Acórdão nº 137/22.5 BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-02-23

Ano2023
Número Acordão137/22.5 BELRA
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

A A. L…, S.A., veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa – Juízo de Contratos Públicos, em 26.09.2022, que julgou totalmente improcedente a ação de contencioso pré-contratual por si intentada contra o Hospital Distrital de Santarém, E.P.E., na qual havia indicado como Contrainteressada a G… Seguros, s.a., peticionando a anulação do ato de homologação do Relatório Final do júri do procedimento que adjudicou o contrato à Contrainteressada, no âmbito do «concurso público internacional n.º 180004/2022 – Prestação Serviços: seguro de acidentes de trabalho Ano 2022»


Em sede de alegações de recurso, concluiu como se seguecfr. fls. 786 e ss., do SITAF:

«(…)

I. A sentença recorrida enferma de erro na aplicação do Direito quando entendeu que a previsão da alínea c) do nº 1 do artº 57º do CCP, se aplicava à A, mesmo não pretendendo esta vincular-se para além daquilo a que já estava legalmente vinculada.

II. A correcta interpretação da norma plasmada na alínea c) do nº 1 do artº 57º do CCP, conjugada com o que a esse respeito dispõe o Programa do procedimento (no caso o artigo 5º e o artigo 9º do Programa) implica que se um concorrente pretender oferecer coberturas suplementares deve vincular-se documentalmente, mas se um outro concorrente não o pretender fazer, apenas tem de se cingir ao que dispõe a Norma Regulamentar, sem necessidade de se vincular documentalmente a uma obrigação a que já está legalmente vinculado.

III. O vicio de erro na aplicação do Direito gera a anulabilidade da sentença, o que aqui se argui.

IV. Mas, mais do que isso.

V. O Tribunal “a quo” também decidiu que “a entidade adjudicante estatuiu e exigiu ‹‹termos ou condições relativas a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule›› [Cfr. artigo 57.º, n.º 1, alínea c) do CCP], pelo que a sua consideração em sede de análise das propostas não enferma o ato impugnado de qualquer vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito.” (sublinhado nosso).

VI. Ora, no que à A e Recorrente respeita, a sua proposta não chegou a ser considerada em sede de análise das propostas, pela razão simples de que foi liminarmente excluída.

VII. Mas, o Tribunal volta a errar na aplicação do Direito. Na verdade

VIII. A A, ora Recorrente, alegou que nos termos do nº 3 do artigo 72º do CCP, impendia sobre o Júri a obrigação de solicitar que, no prazo máximo de cinco dias, procedesse ao suprimento da irregularidade causada por preterição de uma formalidade não essencial.

IX. Mais alegando que o suprimento dessa irregularidade não afectaria a concorrência e a igualdade de tratamento, na medida em que respeita a factos que não estavam sujeitos à concorrência.

X. A este respeito, quando o Tribunal “a quo” decidiu que “não se verificam os pressupostos que permitem ao júri mobilizar o poder-dever previsto no artigo 72.º do CCP, pelo que, não o tendo feito, não se verifica qualquer omissão que enferme o ato impugnado de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito.” errou na aplicação do Direito, porquanto

XI. O Tribunal “a quo” confundiu:

a) o poder/dever que para o júri resulta do disposto no artigo 72º, nº 3 do CCP, de solicitar à A e ora Recorrente que, no prazo máximo de cinco dias, procedesse ao suprimento da irregularidade causada por preterição de uma formalidade não essencial, com

b) a aceitação, pelo júri, dos esclarecimentos que esta viesse a prestar.

XII. E, é ao cair na descrita confusão, decidindo que a tese da ora Recorrente viola o disposto no nº 2 do artº 72º do CCP, que o Tribunal “a quo” inquina o seu aresto com o vicio de erro na aplicação do Direito.

XIII. Na verdade, os esclarecimentos que fossem prestados pela ora Recorrente só integrariam a Proposta se não contrariassem os elementos constantes dos documentos que a constituíssem, não alterassem ou não completassem os respectivos atributos, nem visassem suprir omissões que pudessem determinar a sua exclusão.

XIV. Por isso se pode dizer, sem receio de errar, que, ao invés do decidido pelo Tribunal “a quo”, por via da interpretação, essa sim errónea, do nº 2 e do nº 3 do artigo 72º do CCP, que o júri, num primeiro momento, estava obrigado a pedir os esclarecimentos, mas, no momento seguinte, não estava compelido a aceitá-los.

XV. Ou seja – nunca seria o pedido de esclarecimentos, obrigatoriamente a formular pelo júri, que afectaria a concorrência e a igualdade de tratamento, mas sim a aceitação destes, caso violassem o disposto no nº 2 do artigo 72º do CCP.

XVI. O vicio de erro na aplicação do Direito gera a anulabilidade da sentença, o que aqui se argui.

XVII. Uma outra vez o Tribunal erra na aplicação do Direito. Na verdade

XVIII. Constando da Proposta da aqui Recorrente a remissão para Norma Regulamentar do Instituto de Seguros de Portugal n.º 1/2009-R, é forçoso concluir que aquela Proposta não inclui quaisquer outros serviços ou garantias para além das que obrigatoriamente devem constar de um contrato de seguro para cobertura de acidentes de trabalho.

