Acórdão nº 13609/21.0T8LSB-C.L1-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 28-04-2022

Data de Julgamento28 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão13609/21.0T8LSB-C.L1-8
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório
L.F.M.S. com residência fiscal na Rua …., Guarda, intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra M.C. P.M., com domicílio profissional na Rua …., em Lisboa, pedindo seja a mesma julgada procedente, por provada, decidindo-se, em consequência:
a) Declarar que o A. é comproprietário, sem determinação de parte ou de direito, juntamente com a R., do imóvel sito (…), em Silves, descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o n.º (…);
b) Declarar que o A. é comproprietário, sem determinação de parte ou de direito, juntamente com a R. da viatura automóvel, marca Audi, modelo A1, com a matrícula (…);
c) Ordenar o averbamento da compropriedade do A. sobre os bens ora em referência, no registo predial e automóvel, respetivamente;
d) Declarar que o A. é comproprietário sem determinação de parte ou de direito, juntamento com a R., dos bens móveis que compõem o recheio do imóvel referido na alínea a) supra;
e) Declarar que o A. era comproprietário, sem determinação de parte ou de direito, juntamento com a R. do imóvel sito (…), em Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º (…), da freguesia de Santos-o-Velho, desde a data da sua aquisição, apenas formalmente registada em nome da R., em 25.11.2013 e até 19.02.2020, data em que a R. o alienou sem o consentimento e contra a vontade do A.;
f) Declarar que o A. era comproprietário, sem determinação de parte ou direito, juntamente com a R. da viatura automóvel da marca BMW, modelo X6, com a matrícula (…), desde a data da sua aquisição apenas registada formalmente em nome da R., e até à data da sua venda pela A. em finais de 2019;
g) Declarar que o A. é comproprietário, sem determinação de parte ou de direito, juntamente com a R., dos bens móveis que compunham o recheio do imóvel referido na alínea e) supra;
h) Condenar a R. a reconhecer que o A. é comproprietário, juntamente com a R., sem determinação de parte ou de direito dos bens referidos nas alíneas a), b), d) e g) e, bem assim, que foi comproprietário, sem determinação de parte ou de direito, juntamente com a R., dos bens referidos supra nas als. e) e f), no período compreendido entre a data do registo da sua aquisição pela R. e a sua alienação a terceiros, também pela R.;
i) Condenar a R. a restituir ao A., os seguintes bens pessoais deste com que se locupletou:
(i) Serviço de chá/café em estanho composto entre outros, por bule, açucareiro, prato oval grande;
(ii) Serviço de jantar em louça (antigo), de família, oferecido ao A. pelos seus pais;
(iii) Fio em ouro antigo, pertença do aqui A.;
(iv) Duas toalhas de mesa antigas, uma delas em renda, feita à mão, que pertenceu aos avós do aqui A.;
(v) Uma salva de prata, oferecida ao A. pelos seus pais;
j) Condenar a R. a conferir ao A. acesso para uso e fruição aos bens referidos nas als. a) e b), de cujo uso e fruição exclusivos se locupletou, pelo menos desde setembro de 2019, nos termos previstos no art.º 1406.º n.º 1 do CC;
k) Condenar a R. a pagar ao A., o montante de € 157.709,59 (cento e cinquenta e sete mil e nove euros e cinquenta e nove cêntimos), correspondente a ½ das mais valias auferidas com a venda do imóvel descrito na al. e) e juros de mora vencidos desde a data da alienação e até à presente data, e bem assim nos vincendos até efetivo e integral pagamento;
l) Condenar a R. a pagar ao A. a quantia de € 29.270,96 (vinte e nove mil duzentos e setenta euros e noventa e seis cêntimos) correspondente a ½ do valor investido pelo A., na aquisição da casa de Lisboa, acrescido de juros vencidos até à presente data, calculados à taxa legal em vigor aplicável às obrigações civis, desde a data da aquisição do imóvel (25.11.2013) e, bem assim, nos vincendos até efetivo e integral pagamento;
m) Condenar a R. a pagar ao A. a quantia de € 9.675,75 (nove mil seiscentos e setenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos), correspondente a ½ do montante da dívida contraída pelas partes junto dos pais do A. e que este já pagou na íntegra aos seus pais, acrescida dos juros já vencidos desde a data desse pagamento e até à presente data calculados à taxa legal em vigor aplicável às obrigações civis, desde a data do pagamento (08.04.2020) e até à presente data, e bem assim nos vincendos até efetivo e integral pagamento;
