Acórdão nº 14724/22.8T8PRT-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 21-11-2023

Data de Julgamento21 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão14724/22.8T8PRT-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. 14724/22.8 T8PRT-A.P1
Comarca do Porto – Juízo do Execução do Porto – Juiz 1
Apelação

Recorrente: A... e do Porto, I.P.
Recorrido: AA

Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadoras Maria da Luz Teles Meneses de Seabra e Anabela Dias da Silva




Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:


RELATÓRIO
Por apenso à execução movida pelo A..., I.P., veio o executado AA deduzir os presentes embargos.
Pugna, em primeiro lugar, pela inexequibilidade do título executivo, invocando para tanto e em suma, que:
- do acórdão dado à execução resulta genericamente que o executado terá de pagar as custas do processo em questão;
- o exequente juntou efetivamente a decisão anteriormente proferida pela Câmara de Recurso do EUIPO sob o designativo de documento n.º 2, contudo em língua inglesa;
- o dito acórdão não fixou qualquer valor, pois o exequente não peticionou nenhuma quantia concreta em termos de honorários de mandatário nas suas alegações, tendo pedido só uma condenação genérica;
- só “a posteriori”, de forma extra processual e de modo discricionário e arbitrário, quanto aos honorários de mandatário da exequente, esta enviou ao executado o valor custas de parte – que incluem os ditos honorários de mandatário;
- tratando-se de uma condenação genérica e não dependendo a liquidação da obrigação de simples cálculo aritmético, o acórdão em causa no que diz respeito às custas de parte relativas aos honorários de mandatário, só poderá ser considerado título executivo após liquidação.
A exequente contestou, pugnando pela improcedência dos embargos.
Foi dispensada a realização de audiência prévia.
Seguidamente, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedentes os embargos de executado, determinando a extinção da execução quanto ao montante de 6.000,00€ + IVA (total de 7.380,00€) relativos aos honorários do mandatário do exequente, prosseguindo a execução apenas quanto à quantia de 1.890,00€, acrescida dos juros peticionados.
Inconformado com o decidido, interpôs recurso o exequente, tendo este finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:
I. Ao contrário do que julgou a primeira instância, o Apelante pediu ao Tribunal Geral que condenasse o recorrente a pagar as despesas (“the costs”), todas elas, sem distinguir entre custas processuais e honorários de mandatário.
II. Basta ler o § 20 do acórdão do Tribunal Geral que constitui o título exequendo para confirmar que o Apelante pediu ao Tribunal geral para “condenar o recorrente nas despesas, incluindo as relativas ao processo perante o EUIPO e perante a Câmara de Recurso”.
III. Acontece é que — sendo o inglês a língua oficial em que decorreu o processo no Tribunal Geral — o Apelante pediu a condenação do recorrente em “costs” e o Tribunal condenou a parte vencida a pagar tais “costs”.
IV. A simples leitura do art. 140.º do Regulamento de Processo no Tribunal Geral, que define o que são “despesas recuperáveis” (“recoverable costs”), torna claro que nelas se incluem as “despesas indispensáveis efetuadas pelas partes para efeitos do processo, nomeadamente as despesas de deslocação e de estada e os honorários de agentes, consultores ou advogados.”
V. Em face disto, é evidente o erro em que incorreu a Mma. Juíza a quo, quando concluiu que o Apelante “apenas requereu a condenação do executado em custas”.
VI. O que o Apelante requereu ao Tribunal Geral foi a condenação do executado em “costs”, que na versão portuguesa do RPTG se traduz para “despesas”, as quais incluem não só aquelas que já haviam sido fixadas pela Câmara de Recurso do IPIUE, mas também os honorários de advogados relativos ao recurso para o Tribunal Geral.
VII. Desta forma, tendo havido condenação por parte do Tribunal Geral a pagar as despesas/costs, e tendo o Exequente enviado a nota de custas (acompanhada da nota discriminativa de honorários e fatura) ao Executado, estão preenchidos todos os requisitos de que depende a cobrança coerciva: a obrigação é certa, líquida e exigível.
VIII. Sendo assim, o tribunal a quo equivocou-se ao decidir que inexiste “qualquer condenação do executado no pagamento destas quantias” e que, por esse motivo, a execução “é desprovida de título quanto ao montante de €6.000,00 + IVA” relativos aos honorários do mandatário da Exequente.
IX. Acresce que, no âmbito de processos que tenham corrido termos no Tribunal Geral da União Europeia, se a parte vencida pretender discutir ou reclamar das custas de parte apresentadas pela parte vencedora, o meio processual próprio é a reclamação prevista no art. 170.º do RPTG — que o Executado não utilizou.
X. Por isso, mal andou o tribunal recorrido ao apreciar a exigibilidade dos honorários do mandatário da Apelante, quando tal matéria estava subtraída à sua competência, nos termos do art. 170.º do RPTG.
XI. A sentença recorrida violou, pois, o disposto nos arts. 134.º, 140º e 170.º do Regulamento de Processo no Tribunal Geral, publicado no J.O. L 105/01, de 23.4.2015.
Assim, julgando-se procedente o recurso, deve revogar-se a sentença recorrida, na parte em que julgou procedentes os embargos do executado, devendo prosseguir a execução pela totalidade da dívida exequenda.
(…)
Sem prescindir:
- Apesar de o disposto nos artigos 134.º e 140.º do Regulamento de Processo no Tribunal Geral se mostrar perfeitamente claro.
- Considerando o imperativo de que as normas do Direito da União Europeia gozem de uma interpretação e aplicação uniformes em todos os Estados-membros da União;
- Tendo em conta que, neste caso concreto, da decisão a proferir pela Relação do Porto não cabe recurso ordinário, pelo que este Tribunal Superior decidirá em última instância;
- Considerando o disposto no 3.º parágrafo do art. 267.º do Tratado Sobre o Funcionamento da União Europeia;
- Atenta a incerteza que a interpretação dos artigos 134.º e 140.º do Regulamento de Processo no Tribunal Geral — feita pela Mma. Juíza a quo — pode causar no regime jurídico das custas de parte em processos que corram termos no Tribunal Geral da União Europeia.
No caso de alguma incerteza subsistir a este respeito, requer — ao abrigo do disposto no art. 272.º, n.º 1 do CPC —, que seja decretada a suspensão da instância e endereçado ao Tribunal de Justiça da União Europeia um pedido de decisão prejudicial, nos termos do art. 267.º, alínea b) do Tratado Sobre o Funcionamento da União Europeia, a fim de esclarecer as seguintes questões:
1. O artigo 134.º, n.º 1 do Regulamento de Processo no Tribunal Geral deve ser interpretado no sentido de que as despesas em que a parte vencida é condenada só abrangem os honorários de agentes, consultores ou advogados, quando a decisão do tribunal os referir expressamente?
2. Ou, pelo contrário, o facto de o artigo 140.º desse regulamento definir como “despesas recuperáveis” as “despesas indispensáveis efetuadas pelas partes para efeitos do processo, nomeadamente as despesas de deslocação e de estada e os honorários de agentes, consultores ou advogados”, torna dispensável uma referência expressa a esses honorários, na decisão condenatória?
Não foi apresentada resposta ao recurso.
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Cumpre então apreciar e decidir.
*

