Acórdão nº 133/22.2T8PSR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-02-09

Data de Julgamento09 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão133/22.2T8PSR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

I. RELATÓRIO

1. AA e BB, vieram, ao abrigo do disposto no artigo 377.º do CPC, deduzir contra CC e DD PROCEDIMENTO CAUTELAR DE RESTITUIÇÃO PROVISÓRIA DE POSSE, pedindo, na sua procedência, que se ordene a restituição provisória aos Requerentes da posse do prédio imóvel urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... da freguesia de Montargil, melhor identificado no artigo 1. º da petição inicial, se necessário com arrombamento da porta de entrada e substituição da respetiva fechadura, colocada pelos Requeridos.

Para tanto alegaram, em suma, que:
- Em 03.01.2020, o Requerente marido, celebrou com EE e FF, um contrato promessa de compra e venda do imóvel urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... da freguesia de Montargil;
- A partir do dia 03.01.2020, os Requerentes passaram a utilizar o referido prédio como se fosse seu, onde aí passaram a guardar alguns bens/objetos pessoais, nomeadamente, um veículo automóvel com matrícula francesa, para, oportunamente, proceder à sua legalização, diversas ferramentas e materiais de construção;
- Desde essa data, os Requerentes têm vindo a exercer uma posse pública, pacífica e de boa fé, sem a oposição de quem quer que seja, à vista de todas as pessoas, acredita-se, inclusive, dos Requeridos.
- Em 11.03.2022, através de documento particular autenticado, foi celebrado, entre o Requerente marido e EE e FF o contrato definitivo de compra e venda, relativamente ao referido imóvel urbano;
- O Requerente marido deslocou-se ao imóvel no dia 11.03.2022 a fim de verificar o estado de conservação do mesmo e bem assim dos bens/objetos que ali havia guardado aquando da assinatura do contrato promessa de compra e venda (03.01.2020);
- Ao chegar ao imóvel e ao tentar abrir a porta, o Requerente marido constatou que a fechadura que lá existia havia sido arrombada, tendo sido trocada por outra, a qual continha uma chave introduzida no canhão, por dentro, que não a sua, o que o impediu de aceder ao interior do mesmo;
- Perante o Requerente marido e os Senhores Agentes da Autoridade, chamados ao local naquele dia, o Requerido marido assumiu um comportamento inflexível, no sentido de ser o proprietário do imóvel em litígio que, no seu entendimento, faz parte do imóvel que comprou.
- Os Requerentes foram, assim, impedidos de usar e fruir de um bem de que são possuidores, que lhes pertence, onde, tal como já referido, guardavam bem/objetos pessoais seus.
- Tais bens/objetos – à exceção do veículo automóvel de matrícula francesa – foram retirados do imóvel em causa pelos Requeridos.
Foi, oportunamente, proferido despacho liminar que determinou a citação dos Requeridos para os termos da providência cautelar.
Citados para os termos da providência, os Requeridos vieram deduzir oposição, defendendo, por um lado, que o imóvel (garagem) que ocupam é, pelo menos desde 1995, e talvez até mesmo antes, parte integrante do prédio descrito sob o número ...04 que adquiriram por compra e venda, e, por outro, pela localização e pela área que tem a garagem que ocupam, confrontado com a localização e a área que são referidas na petição inicial, a garagem que está agregada ao seu prédio (descrito sob o número ...04) não é o prédio reclamado pelos Requerentes (prédio ...03).
Mais impugnam os mesmos toda a matéria de facto alegado pelos Requerentes no que concerne à sua posse relativamente à garagem que os Requeridos agora ocupam.
Alegam, subsidiariamente, que, a ser julgada procedente a providência cautelar, sempre o prédio de que são proprietários, descrito sob o número ...04, tem servidão de passagem constituída sobre aquela garagem (prédio ...03), porquanto só por ali pode ser assegurado o acesso ao logradouro do seu prédio pela agora denominada Travessa ....
Concluem pela total improcedência da providencia cautelar e, subsidiariamente, a ser julgado procedente a providência cautelar, pelo pedido de reconhecimento, ainda que a título provisório, de direito de servidão de passagem do seu prédio (prédio ...04) sobre a garagem (prédio ...03) em disputa, a fim de por ali assegurar o acesso à Travessa ....
Notificados da oposição deduzida pelos Requeridos, bem como do teor dos documentos que a acompanharam, os Requerentes vieram reiterar a versão dos factos alegados na petição inicial, concluindo pela total improcedência da oposição deduzida, com a necessária procedência total da providência requerida.
Admitida a prova arrolada, foi determinada a realização de perícia aos imóveis dos Requerentes e dos Requeridos em causa nos autos, sendo certo que, notificado o respetivo relatório pericial junto aos autos, o mesmo não foi objeto de reclamação, tendo o Ex.mo Sr. Perito, a requerimento de Requerentes e Requeridos, prestado presencialmente esclarecimentos em audiência de julgamento.
Foi realizada audiência final, tendo, no âmbito da mesma, sido realizada inspeção judicial ao imóvel reclamado pelos Requerentes e ao imóvel que é propriedade dos Requeridos, no qual, segundo alegam, se integrará o imóvel reclamado pelos Requerentes.
Subsequentemente veio a ser proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo: “Por todo o exposto, julgo improcedente, por não provado, o procedimento cautelar apresentado pelos Requerentes AA e BB e, consequentemente, absolvo do pedido deduzido os Requeridos CC e DD.
Consigna-se que, perante a decisão de improcedência do procedimento cautelar aqui proferida, não há fundamento legal para apreciar o pedido subsidiário formulado pelos Requeridos na sua oposição, pois que o mesmo era diretamente dependente da procedência da providência”.

