Acórdão nº 1541/13.5BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-02-17

Ano2022
Número Acordão1541/13.5BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul


Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

L..., melhor identificado nos autos, intentou acção administrativa especial contra a FCT - Fundação para a Ciência e Tecnologia, com os demais sinais nos autos, formulando o seguinte pedido: “Termos em que, e nos demais de Direito, que o Tribunal doutamente suprirá, se requer que seja (I) impugnado o ato praticado pela FCT em 13.03.2013, que decidiu a classificação final do ora Autor no âmbito do concurso de Atribuição de Bolsas Individuais de Doutoramento e Pós-Doutoramento, para o ano de 2012, e (II) intimação da Ré para a correção da lista de classificação final do referido concurso, com a correspondente atribuição da respetiva bolsa.”
Indicou como Contra-interessados C…, A…., B…, M……, A…, H…, R…., S…., D…., A…, R….. e M…..
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Por sentença, de 30.09.2020, o Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu a Entidade Demandada do pedido. *
Inconformado, o Autor interpôs recurso da referida sentença.
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O Recorrente formulou as seguintes conclusões:
1.ª O presente recurso é interposto por, em nossa opinião, o douto Tribunal a quo ter errado na fixação da matéria de facto relevante para a decisão dos presentes autos, e por ter errado quanto à avaliação dos vícios assacados ao ato impugnado, nomeadamente no que diz respeito à vinculação da Entidade Demandada em considerar o segundo mestrado para aferição critério “mérito intrínseco do candidato” no concurso ora em causa.
i) Não Fixação como Facto Provado do Segundo Mestrado Concluído pelo Autor

2.ª Tendo em conta o documento junto aos autos pelo Autor em 06.12.2017, e a não impugnação do mesmo pela Entidade Demanda, o douto Tribunal a quo deveria ter dado como provado que o Autor concluiu, em 05.09.2012, mestrado em Lógica e Filosofia da Ciência, na Universidade de Salamanca, com classificação de “Notable”, correspondente a uma média final quantitativa de 16,7 valores.
3.ª A Sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia do douto Tribunal a quo quanto ao facto referido na conclusão anterior, porquanto o referido facto é a base da relação material controvertida configurada pelo ora Recorrente.

ii) Valoração Errada do Facto Assente Relativo ao Conteúdo do Edital

4.ª O douto Tribunal a quo valorou de forma errada o facto 3) dado como provado constante, porquanto, não obstante ter dado como provado nesse facto o conteúdo do Edital do concurso ora em causa, tirou conclusões diferentes do que consta do mesmo Edital.
5.ª De facto, e não obstante no Edital constar expressamente que os candidatos não tinham de fazer prova no momento da candidatura do grau académico exigido para as bolsas previstas no concurso ora em crise – cujo teor foi dado como provado –, o Tribunal a quo concluiu que o Autor deveria ter feito prova da conclusão do seu segundo mestrado no momento da candidatura.

iii) Vinculação da FCT em Considerar o Segundo Mestrado do Autor

6.ª Contrariamente ao referido pelo Tribunal a quo, a Entidade Demandada estava vinculada a considerar o segundo mestrado do Autor, porquanto nem o Guião nem o Edital comprimiram a margem de livre apreciação que o artigo 17.º/1 do RBIFCT conferiu à FCT para determinar como se preenchia o conceito indeterminado “mérito intrínseco do candidato” no concurso ora em crise.
7.ª Isto porque, não obstante os critérios e as situações previstas no Edital e no Guião, consta expressamente deste último que o painel de avaliação deve efetuar um “julgamento global” sobre o mérito do candidato e não apenas um julgamento restrito às situações ali expressas.
8.ª Sendo que, naturalmente, interpretando esse conceito indeterminado à luz dos princípios gerais da atividade administrativa que guiam a FCT e à luz dos objetivos com que o concurso ora em crise foi aberto, ter-se-á de concluir que o mencionado conceito visa precisamente permitir que o painel de avaliação tenha em consideração todos os elementos que sejam relevantes para determinar o mérito de cada candidato.
9.ª Isto é, o referido conceito visa vincular a Entidade Demandada a descobrir a verdade material do mérito de cada candidato, de forma a que na avaliação do critério “mérito intrínseco do candidato” sejam consideradas todas as situações que relevantes para o efeito.
10.ª Em harmonia com o que se acabou de concluir, o Guião prevê válvula de escape para o efeito, que consiste na existência de uma fórmula bietápica para os candidatos que efetuaram e concluíram a licenciatura pós-Bolonha e para os candidatos que não têm a sua situação expressa e taxativamente prevista no Guião.
11.ª Note-se que ambos os conceitos são conceitos indeterminados que, conforme referiu o Supremo Tribunal Administrativo em acórdão proferido em 27.11.2013, no âmbito do processo n.º 01159/09, vinculam a Administração na descoberta da única hipótese possível para cada situação em concreto.
12.ª Assim, nunca poderia a FCT desconsiderar o segundo mestrado realizado e concluído pelo Autor, sob pena de violação de violação das regras a que estava legalmente vinculada e de regras a que se auto vinculou na abertura do concurso ora em crise.

