Acórdão nº 1566/17.1T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-07-10

Data de Julgamento10 Julho 2023
Ano2023
Número Acordão1566/17.1T8BGC.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

Proc. n.º 1566/17.1T8BGC.G1

I - AA e marido BB Lopes– titulares dos números de identificação fiscal Singular nº. ...70 e ...88, com residência em ... – ... – ..., intentaram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra CC, casada, nif. ..., residente na Rua ... – ... - ... e marido, DD, casado, nif. ..., residente na Rua ... – ... - ..., pedindo o seguinte:

(a) Se declare absolutamente ineficaz, para efeitos de Inscrição matricial, e Registo Predial, a Escritura Pública de Justificação Notarial, outorgada pelos R.R. em 25 de Outubro de 2017, exarada a fls. 24 e 26 do respetivo livro número duzentos e setenta e três, outorgada no Cartório Notarial, sito na Avenida ..., ..., ... em ..., perante o respetivo Notário Dr.º EE – publicada no Jornal ... a em 31 de Outubro de 2017.
(b) Se declare inexistente o facto da posse e do direito de propriedade justificado pela R. na referida escritura, relativamente ao prédio ali identificado com o artigo matricial ...44.Pº da freguesia ..., do concelho ....
(c) Se declare que as declarações prestadas pelos R.R. e testemunhas nesta escritura de Justificação no que cabe ao prédio rústico, não correspondem à verdade, sendo falsas.
(d) Se declare nula e de nenhum efeito a inscrição matricial de tal artigo, assim como a presente Escritura Pública de Justificação Notarial, por validamente impugnado o seu conteúdo.
(e) Se decrete a falsidade dos factos cuja Justificação se pretendeu através da dita escritura, devendo declarar-se inexistente o pretenso direito dos R.R. sobre o descrito prédio.
(f) Condenação dos R.R. nas custas e condigna procuradoria.
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Os Réus regularmente citados, apresentaram contestação, alegando, em suma, que o falecido FF, pai da Autora mulher, vendeu verbalmente aos aqui Réus uma parcela do seu olival, sito naquele Lugar ..., no ano de 1980.
Depois de comprar o terreno, os Réus começaram a comprar os materiais de construção, colocando-os no terreno (areias, cimentos, tijolos), e logo começaram a construir o estábulo/armazém que ali se encontra hoje.
Pronunciado, assim, pela improcedência da ação, e peticionam a condenação dos AA. como litigantes de má-fé em multa e indemnização a favor dos Réus nunca inferior a €1.000,00.
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Os Autores exerceram o direito ao contraditório quanto à alegada exceção, cfr. fls. 79 e seg..
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O Réu DD faleceu, pelo que, no apenso A, foi julgado procedente o incidente de habilitação de herdeiros, e, em consequência, declararam-se CC, GG e HH, habilitados como herdeiros do Réu, DD, para prosseguir no lugar deste os termos do processo até final

Os autos prosseguiram e, efectuado o julgamento, foi proferida sentença na qual se decidiu:

Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se julgar a ação totalmente improcedente, e, em consequência:

a) Absolver os Réus do peticionado.
b) Julgar o pedido quanto à litigância de má-fé dos Autores improcedente, e, em consequência, absolvê-los.

