Acórdão nº 159/20.0T8MLG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-03-30

Ano2023
Número Acordão159/20.0T8MLG.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório.

AA, viúva, BB, casado, CC, casado, todos com residência no Lugar ..., ..., freguesia ..., concelho ..., por si e em representação da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de DD, instauraram presente acção sob a forma de processo comum contra EE e mulher, FF, com residência na Rua ..., ..., freguesia ..., concelho ..., doravante designados de 1.ºs réus e GG, divorciado, de nacionalidade ..., residente na Rua ..., HH, ..., ..., doravante designado de 2.º réu e II, divorciada, de nacionalidade ..., residente na Rua ..., ..., ..., ..., doravante designada de 3.ª ré, pedindo:

1. A declaração de nulidade, por falsidade, do teor da declaração formulada pelos 1.ºs réus quanto ao facto justificado em escritura de justificação, mais se declarando sem nenhum efeito a referida escritura de justificação;
2. A declaração de nulidade da compra e venda subsequente à justificação ora impugnada, quer no tocante ao usufruto vitalício do prédio ora justificado em favor do 2.º réu, como também no que concerne à raiz ou nua-propriedade do prédio ora justificado em favor da 3.ª ré, por carecerem os vendedores, aqui 1.ºs réus., de legitimidade para a realizar, nos termos do artigo 892.º do Código Civil;
3. O cancelamento da inscrição de aquisição que, com base na mencionada escritura de justificação notarial, vier a ser efectuada por qualquer um dos réus ou por terceiros na Conservatória do Registo Predial em seu favor, bem como de inscrições posteriores que venham a ser registadas;
4. Declaração de que os autores são donos e legítimos possuidores, com exclusão de outrem, do prédio urbano, sito no Lugar ..., freguesia ..., concelho ..., composto por casa de morada com dois pavimentos, uma dependência e rossios, destinado à habitação, com a área total de duzentos e vinte e nove metros quadrados, área coberta de quarenta e oito metros quadrados e área descoberta de cento e oito metros quadrados, a confrontar de Norte com Caminho, de Sul com JJ, de Nascente com KK e de Poente com Caminho, não descrito na competente Conservatória do Registo Predial e inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...84, que teve origem no artigo ...2 urbano (metade) da referida matriz, com o valor patrimonial e atribuído de € 11.449,20;
5. Condenação de todos os réus a reconhecerem os anteriores pedidos alinhados;
6. Condenação dos 1.ºs réus por má-fé, em multa e indemnização aos autores, que deverá consistir no pagamento da quantia de 1.500,00 € (mil e quinhentos euros).
A título subsidiário, peticionaram ainda:
7. Declaração do direito de preferência dos autores enquanto representantes da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de DD, nos de negócios de compra e venda alegados nesta acção, por força do disposto no artigo 1409.º n.º 1, do Código Civil;
8. Condenação dos 2.ºs e 3.º réus a entregarem o prédio em causa aos autores;
9. Condenação dos réus em custas.
Alegaram, para tanto, em síntese, que a escritura notarial para justificação do direito de propriedade sobre o prédio descrito na matriz sob art. ...84.º padece de falsidade no que diz respeito às declarações dos 1.ºs réus e testemunhas aí indicadas, nomeadamente quanto à aquisição do referido prédio em 1998, por acordo verbal de partilhas, e ao exercício da posse pelos autores desde então, na convicção de proprietários.
Mais disseram que o prédio em causa está na posse da autora AA, cabeça de casal, e falecido marido, há mais de 20 e 30 anos, tendo sido adquirido por usucapião e pertencendo à herança indivisa aberta por óbito de DD.
Invocaram que os 1.ºs réus actuaram com dolo e má-fé, pelo que devem ser condenados como litigantes de má-fé.
Finalmente, a título subsidiário, alegaram que apenas em Outubro de 2020 tiveram conhecimento da alienação do prédio, sendo donos e legítimos possuidores de ½ do prédio urbano inscrito sob o art. ...2 (antigo), não lhes tendo sido transmitido pelos vendedores os caracteres da projectada venda.
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Devidamente citados contestaram os 1.ºs réus, dizendo que o prédio ...84.º, proveniente do antigo 72.º, é da sua plena e exclusiva propriedade por o terem adquirido por morte dos pais da 1.ª ré mulher, LL e MM, falecidos, respectivamente, em .../.../1998 e .../.../1985; que a posse exercida pelos pais da ré FF sempre foi pública, pacífica, de boa fé e ininterrupta e manteve-se por mais de 40 ou 50 anos.
Após o falecimento do pai da ré (MM), a mãe da Ré FF, LL, manteve aí a sua residência, até falecer. O falecido casal LL e MM teve quatro filhos, todos nascidos, criados e educados no prédio onde residiam. Quando o pai da 1ª ré faleceu, a mãe LL reuniu os filhos vivos, a FF, a NN e o GG e o neto OO, filho da falecida PP, em representação dos seus cinco irmãos e todos acordaram que os bens pertencentes à herança do seu marido, pai e avô, apenas, seriam partilhados após o seu falecimento, ou seja, da LL.