iv) Erro nos Pressupostos de Facto e de Direito do Ato Impugnado

13.ª Considerando a vinculação da FCT em considerar o segundo mestrado do Autor e a válvula de escape contida no Guião, o Painel de Avaliação devia ter quantificado o critério “mérito intrínseco do candidato” através da aplicação da fórmula bietápica, sob pena de o ato impugnado estar inquinado por erro nos pressupostos de facto e de direito.
14.ª Como consta do Guião, a fórmula bietápica – válvula de escape – deve ser sempre aplicada nos “Casos que não se incluam em nenhuma das classes previstas na tabela anterior”.
15.ª A fórmula bietápica permite a quantificação do critério “mérito intrínseco do candidato” para os candidatos que concluíram a sua licenciatura pós Bolonha, assim como a quantificação e qualificação de todas as situações que não se encontrem expressa e taxativamente previstas no Guião.
16.ª Além disso, a referida fórmula permite que a quantificação de cada candidato seja efetuada através do recurso aos ECTS que cada candidato realizou ao longo da sua carreira académica.
17.ª Desta forma, e considerando que o Autor concluiu a licenciatura de 4 anos, com média de 15,4 valores, a que correspondem 240 ECTs; e que no mestrado realizado na Universidade de Salamanca obteve média de 16,7 valores, a que correspondem 60 ECTs, no caso do Autor a fórmula bietápica consubstancia-se na seguinte equação:
15,4*240 + 16,7*60
________________ = 15,66 = 16
300
18.ª Nos termos do Guião, média de 16 equivale uma classificação de 4,0, à qual deveria ter sido adicionada a bonificação de 0,5, dado o autor ser titular de uma licenciatura e mestrado ambos pré-Bolonha, e uma bonificação de 0,2, previsto por existência de artigos, num total de 4,7 pontos que deveriam ter sido atribuídos no critério ora em causa.
19.ª A classificação do ora Recorrente com a pontuação de 4,7 no critério de “mérito intrínseco do candidato” não implica que os contrainteressados saiam prejudicados, implica apenas que ao Autor seja atribuída a bolsa a que se candidatou e que merece legalmente que lhe seja atribuída; já que a FCT referiu a existência de linha corte para área de Filosofia onde acima de 4,13 pontos é sempre atribuída bolsa.

v) Falta de Instrução

20.ª Uma vez que o Autor apenas tinha de ter provado a conclusão do seu segundo mestrado aquando da atribuição da bolsa, nos termos do expressamente referido no Edital e nos artigos 16.º/2 e 16.º/3/b) do RBIFCT, caso a Entidade Demanda tivesse alguma dúvida quanto à conclusão do mesmo, poderia e deveria ter atribuído bolsa condicionada ou averiguado previamente essa mesma questão.
21.ª Assim, errou o Tribunal a quo ao considerar que o Autor tinha de ter feito prova do seu segundo mestrado no momento da apresentação da candidatura, e ao não considerar que a FCT deveria ter averiguado se o Autor tinha ou não concluído o segundo mestrado, em particular no momento em que respondeu às pronúncias do Autor em sede de audiência prévia e recurso.
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Regularmente notificada para o efeito, a Recorrida não contra-alegou.
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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, não emitiu parecer. *
Os autos foram a vistos.
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II – OBJECTO DO RECURSO

As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 e 2 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, reconduzem-se a saber se a sentença recorrida padece de:
- Nulidade por omissão de pronúncia;
- Erro de julgamento ao concluir que o Autor não tem direito a exigir que a entidade demandada lhe atribua uma bolsa de doutoramento, no domínio da Filosofia, no âmbito do Concurso para Atribuição de Bolsas Individuais de Doutoramento e Pós-Doutoramento – 2012.
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III – FUNDAMENTAÇÃO

De Facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
1) Em 24/06/2005 o autor concluiu a licenciatura em Filosofia, com a classificação final de 15 valores, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa [cf. fls. 8-9, do processo administrativo].
2) Em 02/11/2009 o autor concluiu o grau de Mestre em Filosofia, na área de especialização em Filosofia da Natureza e do Ambiente, com a classificação de Bom, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa [cf. fls. 7, do processo administrativo].
3) A entidade demandada publicitou na sua página da internet o “Edital do Concurso para Atribuição de Bolsas Individuais de Doutoramento e Pós-Doutoramento – 2012”, que tem o teor do documento A, que se dá aqui por...

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