FUNDAMENTAÇÃO
O âmbito do recurso, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.
*

As questões a decidir são as seguintes:
I. Apurar se o exequente, nos presentes autos de execução, dispõe de título executivo no tocante à importância de 6.000,00€+ IVA, relativa aos honorários do seu mandatário;
II. O eventual reenvio prejudicial.
*
Tendo em atenção os documentos juntos aos autos, na decisão recorrida consideraram-se assentes os seguintes factos:
1. O título que serve de base à execução a que estes autos se encontram apensos, é o Acórdão proferido no âmbito do processo n.º T-417/20, pelo Tribunal Geral da União Europeia, de 6 de outubro de 2021, cujo segmento decisório (traduzido) é o seguinte:
54. Face ao exposto, o fundamento único de recurso deve ser declarado infundado na sua totalidade e o presente recurso, que se baseia nesse fundamento único, deve ser rejeitado, sem que seja necessário pronunciar-se sobre a excepção de inadmissibilidade suscitada pela EUIPO relativamente à segunda parte do segundo pedido do requerente e solicitar ao Tribunal Geral que conceda o registo da marca requerida.
55. Nos termos do artigo 134(1) do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada a pagar as custas se tiverem sido requeridas nas alegações da parte vencedora. Uma vez que o autor foi vencido, deve ser condenado nas custas do presente processo, de acordo com os pedidos formulados pela EUIPO e pelo interveniente. Além disso, no que respeita às custas suportadas pelo interveniente nos processos de oposição e perante a Câmara de Recurso, basta notar, dado que o presente acórdão nega provimento ao recurso interposto da decisão impugnada, é a parte operativa dessa decisão impugnada que continua a determinar essas custas (ver, para
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