Acórdão nº 1373/11.5BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 22-06-2023

Data de Julgamento22 Junho 2023
Ano2023
Número Acordão1373/11.5BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul



Tribunal Central Administrativo Sul 22/24
Av. 5 de outubro, n.º 202, 1050 - 065 Lisboa
( 21 7922300 Fax: 21 7960295
E-mail: lisboa.tca@tribunais.org.pt


I-RELATÓRIO

J…, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra os atos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS), e respetivos Juros Compensatórios (JC) respeitantes aos anos de 2007, 2008 e 2009, no valor global de €23.983,23.


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O Recorrente veio apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem:

“1. A sentença recorrida teve como objeto a licitude das liquidações de IRS e respetivos juros relativas aos anos de 2007, 2008 e 2009.

2. Está em causa a qualificação fiscal dada aos rendimentos auferidos pelo Recorrente nesses períodos, resultantes do exercício do cargo de administrador de uma sociedade de advogados, que não devem ser confundidos com os por si auferidos da prestação de serviços de advocacia.

3. Tendo detetado que estes rendimentos foram erroneamente declarados pela sua contabilista como resultantes de prestações de serviços, o Recorrente promoveu a correção das suas declarações de IRS, tendo posteriormente reclamado e impugnado as liquidações que lhe foram notificadas, por não tributarem os rendimentos sob análise como legalmente devido.

4. Entende porém a sentença recorrida que o Recorrente não fez prova bastante de que estes rendimentos resultaram do exercício das funções de administrador.

6. Ora, não só tal prova foi junta aos autos, como o ónus probatório invocado não cabe ao Recorrente.

7. Quanto à prova, o único elemento idóneo a demonstrar a qualidade de administrador remunerado é a Certidão de Registo de Inscrição da Sociedade de Advogados, que foi oportunamente carreado pelo Recorrente.

8. Por força dos princípios da justiça e razoabilidade, deveria esta certidão ser tida, por si só, como bastante para demonstrar a administração remunerada.

9. Sendo este o único documento adequado a provar o facto controvertido, impor- se a necessidade de apresentar outros-com fundamento em remissão para uma norma que não existe (al e) do n.º 2 do art.º 25.º do CIRS) - implicaria exigir ao Recorrente uma prova inalcançável, vedada pela natureza das coisas.

10. No que toca ao ónus probatório, prevê o artigo 74.º da LGT que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.

11. Esta norma deve ser articulada com o artigo 75.º da LGT, que estabelece a presunção de veracidade e boa-fé das declarações dos contribuintes.

12. Da articulação das duas normas resulta um princípio de in dúbio contra fisco, já que se as declarações dos contribuintes se presumem verdadeiras e de boa-fé (artigo 75.º, n.º 1), é à AT que cabe o ónus de provar que não se verificam as condições de aplicação dessa presunção (artigos 74.º, n.º 1 e 75.º n.º 2).

13. Tendo o Recorrente declarado que os rendimentos sob análise eram resultado do exercício das funções de administrador, é à AT que cabe o ónus de demonstrar que a declaração não tem correspondência com a realidade.

14. A decisão recorrida levou igualmente em conta argumentos que não poderiam ser atendidos como fundamento válido, por serem irrelevantes à decisão.

15. Em causa está (i) o modo como é contabilizada a remuneração pela empresa e (ii) não ter sido feita menção ao pagamento dos descontos obrigatórios.

16. Ora, o modo como é feita a contabilização pela empresa - que recorre à mesma contabilista que o Recorrente - respeita à empresa e apenas a esta, não tendo nem podendo ter qualquer impacto ou ingerência no IRS do Recorrente.

17. Acresce que os elementos contabilísticos da empresa são dados protegidos por sigilo fiscal, não podendo ser divulgados salvo nas condições legalmente previstas, que não se verificam neste caso.

18. Quanto à relação contributiva em si (descontos), esta em nada impacta a relação tributária, muito menos a qualificação a atribuir aos rendimentos auferidos pelo sujeito passivo.

19. Ademais, os descontos invocados pela AT não são obrigatórios para o Recorrente, já que por descontar para a respetiva Caixa de Previdência, a efetivação de descontos para a Segurança Social é meramente facultativa.

20. Por último, cumpre notar que a decisão recorrida não se pronuncia sobre o pedido de pagamento de juros compensatórios e moratórios, questão esta que, por integrar o objeto do pedido do Recorrente, deveria ter sido apreciada.”


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A Recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.

