Acórdão nº 1363/10.5BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 05-05-2022

Data de Julgamento05 Maio 2022
Ano2022
Número Acordão1363/10.5BESNT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
O Ministério Público, devidamente identificado nos autos, intentou ação administrativa especial contra o Município de Oeiras, tendente à declaração de nulidade “da deliberação datada de 11.2.2004, da Câmara Municipal de Oeiras e mediante a qual foi aprovado o licenciamento da operação de loteamento urbano denominado «Loteamento das S....».
O Município de Oeiras, inconformado com o Acórdão proferido em 7 de julho de 2014, no TAF de Sintra, no qual se decidiu “ser procedente, por provada, a presente ação administrativa especial, com fundamento em vício de violação de lei, por violação de normas do Regulamento do Plano Diretor Municipal de Oeiras, declarando a nulidade da deliberação que, em 11.2.2004, aprovou a operação de loteamento urbano denominado «S....» e que deu origem ao processo administrativo nº 439/02, da Câmara Municipal de Oeiras”, veio interpor recurso jurisdicional.
Formula o aqui Recorrente/Município nas suas alegações do Recurso Jurisdicional, apresentado 29 de setembro de 2014, e sintetizadas em momento ulterior, no seguimento de despacho judicial, as seguintes conclusões:
“I. O douto acórdão recorrido está ferido de nulidade, por um lado, incorrendo também em erro de julgamento na seleção da matéria de facto e em erro de apreciação da prova, por outro, motivos pelos quais deve a decisão recorrida ser anulada e substituída por outra. O douto acórdão recorrido está ferido de nulidade por ter havido omissão do dever de exame crítico da prova produzida, violando-se assim o disposto no artigo 659.º n.º 3 CPC (artigo 607º n.º 4 do NCPC), aplicável ex ví artigo 1.º do CPTA.
II. A decisão sobre a matéria de facto devia ter refletido o resultado da conjugação dos vários meios de prova, o que não sucedeu, consistindo a fundamentação em relação aos factos considerados provados tão só na identificação dos meios de prova produzidos, sem que o Mmo. Tribunal a quo tenha logrado explicar em que medida os meios probatórios foram determinantes para a formação da sua convicção.
III. Constitui a matéria de facto controvertida com relevância para o objeto do litígio, e que como tal devia ter sido considerada e não foi, a questão de saber se parte dos lotes e construções neles a edificar (e em caso afirmativo, que área, que construções e que edificações) ocupam área classificada como Espaço Natural e de Proteção, pelo Regulamento do Plano Diretor Municipal de Oeiras.
IV. Por entender que a matéria de facto suscitava questões técnicas cuja solução carecia de conhecimentos especiais, o Mmo. Tribunal a quo solicitou parecer técnico à DGT, parecer que sempre tem de entender-se como prova pericial, com as consequências que daí advêm.
V. Em face da receção desse parecer, o ora Recorrente pronunciou-se de imediato tendo solicitado ainda, ao abrigo do disposto nos artigos 265.º n.º 3 e 649.º n.º 1, ambos do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, que o Mmo. Tribunal convocasse o subscritor do parecer emitido pela DST para prestar os esclarecimentos que se afiguravam necessários ao apuramento da verdade dos factos.
VI. Não houve despacho fundamentado a indeferir o requerimento dirigido à produção de prova, não se encontrando sequer preenchidos os pressupostos previstos nos artigos 57.º n.º 1 alínea c) a contrario e 90.º n.º 2, ambos do CPTA, para que o Mmo. Tribunal o quo pudesse ter indeferido tal requerimento.
VII. Assim sendo, e em face da existência de matéria evidentemente controvertida, e sobretudo depois de o Recorrente ter requerido a produção de prova, não se alcança por que razão o Mmo. Tribunal a quo não determinou a abertura de um período de instrução tendo antes proferido despacho saneador no qual considerou que nos presentes autos não existe matéria de facto controvertida, situação com a qual a ora recorrente não se conformou, tendo apresentado a devida reclamação.
VIII. Ora, a resposta às Reclamações apresentadas indicia que o Mmo. Tribunal a quo incorreu em erro na apreciação da prova.
IX. Desde logo porque o parecer emitido pela DGT tem de entender-se como prova pericial nos termos do art. 388.º e ss do CC e não como documento autêntico até porque falta um dos pressupostos da autenticidade, a competência da entidade.
X. De todo o modo, mesmo que se entendesse, como o Mmo. Tribunal a quo entendeu, que o documento elaborado pela DGT possui força probatória plena, nos termos do disposto no artigo 371.º, n.º 1 do CC, por ser um documento autêntico {porque emitido por uma autoridade pública competente em razão da matéria - artigos 369.º e 370.º do CC), sempre teria de concluir-se, sem margem para dúvidas, que as Contrainteressadas e a Recorrente lograram colocar em séria crise os factos que tal documento visa provar através da demonstração dos factos opostos.
XI. Sobretudo quando a força probatória plena de um documento autêntico só respeita aos factos que se referem como praticados pela autoridade ou oficial público, bem como aos factos neles atestados com base na perceção da entidade que emitiu o documento, sendo certo que uma coisa é a força probatória plena do documento, outra a eficácia do ato nele contido e uma não implica a outra, nomeadamente as declarações nele contidas não são necessariamente verdadeiras, válidas ou eficazes.
XII. Não obstante, o parecer técnico consiste numa prova pericial nos termos do disposto no art. 388.º e ss do CC e a força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal e, neste sentido, cabia ao Mmo Tribunal conferir livremente força probatória ao parecer da DGT, mas a apreciação da prova devia ser devidamente fundamentada, o que não aconteceu.
XIII. Pelo exposto conclui-se que o acórdão recorrido está ferido de nulidade, por violar o disposto no artigo 59.º n.º 3 CPC (art. 607.º n.s 4 do NCPC), aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, devendo ser declarado nulo e, bem assim, substituído por outro.
XIV. Caso assim não se entenda, sempre tem de entender-se que o douto Acórdão recorrido padece de erro de julgamento na seleção da matéria de facto e em erro de apreciação da prova, razões pelas quais deverá ser revogado e substituído por outro.
Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado, revogando- se o douto acórdão recorrido, substituindo-o por outro.”

