prédio só pode ser exigida passados 6 meses sobre a verificação do facto que determina a caducidade, ou seja os reconvintes apenas poderiam exigir a restituição em 15/06/2020.
Resulta assente que os reconvintes interpelaram a reconvinda, por carta de 03/03/2020, dando conta da caducidade e interpelando-a para proceder à entrega do imóvel até 15/06/2020 e ao pagamento das rendas vencidas e vincendas.
Resultou, ainda, provado que a reconvinda nada pagou ou respondeu, não tendo, também, procedido à entrega do locado.
Por força do prescrito na al. b) do art.º 8º da Lei n.º 1-A/2020 de 19/030 (na redacção dada pela Lei 14/2020 de 09/05) a data de entrega foi postergada para o dia 30/09/2020, pelo que a partir de tal data a reconvinda deixou de ter justificação para se manter no gozo do imóvel.
Ocorre que resultou também provado que a Reconvinda nada pagou a partir de Agosto de 2019, não lhe sendo, por isso, aplicável a redacção daquela disposição legal introduzida pela lei 58-A/2020 de 30/09. Efectivamente nos termos dos nº. 2 e 3 que foram, então, aditados àquele artº. 8º: “1 - Ficam suspensos até 31 de Dezembro de 2020:
a)-(…)
b)-A caducidade dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, salvo se o arrendatário não se opuser à cessação;
(…)
2–O disposto no número anterior depende do regular pagamento da renda devida nesse mês, salvo se os arrendatários estiverem abrangidos pelo regime previsto no artigo 8.º da Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril.
3–O disposto no n.º 2 aplica-se às rendas devidas nos meses de Outubro a Dezembro de 2020.»

De acordo com o disposto no art.º 1045º, nº 1 e 2 do CC, se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, indemnização que é elevada ao dobro logo que o locatário se constitua em mora na entrega do locado.
Assim, a reconvinda deve pagar aos reconvintes a quantia de 550,00€ por cada mês que tenha decorrido desde Agosto de 2019 até Setembro de 2020 no valor de €7.700,00.
A partir de tal data, não tendo entregue o locado, deve a reconvinda o valor mensal de 1.100,00€ de Outubro de 2020 até à efectiva restituição do locado, o que calculado até à presente data (Março de 2023) soma o valor de 33.000,00€.
A esta quantia, acrescerá, ainda, o montante de € 1.100,00 mensais por cada mês de atraso na entrega do locado, desde Abril de 2023 até à efectiva entrega do mesmo.
Em face desta decisão fica prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário.
Quanto ao pedido de litigância de má-fé, fica também o mesmo prejudicado, uma vez que a Petição inicial foi desentranhada, não havendo contestação ao pedido reconvencional, pelo que não pode ser apreciada a sua conduta processual de quem não intervém nos autos.
Finalmente, no que respeita ao pedido de condenação em sanção pecuniária compulsória, entende-se não ser o mesmo de atender.
(…)
IV–Decisão:
Em face do exposto, julgo o pedido formulado pelos reconvintes totalmente procedente, por provado e, em consequência, decido:
1.–Declarar reconhecido aos reconvintes o direito de propriedade sobre a fracção autónoma correspondente ao 3º andar do prédio sito na Rua… em Lisboa.
2.–declarar a caducidade do contrato de arrendamento celebrado relativamente a tal fracção autónoma.
3.–Condenar a reconvinda a restituir o andar acima identificado aos reconvintes livre e devoluto de pessoas e bens;
4.–condenar a reconvinda a pagar aos reconvintes as rendas vencidas até a cessação do contrato – Setembro de 2020 – no valor de €7.700,00, acrescido de juros, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
5.–Condenar a reconvinda a pagar aos reconvintes
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