Acórdão nº 15905/20.4T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-11-07

Ano2022
Número Acordão15905/20.4T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
APELAÇÃO n.º 15905/20.4T8PRT.P1
SECÇÃO SOCIAL


ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO


I.RELATÓRIO
I.1 No Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo do Trabalho do Porto, AA, através da apresentação do formulário a que se referem os artigos 98.º C e 98.º D, co CPT, deu início à presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, a qual veio a ser distribuída ao Juiz 3, demandando “A..., S.A”, pedindo que julgada a acção procedente seja declarada a ilicitude do seu despedimento por extinção do posto de trabalho, que por aquela R. lhe foi comunicada por escrito.
Juntou a decisão de despedimento.
Designado dia para a audiência de partes, procedeu-se a este acto, mas sem que se tenha conseguido alcançar o acordo entre as partes.
A Ré veio apresentar articulado motivador do despedimento, nos termos do artigo 98º-J do CPT, invocando os factos e fundamentos que motivaram a decisão de despedimento e juntando o respectivo processo de extinção do posto de trabalho.
Alega, no essencial, que no ano de 2020, por força da pandemia Covid-19, no primeiro semestre registou uma descida no valor total dos prémios e um aumento da taxa de sinistralidade, o que conduziu a uma diminuição de proveitos, prevendo que a taxa de sinistralidade viesse a aumentar nos próximos meses e anos. Por isso, decidiu extinguir o posto de trabalho ocupado pela autora de Técnica Administrativa Financeira no Departamento Financeiro, passando as respectivas funções para o responsável daquele departamento e a parte mais administrativa das funções assumidas pelo Assistente de Administração.
Mais alega que a autora era a única trabalhadora a ocupar aquele posto de trabalho e que não existe outro posto compatível com a categoria da autora.
A trabalhadora contestou, pugnando pela ilicitude do despedimento de que foi alvo, negando que a ré tenha levado a cabo uma reestruturação e alegando que os motivos invocados na decisão de despedimento são falsos, atendendo ao facto da ré ser uma empresa de seguros de crédito e, a pandemia, com o aumento da sinistralidade, provocou um aumento de trabalho para a ré. Refere, ainda, que a ré recebeu apoios do Estado para fazer face à sinistralidade daí decorrente.
Por outro lado, alega que das 18 pessoas do quadro de pessoal da ré havia 10 com a categoria de especialista operacional, entre as quais a autora, ficando sem saber a razão para ter sido despedida e, ainda, que havia seis trabalhadores de empresas de trabalho temporário a executar funções enquadráveis naquela categoria.
Finalmente, entende a autora que o despedimento é ilícito porque não pode ter como fundamento a atribuição a outro colega das funções inerentes ao posto de trabalho que ocupava.
Deduz reconvenção, pedindo a sua reintegração e o pagamento das remunerações que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão a proferir, no valor mensal de 1.706,22€.
Subsidiariamente, caso se entenda pela licitude do despedimento, pede a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 1.083,23€ a título de compensação.
A ré exerceu o direito de resposta à contestação com reconvenção.
Foi proferido despacho saneador e foi realizada a audiência de julgamento.
I.2 Subsequentemente foi proferida sentença, fixando os factos e aplicando o direito, concluída com a decisão seguinte:
- «Pelo exposto, julgo procedente o pedido formulado e, consequentemente, a) declaro ilícito o despedimento da autora promovido pela ré;
b) condeno a ré a:
- reintegrar a autora no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; e
- pagar à autora as retribuições mensais, no montante ilíquido de 1.706,22€, que aquela deixou de auferir, desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado desta decisão, deduzidas das importâncias que a autora recebeu, desde o despedimento até à data do trânsito em julgado desta sentença, a título de subsídio de desemprego, que deverão ser entregues, pela ré à Segurança Social.
Fixo o valor da acção em 39.536,84€.
Custas a cargo da ré.
Notifique.
(..)».
I.3 Inconformada com esta decisão, a R.. interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram concluídas nos termos seguintes:
I. A douta sentença não deverá manter-se.
II. Existe erro no julgamento da matéria de facto, tendo sido dados como não provados factos que deveriam ter sido considerados provados.
III. Os pontos 1) a 4) dos factos não provados foram considerados como tal por, no entender da Meritíssima Juiz a quo, não terem sido demonstrados por prova documental.
IV. Incumbindo à Recorrente o ónus da prova quanto a esta matéria, tendo a mesma arrolado testemunhas que a confirmaram e não tendo sido feita prova em sentido contrário pela Recorrida, não se entende o motivo pelo qual a Meritíssima Juiz a quo desvalorizou a prova feita com o argumento de que deveriam ter sido juntos documentos aos autos.
