Acórdão nº 159/16.5T8PRT-B.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 04-03-2024
Data de Julgamento | 04 Março 2024 |
Número Acordão | 159/16.5T8PRT-B.P1 |
Ano | 2024 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Sumário do acórdão proferido no processo nº 159/16.5T8PRT-B.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:
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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:
1. Relatório
Em 28 de junho de 2016, por apenso à ação executiva sumária para pagamento de quantia certa, com o nº 159/16.5T8PRT, pendente na Primeira Secção de Execução da Instância Central do Porto, Comarca do Porto, instaurada por AA e BB contra CC[1], adrede citado para o efeito, DD veio reclamar créditos alegando para tanto, em síntese, que mediante escritura pública celebrada em 27 de setembro[2] de 2013, no Cartório Notarial de EE, em Guimarães, CC confessou-se devedor da importância de sessenta mil euros ao reclamante, dívida que resultou de vários empréstimos que o reclamante fez ao reclamado no ano de 2013, obrigando-se o executado, aqui reclamado, a restituir a referida importância no prazo de seis meses a contar da outorga da referida escritura pública; até à reclamação de créditos o reclamado não restituiu ao reclamante a importância que este lhe emprestou nem pagou os juros que entretanto se foram vencendo; para garantia do capital mutuado, juros remuneratórios à taxa de 4%, juros de mora à taxa de 3% e despesas judiciais e extrajudiciais que o exequente tenha de fazer para efetivar o seu direito no montante de € 2 000,000, o executado deu em hipoteca metade indivisa do prédio urbano composto de edifício de rés do chão, primeiro e segundo andares e sótão, com logradouro, situado na Praça ..., União das Freguesias ..., ... e ..., concelho da Póvoa de Varzim, descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o nº ..., inscrito na matriz urbana sob o artigo ...; o direito dado em hipoteca está penhorado na ação executiva nº 159/16.5T8PRT; a hipoteca foi registada a favor do reclamante pela apresentação nº ... de 28 de novembro de 2013, com o montante máximo assegurado de € 74 600,00.
Observado o disposto no nº 1 do artigo 789º, do Código de Processo Civil, CC impugnou a reclamação de créditos, alegando para o efeito, em síntese, que o reclamante nem em 2013, nem em qualquer outra altura lhe fez algum empréstimo, que o reclamante engendrou um plano para conseguir obter do reclamado diversas quantias em dinheiro que fez suas, que bem sabia não serem devidas; para o efeito convenceu o reclamado de que era necessário efetuar diversos pagamentos para que ele próprio evitasse a realização de arrestos e de penhoras no âmbito de processos instaurados contra o aqui reclamado de cuja existência o reclamante tivera conhecimento, processos esses que, segundo o reclamante, tinham sido instaurados contra o reclamado, pelo facto de o reclamado ter sido sócio da sociedade comercial por quotas com a firma A... LDA; pediu então ao reclamado, que lhe entregou, várias dezenas de milhares de euros para que aquele fosse alegadamente entregando aos Solicitadores nomeados em cada um dos alegados processos, bem como para suportar taxas de justiça e custas judiciais; convenceu ainda o reclamado de que deveria constituir sociedades em Espanha para o que igualmente lhe pediu, e este entregou, dinheiro para esse efeito, sendo certo que o reclamado deslocou-se a Vigo, Espanha, juntamente com o reclamante e procedeu ao imediato depósito da quantia de € 2 000,00 em dinheiro numa conta bancária na Banco 1..., agência de Vigo, alegadamente pertencente ao reclamante e destinada a pagar as despesas de constituição e da contabilidade de uma sociedade comercial de direito espanhol, depósitos esses que o reclamado efetuou e que o reclamante fez seus; nenhuma sociedade foi constituída; com as mais variadas histórias, o valor que foi assim sendo entregue pelo reclamado ao reclamante foi de várias dezenas de milhares de euros; ainda insatisfeito com o dinheiro que havia assim obtido do reclamado, engendrou um outro plano para, segundo ele, evitar a realização de penhoras na metade indivisa do prédio melhor identificado na escritura pública de hipoteca que juntou na Reclamação de Créditos, convencendo o reclamado a realizar tal escritura; tudo isto depois de ter anteriormente convencido o reclamado a assinar várias declarações de dívida, cujos valores delas constantes eram colocados pelo reclamante a seu bel-prazer e sem que as mesmas tivessem alguma coincidência com a realidade, pois que jamais o reclamado foi devedor do reclamante de qualquer quantia; relativamente à outorga da escritura e no sentido de mais facilmente convencer o reclamado a celebrar a mesma, desde logo se prontificou a imediatamente emitir uma declaração para o registo de cancelamento da hipoteca; o reclamante conseguiu obter tais quantias por ter convencido o reclamado de