Acórdão nº 1433/19.4T8TMR.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-11-23

Ano2023
Número Acordão1433/19.4T8TMR.G2
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

Nestes autos emergentes de acidente de trabalho, que prosseguiram para a fase contenciosa por discordância da seguradora sobre a fixação da incapacidade para o trabalho, veio o sinistrado AA apelar da sentença na parte em que condenou a entidade seguradora “EMP01..., Plc -Sucursal em Portugal” a pagar-lhe: “b)i. o capital de remição da pensão anual e vitalícia de 94,23 Eur. (noventa e quatro euros e vinte e três cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal, desde 19.10.2019” e em que decidiu “a) Fixar em 1,5% o coeficiente de IPP que afecta o sinistrado AA, desde a data da alta”.
Esta é a segunda apelação. Na primeira o sinistrado recorreu da sentença que condenou a seguradora nos mesmos termos e atribuiu igual IPP de 1,5%. Este Tribunal da Relação revogou a decisão, com anulação do processado posterior à perícia por junta médica, cuja repetição se ordenou para fundamentação e nova resposta aos quesitos, sendo precedida das diligências que se revelassem necessárias nos termos referidos no acórdão, seguida da prolação de nova decisão. Denegou-se, contudo, provimento à questão relacionada com o alegado “excesso de pronúncia” da junta médica que seria livre de acolher sequelas diferentes das consideradas pelo perito médico do GML na fase conciliatória (sequela do polegar).
Nesse seguimento, o senhor juiz a quo, após recepção dos autos, sem determinar quaisquer diligências prévias, designou data para junta médica. A junta médica de 7-07-2022 manteve as respostas anteriores e atribuiu ao sinistrado o mesmo grau de incapacidade para o trabalho - 1,5%.
O sinistrado reclamou novamente por insuficiência de fundamentação da junta médica. A senhora juíza a quo, fazendo referência à falta de requisição prévia de elementos clínicos, determinou a realização de TAC com incidência no antebraço, mão e polegar esquerdos, bem como a junção aos autos de documentação relativa ao episódio de urgência no Hospital ... onde o sinistrado foi inicialmente atendido. Foi depois ordenada a repetição da junta médica para resposta aos quesitos tendo em conta os novos elementos juntos aos autos. A junta médica de 13-04-2023 manteve as respostas anteriores e grau de incapacidade anteriormente atribuído de 1,5%, a que se seguiu nova reclamação do sinistrado por subsistir a desconsideração da sequela do polegar e suposta falta de fundamentação quanto a este aspecto. A reclamação foi indeferida com prévia e detalhada explicação sobre as diligências efectuadas, concluindo-se pela suficiência de elementos. Seguidamente foi proferida a decisão ora recorrida que atribuiu ao sinistrado uma IPP de 1,5% conforme acima relatado.

RESTANTE PROCESSADO ANTERIOR COM RELEVO NA DECISÃO:

A acção iniciou-se por participação da seguradora após alta clínica com referência a acidente ocorrido em 16-06-2019, que consistiu em queda de escadote com fractura do punho esquerdo. O sinistrado foi seguido na seguradora na especialidade de ortopedia em diversas consultas, além de medicina geral e familiar e fez sessões de fisioterapia.

INQUÉRITO PROFISSIONAL E ESTUDO DO POSTO DE TRABALHO:

Nele consta: na actividade principal do estabelecimento ”Aluguer, fabricação, tendas para eventos”; na profissão do sinistrado “Indiferenciado”; nas “ferramentas” utilizadas “chave de fendas, chave beta, martelo, aparafusadora”; nos materiais utilizados “alumínio, madeira, ferro, alcatifa e lona”

PERÍCIA MÉDICA SINGULAR DA FASE CONCILIATÓRIA - 105º, 106º CPT:
O senhor perito médico concluiu por uma IPP de 10,4100%, com inclusão de factor de bonificação de 1.5 devido à idade, ITA de 15-06-2019 a 16-08-2019 e IPT de 20% 17-08-2019 a 18-10-2019, data de consolidação médico-legal das lesões.

No auto consta:
(i) Na “HISTÓRIA DO EVENTO”: “…o examinando tinha 55 anos de idade e é montador de tendas”, “terá caído de um escadote”, “do evento terá(ão) resultado fractura do punho esquerdo”;
(ii) Como “LESÕES E/OU SEQUELAS RELACIONÁVEIS COM O EVENTO”: “ membro superior esquerdo: mobilidade do punho sem limitação mas com dor no ângulo máximo de supinação e da extensão. Polegar com primeira falange em flexão e tumefação na metacarpo falângica”. As lesões/sequelas foram enquadradas na TNI nas rubricas I.7.2.2.1.a. e I.8.1.5.1.c.
(iii) Na rubrica “LESÕES E/OU SEQUELAS SEM RELAÇÃO COM O ACIDENTE”: “o examinando nunca padeceu de lesões ou sequelas”.
(iv) Na rubrica “ANTECEDENTES” “Não refere antecedentes patológicos e/ou traumáticos relevantes para a situação em apreço”
(v) Na rubrica “QUEIXAS”: “Manipulação e preensão: refere alguma dificuldade para posicionar a mão esquerda e pegar em pesos”
(vi) Na rubrica “VIDA PROFISSIONAL OU DE FORMAÇÃO”:” refere maior dificuldade em pegar em pesos, desapertar parafusos…precisa de ajuda para algumas tarefas…”

TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO – 108º e 112º CPT:
Frustrou-se por falta de acordo da seguradora, a qual não aceitou a IPP atribuída. Na parte que releva ao recurso, consta da acta o seguinte:
Quanto à Descrição do acidente:
“No dia 14.06.2019, pelas 10:00 horas, em ..., em ... quando estava a trabalhar por conta da patronal, encontrava-se em cima de um escadote e ao descer, escorregou, caindo sobre o braço esquerdo, o que lhe originou as lesões descritas na perícia médico-legal de fls. 50 e 51 verso, para as quais remete e cujo teor aqui dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, bem como os períodos de IT`s aí referidos, tendo sido considerado pelo perito médico afectado de uma IPP de 10,4100%, a partir de 18.10.2019, data da cura clínica, o que aceita….”
Posição da seguradora:
“A sua representada aceita a existência do acidente nas precisas circunstâncias descritas neste acto pelo sinistrado e a sua caracterização como acidente de trabalho, o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente e a responsabilidade pelo acidente com base nas seguintes remunerações….Não aceita a IPP de 10,4100%, porquanto o médico da seguradora considera-o com uma IPP de 1,5%.”
REQUERIMENTO DE JUNTA MÉDICA – 138º,2, CPT.
São os seguintes os quesitos que a seguradora apresentou quando requereu exame pericial por junta médica:
1º. – Quais as lesões que o sinistrado sofreu no acidente de que foi vítima em 14/06/2019?
2º. – Apresenta o sinistrado sequelas em consequência dessas mesmas lesões?
3º. – Na afirmativa, quais?
4º. – São essas sequelas aptas a determinarem-lhe Incapacidade Permanente para o trabalho? Na afirmativa, de que grau?

PERÍCIA POR JUNTA MÉDICA DE 13-04-2023 (após anulação do processado)- 139º CPT :
Após a junção aos autos de novos elementos clínicos, por unanimidade da junta médica (“generalista”) respondeu-se aos seguintes do seguinte modo:
“Quesito 1-Mantém a resposta da junta medica 7-07-2022 (fractura distal do rádio esquerdo).
Quesito 2- Mantém a resposta da junta medica de 7-07-2022
Quesito 3 – As sequelas resultantes do acidente em apreço é rigidez na dorsiflexão do punho esquerdo. O sinistrado mantém a descrição do acidente de trabalho como tendo sido resultante de traumatismo do antebraço esquerdo por um escadote. Nos registos clínicos agora facultados, onde consta a observação do sinistrado no serviço de urgência do Hospital ... a 16-06-2019, apenas consta o referido traumatismo do antebraço esquerdo. Durante o acompanhamento nos serviços clínicos da Companhia de Seguros, as queixas do sinistrado foram relacionadas com o referido traumatismo do antebraço esquerdo. Assim, com base nos registos clínicos constantes no processo, bem como os relatórios dos exames agora apresentados, não existem elemento que permitam admitir o nexo de causalidade entre as alterações apresentadas no polegar esquerdo com o acidente em análise.
Quesito 4 – Mantém IPP de 1,5, conforme junta médica de 7-07-2022 a fls 83 e 83v”.”
JUNTA MÉDICA DE 7-07-2022- Dada a remissão para os quesitos 1, 2 e 4 desta junta médica, reproduz-se as respectivas respostas:
“Quesito 1-Do acidente de que foi vítima o sinistrado em 14-06-2019 resultou Fractura distal do rádio esquerdo”
Quesito 2- sim.
Quesito 4 – Sim, IPP de 1,5, conforme quadro em anexo.”
As lesões/sequelas foram enquadradas na TNI na rubrica I.7.2.2.1.a.

FUNDAMENTO DA APELAÇÃO INTERPOSTA PELO SINISTRADO - CONCLUSÕES:
I - Encontram-se incorretamente julgados os pontos 4 e 7 dos factos provados, devendo a passar a constar que: “4. Em consequência do acidente mencionado em 1., sofreu o AA uma fractura distal do rádio esquerdo e instabilidade da metacarpofalângica do polegar esquerdo.” e “7.Das reportadas lesões resultaram para o sinistrado sequelas – rigidez na dorsiflexão do punho esquerdo instabilidade da metacarpofalângica do polegar esquerdo - determinantes de uma IPP de 10,4100% (IPP considerada na perícia junta aos autos e elaborada pelo GML, a qual está devidamente fundamentada).
II - Ainda que os peritos da junta médica possam ser livres de excluir o nexo causal de uma lesão sindicada anteriormente e aceite, a Sentença não poderia aceitar esta omissão.
III - Decorre do que se dispõe no artigo 112.º, n.º 1 do CPT que, frustrando-se a tentativa de conciliação, no respetivo auto são consignados os factos sobre os quais tenha havido acordo, referindo-se expressamente se houve, ou não, acordo acerca da existência e caracterização do acidente, do nexo causal entre a lesão e o acidente, da retribuição do sinistrado, da entidade responsável e da natureza e grau de incapacidade atribuída;
IV - Registado acordo quanto às lesões e nexo de causalidade sancionadas pelo GML manifestadas na posição do sinistrado a que a seguradora anuiu, não podia, salvo melhor opinião, indagar-se sobre aquelas ou estas, antes e apenas ser definido o grau de incapacidade - artigo 112.º, n.º 1 do CPT.
V - Quando a seguradora discordou apenas do grau de incapacidade, mas aceitou as lesões (onde se inclui a instabilidade da metacarpofalângica do polegar esquerdo) descritas em...

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