XIX. Ao invés do que se escreve na sentença aqui posta em crise, a entidade adjudicante deve presumir que a Proposta da Concorrente representa o máximo que esta está disponível para contratar e que corresponde às garantias e coberturas simultaneamente mínimas e obrigatórias.

XX. Ora, ao decidir por uma invocada omissão de que enfermaria a Proposta da aqui Recorrente, o Tribunal errou na aplicação do artigo 70.º, n.º 2, alínea a) do CCP, que deve ser interpretado no sentido de que não há omissão documental quando o Concorrente apenas se vincula às coberturas previstas na Norma Regulamentar aplicável para qui remetendo.

XXI. Verifica-se, ainda, um outro erro na aplicação do Direito ao determinar a inaplicação do efeito anulatório resultante da preterição da formalidade de audiência prévia. Na verdade

XXII. A correcta interpretação da alínea b) do nº 5 do artigo 163º do CPA não permite, nos presentes autos, decidir pela não produção do efeito anulatório, porquanto o que ali se exige é que os valores protegidos pelo instituto da audiência prévia tenham sido assegurados por outra via, de modo a poder afirmar-se que a ilegalidade cometida não teve qualquer efeito sobre a substância da decisão, pelo que não se justifica que tenha relevância invalidante em relação a ela.

XXIII. Ora, a este respeito, não consta (nem poderia constar) do probatório que a Concorrente tenha tido a possibilidade de se pronunciar sobre os novos fundamentos desenvolvidos no Relatório Final.

XXIV. Bem pelo contrário, os novos fundamentos desenvolvidos no Relatório final para sustentar a exclusão da Proposta da Recorrente só foram dela conhecidos no momento em que foi notificada daquele Relatório,

XXV. Não podendo, nem os tendo antecipado quando foi chamada a pronunciar-se sobre o Relatório Preliminar.

XXVI. Por esta razão, os valores protegidos pelo instituto da audiência prévia não foram assegurados por qualquer outra via.

XXVII. Não sendo, por isso, aplicável o regime da alínea b) do nº 5 do artigo 163º do CPA.

XXVIII. O vicio de erro na aplicação do Direito gera a anulabilidade da sentença, o que aqui se argui.

XXIX. Por último, a sentença enferma de vicio consubstanciado em contradição entre os fundamentos e a decisão. Com efeito

XXX. O Tribunal “a quo” para chegar à conclusão de que “[o] fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via;” [Cfr. artigo 163.º, n.º 5, alínea b) do CPA, ex vi artigo 1.º-A, n.º 1 do CCP e artigo 2.º, n.os 1, 3 e 5 do CPA], do que resulta que não deverá produzir-se o respetivo efeito anulatório.”, o Tribunal invoca que “a Autora logrou pronunciar-se no procedimento, ainda que em momento impróprio e num esforço de prognose e perscrutação do sentido e conteúdo do projeto de decisão de exclusão proposto pelo júri [Cfr. ponto 7. do probatório], sobre todas as questões que importavam à decisão; e, por outro, é possível aquilatar da efetiva apreciação e ponderação formuladas pela Entidade Demandada sobre essa pronúncia antes de proferida a decisão final [Cfr. pontos 8. A 11. do probatório].”.

XXI. Ao decidir no descrito sentido e com os descritos fundamentos, o Tribunal cai em contradição com o segmento da mesma decisão onde estatuiu que “o júri ao vir indicar que a proposta é excluída porque não integra um documento contendo os ‹‹termos ou condições››, o qual era exigido no artigo 9.º, n.º 3, alínea e) do Programa do procedimento [Cfr. ponto 8. do probatório], sem que o houvesse afirmado em concreto em sede de relatório preliminar, não se limita a desenvolver o fundamento de exclusão, mas sim, e necessariamente, a alterar o teor daquele e consequentemente, nos termos do citado artigo 148.º, n.º 2 do CCP, haveria lugar a nova fase de audiência prévia. Destarte, não tendo havido lugar a nova fase de audiência prévia na sequência da alteração do teor do relatório preliminar, verifica-se a preterição de uma formalidade prevista na lei, que consubstancia um vício de forma, cujo desvalor jurídico é o da anulabilidade nos termos conjugados do artigo 163.º, n.º 1 com o artigo 161.º do CPA.”.

XXII. Ora o Tribunal “a quo” deu por provado o vicio de preterição da formalidade de audiência prévia mas invocando contraditoriamente o Ponto 7 do Probatório, decidiu que “a Autora logrou pronunciar-se no procedimento, ainda que em momento impróprio e num esforço de prognose e perscrutação do sentido e conteúdo do projeto de decisão de exclusão proposto pelo júri [Cfr. ponto 7. do probatório], sobre todas as questões que importavam à decisão; e, por outro, é possível aquilatar da efetiva...

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