Quando faleceu LL, os filhos vivos e o neto OO, filho da falecida PP, em representação dos seus cinco irmãos, reuniram-se na casa de morada de família do casal MM e LL (o prédio justificado) e procederam, verbalmente, à partilha dos bens da herança aberta por óbito de seus pais e avós. Após esta partilha por óbito dos seus falecidos pais, os 1ºs réus adquiriram o direito de propriedade pleno e exclusivo, sobre o imóvel descrito no artigo 2º desta contestação, por sucessão por morte.
Como o prédio estava omisso, no Cartório Notarial foi dito aos 1.ºs réus, através da testemunha QQ que poderia resolver o problema efectuando a partilha verbal celebrada entre os herdeiros, através de uma habilitação de herdeiros e escritura de partilha ou, na impossibilidade de os juntar a todos, o casal a quem foi adjudicado o bem imóvel outorgar uma escritura de justificação do seu direito de propriedade, juntando, para o efeito, três testemunhas.
Sendo impossível juntar todos os herdeiros dos senhores MM e LL, principalmente os que residem em ..., seus netos, e em ..., os 1ºs réus optaram por outorgar a sugerida escritura pública de justificação do seu direito. Logo, as declarações que os 1ºs réus prestaram perante o Senhor Notário ... são verdadeiras e traduzem, com verdade, a realidade dos factos ocorridos ao longo dos anos.
Mais invocaram que os autores faltaram à verdade na sua alegação na petição inicial, sabendo que o prédio ...84.º sempre pertenceu à herança dos pais dos 1.ºs réus e, após partilha, a estes últimos, devendo ser condenados como litigantes de má-fé.
Alegaram ainda que os autores nunca foram proprietários de metade do art. 72.º do mesmo Lugar ..., que pertencem aos avós maternos do falecido DD e da ré FF, falecidos muito antes de qualquer um deles ter nascido, sendo certo que os tais avós dividiram o art. 72.º em três novos prédios, distintos, autónomos e independentes, que foram doados a cada um dos seus três filhos.
Alegaram ainda que o preço pago pelos 2ºs réus pela aquisição do imóvel justificado foi de dezasseis mil euros e não o que os autores indicam no artigo 36º da p.i.
Concluíram pela improcedência de todos os pedidos formulados e pela condenação dos autores como litigantes de má-fé, em multa e indemnização a favor dos réus, em montante nunca inferior a €3.000,00.
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Foi proferido despacho saneador, tendo os autores sido convidados a cumprir o disposto no rt. 1410.º, n.º 1 do Código Civil, tendo em vista a prossecução da apreciação do pedido subsidiário formulado no prazo de 10 dias.
Foram advertidos de que, não o fazendo no prazo fixado, precludir-se-ia a apreciação do pedido subsidiário, por falta de verificação dos pressupostos legais da acção de preferência.
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Realizou-se a audiência final, onde a título de questão prévia, foi proferido o seguinte despacho:
“No mais, verifico que, aquando da prolação do despacho saneador, foram os autores notificados para o cumprimento do disposto no art. 1410.º, n.º 1 do Código Civil, tendo em vista a prossecução da apreciação do pedido subsidiário, tendo sido atribuído um prazo de 10 dias para o efeito.
Mais se cominaram os AA., à data, de que, não o fazendo no prazo fixado, se precludiria a apreciação do pedido subsidiário formulado, por falta de verificação dos pressupostos legais da ação de preferência, nos termos do art. 1410º, nº 1 do Código Penal.
Isto posto, verifico que até a presente data, o preço depositado corresponde ao valor patrimonial de usufruto e do imóvel transacionado aludido na escritura de compra e venda, e não ao valor do preço devido, ou seja, o preço efetivamente pago aquando da realização da transação.
Aliás, resulta da própria prova documental junto com a petição inicial, pelos próprios autores, que o valor globalmente pago pelos réus adquirentes foi de 16.000,00€, o que é justamente alegado na contestação dos réus EE e FF.
Consequentemente, entendo que não estão verificados os pressupostos liminares para apreciação da ação de preferência, ou seja, o deposito do preço devido no prazo de 15 dias após a prepositura da ação, tendo em vista apreciação destes pressupostos legais, por referência ao art. 1410º, nº 1 do Código Penal.
Como consequência, previamente advertida aos AA., preclude-se a apreciação do pedido subsidiário formulado pelos autores quanto ao direito de preferência, e o tribunal considerará como não escrita a matéria que consta na petição inicial, relativamente a tal matéria, nomeadamente factos alegados quanto ao exercício de direito de preferência, bem como respetivo pedido formulado”.
O despacho proferido não foi objecto de reclamação ou recurso.

Findo o julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:

VI. Decisão.
Atento tudo o exposto e nos termos das disposições legais citadas, julgo a ação totalmente improcedente, por não provada, absolvendo os RR. de tudo quanto foi peticionado pelos AA.
No mais, condeno os AA. como ...

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