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A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

“A) F…, Sociedade de Advogados RL, é uma sociedade profissional de advogados, que iniciou a sua actividade em 09-01-2001 e possui o CAE 069101 – actividades jurídicas, e tem como sócios T… e J… (ou impugnante) é sócio da sociedade de advogados (fls 173, do pa);

B) Nos print’s informáticos da AT consta que a sociedade se encontra no regime de transparência fiscal e, de acordo com a declaração anual, anexo J, Modelo 10, respeitante ao anos de 2007, 2008 e 2009 os rendimentos em causa vêm qualificados como sendo da categoria B, sem menção de terem sido efectuados quaisquer descontos obrigatórios (fls 172 1 175, do pa);

C) Consta do doc nº 5 da pi, cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais, nomeadamente:

(…).

D) O impugnante na declaração Modelo 3 de IRS dos anos de 2007, 2008 e 2009 fez constar o rendimento de €25.451,00, de €29.946,00 e €29.946,00, respectivamente, no campo 403 (outras prestações de serviços e outros rendimentos) do Anexo B (fls 42, do pa);

E) O impugnante foi notificado da liquidação nº 2008 5004483823, com imposto a pagar de €7.794,12, para o ano de 2007, da liquidação nº 2009 5004802062, com imposto a pagar de €5.622,71, para o ano de 2008 e da liquidação nº 2010 5004918023, com imposto a pagar de €734,08, para o ano de 2009;

F) Em 17-08-2010 o impugnante foi notificado da existência de Divergências (doc nº 10, da pi);

G) Foram entregues declarações de substituição onde foi feito constar que os montantes obtidos e identificados em D) foram colocados no campo 420 (serviços prestados por sócios a sociedades profissionais do Regime de Transparência Fiscal) (doc nº 11, 12 e 13, da pi);

H) Em consequência da entrega das declarações de substituição, em 27-09-2010 foram efectuadas as seguintes liquidações (doc nº 1, da pi):

Ano de 2007

Liquidação de IRS nº 2010 5004988463, com imposto a pagar de €3.047,05

Liquidação de juros nº 2010 00001573860

Demonstração da compensação nº 2010 00006586681

Demonstração do acerto de contas nº 2010 00001930068

Ano de 2008

Liquidação de IRS nº 2010 5004989274, com imposto a pagar de €3.469,68

Liquidação de juros nº 2010 00001573934

Demonstração da compensação nº 2010 00006586785

Demonstração do acerto de contas nº 2010 00001930169

Ano 2009

Liquidação de IRS nº 2010 5004981395, com imposto a pagar de €3.320,79

Liquidação de juros nº 2010 00001569276

Demonstração da compensação nº 2010 00006532511

Demonstração do acerto de contas nº 2010 00001909571

I) Em 23-02-2011 o impugnante intentou Reclamações Graciosas (RG) a que foram atribuídas os números (doc nºs 2, 3 e 4, do pa):

RG nº 3247201104001290, referente ao ano de 2007

RG nº 3247201104001311, referente ao ano de 2008

RG nº 3247201104001303, referente ao ano de 2009

J) Por despacho de 21-06-2011, do Chefe da Divisão da Justiça Administrativa, por subdelegação, com base na informação nº 435/11, as RG foram indeferidas:

(…).

«Imagem no original»

«Imagem no original»

(…).

K) Em 09-11-2010 os montantes constantes das liquidações, identificadas em H), foram pagos (doc nº 14, da pi);

L) A impugnação deu entrada em 11-07-2011 (carimbo aposto no rosto de fls 2).


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Consta na decisão recorrida como “Factos não provados” o seguinte:

“Não se fez qualquer prova dos factos constantes dos artºs 14º, 15º, 19º (até “… legislativa”), 57º (no que respeita a “erradamente”).

Igualmente não foi feita prova que o ora impugnante enquanto administrador da sociedade, é remunerado pelo exercício dessas funções.”


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A motivação da matéria de facto assenta no seguinte:

”A convicção do tribunal formou-se no teor dos documentos identificados em cada ponto dos factos provados.”


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III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, o Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações de IRS, e respetivos Juros, respeitantes aos anos de 2007 a 2009.

Ab initio, importa ter presente que, em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se a decisão recorrida padece de:

i. Nulidade por omissão de pronúncia na medida em que não se pronunciou sobre o pedido de reembolso do imposto, acrescido dos respetivos juros;

ii. Erro de julgamento de facto, na medida em que foi erroneamente ponderada como matéria de facto não provada, realidade que se encontra suportada por prova documental idónea;

iii. Erro de julgamento, por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito no concernente:

a. à enumeração e concreta densificação do ónus probatório;

b. à...

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