V. Da audição da testemunha BB, que detém na Recorrente o cargo de Responsável pela área financeira, constata-se que o mesmo foi perfeitamente claro no depoimento que prestou a este respeito, tendo confirmado tais valores com suporte a documentos internos da Recorrente.
VI. De igual forma, também a testemunha CC e a própria parte, representada pelo Senhor Dr. DD, confirmaram tais números.
VII. Ouça-se a este respeito o declarado pela testemunha BB, cujo depoimento se encontra gravado no dia 07/02/2022, das 10:22:26 às 11:48:21, concretamente dos minutos 11:14 a 13:02, dos minutos 15:16 a 16:32, dos minutos 17:35 a 17:56, dos minutos 18:01 a 18:35; a testemunha CC, cujo depoimento se encontra gravado no dia 07/02/2022, das 15:59:18 às 16:24:21, concretamente dos minutos 04:45 a 05:32, dos minutos 12:19 a 12:44; bem como as declarações de parte do Sr. Dr. DD, gravadas no dia 25/02/2022, das 14:42:11 às 15:51:57, concretamente dos minutos 2:58 a 5:17.
VIII. Ora, tendo a Recorrente apresentado duas testemunhas, mais a própria parte, como conhecedoras dos factos e que declararam o que efetivamente estava alegado no processo de extinção de posto de trabalho a este respeito, não se compreende como pode o Tribunal ignorar a prova feita.
IX. Sobretudo quando a Recorrida não contraditou, fosse por que forma fosse, a prova produzida.
X. Se dúvidas houvessem, do Tribunal ou da Recorrida, quanto ao que estava a ser alegado, deveriam ter solicitado a junção de documentos comprovativos aos autos, por forma a contrariarem aquilo que resultou provado no depoimento destas testemunhas.
XI. Aliás, é a própria Meritíssima Juiz a quo que refere, na fundamentação da sentença, que estas testemunhas e o representante da Recorrente explicaram a forma de funcionamento da ré e as consequências da pandemia na sua actividade, o que fizeram de forma segura e coerente entre si e com as regras da normalidade e acrescentou que não restaram dúvidas dos referidos depoimentos de que quanto à ré os resultados do ano de 2020 foram claramente negativos, ao contrário do que vinha acontecendo nos anos anteriores.
XII. Assim, os pontos 1) a 4) dos factos não provados têm necessariamente de se considerar provados na íntegra, aditando-se os mesmos ao elenco dos factos provados.
XIII. Em face desta alteração, deve igualmente o Tribunal ad quem considerar que estão provados e justificados os motivos económicos e estruturais que justificam o presente processo de extinção de posto de trabalho, o que desde já se requer.
XIV. Existe, igualmente, erro na apreciação dos factos 5 e 6 do elenco dos factos não provados.
XV. No que respeita ao ponto 5, a Recorrente alegou tal situação e não se provou o contrário, ou seja, não resulta da prova testemunhal ou documental que a Recorrente tivesse outro posto disponível ao qual pudesse alocar a Recorrida.
XVI. Independentemente da existência ou não de diferenças entre as funções da Recorrida e do colega EE, resulta inegável da prova produzida que a Recorrente reduziu de dois para um os postos de trabalho de “especialista operacional” existentes na área financeira.
XVII. A demonstrar isso, está o facto de a Recorrente não ter contratado qualquer outra pessoa para substituir a Recorrida ou para exercer funções no departamento financeiro, o facto de ter resultado provado que durante meses a Recorrida esteve sem prestar trabalho e as suas funções foram normalmente exercidas pelo colega EE (que não necessitou de fazer trabalho suplementar) e, ainda, o facto de não ter resultado a prova da existência de outro posto ao qual pudesse a Recorrida ser alocada. De realçar, ainda, que resultou provado no ponto S) que não existia, nem existe na ré para o posto de trabalho ocupado pela autora qualquer trabalhador com contrato de trabalho a termo certo ou incerto.
XVIII. A Recorrente alegou, fez prova do facto e nenhuma outra prova foi feita em contrário, logo, o Tribunal devia necessariamente dar como provado tal facto, considerando que o mesmo não foi contraditado – neste caso simplesmente não existe prova da existência de outro posto.
XIX. Requer-se assim seja aditado ao elenco dos factos provados o ponto 5 dos factos não provados.
XX. Não se consegue perceber a razão pela qual a Meritíssima juiz a quo desvalorizou os depoimentos das testemunhas, considerando como não provado o ponto 6.
XXI. Do depoimento prestado pela testemunha EE, cujo depoimento se encontra gravado no dia 07/02/2022, das 15:01:00 às 15:58:02, resulta claro que este e a Recorrida tinham funções diferentes. Ouça-se a este respeito as declarações da testemunha nos minutos 13:02 a 15:02, nos minutos 15:09 a 16:38, nos minutos 54:47 a 55:50 e nos minutos 55:59 a 56:63.
XXII. De facto, não obstante a categoria profissional da Recorrida e do Sr. EE ser a mesma, resulta provado, do depoimento do Sr. EE, que não existia uma total identidade de funções, tendo ficado claro que
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