Acórdão nº 1510/14.8TBACB.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 12-09-2023

Data de Julgamento12 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão1510/14.8TBACB.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE COMÉRCIO DE ALCOBAÇA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA)
Processo n.º 1510/14.8TBACB

(Juízo de Comércio de Alcobaça - Juiz ...)

1.Relatório

O Juízo de Comércio de Alcobaça – J... proferiu a seguinte decisão:

“(…) A remuneração do Sr.º AI fixar-se-ia no somatório do valor de €413133,88 e de 116628,02 €, ou seja 529761,90 € .

Vistos os autos o Sr.º AI entende ser-lhe devida a remuneração de 230439,60€ (acrescida de IVA), isto porque, segundo o Sr.º AI, o limite a que alude o disposto no artigo 23.º, 10 do EAI se reporta ao cálculo efetuado nos termos da alínea b) do n.º 4, ou seja, refere-se à primeira parte do cálculo, antes da aplicação da majoração.

Já os credores que se pronunciaram entendem que o limite estabelecido no n.º 10 do artigo 23.º da Lei 22/2013, aplica-se ao total da remuneração variável, pelo que a remuneração variável do Sr.º AI não pode ser superior a €100000,00.

Vejamos:

O Tribunal não olvida que as alterações decorrentes da Lei 9/2022 vieram trazer alterações ao cálculo da remuneração variável a atribuir aos senhores administradores de insolvência, sendo manifesto que tais alterações implicam o recebimento por parte dos Senhores administradores de valores mais elevados de remuneração. No nosso caso devemos ter em conta que toda a atividade de liquidação foi desenvolvida na vigência da anterior redação do Estatuto do Administrador da Insolvência, tendo o Sr. Administrador a expectativa de vir a receber remuneração variável substancialmente inferior à que agora poderá receber, com a consequente menor satisfação dos créditos.

A tudo acresce o disposto no n.º10 do artigo 23.º do EAJ, de facto e por força de tal normativo a remuneração calculada nos termos da alínea b) do n.º 4 do mesmo artigo, ou seja a remuneração calculada sobre o resultado da liquidação massa insolvente, não pode ser superior a €100.000,00 (cfr. ainda Acórdão do TRE, processo n.º 260/14.0TBTVR.E1, consultável em www.dgsi.pt).

Ora como bem nota o Acórdão n.º 22770/19.2T8LSB-F.L1-1, do Tribunal da Relação de Lisboa, consultável em www.dgsi.pt: “O limite previsto no art. 23º nº10 do Estatuto do Administrador Judicial é aplicável à remuneração variável total, compreendendo a majoração, nos processos em que a remuneração variável seja calculada sobre o resultado da liquidação da massa insolvente, funcionando como limite da mesma e não apenas da parcela achada com a operação de cálculo prevista na al. b) do nº4 e no nº6 do mesmo artigo”.

Pelo exposto e de acordo com as normas legais citadas, a remuneração variável do Administrador de Insolvência cifra-se em 100 000,00 € (cem mil euros) a que acresce IVA à taxa legal.

*

Notifique, sendo o Sr.º AI para apresentar mapa de rateio tendo em conta o despacho supra.

Após, cumpra-se o disposto no artigo 182.º, do CIRE”.

AA, administrador de insolvência nomeado, não se conformado com tal decisão, dela interpõe recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:

I. Dispõe, no que ora releva, o art. 23.º, n.º 4, do EAJ que “Os administradores judiciais (…) auferem (…) uma remuneração variável em função do resultado (…) da liquidação da massa insolvente, cujo valor é calculado nos seguintes termos:

(…)

b) 5% do resultado da liquidação da massa insolvente, nos termos do n.º 6.”

II. Decorre, por sua vez, do n.º 6 do mesmo normativo que “Para efeitos do n.º 4, considera-se resultado da liquidação o montante apurado para a massa insolvente, depois de deduzidos os montantes necessários ao pagamento das dívidas dessa mesma massa, com exceção da remuneração fixa e das custas de processos judiciais pendentes na data de declaração de insolvência”.

III. “O valor alcançado é ainda majorado, em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos, em 5% do montante dos créditos satisfeitos, sendo o respectivo valor pago previamente à satisfação daqueles (art. 23.º, n.º 7, do EAJ).”

IV. De acordo com o disposto no art.º 23.º/10 do EAJ, prevê-se um limite máximo pois a remuneração calculada nos termos da al. b) do nº4 não pode ser superior a 100.000 €.