O Ministério Público veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 21 de janeiro de 2015, nas quais concluiu:
1 - A sentença não é nula, por falta de fundamentação da matéria de facto dada como provada.
2- Não há qualquer erro de direito, ao ser considerado pelo Tribunal, que o parecer da DGT, pedido ex oficio pelo Tribunal “a quo”, constitui um documento autêntico, e consequentemente atribuindo-lhe o valor de prova plena.
3- O R. não invocou a falsidade do documento;
4- Ainda que se considerasse, como faz o R., que estamos perante uma perícia e como tal o valor probatório estava dependente da livre apreciação do Tribunal, certo é que tal ponderação consta do Acórdão final.
5- O Tribunal não errou ao indeferir o pedido de esclarecimentos, uma vez que tal pedido não se encontrava fundamentado, nem foram indicados de forma explicita e fundamentada quais os esclarecimentos que se pretendiam, não tendo sido interposto recurso do despacho que indeferiu tal requerimento.
6- A matéria de facto dada como provada encontra-se devidamente fundamentada e o direito corretamente aplicado.
7- Deve por isso presente acórdão deve manter-se nos seus precisos termos na ordem jurídica julgando totalmente improcedente o presente recurso.
Assim se fazendo Justiça.”

Em 18 de março de 2015 é proferido Despacho de Admissão de Recurso, no qual igualmente se sustenta a decisão recorrida, atentas as nulidades recursivamente suscitadas, nos seguintes termos:
“(…) Vem alegada a nulidade da decisão recorrida por ter havido omissão de dever de exame critico da prova.
Analisemos.
O tribunal fixou a matéria de facto provada no despacho saneador. indicando em cada uma das alíneas do probatório a prova documental em que o facto se alicerça.
Em face de reclamações apresentadas sobre a decisão de facto prolatada no despacho saneador. o tribunal disse, para indeferir as reclamações, que á prova documental não foi imputada qualquer falsidade.
Já na decisão recorrida e a propósito do facto que gerou o litígio o tribunal fundamentou o seguinte:
Como bem referem as contrainteressadas coloca-se nos autos uma questão técnica, que consiste em determinar se a implantação das construções admitidas no loteamento «S....» ultrapassa ou não os limites da área classificada, no PDM de Oeiras, como Espaço Natural e de Proteção.
Os factos provados - na al N) - dizem-nos que parte dos lotes e a construção neles a edificar com os n° 23, 24, 25. 26 e 27. parte dos lotes 31. 32 e 36 e o lote 37 ocupara a área classificada de Espaço Natural de Proteção.
O Tribunal alicerçou a prova deste facto no documento e anexos (mapas topográficos) enviados pela Direção Geral do Território, em 17.4.2012.
Efetivamente, resulta claro, da visualização dos mapas que nos foram enviados, a existência de lotes e de construções previstas em alguns lotes do loteamento «S....» dentro do Espaço Natural e de Proteção do RPDM de Oeiras. A Direção Geral do Território afirmou, de forma perentória, que da análise da sobreposição da planta de ordenamento do PDM de Oeiras e da planta de síntese do loteamento «S....», e tendo em consideração as limitações do erro médio quadrático posicional associado a 2 metros e meio; da georreferenciação da planta relativa ao loteamento tem um erro médio quadrático posicional associado de 11 centímetros e da faixa de indefinição com 20 metros no terreno (originada pela espessura da linha delimitadora do Espaço Natural e de Proteção na...

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