Acórdão nº 14966/17.8T8SNT-E.L1-1 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-01-24

Data de Julgamento24 Janeiro 2023
Ano2023
Número Acordão14966/17.8T8SNT-E.L1-1
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

1-Relatório:
O credor Banco …, S.A., requereu a abertura do incidente de qualificação da insolvência de T…, pedindo seja a mesma julgada culposa.
O Ministério Público pugnou, igualmente, pela qualificação culposa.
Aberto o incidente de qualificação o Requerido T… foi regularmente citado e apresentou oposição, concluindo pelo carácter fortuito da insolvência.
Foi apresentada resposta pelo credor, B…, S.A. e pelo Magistrado do MP.
Foi realizada audiência prévia, identificado o objecto do litígio e os temas da prova e designada data para realização de julgamento.
Procedeu-se a julgamento.
Foi deduzido incidente de justo impedimento, pela Mandatária do insolvente.
Por despacho proferido em 24-11-2021, não se admitiu o mesmo por extemporâneo, mais se julgando não existir qualquer nulidade.
Foi apresentado recurso de tal despacho, o qual não foi admitido.
Veio a ser proferida sentença, com o seguinte teor na sua parte decisória:
«Pelo exposto, nos termos do disposto nos artigos 189.º, n.ºs 1 e 2 e 4 do CIRE, decide-se qualificar como culposa a insolvência de R…, declarando-o afectado e, em consequência:
a) Declara-lo inibido, pelo período de 5 (cinco) anos, para administrar patrimónios de terceiros e para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa;
b) Condenar o Requerido em indemnização a favor dos credores, a liquidação em execução de sentença;
c) Condenar em custas o afectado pela qualificação da insolvência».

