Acórdão nº 14521/20.5T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-10-27

Ano2022
Número Acordão14521/20.5T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação nº14521/20.5T8PRT.P1
Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Local Cível do Porto
Relator: Carlos Portela
Adjuntos: António Paulo Vasconcelos
Filipe Caroço

Acordam na 3ª Secção do tribunal da Relação do Porto

I.Relatório:
O Condomínio ... propôs a presente acção declarativa com processo comum, contra a P..., Lda. e a C... Lda., pedindo a condenação das rés nos seguintes termos:
1º) A reconhecer a existência dos defeitos de construção que constam nos relatórios das 3 peritagens juntas aos autos;
2º) A proceder à reconstrução do muro de suporte que ruiu, nos termos preconizados na 1.ª peritagem e á reparação dos referidos defeitos, bem assim como á reparação de consequências provocadas pelos mesmos no interior da arrecadação da fracção I, a liquidar em execução de sentença.
3º) A pagar ao Condomínio Autor, a título de sanção pecuniária compulsória, nos termos do disposto no artigo 829.º-A do C.C., uma indemnização mínima de 1.000€/mês desde a citação até á efectiva reparação dos defeitos.
Alegou, para tanto, que o edifício constituído em propriedade horizontal que identificou foi construído pela primeira ré e as respectivas fracções vendidas pela segunda ré.
Mais alegou que o mesmo apresenta defeitos ao nível da cave e no muro de vedação e suporte, que inclusive ruiu, e que os denunciou perante as rés.
Alegou ainda que apesar de estas terem procedido a reparações, os defeitos não foram debelados.
As rés contestaram em articulados separados.
No entanto, ambas vieram defender-se por excepção, invocando a irregularidade do patrocínio judiciário e a caducidade do direito do qual o autor se vem prevalecer a juízo.
No mais, qualificaram a sua defesa como de impugnação.
A primeira ré veio ainda suscitar o incidente de intervenção principal provocada da Companhia de Seguros X..., S.A., o qual foi apreciado e julgado procedente.
Citada, a Companhia de Seguros X..., S.A. veio esta contestar, defendendo-se por excepção, invocando a falta de legitimidade activa e passiva.
Sustentou não recair qualquer responsabilidade sobre a primeira ré, bem como que o sinistro não está abrangido pelo âmbito de cobertura do contrato mas, a concluir-se no sentido inverso, deverá ser tida em conta a franquia convencionada.
A ré P..., Lda. exerceu o contraditório quanto aos fundamentos de defesa da interveniente, invocando, por um lado, que as cláusulas de exclusão não são aplicáveis e, por outro lado, arguindo a sua invalidade.
Foi proferido despacho pelo qual o autor foi convidado a suprir a irregularidade do patrocínio, a indicar o custo das obras de eliminação dos defeitos e a exercer o contraditório quanto aos fundamentos de defesa por excepção invocados.
A autora apresentou resposta, tomando posição sobre tais fundamentos de defesa.
Foi designada data para a realização da audiência prévia, enunciando-se as questões a debater.
Foi realizada a audiência prévia, na qual foi proferido despacho onde se fixou o valor da acção, se apreciou a regularidade do patrocínio, se apreciou a excepção da falta de personalidade judiciária do autor quanto ao pedido de reparação dos danos causados no interior da arrecadação da fracção I e se absolveram as rés da instância quanto a este pedido
Apreciou-se, ainda a legitimidade activa e passiva julgando-se as partes legítimas.
Identificou-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas de prova.
Realizou-se a audiência de discussão no culminar da qual se proferiu sentença onde se julgou a acção parcialmente procedente e, se condenaram solidariamente as rés P..., Lda. e C... Lda. a eliminar os defeitos elencados na alínea 31) dos factos provados, absolvendo-as do mais peticionado.
Mais se absolveu a interveniente Companhia de Seguros X... S.A. do pedido.
As rés P... e C... e o autor Condomínio vieram interpor recurso desta decisão.
Foi proferido despacho onde se consideraram os recursos tempestivos e legais e se admitiram os mesmos como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo.
Na sequência do pedido de reforma da sentença no que toca a custas formulado pelas rés/apelantes nos termos e ao abrigo do disposto no art.º 616º, nº3 do CPC, foi proferido despacho no qual tal pedido foi indeferido.
Recebido o processo nesta Relação emitiu-se despacho que teve os recursos como próprios, tempestivamente interpostos e admitidos com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. Enquadramento de facto e de direito:
Aos presentes recursos são aplicáveis as regras processuais da Lei nº 41/2013 de 26 de Junho.
É consabido que o objecto dos recursos, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, é definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pelos recorrentes nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).
No caso é o seguinte o teor das conclusões das alegações de cada um dos recursos interpostos:
No recurso das rés/apelantes P... e C...:
1- A Recorrente considera incorrectamente julgado o seguinte facto constante do item 31 dos Factos Provados: “Nova mancha de humidade e fissura, junto ao pavimento, no lugar de garagem destinada ao uso da “R...”, no Bloco ...”.
2- O Tribunal a quo motivou esse facto “com referência a percepção colhida na inspecção ao local”.
3- No auto de inspecção ao local, vem referido que «Verificou-se que o lugar de garagem assumido pela letra “V” será o correspondente à “R...”», sem que, no entanto, nada se diga quanto à razão de ciência de tal afirmação e sem que dos autos conste qualquer certidão predial ou matricial que comprove tal afirmação.
4- Ainda por cima nenhuma das fotografias juntas no auto de inspecção revela a existência de uma fissura junto ao pavimento, pelo que nenhum nexo de causalidade se consegue estabelecer entre essa fissura junto ao pavimento e o suposto lugar de garagem com a letra “V”.
5- Assim sendo, deve ser eliminado do item 31 dos Factos Provados a expressão “Nova mancha de humidade e fissura, junto ao pavimento, no lugar de garagem destinada ao uso da “R...”, no Bloco ...”, absolvendo-se as Rés desse pedido.
Por outro lado,
6- De acordo com o artigo 616.º, n.º 1, do CPC, a parte pode requerer a reforma da sentença quanto a custas, sendo que cabendo recurso da decisão que condene em custas ou multa, esse requerimento é feito na alegação (cfr. n.º 3 desse normativo).
7- Tendo sido fixado à acção o valor de € 23.404,42 (cfr. despacho de 16/06/2021), significa que de acordo com a sentença ao decaimento do Autor foi atribuído o valor de € 10.470,40 e ao das Rés o restante, ou seja € 12.934,02.
8- Ora, as Rés foram condenadas a eliminar os defeitos elencados na alínea 31) dos factos provados e absolvidas do demais peticionado, nomeadamente proceder à reconstrução do muro de suporte que ruiu.
9- E se atendermos ao orçamento de fls. 174 v. e 175 (que serviu na sentença de referência para fixar o valor dos decaimentos), torna-se evidente que o decaimento das Rés corresponde unicamente aos valores referidos nesse orçamento sob os n.º 2.1.6.1 e 2.1.7, ou seja € 630 + € 1.350.
10- O resto do orçamento refere-se a obras de intervenção no logradouro (reconstrução do muro) e de intervenção nas paredes exteriores dos blocos residenciais 1 e 2 (e, por consequência, no tapete de relva do logradouro e limpeza), do que as Rés foram totalmente absolvidas.
11- Desse modo, o decaimento das Rés é de apenas € 1.980, ao passo que a do Autor é de € 21.424,42, pelo que a sentença viola o artigo 527.º, n.º 1 e 2 do CPC, devendo, pois, ser reformada.
No recurso do autor Condomínio:
1. De acordo com a matéria que resulta provada nos pontos 26, 27, 28 e 29 da douta sentença comprovou-se que, na sequência da denuncia das patologias construtivas enviada em 29 de Abril de 2019, para ambas as Rés, a Ré P... procedeu a reparações que que deu por concluídas em 13 de Setembro de 2019 e que a presente acção foi instaurada em 11.09.2020, ou seja antes de completado o ano previsto no n.º 3 aplicável ex vi o n.º 4 do artigo 1225.º, invocado pelas Rés para fundamentar a excepção de caducidade que alegaram.
2. Não obstante a sentença recorrida tenha desde logo declarado, a fls.19, que este normativo não era susceptível de se aplicar nos presentes autos alegadamente porque «só se justificará a convenção do disposto no artigo 1225.º do Código Civil quando o vendedor tenha simultaneamente sido o construtor», não concordamos com tal entendimento dado que, atendendo á génese da alteração legislativa deste normativo ocorrida em 1994, o que a lei visou com o acrescento do n.º 4 a este normativo, foi precisamente pretender que a legislação que até aí apenas se aplicava aos contratos de empreitada passasse a ser aplicável aos contratos celebrados com os vendedores dos imóveis que fossem “promotores imobiliários” e esses, por definição, mais não são do que os proprietários dos terreno onde os empreendimentos são construídos, habitualmente por terceiros com os quais normalmente celebram contratos de empreitadas.
3. Ainda que assim não se entendesse e sem prescindir, a sentença recorrida não poderia ter concluído pela caducidade do direito de exigir às Rés a reconstrução do muro de suporte, atendendo ao disposto no n.º 3 do artigo 5.º do DL84/2008 de 21 de Maio que introduzindo alterações ao DL n.º 67/2003 de 8.04 que veio dispor que «Caso o consumidor tenha efectuado a denuncia da desconformidade, tratando-se de bem móvel, os direitos atribuídos ao consumidor nos termos do artigo 4.º caducam decorridos dois anos a contar da data da denuncia e, tratando- se de bem imóvel, no prazo de três anos a contar desta mesma data».
4. Embora a douta sentença recorrida tenha entendido que, atendendo aos factos provados 1 a 4 o imóvel em questão foi vendido por quem exerce uma actividade profissional com caracter económico, acabou por
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