Acórdão nº 1516/14.7TBMTJ-A.L2-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 12-05-2022

Data de Julgamento12 Maio 2022
Ano2022
Número Acordão1516/14.7TBMTJ-A.L2-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:



I–RELATÓRIO



1–K……. C……., Executado, deduziu oposição à execução, mediante embargos, aduzindo, em súmula, o seguinte:
o ora Embargante está a ser executado nos autos principais, unicamente, na qualidade de herdeiro do seu falecido pai Arménio ……. ;
pelo pagamento da dívida exequenda apenas respondem os bens que eram da herança do falecido Arménio ……., tal como dispõe o número 2 do artigo 2071.º do Código Civil ;
ficando excluídos, dessa responsabilidade, os bens pertencentes ao ora Embargante, totalmente alheios à herança recebida do seu falecido Pai ;
o avalista Arménio ……. faleceu em 13 de Novembro de 2008, deixando como seus únicos herdeiros os seus três filhos L……. C……., T……. C……. e K……. C……., todos eles Executados nos autos principais ;
até ao seu óbito, Arménio ……. dedicava-se à construção civil, tendo, para o efeito, constituído duas sociedades comerciais “L……., Lda.” e “A……., Lda.”, e, consequentemente, convidado L……. C……. e T……. C……., dois dos seus filhos, para sócios da primeira sociedade comercial ;
sempre tendo estado o Embargante afastado dos negócios da família ;
e assim se mantendo após o falecimento do seu Pai ;
após tal óbito, os irmãos do ora Embargante, L….... C……. e T……. C……., comunicaram-lhe o interesse em manter os negócios das sociedades referenciadas, ainda que a situação financeira das mesmas não fosse favorável ;
tendo o ora Embargante, de imediato, retorquido aos irmãos que abdicava da parte dele, a favor dos mesmos ;
tendo-se então procedido à partilha das quotas das sociedades, a favor dos irmãos, abdicando o ora Embargante do recebimento de quaisquer tornas ;
donde, não é o Executado, ora Embargante, titular de qualquer bem susceptível de ser penhorado para satisfação da quantia exequenda, porquanto pela mesma não respondem os bens pessoais do mesmo, mas apenas os bens herdados do seu falecido Pai ;
por outro lado, o título executivo foi abusivamente preenchido por ausência de interpelação dos obrigados no mesmo, em concreto dos sucessores do falecido avalista Arménio ……., mormente, o Executado K……. C……., aqui Embargante, que sucedeu nos direitos e obrigações daquele ;
estando o ora Embargante a ser demandado na qualidade de herdeiro de seu falecido pai, pode ele invocar as excepções que o falecido teria direito a invocar, na qualidade de avalista, entre elas a de excepção de preenchimento abusivo ;
os sucessores do avalista Arménio ……., dentre os quais o Executado, aqui Embargante, deveriam ter sido interpelados pelo Exequente, aqui Embargado, do vencimento antecipado das prestações previstas até ao termo do Contrato de Abertura de Crédito, por incumprimento do mesmo pela sociedade comercial subscritora da livrança dada à execução, aqui Executada ;
o que não aconteceu e que constitui um pressuposto básico e fundamental que legitimaria o Exequente, aqui Embargado, a preencher a livrança dada à execução ;
sendo que os Executados apenas foram interpelados para proceder ao pagamento dos valores em dívida após a livrança já estar preenchida ;
pelo que, não tendo sido efectuada aquela interpelação, é abusivo o preenchimento da livrança dada à presente execução como título executivo, não existindo, desta forma, um título executivo válido ;
donde, deverá a presente Oposição à Execução, mediante Embargos, ser julgada procedente, com fundamento na inexequibilidade do título executivo, por ausência de interpelação dos obrigados no mesmo, e consequentemente, ser extinta a respectiva execução, nos termos e ao abrigo do número 4 do artigo 732.º do C. P. C. ;
acresce, ainda, que para garantia da dívida exequenda foi constituída hipoteca sobre a fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés-do-chão direito, destinada a comércio, do prédio urbano sito na Rua A....., n.ºs ..., ... e ..., da freguesia de A....., concelho de M_____, descrito na Conservatória do Registo Predial do M_____ sob o n.º 0...0, freguesia de A....., concelho de M_____ e inscrito da respectiva matriz predial sob o artigo 1..9.º ;
tendo a “A……., Lda.” sido declarada insolvente, no âmbito do processo de insolvência que correu os seus termos no Juiz 2 do Juízo de Comércio de Lisboa do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, sob o n.º 1830/14.1TYLSB ;
no qual a ora Embargada reclamou o crédito exequendo, tendo tal imóvel sido ali vendido, destinando-se o preço da venda ao pagamento da dívida exequenda aqui em causa ;
estranhando-se que a Embargada não tenha comunicado ao processo executivo o valor recebido e não promova a redução da quantia exequenda.

Conclui, no sentido de:
ser declarado inexequível o título executivo apresentado, extinguindo-se, no todo, a execução ;
em qualquer caso, extinta a execução, por ausência de bens penhoráveis.