n) Condenar a R. a pagar ao A., o montante de € 10.601,64 (dez mil, seiscentos e um euros e sessenta e quatro cêntimos correspondente ao remanescente do 1/2 do produto da venda do automóvel BMX X6 realizada pela R., acrescida dos juros já vencidos desde a data desse pagamento e até à presente data calculados à taxa legal em vigor aplicável às obrigações civis desde a data estimada da alienação da viatura (01.12.2019) até à presente data, e bem assim nos vincendos até efetivo e integral pagamento;
o) Condenar a R. a pagar ao A. o montante de € 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros) a título de indemnização pelo período em que se locupletou do uso e fruição exclusivos do imóvel referido na al. a) supra, pelo menos desde setembro de 2019, acrescido do montante de € 375,00 ao mês desde a citação e até efetiva disponibilização ao A. do imóvel para seu uso e fruição previstos na al. j);
Caso se entenda que não pode ser reconhecido ao A. a qualidade de comproprietário dos bens objetos dos presentes autos,
p) Condenar a R. a pagar ao A. os montantes peticionados nas als. k), l), m), n), o) supra a título de enriquecimento sem causa acrescido do montante de € 107.000,00 (centos mil euros) também a título de enriquecimento sem causa, respeitantes aos bens referidos nas als. a) e b) supra, acrescido de juros desde a citação até integral pagamento.
Apresentou a final, como prova, entre outros, imagens de mensagens escritas trocadas entre si e a ré, via “Messenger/Whatsapp”, através de telemóvel.
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A ré contestou a ação, concluindo pela sua improcedência e consequente absolvição dos pedidos contra si formulados.
Relativamente à prova apresentada pelo autor, nomeadamente, as mensagens escritas estabelecidas e trocadas entre ambos via Whatsapp/Messanger, através de telemóvel, pediu o respetivo desentranhamento dos autos (documentos nºs 3, 4, 5, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21 e 25), por nunca ter autorizado aquele a usar tais mensagens relativas às suas relações pessoais, e o uso das mesmas constituir meio de prova proibido por violação do segredo relativo às comunicações e dados pessoais, consubstanciando, inclusivamente, o crime de devassa da sua vida privada.
*
O autor opôs-se à pretensão da ré.
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Dispensada a realização da audiência prévia, foi feito o saneamento do processo, fixado o objeto do litígio e elencados os temas da prova.
Apreciados, então, os requerimentos probatórios apresentados pelas partes, e no que concerne à junção da referida prova, foi proferida a seguinte decisão:
“Requer a Ré que todos os meios de prova relativos às conversas entre A. e R. por sms, whatsapp/Messenger, juntas pelo A. sejam desentranhadas dos autos porquanto a Ré não autorizou o seu uso por parte do mesmo, constituindo o uso de tais mensagens meio de prova proibido.
A tal se opôs o A..
Apreciando e decidindo:
As mensagens sms e os e-mails, enquanto documentos eletrónicos, integram-se no conceito de prova documental.
Está em causa nos autos comunicações efectuadas entre A. e R. que tem a mesma natureza que a correspondência, em nada se distinguindo de uma “carta remetida por correio físico”. E tendo sido já recebidas, “se já foram abertas e porventura lidas e mantidas no computador (ou no telemóvel, acrescenta-se) a que se destinavam, não deverão ter mais protecção que as cartas em papel em que são recebidas, abertas ou porventura guardadas numa gaveta, numa pasta ou num arquivo”. Cfr. neste sentido, ainda que no âmbito do processo penal, vidé Ac. da Relação do Porto de 22.05.2013, Relator: Melo Lima, Processo nº 74/07.3PASTS.P1., in dgsi.pt)
De igual modo se decidiu no Ac. R. Lisboa de 15/07/08, Proc. nº 3453/2008, www.dgsi.pt, em que se escreveu: “na sua essência, a mensagem mantida em suporte digital depois de recebida e lida terá a mesma protecção da carta em papel que tenha sido recebida pelo correio e que foi aberta e guardada em arquivo pessoal”, salientando ainda que “tratando-se de meros documentos escritos, estas mensagens não gozam de aplicação do regime de protecção da reserva da correspondência e das comunicações”.
Em face do exposto, indefere-se o pedido de desentranhamento.”
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Não se conformando com esta decisão, dela veio a ré recorrer, concluindo, assim, a motivação do seu recurso:
“A) Como resulta do
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