Inconformado recorreu o insolvente, concluindo as suas alegações:
1- O Recorrente não se conforma com esta douta sentença proferida pelo Tribunal a quo pelo que, da mesma interpôs o presente recurso.
2- Desde logo, o Recorrente não se conforma com o despacho, proferido em 24/11/2021, que não admitiu, por extemporâneo, o incidente de justo impedimento apresentado.
3- O incidente é manifestamente tempestivo porquanto a mi. mandatária do Recorrente procedeu à comunicação ao Tribunal e à alegação de justo impedimento logo que cessou a sua impossibilidade para prática dos atos próprios da profissão de advogada (bem como para a prática de quaisquer outros).
4- No agendado dia da audiência de discussão e julgamento, 20/09/2021, a mi. mandatária do Recorrente foi acometida por doença súbita, imprevisível e incapacitante.
5- A mi. mandatária do Recorrente por força de tal doença (súbita, imprevisível e incapacitante) ficou impossibilitada e impedida de estar presente em tal audiência;
6- Bem como ficou impossibilitada e impedida de praticar quaisquer atos judiciais…
7- Ficou mesmo impossibilitada e impedida de praticar atos de outra natureza, tendo, nomeadamente ficado impossibilitada de proceder, por si, à comunicação de tal facto ao Tribunal ora recorrido.
8- Reafirme-se: na data da realização da audiência de julgamento, em consequência da doença (súbita, imprevisível e incapacitante), a mi. mandatária do Recorrente ficou impossibilitada e impedida de comparecer em tal audiência bem como ficou impossibilitada e impedida de, por si, proceder a qualquer comunicação ao Tribunal ora recorrido, bem como ficou impedida de praticar quaisquer atos judiciais, nomeadamente de alegar justo impedimento para a sua não presença.
9- O Tribunal recorrido não tinha quaisquer indícios de que a comunicação que lhe foi prestada pela mi. advogada Dr.ª A… (informando que a mi. mandatária do Recorrente se encontrava com síndrome vertiginoso e, em consequência, impedida de estar presente bem como de praticar quaisquer atos no processo, próprios da profissão de advogada e de outra natureza) não era verdadeira.
10 - A mi. mandatária do Recorrente esteve impedida de praticar quaisquer atos próprios da sua profissão de advogada (para além de outros) até ao dia 24/09/2021 por força da doença súbita, imprevisível e incapacitante de que foi acometida.
11- No dia em que cessou a incapacidade, de imediato, a mi. mandatária do Recorrente, remeteu ao Tribunal o competente requerimento comunicando o seu impedimento e invocando a existência de justo impedimento, oferecendo de imediato a competente prova.
12 - A mi. mandatária do Recorrente deu cumprimento, logo que lhe foi possível, ao disposto no art.º 140º, n.º 1, conjugado com o n.º 1, do art.º 603º, in fine.
13- Não poderia a mi. mandatária do Recorrente, contrariamente ao que se fez constar do douto despacho recorrido, “ter feito chegar ao processo um requerimento nesse sentido, alegando a factualidade respectiva e requerendo em conformidade o adiamento da audiência e, juntando a respectiva prova ao abrigo do disposto no art.º 140º, n.º 1 e 2 do CPC.”
14- Porquanto, por força da doença súbita, imprevisível e incapacitante, de que foi acometida, ficou impedida e impossibilitada, totalmente, de praticar quaisquer atos próprios da profissão de advogado ou de qualquer outra natureza.
15- O incidente de justo impedimento apresentado deveria ter sido recebido e, no mínimo, caso não se entendesse como prova bastante, o competente atestado médico apresentado bem como a referência à comunicação recebida pelo Tribunal, serem ordenadas as diligências probatórias reputadas necessários, procedendo-se, a final, à decisão de provimento, declarando-se a nulidade da audiência de discussão e julgamento em causa, procedendo-se a nova marcação e aos ulteriores trâmites processuais.
16 - Ao assim não entender, o Tribunal a quo violou o exato entendimento do disposto nos n.ºs 1 e 2, do art.º 140º, conjugado com o n.º 1, do art.º 603º, in fine, ambos do CPC.
Sem conceder, nem conceber, com o devido respeito, subsidiariamente, sublinhe-se,
17- Realizada a audiência de julgamento (como já se alegou, em desrespeito pelo legal formalismo, sem a presença da mandatária do Recorrente, sem a observância do princípio do contraditório, o que constitui nulidade, como já se invocou) o Tribunal recorrido considerou provados, e bem, os factos constantes dos pontos 1 a 15 e 20 a 21, dos “Factos provados”, com base na prova documental produzida.
18- Mas o Recorrente não se conforma com a decisão proferida quanto à matéria de facto ínsita nos pontos 16 a 19 dos “Factos Provados” admitindo, todavia, como possível a exegese efetuada pelo Tribunal a quo tendo em conta a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento a qual foi realizada, reafirme-se, com inobservância das formalidades legais e do princípio do contraditório.
19 - De facto, a matéria essencial em discussão (a validade do contrato promessa de compra e venda celebrado em 09.02.2011, entre o aqui Recorrente e a credora reclamante S…) foi igualmente objeto de análise e discussão no processo executivo 4785/09.0TCLRS, do Juízo de Execução de Loures (em que foram partes os mesmos intervenientes, ou seja, o Recorrente e os credores reclamantes S… e o BCP, SA), sendo que aí foram considerados provados factos diversos, nomeadamente reconhecendo-se a validade de tal contrato, decisão esta confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, na sequência do recurso interposto pelo aqui requerente, BCP, SA (Acórdão proferido em 17/04/2018, na 7ª Secção, Proc. n.º 4785/09.0TCLRS-A.L1).
20- Reafirme-se, o Recorrente não se conforma com apreciação feita pelo Tribunal a quo no que respeita aos factos constantes dos pontos 16. a 19., nomeadamente quanto à referida vontade real dos contraentes no contrato promessa em crise e ao fim pretendido com a celebração de tal negócio (que o ora Recorrente se propõe provar em audiência de julgamento a realizar em primeira instância, a ser ordenada nos termos e fundamentos supra já alegados).
Ainda, sem conceder, nem conceber, sempre com o devido respeito, e, mais uma vez, subsidiariamente, considerando, a factualidade dada por provada na douta sentença recorrida,
21- Com relevo para a decisão da causa, sendo um dos temas da prova, não ficou provado que a credora reclamante S… vivia, desde 2012, maritalmente com o ora Recorrente.
22- Também não ficou provado que o Recorrente, em conjugação de esforços e vontades com a Credora reclamante (que viria a ser sua esposa a partir de 28/05/2016), tivesse(m) praticado quaisquer atos suscetíveis de criar ou agravar a situação com que o Recorrente se viu confrontado em 31/07/2017, quando foi requerida a sua insolvência.
23- Considerando que a factualidade dada por provada pelo Tribunal a quo é a correspondente à verdade dos factos, a decisão a proferir, após subsunção ao direito, não poderá ser a qualificação da insolvência do Recorrente como culposa.
24- Aquela factualidade, sempre com o devido respeito, não preenche os requisitos exigidos pelos invocados artigos 185º e 186º, n.ºs 1, 2 al. b) e n.º 4, do CIRE.
25- Os factos considerados como provados tiveram lugar até 4 anos e 6 meses antes do pedido de insolvência (que ocorreu em 31/07/2017).
26- O casamento do Recorrente com a credora reclamante, celebrado em 28/05/2016, ocorreu mais de 3 anos e 5 meses depois do último ato alegadamente praticado por ambos (ou seja a transação judicial efetuada em 27/12/2012, no processo 5974/12.6T2SNT).
27- O Recorrente, por si, não praticou, com culpa, qualquer ato suscetível de o colocar em situação de insolvência ou, muito menos, de agravar a sua situação sendo que, à data da outorga do contrato promessa em causa (09-02-2011) nada fazia prever que o mesmo viesse a ser confrontado com o facto de ser requerida a sua insolvência.
28- Os únicos créditos em que o Recorrente é o devedor principal, contraídos por si, são os titulados pelo requerente B…, SA.
9- Sendo os restantes, de valor avultado, resultantes do não pagamento dos créditos contraídos pelas sociedades M… SA e A… Lda., os quais, atenta a sua qualidade de sócio sem quaisquer responsabilidades de gerência, garantiu através de fiança
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