2. É desta sentença que recorrem os Requerentes, formulando na sua apelação as seguintes e extensíssimas conclusões:
a) A douta sentença recorrida decidiu – mal – ao absolver os Requeridos do pedido – providência cautelar de restituição provisória da posse – decisão pela qual, por isso, os Requerentes, ora Recorrentes, não se conformam.
b) A discordância dos Recorrentes relativamente à douta sentença recorrida prende-se com o facto de a absolvição dos Requeridos resulta da incorreta apreciação da prova documental junta aos autos e dos depoimentos prestados pelas testemunhas nas audiências de discussão e julgamento, relativamente à matéria de facto.
c) Na verdade, entendem os Recorrentes que a Mma Juiz a quo adotou uma postura pouco imparcial relativamente à matéria a julgar, manifestando ter a sua convicção formada desde o início do julgamento, o que determinou que a mesma, salvo o devido respeito, não tenha apreciado corretamente a prova produzida, não a analisando criticamente e com prudente convicção acerca de cada facto, ao contrário do previsto no n.º 5 do artigo 607º do CPC.
d) Face à prova documental junta aos autos, dúvidas não existem de que:
i. Existem dois artigos matriciais autónomos que correspondem a duas descrições prediais, também autónomas, sendo que a descrição predial ...04 corresponde à matriz 552 (referente à casa principal de habitação) e a descrição predial ...03 corresponde à matriz 156 (referente à garagem identificada como palheiro);
ii. GG e HH eram os proprietários de ambos os imóveis, os quais venderam a II, mãe do Requerente marido, em simultâneo e no mesmo dia, através de duas escrituras públicas de compra e venda realizadas no ... Cartório Notarial ..., em 05.01.2000;
iii. Sobre o imóvel correspondente à casa principal de habitação – descrição predial ...04 e matriz 552 – aquando da aquisição pela mãe do Recorrente marido foi constituída uma hipoteca voluntária a favor do Novo Banco, S.A.;
iv. Sobre o imóvel correspondente à garagem identificada como palheiro – descrição predial ...03 e matriz 156 – nunca existiu qualquer hipoteca, uma vez que o mesmo foi adquirido pela mãe do Recorrente marido sem recurso a crédito bancário;
v. Conforme se pode constatar quer pelos números das descrições prediais, quer pelos números da matriz, o imóvel em litígio nos autos (descrição ...03 e matriz 156) é mais antigo do que a casa principal destinada a habitação (descrição ...04 e matriz 552), ou seja, foi construído e registado, predial e matricialmente, primeiro (ano 1937) do que a casa de habitação (ano 1939);
vi. Tanto a casa principal de habitação como a garagem destinada a palheiro, têm áreas superiores às constantes nos respectivos documentos prediais e matriciais (levantamento topográfico apresentado pelos Requeridos);
vii. Em parte alguma da descrição predial e caderneta predial da casa principal destinada a habitação (descrição ...04 e matriz 552) consta que da mesma faz parte uma garagem e/ou palheiro;
viii. A garagem/palheiro é um imóvel autónomo, com as respectivas descrição predial e caderneta predial (descrição ...03 e matriz 156);
ix. O único imóvel que foi adjudicado ao credor hipotecário Novo Banco, S.A., no âmbito do processo de execução n.º 678/09.0TBPSR que correu termos no Juiz 1 do Juízo de Competência Genérica de Ponte de Sor foi a casa principal de habitação (descrição ...04 e matriz 552);
x. O Novo Banco, S.A. transmitiu o referido imóvel à sociedade Bestyellow – Sociedade Imobiliária Lda, a qual, por sua vez, o transmitiu aos Requeridos por contrato de compra e venda celebrado em 21.06.2021;
xi. O imóvel em litígio nos autos – garagem/palheiro – sempre foi propriedade da D.ª II, mãe do Recorrente marido, nunca teve registada qualquer hipoteca e/ou penhora e, como tal, nunca foi adjudicado por qualquer credor hipotecário nem tão pouco pela sociedade Bestyellow – Sociedade Imobiliária Lda, motivo pelo qual os Requeridos nunca adquiriram o mesmo;
xii. Por escritura pública de compra e venda realizada, em 29.12.2011, no Cartório Notarial .... JJ, o imóvel em litígio nos autos – garagem/palheiro – foi vendido pela D.ª II; mãe do Recorrente marido a EE e mulher.
xiii. Por sua vez, em 03.01.2020, o Recorrente marido celebrou com EE e FF um contrato promessa de compra e...

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