2–Admitidos liminarmente os embargos, após prévio juízo de indeferimento liminar que foi revogado por esta Relação, veio a Exequente/Embargada C……., S.A., apresentar contestação – cf., fls. 75 a 79 -, aduzindo, em resumo, o seguinte:
a questão relativa à identidade e propriedade dos bens objecto de penhora não deve ser apreciada através do presente meio processual, mas antes através do incidente de oposição à penhora, com os fundamentos elencados no nº. 1, do artº. 784º, do Cód. de Processo Civil ;
ademais, não foi ainda realizada qualquer diligência de penhora nos presentes autos, pelo que a defesa deduzida a tal respeito é, para além do mais, intempestiva ;
relativamente à excepção de preenchimento abusivo por falta de interpelação, é sobre o Embargante que recai o ónus probatório de ausência de interpelação, sendo falso que não tenha interpelado os obrigados, mormente os sucessores do avalista Arménio ……. ;
e, mesmo a admitir-se, hipoteticamente, tal falta de interpelação, nunca as consequências jurídicas de tal alegada omissão seriam aquelas pretendidas pelo Embargante ;
sendo que este não põe em causa os elementos com que a Embargada preencheu o título em branco, designadamente o montante dele constante ou a data de vencimento nele aposta ;
donde resulta que o titulo cambiário é exequível, pelo que não poderá deixar de ser julgada improcedente a excepção deduzida ;
por outro lado, é completamente falso que os montantes auferidos ou a auferir pela Embargada, provenientes da referida insolvência, e da concretizada venda do imóvel hipotecado a seu favor, sejam suficientes para liquidar a quantia exequenda nestes autos ;
tal imóvel foi vendido em 29.12.2015, à ora Embargada, pelo preço de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros), tendo esta procedido ao depósito de 20% do preço (€ 15.000,00), encontrando-se dispensada do pagamento do remanescente ;
tal valor auferido com a referida compra e venda foi imputado à dívida do referido empréstimo e só em 18.01.2017 foi declarada finda a liquidação ;
apenas em 27.02.2018 foi elaborado o mapa de rateio referente ao saldo da massa insolvente, no processo de insolvência, sem que a Embargada tenha ainda recebido o valor que, por força de tal cálculo, lhe caberia ;
pelo que, só após definitivo apuramento e efectivo recebimento de todos os montantes provenientes do processo de insolvência fará sentido vir comunicar nos presentes autos qual o montante em dívida e reduzir a quantia exequenda ;
sendo que, atento o valor da quantia exequenda (€ 122.782,04), reportada a 2014, e o valor obtido com a venda do bem imóvel, é manifesto que os montantes provenientes do processo de insolvência da sociedade “A……., Lda.” não são nem serão, de todo, suficientes para liquidar a quantia exequenda.
Conclui, no sentido da improcedência das excepções deduzidas e, consequentemente, pela improcedência dos embargos.

3–Conforme fls. 88 e 89:
dispensou-se a realização de audiência prévia ;
fixou-se o valor processual da causa ;
proferiu-se saneador stricto sensu ;
fixaram-se o objecto do litígio: Analisar se se verificam os fundamentos de embargos de executado previstos nos art.ºs 731.º e 729.º, alínea a), 2.ª parte, alínea e) e alínea g), 1.ª parte, do novo Código de Processo Civil, tendo que se apreciar e decidir se o título é exequível, se a obrigação exequenda é exigível e se ocorreu algum facto extintivo ou modificativo dessa obrigação,
e temas da prova:
I.- Apreciar da admissibilidade, extensão e universo de bens do embargante passíveis de penhora.
II.- Apreciar da existência e efeitos da interpelação do embargante para o preenchimento da livrança e cumprimento da obrigação.
III.- Fixação da quantia exequenda ;
apreciaram-se os requerimentos probatórios ;
designou-se data para a realização da audiência de discussão e julgamento.
4–Designada data para a realização de julgamento, veio este a ocorrer conforme acta de 28/09/2021 – cf., fls. 96 -, com observância do legal formalismo.
5–Após, datada de 05/11/2021, foi proferida SENTENÇA, que terminou com o seguinte dispositivo:
VI–DECISÃO
Pelo exposto, julga-se procedente a presente oposição absolvendo-se o executado da instância executiva.
Custas pela embargada.
Registe e notifique”.
6–Inconformada com o decidido, a Exequente/Embargada interpôs recurso de apelação, em 13/12/2021, por referência à decisão prolatada.

Apresentou, em conformidade, a Recorrente as seguintes CONCLUSÕES:
a)-O presente recurso vem interposto da douta sentença de 05 de Novembro de 2021, com a ref.ª 409279155, que julgou totalmente procedentes os Embargos de Executado, determinando, por conseguinte, a absolvição do Executado da instância.
b)-Não se conforma a Recorrente com a douta sentença aqui em apreço, porquanto a mesma não faz, salvo o devido respeito, que é muito, a correta interpretação da lei e dos factos. Ora vejamos,
c)-A Exequente instaurou, em 26.07.2014, a presente ação executiva tendo por base uma livrança, a
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