Sentença ou Acórdão nº 0000 de Tribunal da Relação, 01 de Janeiro de 2022 (caso Acórdão nº 1368/20.8T8LLE-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2022-03-10)

Data da Resolução01 de Janeiro de 2022

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO
Por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa que, sob a forma de processo ordinário, lhe foi movida por APBL-Associação dos Proprietários à Beira Lago, veio Santosalgar-Sociedade de Administração de Bens Próprios, Lda. deduzir oposição à execução mediante embargos, pedindo que na procedência dos mesmos seja julgada extinta a execução.
Alega, em síntese, que a exequente é parte ilegítima por não ter sido autorizada pela assembleia de proprietários dos lotes; que ao caso específico de cobrança de dívidas nas áreas comuns de um loteamento, como é o caso, as atas aprovadas não podem valer como título executivo, por inaplicabilidade da norma do art. 6º, nº 1, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25.10, que dispõe especificamente sobre as atas de condomínio em regime de propriedade horizontal, pelo que deve considerar-se a execução desprovida de título executivo e, em consequência, ser determinada a sua extinção; que parte dos montantes reclamados se encontram prescritos; e, finalmente, que o Regulamento aprovado em 23.11.2012 é nulo por prever que o valor relativo de cada unidade habitacional seria estabelecido com base no número de camas disponíveis, correspondendo cada quarto a duas camas.
Contestou a exequente, alegando, em resumo, que:
- Na qualidade de administradora, tem legitimidade para intentar a presente ação executiva, pois faz parte das suas funções cobrar os valores devidos para fazer face às despesas comuns, podendo agir em juízo na execução das funções que lhe pertencem, em especial instaurando ações de cobrança nos termos do Art. 6º, n.º 2 do Dec. Lei 268/94; para além disso, na assembleia de 2019 foram dados poderes expressos à administradora para proceder a esta cobrança.
- A embargante foi demandada judicialmente em 2016 pela embargada, tendo-lhe sido pedido o pagamento das quantias em dívida relativas aos anos de 2013, 2014 e 2015, pelo que a citação para essa ação interrompeu o prazo de prescrição, que ainda não decorreu.
- O conjunto das atas dadas à execução, referentes aos anos de 2013 a 2019, é título executivo, nos termos do disposto no Dec. Lei n.º 268/94, que se aplica ao loteamento dos autos:
- O Regulamento do condomínio, que adotou como critério de fixação do valor relativo das propriedades o do número de camas disponível, não padece de qualquer ilegalidade.
Foi realizada a audiência prévia, tendo o Tribunal a quo entendido que o estado do processo permitia, “sem necessidade de mais provas, a apreciação total do pedido”, proferiu despacho saneador-sentença, no qual julgou a exequente parte legítima e os embargos procedentes e, em consequência, declarou extinta a execução.
Inconformada, a exequente/embargada apelou do assim decidido, tendo finalizado a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem:
«24. O argumento da Apelante é, em suma, o seguinte:
a. Como foi recentemente decidido nesta Colenda Relação, no douto acórdão citado, e é jurisprudência dominante, as atas das reuniões das assembleias dos proprietários dos lotes, como as aqui dadas à execução, são tidas como atas de assembleias de condóminos, designadamente para efeitos do disposto no Art. 6º, n.º 1 do DL n.º 268/94, de 25 de outubro.
b. Com efeito, este DL contém normas regulamentares dos Arts. 1420º a 1438º do Cód. Civil, os quais são aplicáveis ao loteamento dos autos por força da remissão do Art. 43º, n.º 4 do RJUE.
c. Não se trata, portanto, de aplicação analógica do Art. 6º, n.º 1 do DL n.º 268/94 ao caso, proibida por se tratar de norma excecional, mas de aplicação direta.
d. O entendimento oposto, que nega a exequibilidade destas atas, não serve os interesses da comunidade jurídica, nem dos inúmeros loteamentos aos quais esta questão se aplica, pois seria de todo impraticável, e incomportável para os tribunais, que se obrigassem os condomínios como a Apelante, com dezenas de condóminos, a intentar ações declarativas de cada vez que um deles não pagasse voluntariamente as contribuições devidas.
e. Sendo julgada procedente a apelação, e por força do Art. 665º do Cód. Proc. Civil, deverão V. Exas. apreciar as demais questões colocadas para decisão, que não foram apreciadas em face da solução dada ao litígio, julgando totalmente improcedentes os embargos.
f. No entender da Apelante, a douta decisão recorrida violou as regras legais mencionadas no corpo das presentes alegações, em especial o Art. 6º, n.º 1 do DL 268/94 de 25 de outubro.
25. Por tudo o exposto, requer-se a V. Exas. reformem a douta decisão recorrida, julgando improcedentes os embargos de executado, aceitando que a Apelante dispõe de título executivo para cobrança dos valores cujo pagamento está a ser reclamado, ordenando, por isso, o prosseguimento da execução.»
A executada/embargante contra-alegou, defendendo a manutenção da decisão recorrida.
Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), a questão a decidir é a de saber se as atas das reuniões das assembleias dos proprietários dos lotes de um empreendimento turístico, podem ser tidas como atas de assembleias de condóminos para efeitos do disposto no art. 6º, nº 1, do DL n.º 268/94, de 25-10, sendo assim títulos executivos.
Caso se responda afirmativamente a essa questão, e porque o processo dispõe dos elementos necessários, conhecerá este Tribunal da Relação das questões que se consideraram prejudicadas pela solução dada àquela questão, de acordo com a regra da substituição ao tribunal recorrido consagrada no art. 665º, nº 2, do CPC, sem necessidade de auscultar as partes que, nas respetivas alegações, já se pronunciaram nesse sentido.
Nesse caso, as questões a apreciar são as seguintes:
- se o Regulamento do condomínio denominado “Administração das Partes Comuns do Lakeside Village - Quinta do Lago”, aprovado em 23.11.2012, está ferido de nulidade;
- se as áreas em discussão nos autos têm natureza comum;
- se as dívidas relativas aos anos de 2013, 2014 e parte de 2015 já se encontram prescritas.

III – FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos[1]:
1. A «APBL-Associação dos Proprietários à Beira Lago», alegando ser a administradora do condomínio denominado “Administração das Partes Comuns do Lakeside Village- Quinta do Lago”, em 17/08/2020 instaurou a execução contra a executada «Santosalgar-Sociedade de Administração de Bens Próprios, Lda», apresentando como títulos executivos o escrito que faz fls. dos autos de execução, no essencial com o seguinte teor:
“Acta da Assembleia Geral do Condomínio do Lakeside Village. 22 de Março de 2013.
Agenda: em anexo. Dados de Referencia: 1. A reunião iniciou-se às 11,15. 2. A reunião foi encerrada às 12:20. 3. A AG foi presidida pela APBL representada por Alastair O Neil (Presidente) e Kenneth New (Secretário). 4. Os proprietários presentes na reunião constam da lista de presenças anexa. 5. As procurações e votos escritos recebidos encontram-se arquivados na sede da APBL. 6. Os apontamentos da reunião ficam arquivados na sede da APBL para serem sujeitos a revisão e aprovação pela próxima reunião geral do Condomínio. Decisões Tomadas. 1. A ata de AGO de 28 Março 2012 foi aprovada conforme documento anexo. 2. A ata da AGE de 23 November 2012 foi aprovada conforme documento anexo (tendo sido esclarecida a assembleia de que o documento distribuído e denominado ata corresponde às notas tiradas na reunião e se destina a complementar, mas não substitui a ata da reunião a que o mesmo fica anexo) 3. A ata da AGO do Bloco 4 (Apartamentos) de 29 Março 2012 foi aprovada conforme documento anexo. 4. A ata da AGO do Bloco 5 (Apartamentos) de 2 Abril 2012 foi aprovada conforme documento anexo. 5. A ata da AGO do Bloco 6 (Apartamentos) de 30 Março 2012 foi aprovada conforme documento anexo 6. O relatório anual da administração do Condomínio Lakeside Village relativo a 2012 foi recebido conforme documento anexo. 7. O relatório anual da administração do Bloco 4 (Apartamentos) relativo a 2012 foi recebido conforme documento anexo. 8. O relatório anual da administração do Bloco 5 (Apartamentos) relativo a 20212 foi recebido conforme documento anexo 9. O relatório anual da administração do Bloco 6 (Apartamentos) relativo a 2012 foi recebido conforme documento anexo. 10. O relatório da auditoria sobre as contas do condomínio para o ano fiscal que terminou em 31 Dezembro 2012 (incluindo as referidas contas) foi aprovado conforme documento anexo. 11. As contas do Bloco 4 (Apartamentos) relativas a 2012 foram aprovadas conforme documento em anexo. 12. As contas do Bloco 5 (Apartamentos) relativas a 2012 foram aprovadas conforme documento em anexo. 13. As contas do Bloco 6 (Apartamentos) relativas a 2012 foram aprovadas conforme documento em anexo. 14. O orçamento para as Áreas Comuns (excepto as áreas de uso exclusivo dos Blocos de Apartamentos) para o ano de 1 Janeiro 2013 31 Dezembro 2013 foi aprovado conforme documento anexo. 15. A Contribuição para fazer face aos custos legais de contingência para o ano 1 Janeiro 2013 31 Dezembro 2013 foi aprovado no valor de 44.820,00. 16. Foi aprovada que a contribuição para o Fundo de Reserva para o ano 1 Janeiro 2013 31 Dezembro 2013 deve ser no valor de 2 17. O orçamento para as Áreas Comuns do Uso Exclusivo do Bloco 4 (Apartamentos) para o ano 1 Janeiro 2013 31 Dezembro 2013 foi aprovado conforme documento anexo. 18. O orçamento para as Áreas Comuns do Uso Exclusivo do Bloco 5 (Apartamentos) para o ano 1 Janeiro 2013 31 Dezembro 2013 foi aprovado conforme documento anexo. 19. O orçamento para as Áreas Comuns do Uso Exclusivo do Bloco 6 (Apartamentos) para o ano 1 Janeiro 2013 31
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