Inconformados os autores interpuseram recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões:
a) Apesar de dar como provados os factos 1 a 6, 9, 11 a 19, o Tribunal a quo não fundamenta nem produz qualquer análise crítica da prova produzida quanto a estes factos, sendo totalmente omissa nessa matéria quanto aos mesmos, violando o disposto no art. 607º, n.ºs 3 e 4 do CPC e conduzindo à inevitável nulidade da sentença, por força do disposto no artigo 615, n.º 1, alínea b) do CPC, com todas as consequências legais.
b) Sem prescindir, sempre se dirá que por essa mesma razão, tais factos não podiam ter sido dados como provados.
c) Tanto mais que, os factos 1 a 6 apenas transcrevem o teor da escritura de justificação que – conforme consta da fundamentação jurídica dessa mesma sentença e como infra melhor se explicará – foi impugnada pelos aqui Recorrentes e, por essa razão, se traduz na impugnação dos factos com base nos quais foi celebrado o registo, impedindo que os aqui Recorridos possam beneficiar da eficácia da presunção legal do registo.
d) Também não se podem manter como factos provados os que vêm indicado como tal nos pontos 2, 3, 5 e 6 uma vez que incluem expressões e palavras que encerram, ora conceitos de direito (ex. posse, direito, donos), ora conclusões (ex. declaram, invocam, de que se arrogam, alegam, concluindo) que não factos, como se impõe, em clara violação do disposto no artigo 607º, n.º 4 do CPC, devendo ser os pontos em causa totalmente desconsiderados cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29-04- 2015, Proc. 306/12.6TTCVL.C1.S1, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 16-01- 2017, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
e) Já quanto aos pontos 11, 13, 14, 15 e 16, a prova produzida nos autos foi em sentido diverso do que ali está representado, devendo ser julgados não provados.
f) Vejam-se, a este propósito, os depoimentos das seguintes testemunhas: II (minutos 06:02 a 06:08, intervalo 16:39:12 a 17:14:37, sessão do dia 08-06-2021); JJ (minutos 11:18 a 11:33, intervalo 14:27:32 a 15:12:00, sessão do dia 30-06-2021); KK (minutos 19:25 a 19:28, intervalo 15:12:53 a 15:44:01, sessão do dia 30-06-2021).
g) Ora, estranha-se que as testemunhas dos aqui Recorridos afirmem perentoriamente e com segurança que a alegada venda e construção do armazém tenha acontecido há mais de trinta anos, mas ainda mais se entranha que nenhuma delas consiga explicar, de forma convincente, o motivo pelo qual refere esse lapso temporal.
h) Será porque é de conhecimento comum que o decurso de um lapso de tempo de 20 ou 30 anos permite adquirir a propriedade por usucapião? Quiçá...
i) Não basta dizer-se “há seguramente mais de 30 anos”, é necessário contextualizar, referir factos concretos, credíveis, coincidentes e que permitam ao Tribunal formar a firme convicção que, efetivamente, tais factos ocorreram nessa data.
j) O que, in casu, não se verificou, não obstante incumbir aos RR. o ónus da prova!
k) Também não percebem os Recorrentes como pode o Tribunal a quo dar como provada a compra de uma parcela de terreno (pontos 11, 13, 14 e 16) quando todas as testemunhas dos Recorridos se referem única e exclusivamente a um armazém/palheiro.
l) É claro que um armazém ou um palheiro não correspondem, nem na gíria, nem a nível técnico-jurídico a um terreno.
m) Veja-se, também, o depoimento das testemunhas LL (minutos 08:20 a 08:29 e 08:37 a 08:42, intervalo 16:20:22 a 16:36:44, sessão do dia 08- 06-2021), MM (minutos 04:37 a 04:40, intervalo 11:39:18 a 12:03:53, sessão do dia 13-01-2021), NN (minutos 18:26 a 18:32, intervalo 12:17:17 a 12:44:02, sessão do dia 13-01-2021) e, ainda, OO (minutos 23:25 a 23:29, intervalo 12:47:04 a 13:21:32 da sessão de 13-01- 2021).
n) Sendo que quanto à factualidade dada como provada no ponto 15 nenhuma prova foi produzida nem carreada para os presentes autos (documental, testemunhal ou outra) que permitisse dar como provado este facto.
o) Por sua vez, devia ter sido dado como provado e, portanto, acrescer à lista de factos, porque essenciais e importantes para o apuramento da verdade material, que:
“O pai da A. mulher, na qualidade de quem gere o património dos filhos, autorizou os RR. a usar parcialmente o prédio, apenas e tão só, o vulgo “palheiro”, por lhes ter sido em tempo exigido, pela junta de freguesia a retirada dos animais do centro das aldeias, para Armazéns e terrenos periféricos, e, em troca os RR., ajudavam os pais da A. Mulher no granjeio das suas hortas e dos filhos”;
“Tal limitado, ao tempo necessário, para que os RR. pudessem construir então um palheiro “seu” deles – O que era normal e usual nas aldeias, a que os AA., não se opuseram, pois, o que o pai da A. mulher decidia, em princípio os AA. não contrariavam”.
p) Isto posto, a ser bem decidida a questão, devem ser alterados, após reapreciação da prova produzida nos termos expostos, os factos provados e enumerados na decisão como 11, 13, 14, 15, 16, para não provados, bem como aditados os factos supra mencionados nos pontos 39 e 40, como factos provados, assim como devem ser expurgados e desconsiderados os factos 1 a 6, 9, 11 a 19, por não estarem fundamentados, conterem meras conclusões e conceitos jurídicos;
q) Sem prescindir, em face dos restantes factos que se aceitam como provados, estes não são adequados a provar...

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