que se não fossem entregues poderia sofrer as consequências de um arresto ou de uma penhora, que teria por objeto a sua residência, bem como a residência das suas filhas e que seria feita por Solicitadores de Execução, acompanhados pela polícia; para convencer o reclamado, o reclamante simulava telefonemas com os alegados Solicitadores de Execução, fazendo crer ao reclamado a dificuldade que tinha em demovê-los de fazer aquelas diligências e que tal só era possível através de pagamentos parciais das alegadas dívidas; foram várias dezenas de milhares de euros assim entregues pelo reclamado ao reclamante, que para o efeito se viu obrigado a recorrer a empréstimos de pessoas amigas, tal foi o estado de medo e inquietação em que se encontrava de ver concretizadas penhoras ou arrestos, designadamente na residência das suas filhas, quantias essas que aquele fez suas; ainda insatisfeito com o dinheiro que havia assim obtido do reclamado, engendrou um outro plano para, segundo ele, evitar a realização de penhoras na metade indivisa do prédio melhor identificado na escritura pública de hipoteca que juntou na Reclamação de Créditos, convencendo o reclamado a realizar tal escritura; tudo isto depois de ter anteriormente convencido o reclamado a assinar várias declarações de dívida, cujos valores delas constantes eram colocados pelo reclamante a seu bel-prazer e sem que as mesmas tivessem alguma coincidência com a realidade, pois que jamais o reclamado foi devedor do reclamante de qualquer quantia.
O reclamante respondeu à impugnação pugnando pela sua total improcedência e ofereceu prova documental.
Em 21 de março de 2017, o reclamado foi convidado a aperfeiçoar a sua impugnação, convite que foi acatado, impugnando o reclamante os aperfeiçoamentos oferecidos pelo reclamado.
As partes foram convidadas a, querendo, pronunciarem-se sobre a dispensa de realização de audiência prévia.
Em 03 de janeiro de 2018 admitiu-se a resposta à impugnação da reclamação de créditos, fixou-se o valor da causa no montante de € 74 850,00, proferiu-se despacho saneador tabelar, identificou-se o objeto do litígio, enunciaram-se os temas da prova, conheceu-se dos requerimentos probatórios das partes, designando-se dia para realização da audiência final.
Em 12 de setembro de 2018, com fundamento em motivo justificado resultante da pendência de recurso interposto em embargos de executado que em primeira instância foram julgados totalmente procedentes, foi declarada a suspensão da instância nestes autos.
Em 11 de outubro de 2021 designou-se nova data para realização da audiência final.
Em 15 de fevereiro de 2022 deferiu-se requerimento de reclamante e reclamado no sentido de suspensão da instância por trinta dias em virtude de estarem em curso negociações para resolução consensual do litígio, designando-se logo data para realização da audiência final prevenindo a eventualidade da almejada resolução consensual do litígio não se concretizar.
A audiência final realizou-se em duas sessões e em 30 de janeiro de 2023 foi proferida sentença[3] que terminou com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto,
- julgo verificados os créditos aqui reclamados por DD, no montante global de € 74.850,00 (setenta e quatro mil, oitocentos e cinquenta euros), acrescido de juros vincendos/despesas e como pedido;
- sem prejuízo do pagamento precípuo das custas (da execução e do concurso), para pagamento pelo produto da alienação do referido imóvel penhorado (acima referido em 1.º), graduo os créditos verificados e o crédito exequendo do seguinte modo:
1.º - crédito exequendo.
2.º - créditos aqui reclamados por DD e acima verificados.
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Custas pelo aqui reclamado/executado, mantendo-se à presente reclamação o valor indicado na petição inicial[[4]].
Registe e notifique.”
Em 13 de março de 2023, inconformado com a sentença que precede, CC interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
“1. Entende-se hoje que um sistema judicial inspirado em valores democráticos não é compatível com decisões que hajam de impor-se apenas em razão da autoridade de quem as profere, mas antes pela razão que lhes subjaz e que só uma cabal fundamentação da decisão permite o controlo da legalidade do ato e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da correção e justiça, sendo ainda um meio importante para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, atuando por isso como meio de autocontrolo.
2. Porém, como tem dito o Tribunal Constitucional, a livre apreciação da prova não pode ser entendida como uma atividade puramente subjetiva, emocional e, portanto, não fundamentada juridicamente. Tal princípio, no entendimento do Tribunal Constitucional, concretiza-se numa valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permitirá ao julgador objetivar a apreciação dos factos, requisito necessário para uma efetiva...
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