V. Compulsado o n.º 10 do artigo 23.º da Lei 22/2013, verifica-se que o limite aí referido se reporta ao cálculo efetuado nos termos da alínea b) do n.º 4, ou seja, refere-se à primeira parte do cálculo, antes da aplicação da majoração.

VI. Desde logo, menciona a “remuneração calculada nos termos da al. b) do nº4”, referindo-se prima facie à parcela sem a majoração (que está prevista no nº7 do mesmo art.º 23.º).

VII. “(…) por regra, as remunerações não conhecem limites máximos no processo de insolvência (com excepção do fiduciário), acrescendo que seria questionável o acerto de uma solução que, a partir de certo montante do resultado da liquidação, deixasse de constituir incentivo ao AI para a demanda de maiores rendimentos em benefício da massa insolvente (…).”

VIII. Não será justificado, designadamente preconizar um limite de € 100.000,00 como tecto máximo inultrapassável quando, calculada nos termos da Portaria nº51/2005, de 20-1, a remuneração variável pelo produto da liquidação seja superior a tal montante, face ao claro intuito do aumento dos seus valores que perpassa as alterações promovidas pela Lei 9/2022, de 11-1, e da portaria que visou transpor.

IX. Assim, dever-se-á atribuir ao valor de € 100.000,00 a natureza de um limite criado para a remuneração calculada nos termos da al. b) do nº4, ou seja, à parcela sem a majoração, que melhor se coaduna com a consagração desse montante em número diverso (nº 10 do art.º 23.º) do número (o nº 8 da mesma disposição legal) onde prevê o valor de € 50.000,00

X. É que, caso estivesse em causa um critério rígido, contemplando um valor inultrapassável, apenas faria sentido a sua previsão numa única norma (que nesse caso determinaria que o valor da remuneração por liquidação, quando superior a € 50.000,00, é fixado pelo juiz considerando as circunstâncias do caso e o limite máximo de € 100.000,00).

XI. Importa, ainda, referir que o presente processo em causa apresenta um elevado grau de complexidade destacando-se os seguintes pontos:

• Foram apreendidos e alienados 50 imóveis e bens móveis, com caraterísticas diversas, o que implicou um tratamento individualizado em função das características e publico alvo de cada um dos bens em venda;

• A verba n.º 53 corresponde a um empreendimento de grandes dimensões em fase de construção, facto que impôs a rápida atuação do administrador tendo em vista a segurança do mesmo por forma a evitar assaltos e/ou pilhagens dos bens apreendidos e/ou de componentes passíveis desvalorizar os mesmos;

• Desmontagem da grua localizada na verba nº 53 atendendo o risco de queda e danificar o edifício e bens de terceiros;

• Identificação e localização de bens e locação financeira e correspondente devolução;

• Foram reconhecidos créditos no valor de € 25.775.820,07, repartidos por mais de duas dezenas de credores, sendo que decorreram diversas contingências no reconhecimento dos mesmos, nomeadamente, impugnações, interposição de recuso contra a Massa insolvente e depois quanto à Sentença de Verificação e Graduação de Créditos;

• Resolução das questões relativas ao condomínio do Edifício ..., com alterações de fechaduras, substituição de um vidro na fachada e acompanhamento das reuniões de condomínio, sempre em período noturno e fora do horário de expediente;

• Análise e tratamento de diversas ações judiciais em curso;

• Realização de cobranças.

XII. A decisão do Tribunal a quo violou a normas legais supra citadas, tendo aquele Tribunal interpretando erroneamente o disposto no artigo 23.º do Estatuto do Administrador Judicial (EAJ), Lei n.º 22/2013, de 26 de fevereiro, com a redação da Lei 9/2022, devendo, por isso, essa decisão ser substituída por outra que aplique corretamente as regras de cálculo constantes do artigo 23.º do Estatuto do Administrador Judicial e, nos termos do art.º 665º do CPC, em juízo de substituição, fixar-se a remuneração do Administrador da Insolvência nos termos supra referidos.

TERMOS EM QUE,

A) se deverá revogar a douta decisão impugnada;

B) atento o disposto no art.º 665º do CPC e estando disponíveis todos os elementos necessários para o efeito, dever-se-á, em juízo de substituição, fixar-se a remuneração do Sr. Administrador da Insolvência nos termos da nova redação do art.º 23º do EAJ. no valor de € 230.439,60 (€ 100.000,00 + € 130.439,60), acrescida de IVA à taxa...

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